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I Volume da Serie de Estudos Linguísticos e Estudos da Tradução e Interpretação sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, publicados pela Editora Insular e promovidos por cursos de pós-graduação da UFSC.

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  • Estudos da Lngua Brasileira de Sinais I

  • Ronice Mller de QuadrosMarianne Rossi StumpfTarcsio de Arantes Leite

    (organizadores)

    2013

    Florianpolis

    SRIEESTUDOS DE LNGUA DE SINAIS

    Volume I

    Estudos da Lngua Brasileira de Sinais I

  • Editora Insular

    EditorNelson Rolim de Moura

    Editora EletrnicaSilvana Fabris

    CapaLucas Mller de Jesus

    Superviso da capaRodrigo Poeta

    Estudos da lngua brasileira de sinais. Ronice Mller de Quadros, Marianne Rossi Stumpf e Tarcsio de Arantes Leite (orgs.). Srie Estudos de Lngua de Sinais. V.I. Florianpolis: Insular. 2013.

    232 p. : il. ISBN 978-85-7474-709-5 1. Lingustica. 2. Lngua de sinais. 3. Libras. 4. Traduo I. Ttulo.

    CDD 419

    Ronice Mller de QuadrosMarianne Rossi StumpfTarcsio de Arantes Leite

    (organizadores)

    Conselho EditorialDilvo Ristoff, Eduardo Meditsch, Fernando Serra, Jali Meirinho,Natalina Aparecida Laguna Sicca, Salvador Cabral Arrechea (ARG)

    Conselho Cientfico da Coleo LingusticaHeronides Moura, Adair Bonini

    EDITORA INSULARRodovia Joo Paulo, 226

    Florianpolis/SC CEP 88030-300Fone/Fax: (48) 3232-9591

    [email protected] twitter.com/EditoraInsularinsular.com.br facebook.com/EditoraInsular

    INSULAR LIVROSRodovia Jos Carlos Daux, 647, sala 2Florianpolis/SC CEP 88030-300

    Fone: (48) [email protected]

    Estudos da Lngua Brasileira de SinaisVolume I

  • Sumrio

    Apresentao ......................................................................................................... 9 Ronice Mller de Quadros Marianne Rossi Stumpf Tarcsio de Arantes Leite

    Parte I

    Estudos lingusticosContextualizao dos estudos lingusticos sobre a Libras no Brasil .......... 15 Ronice Mller de Quadros

    O futuro dos estudos das lnguas (de sinais) ................................................... 37 Tarcisio de Arantes Leite

    A histria da lngua de sinais brasileira (libras): um estudodescritivo de mudanas fonolgicas e lexicais ................................................ 59 Heloise Gripp Diniz

    A organizao dos morfemas livres e presos em LSB: reflexes preliminares ................................................................................... 79 Sandra Patrcia de Faria do Nascimento

  • Parte II

    Estudos da traduoContextualizao dos Estudos da Interpretao no Brasil ......................... 119 Silvana Aguiar dos Santos

    Percepes da norma surda de traduo no Brasil:o caso do curso de Letras-Libras da UFSC .................................................153 Saulo Xavier de Souza

    Aspectos imagticos da linguagem cinematogrficae da lngua de sinais na traduo de fbulas para Libras ............................. 183 Nelson Pimenta de Castro

    Aspectos processuais na interpretaosimultnea para a Lngua de Sinais Brasileira ...............................................195 Carlos Henrique Rodrigues

  • 9ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    Apresentao

    A Srie Estudos de Lngua de Sinais compreende publicaes de pes-quisas em duas reas de investigao, a Lingustica e os Estudos da Traduo. Essa Srie um desdobramento das pesquisas desenvolvidas nos Programas de Ps-Graduao em Lingustica e Estudos da Traduo, da Universidade Federal de Santa Catarina UFSC. A proposta surge com o crescimento das pesquisas realizadas com a lngua brasileira de sinais, tanto no escopo dos prprios programas, como em outros programas de pesquisa. A criao da linha de pesquisa em libras, no Programa de Ps-Graduao em Lingustica e da linha de pesquisa em interpretao, no Programa de Ps-Graduao em Estudos da Traduo, criou um espao para produes de pesquisas atenden-do as demandas j institucionalizadas. A criao do Curso de Letras Libras, em 2006, na UFSC e, posteriormente, na Universidade Federal de Gois e na Universidade Federal da Paraba, formaram profissionais da rea do ensino da libras e do campo da traduo e interpretao de libras que possibilita-ram uma formao com base na rea de Letras e fomentaram a iniciao cientfica. A partir desse curso, o nmero de mestrandos e doutorandos vem crescendo de forma significativa. O PGL j conta com 10 dissertaes de mestrado e 3 (trs) teses de doutorado defendidas, alm das 06 (seis) disserta-es e 04 (quatro) teses que esto em andamento. Nos Estudos da Traduo, 9 (nove) dissertaes de mestrado foram concludas e, ainda, contamos com 9 (nove) mestrandos e 6 (seis) doutorandos desenvolvendo suas pesquisas, todos envolvendo a libras. A Srie Estudos da Lngua de Sinais traz captulos relacionados aos estudos lingusticos e aos estudos da traduo. Dessa forma, as duas reas abrangidas por nossos programas so contempladas.

    Alm do crescimento da produo de pesquisas no escopo dos progra-mas da UFSC, temos produes espalhadas pelo pas. Assim, a Srie Estudos da Lngua de Sinais abre espao para que essas produes sejam comparti-lhadas com a comunidade cientfica e demais profissionais interessados nas pesquisas com essa lngua.

    A Lei de Libras 10.436/2002 reconhece a lngua brasileira de sinais como lngua nacional usadas pelas comunidades surdas do Brasil. A legitima-

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    Ronice Mller de Quadros, Marianne Rossi Stumpf e Tarcsio de Arantes Leite (orgs.)

    o dessa lngua , tambm, consolidada por meio das pesquisas desse bem imaterial, uma lngua de sinais nacional. Dessa forma, trazemos ao pblico esta Srie Estudos da Lngua de Sinais.

    Na primeira parte, temos as pesquisas do campo dos estudos lingusticos que inicia com uma contextualizao dos estudos das lnguas de sinais no Brasil, escrito por Ronice Mller de Quadros. A autora abre esta srie apre-sentando uma retrospectiva histrica das produes relativas a libras ao longo das ltimas quatro dcadas. Na sequncia, Tarcsio de Arantes Leite apresenta as perspectivas para as pesquisas com a lngua de sinais no futuro, acenando para a interao das pesquisas com o uso de tecnologias que favorecem a anlise da lngua de sinais. Com estes dois captulos, h um delineamento do estado da arte das pesquisas com a libras desenvolvidas e em andamento no pas. Temos, ento, dois captulos que resultam de pesquisas desenvolvidas no mestrado por Heloise Gripp, em 2010, sobre as mudanas fonolgicas e lexi-cais de surdos de diferentes geraes, um dos primeiros estudos apresentan-do dados da libras ao longo da histria. Sandra Patricia Farias do Nascimento, apresenta um captulo sobre os morfemas presos, tema que foi discutido em sua tese defendida em 2008, na Universidade de Braslia. Esse estudo analisa as mos que so chamadas comumente de mos passivas nas lnguas de sinais, mas que em nada passivas so, pois o argumento da autora o de que a mo passiva representa morfemas presos que acrescentam significado s palavras formadas em sinais.

    Na segunda parte desse volume, temos as pesquisas desenvolvidas no campo dos Estudos da Traduo. Essa parte iniciada com uma contextua-lizao dos estudos da interpretao da libras e do portugus, no Brasil, por Silvana Aguiar dos Santos, tema abordado em sua tese de doutorado defendi-da em 2013. Esse captulo apresenta o estado da arte das dissertaes e teses concludas nesse campo de investigao. Na sequncia, Souza apresenta as percepes da norma surda de traduo no Brasil, analisando as tradues realizadas por tradutores surdos no contexto do Curso de Letras Libras, na modalidade a distncia. Norma surda trazida pelo autor no sentido discu-tido por Stone (2009) que observa caractersticas especficas das tradues realizadas por surdos que precisam ser aprimoradas nos tradutores e intr-pretes ouvintes. A norma surda passa a servir, ento, como referncia para a formao desses profissionais, que, na sua grande maioria, formada por ouvintes que adquirem a libras como L2. Essa pesquisa de Souza foi aborda-da em sua dissertao de mestrado, defendida em 2010. O captulo seguinte traz aspectos dessa norma surda com o trabalho do Nelson Pimenta sobre a

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    traduo de fbulas para a libras. O autor apresenta vrios aspectos imagti-cos da linguagem cinematogrficas que aparecem nas tradues das fbulas para a libras, por exemplo, ele traz o uso dos diferentes planos da linguagem cinematogrfica como elemento importante do uso espacial das produes em sinais para dar a dimenso visual das relaes entre os referentes. Essa percepo das produes em sinais foram apresentadas a partir do olhar sur-do, o que Stone e Souza referem como norma surda.

    Encerramos o nosso primeiro volume da Srie Estudos da Lngua de Sinais com o trabalho importante de Carlos Henrique Rodrigues que com-partilha neste captulo um dos aspectos abordados em sua tese de doutora-do defendida em 2013, aspectos processuais na interpretao simultnea de portugus para a libras. O foco dos processos analisados est no monitora-mento da velocidade de produo do texto alvo em relao velocidade de recebimento do texto fonte, que impulsiona o estabelecimento de estratgias de interpretao.

    Ronice Mller de QuadrosMarianne Rossi Stumpf

    Tarcsio de Arantes Leite

    Universidade Federal de Santa CatarinaPrograma de Ps-Graduao em Lingustica

    Programa de Ps-Graduao em Estudos da Traduo

  • Parte I

    Estudos lingusticos

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    Contextualizao dos estudos lingusticossobre a Libras no Brasil

    Ronice Mller de QuadrosUniversidade Federal de Santa Catarina

    Introduo

    O objetivo deste artigo apresentar o estado da arte dos estudos da Lngua Brasileira de Sinais Libras. A Libras uma lngua usada pela co-munidade surda brasileira, incluindo pessoas surdas e ouvintes (amigos, fa-miliares e profissionais). O Brasil conta com aproximadamente 5.750.805 surdos brasileiros, dos quais 766.344 so jovens entre 0 e 24 anos de idade (FENEIS, 2011). Muitos desses surdos usam a Libras, uma lngua reconhe-cida como nacional por meio da Lei 10.436/2002, regulamentada pelo De-creto 5626/2005. No campo acadmico, temos estudos sobre a Libras que iniciaram nos fins dos anos 80. Os estudos publicados representam campos de investigao da Lingustica, tais como, a fonologia, a morfologia, a sinta-xe, a semntica, a pragmtica, a sociolingustica e a anlise do discurso, bem como, pesquisas no campo da lingustica aplicada com enfoque no ensino de lnguas. Neste captulo, estaremos apresentando uma amostra destes es-tudos com base em publicaes, a partir do banco de dissertaes e teses da CAPES e alguns livros1.

    1 Levantamento de teses e dissertaes a partir do Banco de Teses da CAPES

    Realizou-se um levantamento de teses e dissertaes utilizando o termo Libras e/ou lngua de sinais no sistema de busca. No nvel de mestrado, foram localizadas 166 dissertaes e no nvel de doutorado foram localizadas 44 teses, distribudas basicamente entre quatro reas: Educao, Psicologia, Lingustica/Letras e Computao/Informtica. A maioria dos estudos inclui

    1 O presente captulo no necessariamente representa todas as produes envolvendo a Libras no contexto brasileiro.

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    Ronice Mller de Quadros, Marianne Rossi Stumpf e Tarcsio de Arantes Leite (orgs.)

    a Libras como parte integrante da pesquisa sob diferentes enfoques, especial-mente, com o foco no usurio da Libras ou na prpria Libras.

    Das 166 dissertaes de mestrado, 59 so da rea da Lingustica/Letras (inclui-se aqui tambm Lingustica Aplicada, Literatura e Estudos da Tradu-o). No nvel de tese, das 44, 17 foram realizadas nestas reas de investiga-o, foco do presente captulo2.

    Em relao s produes do mestrado, claramente se observa uma evo-luo nas produes envolvendo o estudo da Libras, conforme apresentado no grfico a seguir:

    J com relao produo das teses de doutorado, as mesmas se mantm estveis entre uma a duas por ano, conforme visualizado no grfico a seguir:

    2 As demais esto relacionadas, especialmente, com a educao de surdos.

    1994 1995 1997 1998 1999 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

    14121086420

    Quantidade de Teses

    1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2006 2007 2008 2009 2010

    25,

    2

    1,5

    1

    0,5

    0

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    Quanto distribuio dos campos de investigao nas reas da Lingus-tica, Letras e Estudos da Traduo, observamos que a maior parte das produ-es envolve o ensino de lnguas, compreendendo o ensino da Lngua Por-tuguesa para usurios de Libras, a aquisio de leitura e escrita e o ensino de Libras como primeira lngua (L1) ou segunda lngua (L2). Esta rea seguida pelos estudos nas reas da Sociolingustica e Lexicografia em nvel de mestra-do e nas reas da Morfologia, Semntica e Tipologia em nvel de doutorado. No mestrado ainda destacam-se pesquisas produzidas nas reas da Traduo e Interpretao de Lnguas de Sinais e Portugus (TILSP) e Anlise do Dis-curso, bem como algumas produes nas reas da Aquisio da Linguagem e

    Polticas Lingusticas. Em nvel de doutorado, houve tambm uma tese para cada uma das seguintes reas: Sintaxe, Fonologia, Poltica Lingustica, Anlise do Discurso, Sociolingustica/Lexicografia e Aquisio da Linguagem. Em

    nvel de mestrado, houve ainda uma dissertao em cada uma das seguintes reas: na Literatura, Fonologia e Sintaxe. Os grficos a seguir sintetizam esta

    distribuio de publicaes.

    reas de pesquisas contempladas nas dissertaes de mestrado

    Literatura

    Fonologia

    Sintaxe

    Poltica Lingustica

    Aquisio

    Discurso

    Traduo/Interpretao

    Socil/Lexic

    Ensino de lnguas

    0 5 10 15 20 25 30

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    Ronice Mller de Quadros, Marianne Rossi Stumpf e Tarcsio de Arantes Leite (orgs.)

    reas de pesquisas contempladas nas teses de doutorado

    Este panorama aponta para o fortalecimento dos campos de investi-gao da Lingustica, Letras e Estudos da Traduo, especialmente a partir de 2006. No ano de 2006, o Curso de Letras Libras, Licenciatura, passou a fazer parte dos cursos de Letras no Brasil. Em 2008, passou a ser oferecido tambm o Curso de Letras Libras, Bacharelado. A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) foi pioneira no oferecimento destes cursos, iniciando na modalidade a distncia e, a partir de 2009, na modalidade presencial. Alm da UFSC, a Universidade Federal de Gois e a Universidade Federal da Para-ba esto oferecendo a Licenciatura deste curso, indicando uma tendncia na ampliao do seu oferecimento em todo o Brasil. O fato de contarmos com alunos se formando em Letras Libras pode contribuir significativamente no crescimento de produes cientficas envolvendo a Libras nos campos da Lingustica, Letras e Estudos da Traduo. Os dados referentes s produes de teses e dissertaes, de certa forma, indicam esse crescimento. Destaca-se ainda que vrias publicaes nas reas da Educao, Psicologia e Computao tratam de questes relativas linguagem, envolvendo direta ou indiretamente a Libras.

    Fonologia

    Sintaxe

    Poltica Lingustica

    Traduo/Interpretao

    Discurso

    Socioling/Lxico

    Aquisio

    Semntica

    Tipologia

    Morfologia

    Ensino de lnguas

    0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    2 Histrico das publicaes sobre a Libras

    Os primeiros artigos e livros publicados sobre a Libras so de Ferreira Brito (1984, 1990, 1993, 1995). Ferreira Brito (1984, 1993) apresentou ao mundo duas lnguas de sinais brasileiras, a lngua de sinais dos centros urba-nos brasileiros (atualmente referida como Libras), focando na variante de So Paulo, e a lngua de sinais Urubu-Kaapor, pertencente famlia Tupi-Guarani, uma lngua usada na comunidade indgena Urubu-Kaapor do interior do Ma-ranho. Nesse artigo, a autora apresenta algumas similaridades e diferenas entre essas duas lnguas. Por exemplo, na lngua de sinais Urubu-Kaapor, o uso do espao parece ter uma flexibilidade bem maior do que na lngua de sinais usada em So Paulo, em que os sinais so realizados em um espao bem mais restrito. Por outro lado, ambas as lnguas usam os intensificadores e os quantificadores depois do nome ou incorporados ao nome (exemplos usados pela autora em (1) e (2)). No caso da incorporao do intensificador, a autora observou a mudana no padro do movimento.

    (1) lngua de sinais Urubu-Kaapora) PSSARO QUATROb) PEIXE MUITOc) FLORES VRIASd) BOM+intensificador

    (2) lngua de sinais de So Pauloa) FELIZ MUITOb) BOM+intensificador

    Ferreira Brito (1995) apresenta uma sntese dos estudos produzidos pelo grupo de estudos de lngua de sinais brasileira, com resenhas e pesquisas realizadas por suas orientandas, alm de suas prprias pesquisas, chamado de GELES, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Entre as pesquisas apresentadas neste livro, Ferreira Brito traz uma discusso sobre aspectos pragmticos, focando nos elementos de polidez. A autora apresenta vrios exemplos em que a polidez marcada pela reduo no tamanho do sinal e no padro do movimento.

    Berenz e Ferreira Brito (1987) apresentam um comparativo entre a pro-duo pronominal na lngua de sinais americana e na lngua de sinais brasilei-ra. As autoras identificam vrias formas comuns. As autoras sustentam que

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    Ronice Mller de Quadros, Marianne Rossi Stumpf e Tarcsio de Arantes Leite (orgs.)

    os pronomes pessoais nessas lnguas de sinais funcionam como pronomes de fato, ou seja, so pronomes pessoais e pronomes demonstrativos e no apenas como uma forma nica com um local referencial associado e nem como advrbios locativos. Essa constatao apresentada, uma vez que h uma tendncia de confundir a apontao gestual com o uso de pronomes, apesar de terem a mesma forma. Conforme a proposta das autoras, h uma representao do sistema do espao que tripartida para a locao, com trs nveis espaciais diferenciados: (1) a locao vista como um componente in-terno da estrutura de um sinal; (2) a locao vista como parte do espao de sinalizao usado como estrutura lingustica para pronomes (a interpretao espacial lingustica de referentes) e (3) a locao atual dos participantes da conversao e dos referentes de terceira pessoa. Os dois primeiros nveis so lingusticos e convencionais, em oposio ao terceiro nvel que no apresenta essa convencionalidade.

    Mais tarde, Berenz (1996) conclui a sua tese de doutoramento sobre pessoa e dixis na Libras. Nesse trabalho, Berenz descreve detalhadamente o sistema de referncia da Libras. Por exemplo, na Libras, o conjunto de pronomes pessoais se distingue em trs pessoas (primeira, segunda e terceira) e em trs nmeros (singular, dual e mltiplo/mais de dois). O sistema no apresenta marcao de gnero, embora os pronomes de terceira pessoa pos-sam ser precedidos dos sinais HOMEM e MULHER, quando for relevante. A autora tambm identificou que a Libras apresenta uma categoria gramatical do sistema pronominal chamada de nmero dual. A evidncia para isso encontrada nas formas dos prprios pronomes pessoais e nas modulaes para nmero nos verbos: NS-DOIS, VOCS-DOIS, ELES-DOIS. A mar-cao dual uma categoria completamente gramaticalizada. Na Libras, todas as formas com o dedo indicador apontado com movimento em arco so con-sideradas mltiplas, em contraste com as formas singular e dupla. Na forma coletiva, em que os no participantes (outras pessoas alm do sinalizante e o seu interlocutor, eles) estejam presentes, o sinal inicia com contato do dedo indicador no peito e faz o movimento em arco no plano horizontal e termina novamente com contato no corpo do sinalizante. A segunda pessoa do plural (vocs) pode ser marcada com uma forma coletiva do interlocutor ou uma combinao da forma singular do interlocutor mais no participantes. Para a terceira pessoa do plural (eles), o dedo indicador se move em arco para fora do espao frente do sinalizante. Para referentes presentes dos no partici-pantes, o dedo indicador fica na posio horizontal na direo dos prprios referentes indicados; para referentes no presentes, o dedo indicador fica na

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    posio perpendicular indicando pessoas que estejam fora do contexto dis-cursivo direto.

    Berenz (1996) tambm apresenta em detalhes as formas usadas para os possessivos. A Libras pode apresentar formas singulares e plurais marcadas com diferentes sinais. Por exemplo, o sinal SEU feito com a mo em P di-recionada ao referente possuidor de algo ou a vrios referentes.

    Felipe (1998) apresenta uma descrio tipolgica para os verbos da Li-bras. A autora apresenta os verbos em duas classes principais, aqueles que no apresentam flexo e os que apresentam flexo. Os primeiros so verbos de flexo zero, pois so produzidos sem estarem associados a algum morfema. Os segundos so referidos como verbos direcionais pela autora. So verbos que apresentam uma trajetria de movimento incorporada a sua raiz. A au-tora tambm apresenta os verbos quanto categoria semntica. Os verbos instrumentais, por exemplo, so aqueles que incorporam o instrumento sua raiz (como PINTAR-COM-PINCEL); os verbos de movimento envol-vem eventos (como ENTREGAR) e os verbos locativos envolvem locativos (como IR).

    Karnopp (1994, 1999) apresenta uma descrio bsica da estrutura fo-nolgica da Libras. A autora se aprofunda no parmetro configurao de mo e analisa os processos fonolgicos de apagamento, assimilao e substituio em uma criana surda, adquirindo a lngua de sinais brasileira. A autora baseia sua anlise em dados coletados longitudinalmente de uma criana surda, filha de pais surdos, coletados mensalmente entre 1 e 4 anos de idade. A menina apresenta vrias evidncias de aplicao de processos fonolgicos. Entre eles, por exemplo, a criana apresenta substituio de uma configurao de mo mais complexa por uma configurao de mo mais simples: PATO produzido com a configurao de mo 5 sendo aberta e fechada ao invs da configu-rao de mo com dois dedos selecionados. Esse tipo de exemplo evidencia que crianas surdas em fase de aquisio apresentam os mesmos processos fonolgicos observados em crianas adquirindo uma lngua falada.

    Quadros (1997) apresenta uma anlise de crianas surdas adquirindo a Libras como primeira lngua, em nvel sinttico. A autora apresenta uma des-crio do fenmeno do licenciamento de argumentos nulos e faz um estudo considerando o padro de aquisio dessas estruturas na aquisio monoln-gue da Libras (L1), de dados coletados de forma transversal, de diferentes crianas surdas, filhas de pais surdos, adquirindo a Libras como primeira ln-gua. A autora observa que as crianas produzem sentenas com pronomes nulos tanto com verbos com flexo marcada, como com flexo no marcada.

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    Ronice Mller de Quadros, Marianne Rossi Stumpf e Tarcsio de Arantes Leite (orgs.)

    No entanto, os contextos dessas marcaes determinam a recuperao dos referentes por via sinttica ou por via pragmtica. O uso da apontao, o esta-belecimento de nominais no espao, o uso do espao fazem parte do sistema sinttico da Libras, apresentando uma evoluo durante os diferentes estgios de aquisio. Inicialmente, as crianas surdas no estabelecem os nominais no espao de forma apropriada. Esse uso apropriado do espao utilizado de forma complexa na lngua vai ser estabelecido por volta dos cinco anos de idade.

    Quadros (1999) apresenta a estrutura da frase na Libras, incluindo uma anlise dos verbos simples (sem marcao de flexo) e verbos com concor-dncia (com flexo marcada). A autora identifica uma assimetria entre esses dois grupos de verbos que se reflete nas estruturas geradas nessa lngua. Por exemplo, o licenciamento de pronomes nulos apresenta um comportamento diferenciado quando seleciona verbos com ou sem concordncia. Outra con-sequncia observada no comportamento sinttico da Libras diante do tipo de verbo selecionado est relacionado com a ordenao dos sinais. As senten-as com verbos com concordncia parecem apresentar maior flexibilidade na ordenao do que aquelas com verbos simples. A autora tambm descreve estruturas com verbos pesados (heavy verbs), ou seja, (a) formas produzidas por meio de classificadores que incorporam a ao verbal, (b) verbos manuais (aqueles que incorporam instrumentos ou partes de objetos) e (c) verbos com flexo aspectual (incorporada ao verbo por meio de mudana no padro do movimento). Essas estruturas sempre apresentam esses verbos na posio final, tendo os argumentos estabelecidos em posio que antecedem esses verbos pesados, independente da classe a qual o verbo pertence. A autora tambm apresenta as sentenas com tpicos, com interrogativas e com foco. A partir de toda essa descrio, a autora prope duas estruturas sintticas que podem ser aplicadas Libras de acordo com as duas classes verbais existentes (com e sem flexo verbal).

    A partir do novo milnio, os estudos sobre a Libras comeam a ga-nhar fora. No podemos ignorar o acontecimento da Lei de Libras (Lei 10.436/2002) e a sua regulamentao em 2005 (Decreto 5626/2005) como fundamentais para o estabelecimento das pesquisas com Libras no Brasil. Com essa legislao, temos a criao do Curso de Letras Libras, na Univer-sidade Federal de Santa Catarina, em 2006. Em seguida, temos esse curso criado na Universidade Federal de Gois e na Universidade Federal da Para-ba, como j mencionado. O reconhecimento da Libras como lngua nacional impulsionou os estudos sobre essa lngua.

  • 23

    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    Na Universidade Federal do Rio de Janeiro, dois trabalhos so defendi-dos com pesquisas com a lngua brasileira de sinais: Santos (2002) e Castro (2007). O primeiro refere a um estudo geral da fonologia e da morfossintaxe da lngua brasileira de sinais a partir de pesquisas com outras lnguas de sinais. A autora identifica aspectos da simultaneidade e da linearidade que susten-tam a base fonolgica dos sinais. Quanto a morfossintaxe, Santos apresenta a dimenso do espao a frente do sinalizante para formar sinais e compor a gramtica dessa lngua. Alm do aspecto espacial, a autora analisa aspectos relacionados aos movimentos associados aos sinais, levantando algumas pro-priedades, tais como, a marcao argumental, a marcao de pessoa e nmero. Para concluir sua anlise, a autora tambm considera as marcaes no manu-ais associadas a essa gramtica espacial. O segundo trabalho, Castro (2007), inaugura os estudos da composicionalidade semntica, uma rea complexa de investigao, at por que exige uma percepo acurada e sutil da lngua para concluses a respeito da organizao da mesma no campo que envolve significados. Identificar as fronteiras das proposies exigiu, primeiramente, identificar as prprias proposies usadas por sinalizantes da lngua de sinais brasileira. Partir de uma histria contada por um surdo e por julgamentos de outras duas falantes nativas dessa lngua deram alguns elementos para come-ar a conversa neste campo de investigao.

    Nesse milnio, realizamos a 9 Conferncia de Questes Tericas de Pesquisas de/sobre Lnguas de Sinais (o TISLR), em 2006, na Universidade Federal de Santa Catarina. Esse evento tambm marca as produes de pes-quisas com a Libras no Brasil e fora do pas. O TISLR um evento ligado Sociedade Internacional de Pesquisadores de Lnguas de Sinais (http://www.slls.eu) e considerado o evento internacional mais importante de estudos de lnguas de sinais. No Brasil, reunimos pesquisadores de 33 pases apresentan-do pesquisas sobre diferentes lnguas de sinais e impactos tericos para a lin-gustica em geral. Desse evento, foram produzidos dois volumes disponveis gratuitamente para download com os textos na ntegra apresentados por oca-sio do evento em ingls e uma verso com artigos selecionados traduzidos para o portugus e para a Libras (Quadros, 2008; Quadros e Vasconcellos, 2008).

    Ainda nesse milnio, tivemos o incio da publicao da coleo Estudos Surdos, com pesquisas do campo da lingustica e interfaces com educao e com traduo e interpretao. Foram publicados quatro volumes contendo resultados de pesquisas desenvolvidas por pesquisadores surdos e ouvintes (Quadros, 2006; Quadros e Perlin, 2007; Quadros 2008; Quadros e Stumpf,

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    Ronice Mller de Quadros, Marianne Rossi Stumpf e Tarcsio de Arantes Leite (orgs.)

    2009). Quadros e Karnopp (2004) publicaram Lngua de Sinais Brasileira: Estudos Lingusticos apresentando um panorama dos estudos fonolgicos, morfolgicos e sintticos dessa lngua.

    Novos centros de pesquisas comeam a surgir no pas. Temos as uni-versidades que passaram a oferecer o Curso de Letras Libras e os polos do Curso de Letras Libras na modalidade a distncia espalhados por todo o pas curso oferecido pela Universidade Federal de Santa Catarina em par-ceria com outras universidades ou instituies de ensino superior pblicas do pas: Universidade Federal do Amazonas, Universidade de Braslia, Uni-versidade Estadual do Par, Universidade Federal do Cear, Universidade Federal de Pernambuco, Universidade Federal da Bahia, Universidade de So Paulo, Universidade de Campinas, Universidade Federal do Esprito Santo, Instituto Nacional de Educao de Surdos, Cefet de Minas Gerais, Instituto Federal do Rio Grande do Norte, Instituto Federal de Gois, Uni-versidade Federal de Grande Dourados, Universidade Federal do Paran, Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Universidade Federal de San-ta Maria. Com isso, as pesquisas comearam a se disseminar e tomar outra dimenso no pas.

    A exemplo desses desdobramentos, Nascimento (2003), da Universida-de de Braslia, apresenta um estudo sobre metforas na Libras. o primeiro estudo realizado no pas sobre essa temtica, observando na Libras a produ-o de metforas. A autora apresenta um repertrio de expresses idiomti-cas da Libras que coincidem ou no com o portugus ou com outras lnguas. Por exemplo, a metfora CABEA-DURA comum entre as lnguas, mas j a metfora MINHOCAS-BARRIGA que significa estar com muita fome usada apenas na libras. Em 2009, Nascimento apresenta uma nova pesquisa, que inclui a produtividade dos sinais. A autora apresenta um estudo mais do campo lexicogrfico, analisando tambm os neologismos. Considerando essa perspectiva, a autora apresenta uma anlise dos dicionrios de Libras produ-zidos no pas e prope sistemas de busca com base visual.

    Na Universidade de So Paulo surge outro foco de pesquisas com a libras com McCleary e Viotti (2010, 2011), com estudos voltados para a ges-tualidade nas lnguas de sinais. A exemplo, os autores publicam um artigo que analisa a simbiose entre o gesto e o sinal em narrativas produzidas em libras. Os autores partem da Lingustica Cognitiva para analisar o uso dos gestos da Libras enquanto representaes mentais do uso do espao sendo reproduzi-das gestualmente. O estudo sobre gesto usado de forma a contribuir para as anlises dos autores.

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    Uma das produes derivadas do grupo de pesquisas na Universidade de So Paulo de Leite (2008), com uma pesquisa envolvendo uma anlise da conversao em sinais. O autor apresenta vrios elementos que so en-volvidos na troca de turnos de surdos realizando uma conversao livre. Ele identifica, por exemplo, o piscar de olhos como um elemento que indica con-cluso de um turno associado ao reposicionamento do movimento das mos para a posio de descanso. O autor tambm identifica algumas formas de interrupo de turnos com mudana no padro dos movimentos dos sinais, bem como da marcao facial.

    Na Universidade Federal da Paraba, temos a pesquisa de Souza (2009) que busca descrever a construo da argumentao na lngua brasileira de si-nais. A autora analisou quatro episdios de vrios vdeos com produes em libras, constatando que a argumentao na Libras envolve elementos discursi-vos de retomada e deslocamento, marcados pelo movimento da proxmica e alteraes na velocidade do movimento, da amplitude na expresso corporal e nas marcaes faciais, alm da tenso da mo.

    Ainda no contexto das produes advindas da lingustica, pelo Programa de Ps-Graduao em Lingustica da Universidade Federal de Santa Catarina, temos Pizzio (2007, 2010), Barros (2008); Paterno (2008); Vilhalva, (2009); Anater (2009); Adriano (2010); Silva (2010); Gripp (2010); Wanderley (2012); Costa (2012); Silva (2013); Schmitt (2013) e Zancanaro (2013).

    Pizzio (2004) desenvolve uma pesquisa no campo da aquisio da Libras. A autora analisou a aquisio da ordem dos sinais em uma criana surda, filha de pais surdos do Banco de Dados do Ncleo de Aquisio de Lnguas de Sinais da Universidade Federal de Santa Catarina. A autora identificou que essa criana j prioriza a ordem bsica da Libras, SVO, desde o incio da aqui-sio. No entanto, h outras ordenaes possveis, como OSV e SOV que so observadas na produo da criana ao longo do seu desenvolvimento. Essas ordenaes tambm so observadas nas produes de adultos sinalizantes da Libras e ocorrem, normalmente, devido utilizao de estruturas com tpico e foco. A autora verificou que os contextos poderiam ser interpretados como de tpico e foco, mas no observou as marcas faciais consistentes associadas a esses tipos de estruturas nas produes da criana observada. Pizzio (2010) apresenta um estudo mais tipolgico. Ela faz uma descrio das categorias das palavras de nomes e verbos na Libras, buscando identificar caractersti-cas especficas associadas s categorias. A autora aplica alguns instrumentos para coletar os dados de sua pesquisa e identifica alguns padres, apesar de identificar algumas inconsistncias. Por exemplo, h diferenas no padro de

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    movimentos que so identificados em sinais caracterizados como nomes ou como verbos. No entanto, a autora tambm identificou que alguns sinais so usados indistintamente como nomes ou verbos.

    Barros (2008) apresenta uma proposta terica para a escrita de sinais com base fonolgica. A autora cria uma escrita de sinais chamada Elis Es-crita da Lngua de Sinais. A proposta parte dos dedos selecionados nas con-figuraes de mos com uma escrita altamente econmica que foi, posterior-mente, gerada como fonte para ser digitada ou escrita a mo livre. A autora utiliza termos especficos para captar as unidades mnimas da lngua com base visual, as quais ela refere como visemas.

    Paterno (2008) faz um estudo mais voltado para polticas lingusticas. O autor analisa o impacto da legislao que reconhece a Libras como lngua na-cional nas polticas de educao. O estudo evidencia que ainda algumas aes previstas no planejamento lingustico previsto pelo Decreto 5626/2005 esto em fase de implementao e ainda no foram implementadas. Por outro lado, o autor destaca vrias aes positivas que podem ser observadas no sentido de afirmar a Libras no pas.

    Vilhalva (2009) faz um estudo das lnguas de sinais emergentes em co-munidades indgenas brasileiras de algumas localidades do Mato Grosso do Sul. Vilhalva observa a existncia de lnguas de sinais emergentes usadas por ncleos que comeam a ter acesso Libras na escola. Assim, essas lnguas prprias das comunidades tendem a desaparecer caso no haja uma preocu-pao em garantir o seu estabelecimento na comunidade.

    Anater (2009) faz uma anlise da aquisio das marcas no manuais em uma criana surda adquirindo a libras, como primeira lngua. Essa criana faz parte do Banco de Dados do Ncleo de Aquisio de Lngua de Sinais, da Universidade Federal de Santa Catarina. Anater identifica marcas no ma-nuais associadas a estruturas especficas usadas de forma inconsistente pela criana ao longo do seu processo de aquisio. A autora confirma estudos que afirmam que o controle das marcas no manuais vai ser estabelecido tar-diamente pelas crianas adquirindo lnguas de sinais.

    Silva (2010) faz um estudo no campo de aquisio da lngua de sinais com uma criana surda, filha de pais surdos, que tambm faz parte do Ban-co de Dados do Ncleo de Aquisio de Lnguas de Sinais da Universidade Federal de Santa Catarina. Ela analisa o processo de aquisio das marcas as-pectuais associadas aos sinais na produo de uma menina adquirindo a libras como primeira lngua. A autora identifica vrias marcas aspectuais associadas aos verbos, com padres de movimento especficos, bem como marcaes

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    no manuais que comeam a aparecer de forma mais consistente ao longo do processo de aquisio.

    Adriano (2010) apresenta um estudo mais voltado para as produes de sinais caseiros por surdos adultos em uma turma de educao de jovens e adultos. A autora identificou o uso de sinais padronizados, bem como o de-senvolvimento de padres gestuais em direo convencionalidade quando os surdos passavam a fazer parte de um grupo de surdos.

    Gripp (2010) apresenta um estudo mais voltado para o campo da socio-lingustica. A autora faz uma anlise dos primeiros registros da Libras em for-ma de desenhos e compara com os usos atuais dos mesmos sinais. A autora observa mudanas em nvel fonolgico e morfolgico nos sinais comparados.

    Wanderley (2012) realiza um estudo analisando a alfabetizao de alunos surdos na escrita de sinais. A autora busca identificar os elementos que cons-tituem a compreenso e a produo de sinais escritos na Libras, comparando o processo de aquisio dessa escrita em crianas e em adultos que tambm esto aprendendo a ler e escrever na escrita de sinais. Wandereley tambm analisa os elementos coesivos utilizados nas produes escritas dos alunos. A autora faz uma anlise dos dados observando tambm a relao da conscin-cia fonolgica com as produes dos textos escritos em sinais.

    Costa (2012) desenvolve uma pesquisa sobre a iconicidade presente nas lnguas de sinais como motivao principal para a criao dos sinais. A in-vestigao analisa a configurao de mo que compe os sinais para analisar possibilidades de motivao icnica que puderam ter influenciado a produo do sinal convencionado. O autor usa como base dados um dicionrio digital e conclui a partir desses dados que parece realmente haver uma motivao icnica na formao dos sinais investigados.

    Silva (2013) analisa os recursos lingusticos usados para marcar o registro formal da lngua brasileira de sinais. O autor analisa as formas de uso desses recursos e os principais aspectos que caracterizam um texto formal em libras. Por texto em libras, o autor analis produes acadmicas monolgicas produ-zidas por surdos e registradas em vdeo.

    O ensino de libras para ouvintes passa a contar com uma produo aca-dmica no campo da lingustica aplicada ao ensino de lnguas, com foco no ensino da libras. Zancanaro (2013) apresenta uma anlise das produes de alunos aprendizes da libras como L2 com foco na fonologia. O autor iden-tificou vrias trocas de configuraes de mos, algumas trocas no padro do movimento e raras trocas no parmetro da locao. A pesquisa tambm apre-senta uma comparao entre aprendizes iniciantes e avanados, evidenciando

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    um padro de desenvolvimento da aquisio. Assim, esse estudo identifica um processo de aquisio da fonologia, de certa forma, anlogo a aquisio da Libras em crianas surdas adquirindo a libras (Karnopp, 1999).

    Schmitt (2013) apresenta uma anlise de um conjunto de sinais pro-duzidos por surdos de diferentes faixas etrias, de Santa Catarina. O autor identifica sinais que apresentam variao lingustica diacrnica contrastando sinais usados por surdos com mais de 60 anos com surdos mais jovens. Alm da anlise das mudanas dos sinais ao longo do tempo, o autor relata aspectos scio-histricos marcados pelo Sr. Francisco Lima Junior, o primeiro surdo catarinense a ensinar outros surdos em Libras.

    Paralelamente, Quadros apresenta vrios resultados de pesquisas sobre a Libras e, tambm, comparando com outras lnguas de sinais, focando tanto na morfossintaxe como nos estudos de aquisio de lnguas de sinais.

    Quadros (2004) faz um estudo sobre formas de avaliar o desenvolvi-mento da linguagem em crianas surdas, uma vez que o desenvolvimento da linguagem nessas crianas normalmente apresenta especificidades relaciona-das com o contexto de aquisio que se apresenta. Na maioria das vezes, as crianas surdas so filhas de pais ouvintes e apresentam uma variao muito grande na quantidade de qualidade do input em Libras. Assim, torna-se fun-damental a avaliao. Quadros e Cruz (2011) publicaram um instrumento de avaliao formal que foi desenvolvido pelas autoras para auxiliar profissionais a procederem com a avaliao da linguagem em crianas surdas.

    Quadros (2006) faz uma anlise das pesquisas que observam os efeitos de modalidade nos estudos com lnguas de sinais apresentando como os es-tudos com a Libras evidenciam isso, especialmente, em relao aos dados da aquisio da lngua de sinais. Apesar desses efeitos de modalidade, observa-dos nos estudos com lngua de sinais, serem especficos das lnguas visuais--espaciais, de modo geral, os estudos concluem que as lnguas de sinais apre-sentam as propriedades lingusticas observadas tambm nas lnguas faladas.

    Ainda em 2006, Quadros apresenta uma anlise das polticas lingusticas da Libras e os seus desdobramentos nas produes de pesquisas e aes que consolidam a Libras no pas. Nessa mesma linha, Quadros e Campello (2010) analisam a constituio poltica, social e lingustica da Libras no Brasil.

    J em uma perspectiva mais terica, Nunes e Quadros (2008) apresen-tam uma anlise sinttica das realizaes fonticas de elementos duplos na Libras. As construes duplas so muito comuns na Libras e envolvem es-truturas sintticas complexas associadas a foco. Os autores apresentam evi-dncias para tratar essas realizaes como produes fonticas que no so

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    mais vistas pela sintaxe durante a computao da sentena (a sintaxe cega ao elemento fonolgico, pois entente que ele foi checado), observando, portanto a linearizao. Em parceria com outros pesquisadores, Quadros compara a Libras com outras lnguas de sinais.

    No campo da sintaxe, Quadros (2004) faz uma anlise da distribuio dos verbos na Libras que depois retomada em Quadros e Quer (2010) que apresentam uma anlise dos verbos na Libras e na lngua de sinais catal. Os autores identificam padres de comportamento similares nas duas lnguas que caracterizam concordncia sinttica e semntica. Eles observam que as marcas de concordncia esto disponveis como morfemas nessas lnguas associadas a locativos e aos argumentos sentenciais, podendo ser marcados ou no de acordo com a estrutura gerada. Assim, os autores concluem, por exemplo, que estruturas infinitivas tambm podem ser geradas na Libras e na lngua de sinais catal, de acordo com a estrutura gerada.

    Quadros e Lillo-Martin (2008, 2010) comparam Libras e lngua de sinais americana no que diz respeito estrutura da frase. As autoras apresentam vrios aspectos estruturas que so comuns e alguns que so diferentes quanto s construes bsicas, s interrogativas, s estruturas com tpico e foco.

    Alm desses estudos, Spence e Quadros (2005) comparam aspectos lin-gusticos de produes poticas em libras e na lngua de sinais inglesa. As autoras observaram os mesmos padres lingusticos nas produes poticas, alm dos fatores socioculturais observados neste tipo de produo.

    Quadros tambm tem um conjunto de produes associadas aquisio da Libras em diferentes contextos de aquisio (Quadros, 2010). Lillo-Martin e Quadros (2009, 2011), Lillo-Martin e Quadros (2009) apresentam vrios estudos comparando a aquisio de Libras com a aquisio da lngua de si-nais americana e identificam vrios padres comuns de aquisio. As autoras evidenciam, por meio dos dados de aquisio morfossinttica, o quanto a aquisio de lnguas de sinais evidenciam que a aquisio da linguagem segue princpios universais de aquisio, mesmo envolvendo lnguas em modalida-de visual-espacial. Mais recentemente, Lillo-Martin et al. (2009), Pichler et al. (2009, 2010), Quadros et al. (2011) apresentaram estudos com crianas biln-gues adquirindo uma lngua de sinais e uma lngua falada simultaneamente. Os estudos indicam padres muito interessantes especficos desse contexto, por exemplo, o fato das crianas produzirem as duas lnguas simultaneamen-te. Apesar das especificidades observadas nesse contexto de aquisio, as au-toras encontram padres comuns aos bilngues unimodais. O interessante desses estudos com bilngues intermodais que se abre um campo de pesqui-

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    sas que se conecta com os estudiosos de gestos que abordam os estudos da produo gestual concomitante com a produo lingustica em lngua falada. No caso dos bilngues intermodais, a possibilidade de produzir uma lngua visual-espacial simultaneamente com produes da lngua oral-auditiva torna os dados muito importantes para a discusso da lingustica em geral.

    3 O futuro das pesquisas com a Libras

    As pesquisas com a Libras tm se fortalecido com a poltica que a reco-nhece como lngua nacional no Brasil. Alm disso, o fato de dispormos de fer-ramentas tecnolgicas que favorecem a anlise de produes em sinais tambm se tornou um aliado na produo de pesquisas com Libras. A tecnologia uma aliada muito importante, pois permite que vdeos em Libras sejam analisados por meio de ferramentas disponveis online, gratuitamente, como o Sistema de Anotao ELAN (http://www.lat-mpi.eu/tools/elan/). No Brasil, os pesqui-sadores j comeam a integrar o uso deste sistema de notao em suas pesqui-sas (Maccleary, Viotti e Leite, 2010; Quadros e Pizzio, 2007).

    Os avanos metodolgicos tambm tem possibilitado um estudo mais detalhado e aprofundado da Libras. J est sendo produzido um Identificador de Sinais com identidades pr-definidas para cada sinal para padronizar o uso de glosas para os sinais transcritos em diferentes corpora da Libras (Quadros, em elaborao). Tambm est sendo proposto a constituio de um Corpus de Libras (Projeto Corpus de Libras, sob a coordenao dos pesquisadores Tarcsio Leite, Ronice M. de Quadros (Leite e Quadros, no prelo). A pesquisa dever oferecer como produto: i) um corpus de Libras para ser utilizado em pesquisas e em outras finalidades aplicadas; ii) um conjunto de diretrizes para o registro e arquivamento de dados e metadados relativos ao uso da libras; e iii) um programa online para acesso aos dados e metadados do corpus. Essa rea se amplia tambm com a presena de vrios novos pesquisadores, atu-almente produzindo suas dissertaes e teses de doutorado sobre a Libras, como por exemplo, Aline Nunes Sousa, Marilyn Mafra Klamt, Edgar Veras, Rodrigo Custdio da Silva, Fernanda de Arajo Machado e Dionsio Schmitt, dentre os quais, os dois ltimos so surdos. Alm disso, contar com a parti-cipao de vrios pesquisadores de vrias universidades brasileiras, iniciando com a representao de cinco regies brasileiras: a Universidade Federal do Par, com a Elen Formigosa; a Universidade Federal da Paraba, com a Naya-ra Adriano; a Universidade Federal do Rio de Janeiro, com a Heloise Gripp; a Universidade de Braslia, com o Messias Ramos e a Universidade Federal do

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    Rio Grande do Sul, com a Carolina Hessel. Todos esses pesquisadores so professores surdos. Essa proposta ir garantir a documentao da Libras com a presena de pesquisadores surdos juntamente com demais pesquisadores da lngua brasileira de sinais.

    Alm das perspectivas que se abrem para vrias pesquisas sobre a Libras no campo da Lingustica, temos as produes nas interfaces com outros cam-pos de investigao.

    As produes que envolvem interfaces com pesquisas no campo dos Estudos da Traduo tambm apresentam novas frentes de investigao. Ra-mos (2000) foi um dos primeiros trabalhos especficos neste campo de pes-quisa analisando a traduo para a Libras de Alice no Pas das Maravilhas; posteriormente tivemos outros estudos, por exemplo, de Passos (2010), sobre os intrpretes de lngua de sinais, com foco nas atitudes frente a essa lngua (ver mais detalhes em Santos, neste volume). Temos vrias pesquisas que esto em andamento, dentre as quais, mencionamos as dissertaes e teses de Janine Oliveira, Silvana Aguiar dos Santos; Maria Cristina Pereira, Silvana Nicoloso, Renata Krusser, Franz Kafka Domingos, Fernanda de Arajo Ma-chado, entre outras j concludas, tais como as de Rimar Segala, Saulo Xavier dos Santos, Thas Fleury e Nelson Pimenta, do Programa de Ps-Graduao em Estudos da Traduo, da Universidade Federal de Santa Catarina. To-dos esses trabalhos envolvem pesquisas no campo dos Estudos da Traduo analisando aspectos da traduo ou a interpretao de Libras, com vrios pesquisadores surdos.

    Alm dessa interface, temos vrios estudos no campo da lingustica apli-cada analisando a educao bilngue, a aquisio e o ensino de lnguas, a lei-tura e a escrita (entre eles citamos Sousa 2008, 2012; Pereira, 2005; Pereira e Rocco, 2009; Nascimento, 2008; Favorito, 2006; Gesser, 2006; Costa, 2001; Quadros, 1997).

    Dentro da prpria Lingustica, percebemos que as pesquisas comeam a adentrar novas reas de investigao para alm da Fonologia, Morfologia e Sintaxe, produes comeam a prometer publicaes nos campos da Socio-lingustica, Polticas Lingusticas, Semntica, Pragmtica, Anlise do Discurso e Semitica. O espao bastante profcuo. O futuro promete muitas pesqui-sas com muitos novos e velhos pesquisadores de libras e com a presena de muitos surdos linguistas, algo que pode impactar de forma interessante os estudos das lnguas de sinais. Portanto, os dois grandes trunfos das pesquisas com lnguas de sinais so o da tecnologia, que nos brinda com novas formas de olhar para a libras e a presena de mais e mais pesquisadores surdos, que nos brindam com o olhar dos prprios surdos perante a libras.

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    O futuro dos estudos das lnguas (de sinais)

    Tarcsio de Arantes LeiteUniversidade Federal de Santa Catarina

    1 A construo do conhecimento humano

    O sculo XX trouxe consigo uma mudana histrica no pensamento do homem, impactando de forma particularmente marcante o nosso enten-dimento sobre o papel da cincia na compreenso da realidade. Por sculos e sculos, o homem debruou-se sobre o mundo externo acreditando que, em sua investigao, o cientista estaria se posicionando como um observa-dor diante de um objeto, para analis-lo de forma natural e objetiva.

    Desde a filosofia, passando pelas cincias humanas, e atingindo at mesmo as cincias exatas, como o caso da fsica, os grandes pensadores do sculo XX romperam em definitivo com essa viso ingnua da realidade. Ao constatar que a abordagem terica e os instrumentos metodolgicos de anlise afetam os resultados de experimentos e observaes naturais, os pesquisadores se deram conta de que, embora a cincia nos permita aprofun-dar nosso entendimento da realidade, esse aprofundamento sempre parcial, nunca esgota a natureza dos objetos, e no pode ser separado dos prprios processos subjetivos de construo do conhecimento. Em outras palavras, por meio da racionalidade cientfica, ganhamos novos insights sobre a realida-de, mas no podemos jamais chegar realidade em si (e.g. Garfinkel, 1967).

    Se nem mesmo as teorias e os instrumentos metodolgicos do cientista nos permitem alcanar a realidade ltima, h que se constatar uma espcie de armadilha no progresso do conhecimento humano, pois da mesma maneira que nossos achados iluminam certos aspectos da realidade, inevitavelmente obscurecem outros. A dinmica do processo pode ser ilustrada pelo exame da imagem A abaixo, discutida no livro de Padma Santem, A Roda da Vida (2010).1

    1 Para ver um debate mais geral sobre os pontos de convergncia e divergncia entre a perspectiva budista par-ticularmente a do budismo tibetano e a cincia ocidental, ver Dalai Lama (2006) e Wallace (2012). Varela et al. (1991) exploram essa interface tratando mais especificamente de questes em geral abordadas nos estudos de linguagem.

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    Ronice Mller de Quadros, Marianne Rossi Stumpf e Tarcsio de Arantes Leite (orgs.)

    Figura 1. Uma realidade, diferentes apreenses

    Quando olhamos para essa imagem, podemos enxergar diferentes reali-dades parciais: um hexgono, com arestas ligando uma extremidade a outra, a leitura mais imediata. Mas, com um certo exerccio de abstrao, podemos ver tambm cubos com diferentes orientaes imaginando algumas arestas ao fundo, como salientado nas imagens B e C por meio das linhas ponti-lhadas. O processo fascinante que, quando buscamos perceber uma dessas formas em A, as outras desaparecem. Essa impossibilidade de enxergar a realidade por completo revela essa natureza parcial das nossas apreenses do mundo, sempre moldadas por nossas teorias (neste caso, o tipo de figura que esperamos ver) e por nossos instrumentos de percepo (neste caso, os nossos olhos nus).

    O campo dos estudos de lnguas de sinais so uma excelente fonte de evidncia dessa (por vezes cruel) dinmica do progresso do conhecimento humano. Dentro de uma viso do senso comum, as lnguas de sinais no so enxergadas como lnguas naturais, com o mesmo estatuto das lnguas orais, e por isso as pessoas surdas at hoje lutam para ter a sua lngua plenamente reconhecida. Na verdade, num olhar superficial, as lnguas de sinais parecem totalmente distintas das lnguas orais: as primeiras seriam produzidas com as mos e apreendidas pela viso, enquanto as ltimas seriam produzidas com a boca e apreendidas pelos ouvidos. Essa percepo tem levado leigos e cien-

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    tistas a crer que as lnguas de sinais sejam equivalentes a uma forma primitiva e universal de expresso corporal, incapaz de expressar conceitos abstratos e carentes de uma estrutura complexa e produtiva, tal qual a identificada nas lnguas orais. A descoberta de que as lnguas de sinais so lnguas naturais com o mesmo estatuto das lnguas orais, ento, s viria a ocorrer na dcada de 1960, com os trabalhos liderados por William Stokoe, e, ainda que seu trabalho revolucionrio tenha resultado em mais de cinco dcadas de estudos cientficos das lnguas de sinais, a viso superficial e equivocada dessas lnguas ainda permeia o senso-comum e persiste at mesmo em alguns setores da academia.2

    Agora, to revelador quanto o processo de descoberta das lnguas de sinais pela cincia lingustica est o processo de desenvolvimento dos estudos das lnguas de sinais ao longo das dcadas e aqui nos aproximamos mais do tema central deste artigo. Quando refletimos sobre os estudos que se co-locam nesse campo, desde o seu advento nos anos 60 at a primeira dcada do sculo XXI, constatamos que as caractersticas das tecnologias de que dispunham os linguistas impunham, cada uma ao seu modo, certas possibili-dades e certos limites s suas anlises. Por causa disso, as prprias questes de pesquisa colocadas por esses pesquisadores, bem como as respostas por eles encontradas, se revelam dependentes das tecnologias que esto ao seu dispor. Com esse tipo de anlise, ento, podemos vislumbrar alguns possveis rumos que, diante da exploso tecnolgica do sculo XXI, as pesquisas lingusticas podem tomar futuramente, bem como considerar o possvel impacto dessas pesquisas sobre o nosso entendimento acerca das lnguas humanas.

    Na seo 2 a seguir, explorarei o impacto da tecnologia da escrita na lingustica moderna, como foco sobre um dilema que todo linguista enfrenta ainda que muitos no se deem conta. Por um lado, a pesquisa lingustica pressupe o carter primordial da lngua oral em relao escrita no estudo

    2 Ver, por exemplo, no campo da prpria lingustica, a definio de lngua como sistema de signos vocais em Martelotta (2008, p. 16) e a necessidade de ressalva do editor na nota de rodap 1 (p. 29) um deslize infeliz que contrasta com a qualidade, e em particular com a atualidade, das reflexes tericas trazidas nessa obra.

    Exemplos mais dramticos do no reconhecimento das lnguas de sinais no campo acadmico podem ser en-contrados em alguns setores da medicina (e.g. o debate recente sobre o uso da Libras numa novela brasileira, em http://www.sborl.org.br/conteudo/secao.asp?id=2092&s=51), onde a Libras vista como um retroces-so para o desenvolvimento da pessoa surda, e no campo da educao inclusiva (e.g. http://revistaescola.abril.com.br/inclusao/inclusao-no-brasil/maria-teresa-egler-mantoan-424431.shtml), onde a libras vista como um recurso facilitador da escolarizao dos surdos, mas no essencial. Infelizmente, a manifestao desses pontos de vista no tem sido acompanhada, como se esperaria num ambiente acadmico, de um dilogo com as evidncias acumuladas nas ltimas cinco dcadas de estudos no campo da surdez e das lnguas de sinais, que destacam o papel fundamental das lnguas de sinais no desenvolvimento pessoal e escolar das crianas surdas ver, por exemplo, a excelente sntese em Cummins (2011), ou ainda, no Brasil, os inmeros trabalhos liderados pelo prof. Fernando Csar Capovilla (e.g. Capovilla, 2009).

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    das lnguas naturais, e inclusive destaca os riscos de interferncia da ferramen-ta da escrita nesse empreendimento.3 Apesar disso, todo linguista observa e analisa a lngua oral por intermdio da escrita, o que restringe nossas questes e achados ao que a escrita nos permite questionar e ver.4 A partir dessa refle-xo, ser discutido de que maneira o conhecimento lingustico dos cientistas, construdo com base nas lnguas orais sob as lentes da escrita, possibilitou o reconhecimento das lnguas de sinais enquanto lnguas naturais ou ainda, sob outro prisma, que tipo de lngua de sinais pde ser descoberta a partir do aparato terico e metodolgico de que os linguistas dispunham nas primeiras dcadas de investigao dessas lnguas.

    Na seo 3, explorarei o papel de diferentes tecnologias nos estudos lingusticos ao longo do sculo XX. A seo se inicia com um caso ilustrativo, retirado da lingustica das lnguas de sinais, que revela tanto as limitaes da escrita para o estudo das lnguas de sinais quanto a importncia das novas tecnologias para o avano nesse campo. Em seguida, as diferentes tecnologias que vm sendo empregadas nos estudos das lnguas naturais sero conside-radas, dando destaque para o tipo de recorte que elas imprimem sobre os dados originais, a sua versatilidade operacional para manipulao e anlise dos dados, a qualidade dos dados que elas apresentam para a verificao das anlises e os tipos de dados lingusticos que elas possibilitam ser trazidos como objeto de estudo.

    A concluso do captulo na seo 4 retoma a questo da interdepen-dncia entre teoria, instrumentos metodolgicos e resultados de pesquisa, apontando duas constataes emergentes dos estudos de lnguas de sinais que, a despeito de sua significncia, tm recebido uma ateno marginal por parte dos linguistas. So elas: (i) as lnguas de sinais resistem, de uma maneira que no se v com nenhuma lngua oral, criao de um sistema de escrita que possa satisfatoriamente descrever o que foi dito num discurso sinalizado particular; e (ii) as lnguas de sinais impem, de uma maneira que no ocorre com nenhuma lngua oral, uma contnua e difcil avaliao do que lngua e o que gesto no discurso sinalizado. O presente trabalho prope que uma refle-xo aprofundada sobre essas questes, com nfase sobre o papel chave das tecnologias na mediao do conhecimento, dever afetar no apenas o futuro dos estudos das lnguas de sinais, mas das lnguas naturais de maneira geral.

    3 A primordialidade da oralidade em relao escrita se deve ao fato de a oralidade anteceder a escrita tanto do ponto de vista filogentico quanto ontogentico, o que se revela particularmente no fato de todas as socieda-des humanas possurem uma lngua oral, mas nem todas possurem uma lngua escrita.

    4 Para uma fascinante e abrangente discusso sobre o impacto da escrita tanto sobre o uso quanto sobre o estudo cientfico da linguagem, ver McCleary (2011).

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    2 A escrita e a cincia da linguagem

    2.1 A lingustica e o seu objeto

    A dificuldade de identificao do objeto de anlise dos estudos lingusti-cos pode ser apreciada em qualquer aula comum de introduo a lingustica. No campo da lingustica histrica, por exemplo, estudamos as transforma-es pelas quais as lnguas naturais passam com o decorrer do tempo, motivo pelo qual as palavras e construes de hoje no so mais iguais s palavras e construes de ontem. Questionamos ento os alunos com relao a essa constatao um tanto bvia de que as lnguas mudam, pedindo um exem-plo tangvel de mudana lingustica. Como resposta, ouvimos coisas do tipo: a palavra farmcia, que antigamente se escrevia pharmcia.

    A enorme confuso que fazemos entre lngua escrita e lngua falada nas sociedades letradas j era anunciada por aquele que hoje considerado o pai da lingustica moderna, Ferdinand de Saussure. Em seu livro clssico, Curso de Lingustica Geral, Saussure afirma:

    O objeto lingustico no se define pela combinao da palavra escrita e da palavra falada; esta ltima, por si s, constitui tal objeto. Mas a palavra escrita se mistura to intimamente com a palavra falada, da qual a imagem, que acaba por usurpar-lhe o papel principal; terminamos por dar maior impor-tncia representao do signo vocal do que ao prprio signo (...) A lngua tem, pois, uma tradio oral independente da escrita (...), todavia o prestgio da forma escrita nos impede de v-la. (Saussure, 2002 [1916], p. 33-34)

    Um estudioso de Anlise do Discurso destacaria, apropriadamente, que Saussure optou por tratar este tema por meio de um discurso polmico, pressu-pondo como pblico-alvo o estudante que enxerga o objeto lingustico como definido pela combinao da palavra escrita e da palavra falada da a sua formulao da definio de objeto lingustico na forma de uma construo negativa. De fato, como se d na passagem acima, h na obra de Saussure lon-gas discusses sobre as relaes entre lngua oral e lngua escrita com o intuito de elucidar as suas diferenas e evitar a confuso indiscriminada entre ambas.

    Na citao acima, Saussure atribui essa confuso ao prestgio que a escrita tem nas sociedades letradas atuais, um aspecto do senso comum cla-ramente constatvel que realmente precisa ser desconstrudo ao longo da formao de qualquer estudante de lnguas. Contudo, h outras formas de in-terferncia da lngua escrita sobre o nosso entendimento das lnguas naturais que opera num nvel mais sutil, e que, em certa medida, inevitvel.

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    Ocorre que foi a escrita que permitiu, antes de tudo, o prprio estudo cientfico das lnguas naturais, fixando e objetificando a lngua de tal forma que pudssemos enxerg-la como um objeto passvel de anlise (Ong, 1982). Assim, todo o nosso conhecimento sobre as lnguas naturais inician-do nos primeiros estudos clssicos do snscrito por volta do sculo V a.C. e culminando com os mais variados estudos modernos da lingustica do sculo XX foi construdo utilizando-se a escrita como a lente do linguista para o escrutnio desse objeto esguio e dinmico que chamamos i.e. reificamos sob o conceito de lnguas naturais.

    2.2 O dilema do linguista

    Que percepo de lngua teramos ns se jamais tivssemos sido expos-tos a escrita num universo letrado? Ainda que um exerccio filosfico inte-ressante, essa uma questo na prtica impossvel de ser respondida. Afinal de contas, at que ponto podemos colocar a escrita em suspenso para po-der pensar o objeto lingustico livre de seus vieses? Aqui identificamos uma forma mais sutil de interferncia da escrita sobre o nosso entendimento das lnguas naturais: no somente o linguista observa o objeto lingustico atravs das lentes da escrita; o linguista sequer pondera sobre o objeto lingustico sem o suporte cognitivo da escrita. A diferena que, no primeiro caso, constatamos o papel da escrita na mediao fsica de atos especficos de anlise, enquanto, no segundo caso, constatamos o papel da escrita na mediao cognitiva de atos bsicos de racionalizao (McCleary, 2011).

    A viso preponderante em nossa sociedade supe que os nossos atos de cognio sejam um tipo de processo que acontea l dentro, atravs do processamento interno de estmulos e posterior exteriorizao de res-postas. Essa viso de cognio tem sido h muito tempo questionada por estudiosos em diferentes campos de pensamento, em particular na filosofia e em alguns campos das cincias humanas (e.g. Coulter, 1991). Particularmente relevantes para a presente discusso so os estudos no campo da chamada cognio distribuda situados na interface dos estudos da cognio e da antro-pologia cultural que descrevem o processo por meio do qual as tecnologias tornam-se ncoras materiais para a realizao de processos racionais mais sofisticados (Hutchins, 2005).

    Comeamos assim a apreciar melhor o quo complexo o problema em que estamos envolvidos. Reconhecemos, enquanto linguistas, que o nosso objeto de estudo primordial a lngua oral. Apesar disso, nascemos e somos

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    criados em sociedades que enxergam a lngua escrita como uma representa-o mais completa e perfeita e a lngua oral como uma manifestao parcial e particular. Quando superamos esse vis social, continuamos em total de-pendncia da escrita como ferramenta mediadora de nossas anlises da lngua oral e, mais do que isso, nos apoiamos na escrita como ncora material para racionalizar de maneira mais aprofundada sobre o objeto lingustico. Eis, por-tanto, o dilema do linguista: depender fundamentalmente da escrita para compreender algo que no deve ser confundido com a escrita, embora facilmente o seja.

    Mas porque a tecnologia da escrita se mostra to til para a nossa refle-xo sobre a lngua? Ora, a escrita permite ao analista um registro da lngua isolado de seus contextos naturais de emergncia, completamente esttico e altamente sinttico, tornando a tarefa de observao e manipulao dos dados extremamente eficiente. E esses meios refinados de isolar, observar e manipular dados so a faca e o queijo que qualquer cientista deseja ter em mos, pois o que permite a ele notar dimenses da realidade que passariam despercebidas no fluxo dinmico e fugaz dos eventos lingusticos naturais. A contrapartida indesejvel que, quanto mais a metodologia adotada nos distancia do fenmeno natural, mais enviesados sero nossas concluses a respeito desse fenmeno.

    Tomemos brevemente duas afirmaes bsicas sobre as lnguas natu-rais que se mostram particularmente relevantes para a presente discusso. H dezenas ou centenas de milhares de anos o homem se relaciona com seus pares em contextos de interao face a face, desenvolvendo isso que hoje chamamos de lnguas naturais.5 Apesar disso, abrimos um livro de introdu-o lingustica e consideramos razovel quase um senso comum! uma afirmao do tipo: as lnguas naturais so produzidas por meio do aparelho vocal, e percebidas por meio dos ouvidos; ou, no melhor dos mundos, as lnguas orais so produzidas por meio do aparelho vocal e percebidas por meio dos ouvidos. Se as frases acima de fato parecem bvias, cabe aqui um ques-tionamento: teriam os homens cruzados seus braos e fechado seus olhos ao longo das dezenas ou centenas de milhares de anos em que utilizaram as lnguas em contextos de interao face a face, a ponto de os gestos corporais e a viso no desempenharem um papel central na produo e percepo das lnguas naturais? Ou no seria mais plausvel hipotetizar que a dimenso sonora dessas lnguas naturais foi colocada em primeiro plano nas reflexes

    5 No h um consenso cientfico sobre quando surgiram as lnguas humanas, pois, como no poderia deixar de ser, diferentes estimativas resultam de diferentes pressupostos tericos e metodolgicos dos cientistas. As estimativas variam entre 50 mil e 200 mil anos.

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    cientficas exatamente por ser a dimenso das lnguas que aparece represen-tada na tecnologia escrita?

    Avancemos um pouco mais no livro de introduo lingustica e con-sideremos uma segunda afirmao, essa j mais sofisticada e bem longe do senso comum. Diz o livro que uma das caractersticas definidoras das ln-guas naturais a sua produtividade, isto , a sua capacidade de construir formas infinitas de expresso a partir de um conjunto finito de elementos. Como exemplo dessa propriedade, o professor de lingustica escreve no qua-dro as palavras mata, pata, data, cata, nata, ilustrando essa impressionante produtividade que os sistemas lingusticos revelam e que se estende desde o nvel mais bsico da palavra at os nveis mais elaborados de construes complexas.

    Aqui, novamente, o vis da afirmao pode ser percebido quando consi-deramos de que maneira a tecnologia escrita nos conduz a essa concluso: ao registrar a lngua numa forma grfica alfabtica, a escrita reduz a sofisticada linguagem corp(oral)6, produzida pela articulao de todo o corpo no espao tridimensional, a um conjunto finito de elementos discretos (i.e. letras) que se recombinam de forma linear num espao bidimensional. Nesse recorte, emergem como centrais ao fenmeno das lnguas naturais as unida-des discretas que a compem e suas inmeras possibilidades combinatrias, e ficam relegados ao segundo plano ou totalmente obscurecidos os gestos, os olhares, as expresses faciais, as ricas nuances prosdicas, a orientao e os movimentos do corpo, a postura, a arranjo espacial dos interlocutores, entre vrios outros elementos que desempenham papel crucial no uso cotidiano, vivo, face a face da linguagem (Goffman, 1981).

    Longe de querer concluir que a escrita seja um inconveniente para o linguista, destaco aqui apenas a parcialidade que a escrita proporciona na apreenso do fenmeno da linguagem, e a consequente necessidade de bus-carmos novas perspectivas e incorporarmos novas ferramentas no estudo dessas lnguas, de modo a ampliarmos o nosso entendimento da linguagem de forma geral. De fato, essa a lio que tem nos ensinado alguns dos mais importantes cientistas das lnguas de sinais (Armstrong et al., 1995; Stokoe, 1991; Liddell, 2003), cuja obra sugere que, para o avano de nosso enten-dimento das lnguas naturais, o dilema do lingista aqui discutido deve ser reconhecido e suas implicaes para as nossas concepes de lngua devem ser exploradas.

    6 McCleary (2003) prope o termo corporalidade em relao ao termo oralidade, para destacar o fato de que a oralidade em seu sentido mais amplo no est restrita ao aparelho vocal ou mesmo sonoridade, envolvendo na verdade todo o corpo situado em contextos de interao face a face.

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    ESTUDOS DA LNGUA BRASILEIRA DE SINAIS I

    2.3 A descoberta das lnguas de sinais

    Ainda que as lnguas orais estejam sendo estudadas h cerca de 2500 mil anos, desde os estudos do snscrito na ndia antiga, a cincia lingustica tal como a conhecemos hoje surgiu h pouco mais de 100 anos, quando Saus-sure inaugurou uma nova forma de olhar para as lnguas. De acordo com essa nova viso, a lngua passa a ser vista enquanto um sistema abstrato, de natureza psquica, estruturado por meio de uma complexa rede de relaes de

    combinao e associao entre seus elementos. Mutatis mutandis, essa viso de lngua enquanto sistema permeia as diferentes correntes lingusticas moder-nas independente de suas divergncias tericas especficas.

    Expandindo essa perspectiva geral, a lingustica do sculo XX formu-lou algumas caractersticas bsicas que todas as lnguas naturais possuem e que nos permitem diferenci-las de outros tipos de linguagens humanas e no humanas. De um lado, destaca-se o carter articulado/estruturado do sistema, que lhe confere uma produtividade ilimitada com grande economia, permitindo ao usurio expressar-se com grande refinamento e criatividade;

    de outro lado, destacam-se a convencionalidade e a arbitrariedade dos seus elementos, que lhe confere um grande potencial de abstrao, permitindo ao usurio deslocar as expresses lingusticas dos contextos concretos de onde

    elas originalmente emergiram.As lnguas de sinais somente passaram a ser reconhecidas enquanto ln-

    guas naturais quando os cientistas foram capazes de vislumbrar de que ma-neira tais lnguas poderiam ser analisadas a partir desses princpios fundamen-tais (Stokoe, 1960; Klima e Bellugi, 1979). A primeira etapa dessa revoluo, e talvez a mais importante, veio com os trabalhos liderados por William Stokoe, que foi capaz de demonstrar que as lnguas de sinais tambm faziam uso de um nmero finito de elementos (i.e. as configuraes, movimentos e locaes

    das mos na produo do sinal) de forma produtiva e econmica para per-mitir a expresso de tudo que as pessoas surdas necessitam. A segunda etapa dessa revoluo, que representou a consolidao dessa descoberta, viria com os trabalhos liderados por Edward Klima e Ursulla Bellugi, que demonstra-ram que os sinais das lnguas de sinais tambm eram convencionais e arbi-trrios e que a gramtica das lnguas de sinais, de natureza visual e espacial, era to sofisticada quanto a das lnguas orais. Abria-se assim um novo campo

    de investigao que se fortaleceu nas dcadas subsequentes e que continua ganhando cada vez mais espao na academia.

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    Ronice Mller de Quadros, Marianne Rossi Stumpf e Tarcsio de Arantes Leite (orgs.)

    Para essa revoluo iniciar, foi portanto necessrio algumas mentes par-ticularmente engenhosas, capazes de enxergar a realidade para alm das vi-ses de mundo que a maioria das pessoas, incluindo os cientistas, tomavam como pressupostos como por exemplo a viso de que as lnguas naturais se-riam produzidas pelo trato vocal e percebidas pelos ouvidos. Por outro lado, como de fato se deu com tantas outras grandes revolues na concepo do homem sobre a realidade, essa mudana no envolveu apenas rupturas, mas tambm continuidades: a escrita, ferramenta to primordial de trabalho do linguista, continuou desempenhando um papel chave para o entendimento das lnguas de sinais. A fim de demonstrar a produtividade dessas lnguas, Stokoe precisou desenvolver um sistema notacional linear em que smbolos grficos representavam os diferentes aspectos sublexicais dos sinais, conce-bidos como elementos de carter discreto e combinatrio. Klima e Bellugi, por sua vez, adotaram um sistema notacional composto por g