a fronteira: enigmas de outrora vol. i

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O jovem príncipe Nicholas, impulsionado por forças desconhecidas e perturbado por enigmáticos sonhos e visões, tem de partir de sua terra, Benedictio, para enfrentar os assombrosos mistérios e incontáveis perigos de um continente amaldiçoado, Sprevit. Para isso, terá de atravessar uma imensurável e abissal fronteira no centro do oceano. Nesta mortífera aventura, ele contará com a ajuda de um grupo muito peculiar de amigos. Infindáveis batalhas os esperam, bem como terríveis segredos sepultados há centenas de anos. O risco se torna ainda maior quando repentinas traições vindas de dois confusos triângulos amorosos surgem entre eles, colocando tudo a perder. Prepare-se para uma aventura muito além da imaginação, num mundo repleto de criaturas fantásticas, mistérios e magia!

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A FRONTEIRAEnigmas de outrora

l. scheleger

talentos da literatura brasileira

SÃO PAULO, 2016

Vol. 1

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A fronteira: enigmas de outroraCopyright © 2016 by Lucas Reis SchelegerCopyright © 2016 by Novo Século Editora Ltda.

aquisiçõesCleber Vasconcelos

preparaçãoFernanda Guerriero Antunes

diagramação e montagem de capaJuarez Sanches

ilustração de capaAlexandre Santos

revisão Lotus Traduções

NOVO SéCULO EditORA LtdA.Alameda Araguaia, 2190 – Bloco A – 11o andar – Conjunto 1111 CEP 06455 ‑000 – Alphaville industrial, Barueri – SP – Brasiltel.: (11) 3699 ‑7107 | Fax: (11) 3699 ‑7323www.novoseculo.com.br | [email protected]

texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), em vigor desde 10 de janeiro de 2009.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)(Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil)

Scheleger, L.A fronteira : enigmas de outrora, vol. iL. Scheleger.Barueri, SP: Novo Século Editora, 2016.

(Coleção talentos da literatura brasileira)

1. Ficção brasileira. 2. Ficção de fantasia. i. título. ii. Série.

15 ‑11033 cdd ‑869.3

Índice para catálogo sistemático:1. Ficção : Literatura brasileira 869.3

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Em primeiro lugar, agradeço a Deus por tudo em minha vida, principalmente por esta obra, e por muitas outras que ainda virão pela frente.

Agradeço ao meu fiel pai, pois sem ele o meu livro nunca seria publicado.

À minha irmã e a todas as pessoas em geral que me ajudaram.

Em especial, à editora Novo Século, por publicar este trabalho.

Enfim, a todos os que me apoiaram e abriram as portas para mim.

Obrigado de verdade a todos os leitores. Que eu possa transformar um dia de tédio em uma longa e intensa jornada em suas mentes, em suas imaginações…

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Em um mundo fantasioso e medieval, Nicholas, um jovem príncipe, obrigado e pressionado por forças desconhecidas, tem de enfrentar os mistérios de um continente amaldiçoado, porém, antes de chegar ao final, terá de ligar seus ocultos e enigmáticos sonhos com a realidade. Durante uma noite muito perturbada, teve sonhos e visões, reais e simbólicas, que nunca teve antes. Agora tem de desvendar segredos soterrados, sepultados há centenas de anos…

Os mistérios ocultos dos acontecimentos de trezentos anos de outrora se descorti-naram! Pois, minuciosamente, os estranhos sonhos de Nicholas trazem laços proféticos e se unem com acontecimentos do passado.

Essa terra medieval e fantasiosa, na qual habitam as reais naturezas ancestrais dos druidas e as mentalidades sobrenaturais dos psíquicos, é dividida em dois continentes que são separados por uma amaldiçoada, imensurável e abissal fronteira no centro do oceano. Toda essa terra é repleta de animais falantes com personalidades humanas, antropomorfismos, mistérios, enigmas, coisas sobrenaturais, mágicas, cômicas e tam-bém muitíssimo bizarras.

Agora, disposto a desvendar os enigmas do passado e os mistérios do ocultismo que pareciam mortos, Nicholas e um grupo de amigos humanos, junto de dois lagartos gêmeos e um elefante, partirão numa duradoura e mortífera aventura longe de seu continente abençoado, Benedictio, para enfim desvendar os segredos que envolvem o continente amaldiçoado, Sprevit, onde, há trezentos anos, ocorreu uma épica mor-tandade. Alguns, porém, colocarão quase tudo a perder, pois ninguém esperava por repentinas traições vindas de dois confusos triângulos amorosos.

A seguir, novos universos de romances, guerras, batalhas, profecias, aventuras, mistérios, suspenses e imprevistos serão abertos como um leque na vida do jovem prín-cipe Nicholas e de seus amigos!

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“Há madrugadas que não são feitas para dormir, e sim somente para esperar o pior, provindo do mundo real ou sonhador…”

Era uma vez, em um universo paralelo onde até as rochas tinham vida, um jovem príncipe que vivia em um planeta tão bizarro, que nem mesmo os dragões surpreendiam alguém. A vida nesta terra ilusória – mas impossível de ser iludida – era cruel. Revi-ravoltas e traições jamais esperadas mudaram completamente o

rumo deste planeta, diferentemente de todos os outros universos.Era uma vez um jovem príncipe, em um mundo tão, mas tão real, que a

dor era diária, a vida era passageira, a esperança jazia, o amor era traiçoeiro, e o tempo, o único e verdadeiro aliado, fazia os maus presságios irem embora e as feridas cicatrizarem. No entanto, as marcas de um final nem sempre (ou talvez quase nunca) feliz permaneceram juntas, em um mundo tão, mas tão real e tão distante…

* * *

O grandioso céu noturno, ausente das estrelas e da lua, contempla todo o Império Mefizeboth, e a neblina que desce do céu como estrela caden-te comprime todas as vidraças mais altas do palácio imperial. As remotas cordilheiras erguidas do coração da terra, mais antigas do que as próprias

PrÓlOgO

VIGÍLIAO intermédio entre o mundo real e o mundo surreal

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estrelas, continuam inertes por mais um dia, contemplando o céu ausente de luz. As brisas, que de dia são calmas e calorosas, agora estão gélidas e perfurantes, e como um único ser percorrem todo o planeta, com toda a sua onisciência e onipresença.

Em mais uma assustadora e perigosa madrugada, durante o repouso per-tencente à Noite Oculta, na torre mais alta e no pico mais elevado do gran-dioso palácio, o príncipe Nicholas repousa em seu grande e escuro quarto repleto de várias riquezas materiais. Abastecido por belos lustres, abajures, pisos de mármore, camas e cobertores, o cômodo é adornado por finas joias e nobres armários de madeira antiga. Todas as outras riquezas, incluindo o próprio luxo não provindo da alma humilde de Nicholas, e sim do palácio no qual ele habita, estão perdidas em meio a essa escuridão noturna e passageira.

Deitado em sua cama e coberto da cabeça até as pontas dos pés, Nicholas se revira de um lado para o outro, como quem está agoniado pelos pensa-mentos e pelo sufocante calor proveniente de seu corpo. Uma perturbadora e insistente insônia como essa nunca o havia acometido antes.

A fim de inalar mais oxigênio como forma de concentração para meditar e entrar direto em seu tão querido sono, o príncipe retira um pouco o cober-tor da cabeça, deixando à mostra somente os olhos fechados.

Som de cascos frios como gelo colidindo no telhado de aço de seu quarto funde-se ao vento seco que vaga dos oceanos repousantes, oce-anos repletos de vida marítima somente da alvorada até o crepúsculo. Uma forte corrente de vento sopra incessantemente, nascida no coração de eternos furacões, todos provenientes de um oceano remoto, ermo e inexplorado, extremamente temido por todos. Por causa da longa viagem feita por esses ventos, centenas de quilômetros distantes dali, eles chegam apenas como brisas medonhas, levando consigo a maresia de seu imensu-rável e desértico oceano.

Por ocasião do destino ou por mera impressão, essa corrente de fraquís-simas e misteriosas brisas vagantes parece estar chegando o mais próximo possível do príncipe Nicholas, deixando a mente dele confusa, sem que con-siga distinguir se elas são apenas força da mãe natureza ou realmente alguma perseguição maligna. O jovem sente-se atordoado e se torna vigia de seus próprios pensamentos paranoicos… Ou talvez verdadeiros.

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No telhado, o temido suspense ainda continua como o arranhar de garras afiadíssimas contra o aço, enquanto o proveniente som agudo e frio quase perfura os tímpanos do príncipe. Rapidamente e com uma tremedeira acom-panhada de pavores e profundas respirações, o jovem Nicholas se contrai e pressiona o cobertor sobre o corpo, arregalando os grandes olhos casta-nho-escuríssimos. Com mãos, lábios, face, testa e couro cabeludo úmidos molhando o cobertor, ele olha em direções alternadas, mas não é possível ver nada além do branco de seus espantados olhos no breu do próprio quarto.

Como em noites sem estrelas, um sonoro pio de um raríssimo pássaro atravessa as paredes de seu quarto e entra em sua mente.

– Ahn? Quê? É você? É você? – ele indaga um pouco assustado, procu-rando por algo ou por alguém que parece ser benigno e íntimo dele.

Mas o que será que é?, ele se questiona em pensamento.Alguma lembrança de infância? Alucinações dessa noite maldormida?

Ou talvez algum fruto de sua imaginação e do pavor dessa perturbante in-sônia? Nicholas levanta-se da cama em um único salto, sabendo que não há chance de encontrar absolutamente nada nem de saber de onde vem esse pio. Perplexo, ele então cai de joelhos em sua quentíssima e confortável cama.

Agora, o som de garras e cascos retorna incessantemente, como se criaturas medonhas trepidassem e andassem pelo seu telhado de aço. Barulhos agoniantes acompanhados dos sussurros das brisas viajantes perfuram a grossíssima pro-teção de concreto do seu quarto e novamente atordoam a sua mente sem sono.

– Carniceiros!? Mas é muito distante de suas moradas, raramente eles aparecem por aqui. Muito estranho… Por que isso? E por que bem aqui em meu palácio? – murmura.

Em seu coração, Nicholas sente os dizeres do seu próprio espírito. En-tão, afundado na paranoia, ou talvez não, acaba por confirmar que tudo isso se trata de uma grande perseguição maligna. O motivo, porém, ele não sabe, apenas sente e conclui se tratar dos medonhos monstros conhecidos como Carniceiros.

– Espero que você ainda saiba se cuidar… – diz dolorosamente, preocu-pado e referindo-se a quem possa ter emitido o pio e, novamente se reviran-do, se mexendo e se contorcendo para todos os lados a fim de tentar dormir.

Algo continua a incomodá-lo infindavelmente, perfurando a sua carne, acertando o seu coração, passando por sua alma e contaminando o seu espírito.

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Nicholas não sabe distinguir o que é, se opressão de alguma força maligna ou alguma ajuda benigna lhe dando sinais para que fique alerta. Seus pensamentos continuam a rondá-lo insensata e confusamente, mas agora, por algum milagre, parece que o jovem realmente está começando a cair no sono. Sua mente está repleta de raras imagens, talvez lembranças ou apenas algum sonho ou pesadelo. Ainda com metade do cérebro ligada ao mundo real, e a outra, ao mundo dos sonhos, um assustador jogo de cartas se inicia. O corpo de Nicholas e seu des-gastado espírito querem e necessitam dormir, mas uma força misteriosa além da verdadeira e abissal fronteira não o deixa entrar em transe.

Nicholas sente que uma guerra incontestável foi iniciada dentro de seu cor-po, como uma força maligna trazida pelos ventos de um gélido e ermo oceano amaldiçoado. A mente dele parece um oceano de profundezas atormentadas, porém sua alma é como água superficial, completamente calma e vívida.

De repente, como um imprevisto e incontestável furacão, o barulho es-trondoso retorna sobre o telhado de seu quarto e imediatamente leva embora toda aquela meia paz, revertida em total desespero e prantos. Ele tem a certe-za de que uma brutal invasão está prestes a acontecer, perante essa traiçoeira madrugada e adentro de seu quarto.

– Carniceiros! Carniceiros! São eles! – grita, contorcendo-se ainda mais na cama e rezando para que essa fúria seja apenas passageira.

Essas criaturas também emitem fortíssimos bramidos e uivos estridentes, e a cada momento que se passa, o som parece estar mais e mais forte, como se um maremoto estivesse colidindo contra gigantes e firmes montanhas.

– Mas que Carniceiros malditos! O que eles querem de mim!? Pelos deu-ses*! Por que não saem do meu telhado!? Em todo o meu tempo de vida, nunca fizeram pouso nem tentaram invasão sobre o meu telhado! O que esses Carni-ceiros, que residem tão, mas tão distante, querem comigo? – resmunga o prín-cipe, virando-se de bruços e pondo o travesseiro sobre a cabeça e os ouvidos.

O jovem Nicholas sabe que seu quarto é extremamente protegido, então seria impossível invadi-lo, porém ele também tem o conhecimento de que na parte oculta da escuridão noturna todas as formas de vida que se encontram com esses Carniceiros morrem antes mesmo de conseguir iniciar uma fuga.

* A expressão “pelos deuses”, utilizada por Emaneus, é uma gíria que expressa sentimen-tos, emoções, indagações, euforias, inconformidade.

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O príncipe está entre uma noite aconchegante bem-dormida em sua confor-tável cama e uma morte violenta contemplada por todas as estrelas.

Por que você tinha de piar e dar sinal? Mas que perigo vagar por aí, ain-da mais com esses Carniceiros ao redor… Espero que os deuses atendam às minhas preces, murmura em sua mente com um tom de quem está muito preocupado, referindo-se àquele estranho sujeito do qual somente ele tem conhecimento.

Com a contemplação de uma lua de sangue, como um exército aliado de soldados feridos lançando-se da parte mais alta dos mármores de seu imensurá-vel palácio. Fechando totalmente o céu junto de um eclipse milenar, como uma chuva de lanças em uma eterna guerra vespertina, sucumbindo todas as nuvens, impetuosamente espalhando o caos e a discórdia. Dessa maneira são os sons ui-vantes, que não cessam e atravessam toda a rigidez do aço de seu quarto, rangen-do em sua mente e deixando o príncipe Nicholas quase à beira da loucura.

– Parem! Parem! Parem, seus monstros malditos! O que vocês querem de mim? – murmura com a voz baixa, trêmula e embargada, ainda pressionando fortemente o travesseiro sobre a sua cabeça.

De repente, o mesmo pio penetra sua atormentada mente, sossegando-a de imediato e enchendo-a de tranquilidade e paz. Fechando a boca de todas as criaturas malignas e atravessando as paredes de aço e concreto do seu quarto, o pio cala os rugidos dos Carniceiros e os espanta por completo, como um suave cântico.

Nossa, os Carniceiros se calaram e não estão mais andando em meu telha-do! Que milagre é esse? Eu sempre soube que você não era normal, e sim muito mais que especial. Pouco tempo após, paz e silêncio, boquiaberto, ele pensa positivamente se referindo ao sujeito do manso pio.

Um mero cântico, O pio de uma ave abençoada…

Intensamente, mais da metade de dúvidas e opressões agoniantes que estavam em seu corpo e em sua alma se dispersa para outra dimensão, dei-xando-o leve e tranquilo, porém a insônia ainda persiste. A certeza caminha em seus pensamentos, fazendo-o realmente saber que é perseguido pelo ma-ligno, mas o mesmo mal que o persegue tem algum rival: aquele que cessou

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os Carniceiros e que agora está trazendo a paz para o jovem tentar entrar em um belo e longo sono.

De barriga para cima, Nicholas espalha o cobertor sobre si e mais uma vez fecha os olhos. Subitamente, imagens ofuscadas e sem brilho começam a se formar em sua mente, já quase entrando em transe, enquanto a mesma força cruel e perseguidora que o colocou nesse carma vigilante de insônia ainda tenta retirá-lo do mundo dos sonhos. Em contrapartida, a misteriosa e repentina força benigna o relaxa, levando-o aos poucos para um universo cheio de sonhos simbólicos e primordiais.

Agora, tal qual uma pessoa à beira da morte revivendo todas as memórias de sua vida, Nicholas entra de uma única vez no universo paralelo entre o mundo real e o mundo surreal. Segundos antes de cair em sono profundo, o príncipe revive sonhos e imagens embaralhadas, e vê acontecimentos ocultos jamais presenciados em toda a sua vida. Mistérios enigmáticos, coisas ini-gualáveis, profecias desconhecidas e sonhos inimagináveis.

Cinco profecias simbólicas repletas de experiências sobrenaturais, ou di-ria visões simbólicas, cinco dessas perturbam e nascem em sua mente…

* * *

Surgem, então, imagens de uma oficina musical em ruínas e abandonada há séculos, totalmente moldada, criada e amparada pela soberania da arte, repleta de poeira e teias de aranhas que se entrelaçam do chão até o teto. Com paredes concretizadas por rochas grossas e rachadíssimas que deixam escombros nos chãos, essa oficina é repleta de velhos e antigos instrumentos musicais feitos de madeiras nobres. Nela há também pequeníssimas caixi-nhas mágicas de músicas, que mais servem como fartas relíquias, e cadernos de desenhos e velhos quadros de muitíssimos talentos, a maior parte deles caída ao chão e danificada.

O que chama a atenção nessa oficina é um grande quadro com um com-pridíssimo rasgo em seu centro, preso à parede e bastante empoeirado, em oposição à sua fortíssima pintura, como se estivesse há mais de duzentos anos abandonado. Ele está um pouco inclinado para a direita e sua ilustração representa uma imagem ofuscada de uma desolada e nebulosa montanha.

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Uma montanha enigmática e muito almejada, Cuspida pelo magma da Terra e erguida em solo real,

Ou criada pela mera imaginação de um pintor…

Cenários esculturais de pedras vêm à mente de Nicholas, em uma sala com várias paredes divisórias e pequenos fragmentos de rochas espalhados por todas as partes. Lá há uma estátua caída e quebrada, repleta de rachadu-ras, e a mais profunda de todas nasce em seu peito esquerdo, onde também se encontra o seu destroçado coração. É a estátua de um jovem rapaz, cujo rosto sofredor e desamparado parece ser de um ser humano que acabou de presenciar sua fatal morte.

Essa mesma estátua segura a mão de uma estátua feminina, com finos e belos traços faciais juntos de seus compridos fios capilares também concre-tizados. Assim como na estátua, nela também há grandes fissuras, e a mais profunda delas provém de seu coração de pedra. Os olhos estão fechados e o seu semblante é tristonho, acompanhado de muito espanto, como se estivesse vendo algo aterrador antes de sua crucial morte.

Como um casal, as mãos e os dedos de ambos se entrelaçam de forma incontestável e inseparável. Mesmo sendo apenas estátuas, o sangue averme-lhado e seco, provindo das nascentes de seus mortos e concretizados cora-ções, contrasta em seus corpos de pedras, marcando, manchando e se espa-lhando por ambas as estátuas.

Uma mera e enigmática caixinha de música, mesmo também feita de pedra, lança um eterno e calmo som de mansas ondas, destacando-se nos braços da bela moça.

Formando uma eterna e sólida, Dolorosa morte…

Em uma bela e infinita planície, completamente moldada por um majesto-so e também infinito jardim, repleto de verde, flores e, principalmente, imen-sas árvores floridas, há três estátuas em formato de pássaros com tamanhos e portes grandiosos. Os seus detalhes são tão perfeitos e raríssimos, que parecem

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até ter sido construídas pelos próprios deuses, que, depois de tanto trabalho perfeccionista e árduo, passaram a eternidade apenas em repouso profundo.

Uma das aves parece arquear voo, com o seu grande bico erguido em sinal de soberania e a bramir incessantemente. As suas grandes asas de pedra estão abertas em uma extrema envergadura, prestes a resplandecer um magnífico voo.

A ave do meio está parada em pé, em uma posição normal e serena, e seu bico está fechado e retilíneo, acompanhando o seu suficiente olhar. Como o de um dourado pavão, o seu grandioso e compridíssimo rabo de penas ro-chosas vagueia e se estende por todo o chão.

A última ave parece tristonha e em uma posição de que está a chocar algo, talvez um ovo de pedra, mas é somente sua posição corcunda e depreciativa. Ela está de cabeça e bico inclinados para baixo, com os olhos fechados. Apa-renta estar depressiva, sábia e sem esperanças, que tem o conhecimento de um futuro mortífero e devastador e o previu.

Repentinamente, um forte vendaval passa por toda a infinita planície, sem local de nascença determinado e muito menos de parada, apenas so-prando como um oceano de ondas eternas. Imediatamente toda a planície e o seu jardim secam por completo, apodrecendo e morrendo aos poucos. O verde se torna amarronzado e as cores, antes vívidas, estão acinzentadas; tudo cai perante o solo também morto.

As aves ainda estão firmes e extremamente concretizadas, indestrutíveis, mesmo depois desse forte vendaval, quando, de repente, desce dos céus uma cor-rente de vento espiral passando entre as três legendárias aves. De primeira vista o vendaval aparenta não causar danos, porém, quando toda a maligna tempestade cessa, como um lento e triunfal desmoronamento, as indestrutíveis rochas pro-vindas das dimensões dos deuses começam a rachar: primeiro o pescoço, depois a cabeça, colidindo contra o chão e liberando cortantes raios brancos de dentro delas. As estátuas continuam a cair e seus fragmentos se espalham, restando ape-nas pó. As três estátuas dos deuses foram, então, destronadas.

Quando uma fortíssima tempestade é prevista, Os danos são poucos;

Porém, quando se está duro e inerte feito uma rocha, Qualquer vendaval pode derribar…

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* * *

Sob um céu estrelado, no pico de uma destroçada montanha repleta de árvores secas, frágeis e mortas, assim como o próprio clima seco e nebuloso da região, há um grandioso e acinzentado castelo em ruínas. O seu tama-nho é exuberante e toda a sua magnificência é repleta de formosas torres. É um belo castelo, construído por imensos blocos de resistentes rochas, porém quase tudo está em total desmoronamento, em total declínio.

Nascendo no centro do castelo e erguendo-se ultrapassando até as neblinas, é possível ver a torre mais alta do mundo, antigamente reta, mas agora em total declínio e tortuosa. A sua grandiosa altura também ultra-passa as nuvens e até as montanhas dos arredores, e sua fina estrutura e seus telhados estão muitíssimos úmidos, quase desabando por completos. Em lentíssima velocidade escorrem rios de águas das chuvas e das nebli-nas, penetrando em suas rachaduras e apodrecendo mais ainda toda a sua fragilizada estrutura, a que outrora nem mesmo os poderosos dragões de sangue frio, com seus furores e bramidos, conseguiam sequer causar algum arranhão.

Os relâmpagos são contínuos, com os seus raios iluminando magnificamente toda a área da fina torre, lançando estrondosos trovões junto de forças devasta-doras que denigrem mais ainda a rochosa e velhíssima estrutura dessa torre.

Através da única e quebrada vidraça, por meio da qual não cessam as en-tradas dos chuviscos de chuvas e as gélidas neblinas, em uma poça próxima da janela desse deserto e imundo quarto, é possível ver uma estátua rachada e caída no formato de um rei morto. De olhos fechados, com semblante de conformação, os seus braços estão estendidos pelo chão em formato de cruz, e os seus trajes são uma imensa capa, grandes botas e luvas, braceletes e um majestoso cinturão. O seu cabelo é expansivo como o de um verdadeiro rei e leão, enquanto a sua majestosa coroa é repleta de joias. No entanto, trata-se apenas de uma acinzentada e velha estátua, nada mais do que isso…

Em todo esse cenário de morte e angústia, o mais chamativo e intrigante é uma mortífera e peçonhenta serpente de olhares maliciosos, língua para fora e com o corpo completamente enrolado ao pescoço do grandioso rei morto, outrora bravo como um leão, cuja magnificência era tão formosa quanto a de um impetuoso felino. A serpente das sombras e das névoas mantinha uma

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posição sucumbida e triunfal, como se o réptil de sangue frio acabasse de realizar o seu tão silencioso e traiçoeiro assassinato.

A hierarquia pode ser a de um majestoso rei, Dominante sobre um grandioso castelo,

Porém basta apenas uma mera e traiçoeira víbora, Para acabar com todo o seu reinado e esplendor…

* * *

Em um quilométrico vulcão de altitude incalculável, manso, inativo e completamente lacrado de qualquer resíduo fatal de lava ou enxofre, há um belo altar feito de raríssimas rochas negras e que desde eras passadas ema-nam divinas cristalizações místicas. No topo desse altar, um objeto intrigante e almejado por todo o universo: uma coroa feita de ouro e com belas ondula-ções fazendo parte de toda a sua arte.

Nessa coroa, em uma seguida ordem, conta-se um total de nove pedras preciosas, como rubis, esmeraldas, safiras e um grandioso diamante em seu centro, sendo como único; cada uma das pedras representa um nome. As luzes radiantes da alvorada cortam toda a atmosfera e penetram sua dourada rigidez, contrastando toda a sua riqueza espiritual e material, transformando-a em uma pequena estrela terrena que resplandece uma aurora poderosíssi-ma provinda das galáxias mais distantes, capaz de petrificar todos que ousam se aproximar de sua exuberante glória.

No perímetro do vulcão, incluindo toda a área extremamente quilomé-trica e sem fim de todo o seu arredor, há milhares de estátuas de soldados vestidos com armaduras de guerra, capacetes modernos, todos empreitando lanças, espadas e escudos. Alguns guerreiros estão montados em estontean-tes cavalos, também feitos de pedra, e outros soldados, em grandes torres, manuseiam poderosíssimas catapultas. Se são estátuas moldadas e constru-ídas por belos talentosos ou seres vivos que realmente foram petrificados nessa eterna e imortal guerra santa, isso não se sabe…

Escalando o vulcão, também há milhares de guerreiros feitos de pedras, como se tivessem sido petrificados enquanto escalavam, porém o vulcão é

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tão alto, que todos eles demorariam anos até chegar ao topo. Todo esse alvo-roço e guerrilha são causados pela inveja do esplendor de uma divina coroa.

Em meio a toda essa guerra, o que acaba por ser mais fatal e chamativo é a presença de um gigantesco, crucial e inigualável dragão também feito de ro-chas, pairando entre as calorosas e mansas nuvens. A criatura está totalmente inerte, sem cair ou ser movida, como uma imensa e mágica estátua flutuante que desafia toda a lógica.

Enquanto os milhares de guerreiros petrificados há milênios sofrem os efeitos do poder da natureza, como rachaduras, umidade e infiltração, a estru-tura desse imenso e superior dragão considerado o deus do submundo, mesmo petrificado há milênios, não sofre nenhum dano, nenhum arranhão sequer.

A sua majestosa envergadura de asas escamadas e rochosas impede as fortíssimas tempestades. A sua compridíssima e rochosa calda combate as hordas de relâmpagos, o seu grossíssimo e resistente dorso compete des-truindo até estonteantes asteroides, e sua grandiosa mandíbula e sua gargan-ta, mesmo petrificadas desde os primórdios até hoje, exaltam um rugido que vagueia pelos séculos do séculos.

O furioso dragão nascido da lava e herdeiro do submundo, sem cessar, libera continuamente esse infinito rugido milenar, esperando somente o mo-mento certo de ressurgir a vida.

Um eterno rugido que percorre todos os céus e vales da Terra, Liberando completamente o seu ódio e furor,

Crente que em algum século ele retornará ao seu corpo carnal, Para então engolir, de uma única vez,

A coroa representante de todo o cosmo universal…

* * *

Essas foram as imagens e os cinco acontecimentos ofuscadíssimos que percorreram a mente do jovem príncipe Nicholas, depois que a suposta e misteriosa força benigna conseguiu extorquir por completo a enigmática oferenda maligna que tanto o atormentava. Sem se lembrar, nem um pou-co sequer, dessa sua noite de vigília e insônia, bem como das embaralhadas

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imagens não vistas, e sim vividas no mundo intermediário, finalmente o príncipe entra em sono profundo.

No próximo dia e seguindo a sua vida adiante, ele jamais saberá o que aconteceu nesse intermédio entre a vida e o sono, entre o mundo real e o surreal… Nunca…

Agora, quatro sonhos reais, proféticos e simbólicos, dos quais ele jamais se esquecerá e que marcarão para sempre em oculto a sua vida, serão revela-dos pelas garras do destino…

Entrando de uma única vez em sono REM,* Ele agora começa a vivenciar o real,

O passado, as profecias e os símbolos, Numa madrugada que marcará eternamente a sua vida,

E, até depois da morte, deixará vestígios em sua alma e seu espírito. Sonhos nunca antes…

… sonhados.

* Sono REM, ou Rapid Eye Movement (movimento rápido dos olhos, em inglês), é a fase do sono em que ocorrem os sonhos mais vívidos. Nele, percebe-se a movimentação rápida dos olhos e uma atividade cerebral similar àquela quando estamos acordados.

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1a parteO homem de preto

“Há males que vêm para o bem, porém também há males que vêm para a morte…”

Acontecimentos da virada de ano 31 de dezembro de 15074o período de noiteContinente Benedictio

A cidade turística de Nobezor, entre todas as outras cidades e im-périos, mesmo separada pelo imenso oceano Astrul, continua sendo a cidade mais próxima do Abismo da Fronteira. Diante dela há uma enorme e magnífica praia de ondas calmas e águas puras. Uma completa costa marítima acompanha toda a ex-

tensão do continente, formando praias não só por Nobezor, mas também por todo o continente Benedictio, mais conhecido como o continente abençoado. O oceano Astrul não é somente uma imensidão de águas azuis e puras, mas também é universo de novas vidas misteriosas e fabulosas.

cAPÍTUlO 1

SONHOS ENIGMÁTICOS

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O abismo, também chamado de Abismo da Fronteira, tem uma largura incalculável e localiza-se bem no centro do planeta; ele é a própria fronteira, e a fronteira é ele mesmo. Segue ao leste do oceano Astrul, quilômetros e quilômetros após todo o litoral marítimo e praiano do continente Benedictio.

Todo o continente Benedictio é abastecido pelo oceano Astrul, que tam-bém segue caminho até o Abismo da Fronteira, derrubando as águas por toda sua lateral e formando uma cachoeira sem fim, que deságua até os es-combros do planeta. Seu desaguar, porém, é tão calmo, que mais forma cân-ticos agitados do que barulhos estrondosos.

De norte a sul e de sul a norte, esse abismo ou fronteira colossal circunda todo o planeta, com uma profundidade que leva a partes infernais e desconhe-cidas: seus confins sem fins com quilômetros de profundidade. Há grandes hordas separadas e afiadíssimas de quilométricas estalagmites originadas de seu solo, todas provindas do abismo mais escuro; às vezes suas pontas chegam até o topo do abismo, algumas passam um pouco, outras nem chegam. Mas elas ocupam apenas uma pequena parte do abismo da fronteira.

Esse abismo é considerado uma fronteira, pois separa o oceano Astrul do oceano Morral. Assim como a sua profundidade, a sua largura também é incalculável, justamente para não ser atravessado por meros mortais. Uma das maneiras de cruzá-lo, porém sem permissão, seria a bordo de balões ou dirigíveis, mas é extremamente arriscado, por não se saber o que esperar do outro lado do continente.

As histórias da Terra e dos dois continentes hão de sempre dizer que esse abismo fora fundado pelos mesmos deuses, criadores do próprio planeta há milhões de anos, com o intuito então de dividi-lo em dois continentes abenço-ados. Por serem deuses, realizaram essa façanha de abençoar os dois continen-tes, porém, por intermédio das maléficas vontades e soberanias dos homens séculos atrás, o continente do leste foi amaldiçoado pelos próprios homens.

Apenas um continente conseguiu se sobressair, considerado o abenço-ado: o continente do oeste, o Benedictio. Nele há três impérios, domina-dos por três raças diferentes, tudo na maior civilidade possível e pacífica, com muita prosperidade. O clima de lá é tropical e em suas terras férteis não há cortiços, periferias, favelas, becos, tampouco escravidão, indigentes ou mendigos passadores de fome. Nesse continente preza-se pela vida, saúde, educação, habitação, família e pelo casamento agregado em valores

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de fidelidades, também em farturas de vida e prosperidades. A política prevalece e prospera, e ninguém vive mais em condições suburbanas, sub-humanas ou miseráveis.

A trajetória da história inicial do século I, e também desde antes da colonização por completo do próprio continente abençoado, é um misté-rio; todos creem que os humanos foram depositados pelos próprios deuses nesse continente.

De Sprevit, o outro continente, amaldiçoado, maldito e rejeitado – o continente do leste –, praticamente nada se sabe. Conhece-se um pouco do clima, porque suas nuvens de maléficas tempestades vão para o continente Benedictio e sempre se profanam do leste. Pesquisadores e sábios que já o observaram de pequenas ilhas e barragens do oceano Astrul, próximas ao Abismo da Fronteira, têm uma breve noção a respeito do oceano denomina-do Morral, cujas águas são as mais espessas, densas e escuras que existem. A potência de suas águas é tão forte, que elas são capazes de petrificar os que lá mergulham ou se banham. Pássaros jamais foram vistos sobrevoando por lá à procura de peixes, muito menos barbatanas e outros animais marinhos.

Muitas vezes aventureiros e pescadores navegavam, até recentemente, os navios seguros destinados aos mais ricos pelo Oceano Astrul adentro… Algumas vezes, quando esse mesmo oceano estava em ressaca e tão revolto quanto a fúria dos deuses – tanto nos tempos atuais como séculos atrás –, havia muitas notícias de embarcações que se perdiam e nunca mais volta-vam por esse oceano do próprio continente abençoado… Todas essas em-barcações eram perdidas pelos naufrágios, mergulhando os seus passageiros e os matando afogados nas profundezas mais ocultas e gélidas dos mares e oceanos. Outras embarcações eram sugadas pela fúria das quilométricas Ca-choeiras Abissais, matando-os e derrocando-os abismo e fronteira adentro. Uma morte abissal, tragada ao centro da Terra, inundada de águas oceânicas, enxofre, barro e lava, da qual nem suas almas conseguem se salvar.

As correntes marítimas do oceano Morral são fortes como os seus ven-davais, enquanto que a cachoeira abissal do oceano Astrul é calma e de águas brilhosas e cristalinas. A cachoeira abissal que caminha do oceano Morral se despeja pela lateral leste do abismo, com águas bravas e furiosas, sempre de ressaca, jorrando para dentro do abismo de maneira incontrolável, destruti-va e estrondosa. Há uma grande diferença entre essas Cachoeiras Abissais,

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divididas pela fronteira: a oeste, encontramos o oceano Astrul, de marés cal-mas; a leste, o oceano Morral, de águas tortuosas.

Ao avistar as nuvens carregadas do continente Sprevit, pode-se constatar que o seu clima é inundado, diluído pelas nuvens umbráticas e domadas pela penumbra. Por alguns relatos, sabe-se que lá nunca há os sóis e seus belos dias, apenas eternas noites que se deixam por sempre revelar a parte mais densa e amaldiçoada da Grande Lua… Noites macabras acompanham tempestades com tornados destrutivos, chuvas ácidas e de relâmpagos estrondosos. Não se sabe se lá há alguma forma de vida, muito menos de terras e suas plantas. Ninguém consegue realmente investigar o continente Sprevit e seu assustador oceano Morral, por muito medo do que possa ser encontrado neles.

É proibido pelos três impérios do continente Benedictio se aproximar do Abismo da Fronteira ou atravessá-la, punível de prisão perpétua ou até pena de morte. Diante de tantas leis e regras sobre esse continente amaldiçoado, até hoje ninguém sabe sobre a sua verdadeira história milenar, sua colonização e o porquê de esse continente ser assim.

Nesse mesmo traiçoeiro continente, ocorreu a Épica Mortandade do Sé-culo XII: milhões de soldados de todas as raças morreram misteriosamente em missões de novas colonizações e minerações, havendo somente quatro remanescentes…

Até hoje esse segredo, Em oculto,

Permanece guardado a sete chaves, E enterrado no fundo do abismo…

* * *

Em Nobezor, durante a virada de ano, há o que chamam de celebração. Mi-lhões de pessoas, lagartos e mastodontes se locomovem de seus três impérios diferentes, sobre grandes dirigíveis, montarias, carros puxados a cavalos, carros-fortes movidos a energia solar, a vapor ou brasa. É uma migração de milhões de milhões. Trabalhadores das cidades-pilares também saem de seus trabalhos para comemorar o ano-novo, mas há aqueles que não embarcam nessa longa viagem e continuam em suas terras natais, onde também há suas festas.

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Durante os dois períodos do dia e o 3o período de noite, todas as come-morações são feitas por milhares de pessoas, que admiram os dois sóis de dia até a Pérola dos Deuses de noite, enquanto curtem as atrações da cidade e as praias. Quando o 4o período de noite chega, há muitíssimas tempesta-des, mas que são os menores problemas perto dos Carniceiros. Essas criatu-ras abissais, terrestres e até voadoras rondam incessantemente à procura de alimentos vivos ou carnes putrefatas, verdadeiros caniçais. Seu paladar tem preferência por corpos em decomposição e estragados; quando matam algo vivo ou saudável, acabam por esperar o primeiro estômago o decompor para depois vomitar o alimento e em seguida comê-lo de volta. Assim, alimentam-se do mesmo corpo, que dessa vez está estragado.

Essas criaturas errantes alimentam-se também de ossos velhos e secos. Infelizmente há casos semanais de pessoas e animais mortos por Carniceiros, ou de túmulos e sepulturas violados daqueles que jazem em paz.

Uns dizem que o Abismo da Fronteira abriu as portas do cemitério para essas criaturas saírem, outros contam que são apenas bichos noturnos e bi-zarros que vivem nas profundezas escuras do abismo, mas na realidade nin-guém sabe ao certo o que eles são.

Há um muro de proteção que cerca por completo toda a grande cidade de Nobezor, com exceção da praia e sua orla, porém os que querem curtir a praia nos períodos diurnos devem sair da cidade através dos muros, pelas peque-nas passagens propriamente feitas para esse procedimento. Esse muro tem 20 metros de grossura e 200 metros de altura, e seus tijolos são feitos de rochas marítimas grossas, encontradas somente nas profundezas do oceano Astrul.

Compridos e afiados fios de aço estão dispostos vertical e horizontalmen-te pelo muro, ultrapassando a sua altura e servindo como uma rede, uma armadilha para os Carniceiros voadores. Os que voam um pouco acima do muro acabam sendo dilacerados, e os que voam mais alto, não. Uma das maiores preocupações da cidade é o fato de ela ser à beira-mar e localizada próxima do Abismo da Fronteira, que é onde vivem os Carniceiros.

O muro por inteiro é selado com grandes comportas feitas de bronze, com símbolos escritos em letras extintas. Essas imensas comportas são separadas por blocos de colunas, da primeira até a centésima, e todas se abrem para cima, puxadas por soldados e fortes guerreiros que lá operam os seus servi-ços assalariados. Cada um desses grandes portões tem aproximadamente 30

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metros de altura por 10 metros de largura, totalizando 1 quilometro de ex-tensão de portões espalhados pelo gigantesco muro que cerca a cidade. Essa grande muralha é oca, pois dentro há os corredores e suas comodidades, com pequenas ventilações.

Por ser uma cidade turística, Nobezor é a mais luxuosa, soberba e rica de todas dos três impérios! Lá não há casas, muito menos construções de por-tes pequenos, apenas imensuráveis, riquíssimas e nobres arquiteturas, gran-diosos edifícios, luxuosos hotéis, torres de apartamentos dos nobres e belas galerias centrais de compras. Nobezor também é dona da maior estrutura de pouso e decolagem de dirigíveis do mundo, suportando milhares deles, e do maior estacionamento de animais e alguns tipos de veículos.

No ano-novo, milhares de migrantes e turistas lotam os apartamentos, pousadas, hotéis e até motéis. As festas começam sempre no 1o período do último dia do ano até o 3o período de noite, pois no 4o período de noite po-dem aparecer por lá os perigosos Carniceiros. Então, antes desse período ser iniciado, todos se abrigam no chique e majestoso Salão Subterrâneo, locali-zado abaixo e ao redor de todo o litoral da bela e fantasiosa cidade Nobezor.

Todas as cidades e impérios têm os seus salões subterrâneos, utilizados para festas e eventos que perduram até o 4o período de noite, mas o de No-bezor é o maior de todos. Esse salão é feito de concreto e mármores repletos de quartzos azuis, com uma altura inigualável como a de palacetes. Por ser muito grande, ele banha toda a praia abaixo das areias, e se estende até os ma-res, circundando-os por grandes e grossos blocos de vidro. Assim, avista-se o mar e a vida marinha dali: peixes, tubarões e baleias luminosos e iluminados. Alguns carregam uma grande esfera brilhante em sua face, outros na cabeça. Os mais belos, porém, são as baleias, que carregam um líquido brilhante em suas barbatanas e caudas, jorrando-o por onde passam e tornando, assim, tudo fluorescente.

Há as algas e os corais, alguns sem fonte de luz própria, outros fluorescen-tes por causa dos líquidos das baleias que flutuam até eles. Os maiores, mais raros e maravilhosos são os que cintilam uma grande luz própria de seus centros, fazendo as luzes transcenderem por seus corpos coloridos, impreg-nando o oceano de cores, ultrapassando as vidraças do Salão Subterrâneo e encantando a todos que comtemplam.

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