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8/17/2019 Potiguara http://slidepdf.com/reader/full/potiguara 1/68 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS POTIGUARA 

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POTIGUARA 

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O povo da nação Potiguara é o verdadeiro autor deste livro. As ideias, opiniões e os sentimentos dos Potiguaraestão expressados nesta obra através de textos e fotografias feitos pelos próprios indígenas Potiguara. A tec-nologia social ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS é uma realização da ONG THYDÊWÁ, com a coordenação de

Sebastián Gerlic que, com esta publicação, realiza seu décimo quinto título:

POTIGUARA.

 Autores: Ailton Silva de Lima, Bruno Potiguara, Cacique Comadre, Capitão Potiguara, Gessé Potiguara, IrembéPotiguara, Ivanilda da Rocha Silva, Isaías Potiguara, José Medeiros, Josecy Potiguara, Luís Benedito da Silva,Magna Lima, Maria Antônia, Maria de Lourdes, Michele Benedito da Silva, Natali Galdino, Nathália Rafaela,

Poran Potiguara, Raíssa Potiguara.

Participação: Amilton Fernandes da Silva, Cacique Alcides, Cacique Aníbal, Cacique Bel, Cacique Toinho daCarneira, Chico Potiguara, Danielle Lima da Silva, Itajaciana Maximiano da Silva, Josafá Padilha Potiguara,

Manoel Pereira “Manezinho” Potiguara, Marcos Santana Potiguara, Natanael da Silva, Sandro Potiguara.Fotografias: Bruno Potiguara, Gessé Potiguara, Irembé Potiguara, Peter Anton Zoettl, Raíssa Potiguara.

Organização: Sebastián Gerlic, Peter Anton Zoettl.

Projeto gráfico: Peter Anton Zoettl.

Consultoria: Derval Cardoso Gramacho.

Este livro foi realizado através do Programa BNB de Cultura, Edição 2010, Parceria BNDES com tiragem de 1.000exemplares. A THYDÊWÁ quer registrar seu sincero agradecimento a todo o povo da nação Potiguara pelaconfiança. Agradecemos também o apoio do Ministério da Cultura e a colaboração de Atia Pankararu, Maria

Pankararu, Alessandra Girotto.

Você pode copiar este livro ou trechos do mesmo, devendo mencionar o povo Potiguara como autor e citar onome completo do livro. Não pode usá-lo de forma comercial ou criar obras derivadas dele sem autorizaçãoescrita do povo Potiguara. Este livro pode ser vendido por integrantes da comunidade autora e pela ONG rea-

lizadora com o compromisso de reverter os recursos obtidos na valorização das culturas indígenas.

Dados Internacionais de Catalogação (CIP)

Gerlic, Sebastián e Zoettl, Peter Anton (orgs.)Índios na visão dos índios: Potiguara

Salvador: Thydêwá, 2011

1a edição

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 Após um duro trabalho realizando entrevistas, dialogando com nossos parentes,

 podemos nos orgulhar do resultado: Um livro que possui histórias do nosso coti-diano e que mostra quem somos e onde estamos. A voz do nosso povo pode ser

ouvida através dessas páginas.

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Mulheres Guerreiras

Mulher sempre foi sin nimo de delicade-

za e fertilidade, mas a mulher indígenamostra que pode ser mais que isso. Nósmulheres Potiguara somos as responsá-veis pela continuidade de nosso povo.Nossos filhos são o futuro de nossa gentee por isso temos a tarefa de cuidá-los ecriá-los seguindo os costumes Potiguara.Antes, as mulheres tinham a sua atuação

restrita a cuidar dos afazeres domésticose da família, mas com o passar do tempocomeçaram a perceber que podiam e ti-nham o dever de fazer mais.Começaram a sair das cozinhas de suascasas e a trabalhar junto com as lideran-ças em prol de seu povo, mas sempresofrendo o preconceito por parte dessas

lideranças, que eram todos homens enão viam com bons olhos a entrada delasno movimento indígena. Insistentes nes-se objetivo de ajudar sua comunidade,elas passaram a frequentar as reuniões,participar mais do Toré, envolver-se napolítica partidária e representarem suas

aldeias.„ as mais velhas às mais jovens, as mu-lheres Potiguara cada vez mais deixamsuas marcas na história de seu povo mos-trando a força da mulher indígena de di-versas formas.Exemplos de mulheres guerreiras Poti-guara não faltam. Podemos citar Clau-

deci Braz, cacique da aldeia Monte-mór

e vereadora do município de ‰ io Tinto(PB).Temos também Itajaciana, que é conse-lheira tutelar, secretária da A ssociaç ã oT oré F orte e universitária e Maria SoaresGomes, mais conhecida como Comadre,mãe de três filhos, dona de casa, artesã ecacique da aldeia ’ agoa do Mato.

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7MULHERES GUERREIRAS

Comadre já está há cerca de três anos

como cacique dessa aldeia e conta queconseguiu grandes avanços durante esseperíodo. „ esde pequena tentava se en-volver nas lutas, pois, como ela mesmadiz, “nasci no movimento”.“A gente tem que chegar à igualdade.Se não estivermos juntas com os ho-mens como vamos conseguir algo•” Ela

diz que as mulheres aos poucos estão seorganizando e, prova disso, foi o fato deterem sido contempladas com o Prê m io

C ulturas Indígenas com o projeto de re-vitalização da ’ agoa Encantada.Comadre conta que, juntamente com asdemais mulheres, conseguiu apoio deentidades feministas do estado da Paraí-ba e também do próprio governo estadu-al para a realização de palestras sobre asaúde da mulher.

Elas sempre estão em atividade e paraComadre é esse o motivo de os homensde nosso povo hoje estarem aceitandomelhor a participação das mulheres den-tro do movimento indígena.Agora as mulheres estão na busca de le-galizar a A ssociaç ã o Mulheres C om p a-nheiras da A ldeia agoa do Mato, a fim

de conseguir financiamentos para proje-tos de sustentabilidade a serem implan-tados em nossa área.Essas mulheres integram o povo Poti-guara e são parte do retrato da mulherindígena.Ser mulher Potiguara é ter a delicadeza

e a força em equilíbrio, é viver para suagente. É ser, mãe, parteira, agricultora,marisqueira, conselheira tutelar, verea-dora, artesã, cacique, liderança e acimade tudo uma guerreira.

Bruno Potiguara• C aci ue C om adre• essé Potiguara• Irem bé Potiguara•

Maria A nt nia• aíssa Potiguara

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9MANGABA

ManGaba

Uma fruta que temos em fartura em nos-

sas terras Potiguara é a mangaba. Ela étradicional em nossa região e é nativa denossa terra, pois nasce sem que a genteprecise cultivá-la. A mangaba tambémé produto de venda colaborando com osustento das famílias do nosso povo.Maria Miriam da Conceição, mais co-nhecida como Nin , moradora da aldeia

’ agoa do Mato, está entre os tantos Po-tiguara que sobrevivem catando manga-ba.Além dessa atividade, Nin para garan-tir o sustento da casa ainda desenvolveoutras, como o artesanato.“A gente trabalha dois dias para fazerquinze caixas de mangaba”, afirma Nin .

Mas um problema dos catadores de man-gaba em nossa área, inclusive Nin , sãoos atravessadores. Após trabalhar duroeles vendem a caixa de mangaba emmédia por ‰ ™ š › para o atravessador quelucra muito à custa dos catadores, reven-dendo a mangaba por um preço muitomais acima do que ele adquiriu.Tentando desviar desse caminho, nossosparentes tentam aos poucos vender osseus produtos nas feiras da região, comoé o caso dos senhores Epitácio e CarlosCiríaco.Seu Epitácio e seu Carlos, moradoresda aldeia São Francisco, juntamente

com sua família, sobrevivem da vendade produtos que cultivam e também damangaba.“Eu vendo frutas e também faço polpade várias delas e levo pra cidade pravender”, afirma seu Epitácio, que todo

sábado desce de bicicleta da aldeia paraa cidade onde tenta garantir o pão decada dia para sua casa.Apesar de iniciativas como a de seu Epi-tácio e seu Carlos de venderem eles mes-mos a mangaba, o que eles ganham nãochega a ser metade do que o atravessa-dor ganha à custa dos catadores, daí apreocupação de todos em buscar meiosde acabar ou ao menos amenizar a pre-sença dos atravessadores em nossa terra.Um sonho que se busca concretizar éconseguir comercializar a fruta sem ocontato com os exploradores atravessa-dores, fazendo com que a renda dos que

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trabalham com a mangaba possa crescere servir de sustento para cada vez maisfamílias. Assim essa fruta que é tradição

Potiguara estará presente por muito tem-po entre nós.

Bruno Potiguara• Irem bé Potiguara

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Pintura PotiGuara

Nossa pintura retrata a história Potigua-ra. Com ela trazemos no corpo a marcade nossos antepassados. É um meio denos revestirmos de nosso valor cultural.Todos os momentos em que vamos rea-lizar o ritual do Toré existe a preparaçãoanterior onde fazemos uso do Jenipapo edo Urucum para cobrirmos o nosso cor-po.

A pintura pode representar um momentode reivindicação ou um ato de comemo-ração.O Urucum traz a cor vermelha do sanguee força de nossos guerreiros antepassa-dos e o Jenipapo nos oferece a cor pretada Mãe Terra, nossa fonte de energia.Com o Urucum, a extração da tinta é

direta da semente para o corpo. Nós oabrimos, esfregamos a mão na sementee passamos em nosso rosto. E o usamosmais em momentos de luta e reivindica-ções.Com o Jenipapo, o processo de retirar atinta é mais demorado, mas não é difí-cil, principalmente por ser feito há muitotempo por nossos parentes.’ uiz Benedito da Silva, liderança Poti-guara e ex-cacique da aldeia Cumaru,sabe muito bem como fazer isso, pois hámuitos anos faz a tinta do Jenipapo e dis-tribui entre os parentes.’ uiz conta que para se extrair a maior

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13PINTURA POTIGUARA

quantidade de sumo desse fruto é preci-so que ele esteja ainda em fase de cresci-mento (meio verde), pois assim terá maiscaldo. Tem que se ralar o Jenipapo, colo-car suas raspas em uma vasilha.Para cerca de 20 frutos deve-se acres-centar dois litros de água e colocar paradescansar exposto ao sol.„ urante três dias deve-se mexer de duasem duas horas sempre prestando atençãopara ver se o caldo que se solta da massa

está ficando com a cor forte. A água temque ficar mais baixa do que a massa.„ epois desse período a tinta é coada ese espreme a massa para retirar o caldorestante.Após esse processo nossa tinta de Jeni-papo fica pronta para ser usada.Na maioria das casas temos uma reserva

de tinta de Jenipapo para quando preci-sarmos.Para nós Potiguara estar com nossos cor-pos pintados é muito importante para re-alizarmos nosso ritual.

Bruno Potiguara• essé Potiguara•Irem bé Potiguara• aíssa Potiguara

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sinto orGulho de ser artesã

Eu me orgulho muito de ser uma artesã.Gosto muito do que faço, pois ser arte-sã é minha vida. Fico muito feliz quandovendo uma peça, e quando recebo elo-gios. O artesanato é muito importantena história de nós Potiguara, pois produ-zimos peças para o uso doméstico, paraenfeitar o corpo durante o ‰ itual do Toré,como também para comercialização.

A maior dificuldade que encontramosna confecção do artesanato é a própriasemente. Com o processo de desmata-mento e a queimada de forma crimino-sa esse recurso se torna cada vez maisdifícil, levando ao seu desaparecimento.Temos uma outra dificuldade em relaçãoàs peças produzidas em nossa aldeias:

não dispomos de um lugar adequadopara a comercialização, e tão pouco osmeios necessários para o transporte danossa produção, que precisa ser vendi-da em outras cidades ou outros estadosdo nosso País. Já desisti muitas vezes departicipar de encontros ou até mesmo defeiras artesanais por falta de condiçõesque jamais me foram ofertadas. Essa si-tuação é muito difícil. Por outro lado, souuma artesã muito feliz por ter alguns dosmeus artesanatos espalhados pelo nossoPaís e até mesmo no exterior.

Ivanilda da ocha Silva

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15SINTO ORGULHO DE SER ARTESÃ

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internet eM nossas aldeias

A Internet é, como diz o ditado popular,uma “faca de dois gumes”. A maneiracomo ela será utilizada é que dirá se elacontribui de forma positiva ou negativapara alguém ou algum lugar.Para o nosso povo a Internet chegou háalguns anos, e hoje está se popularizan-do, principalmente entre os jovens. Noinício, acessava-se nas lan houses  da

cidade, mas atualmente já temos casasque possuem computador com conexão.Além disso, também existe um telecen-tro na aldeia Cumaru, no município deBaía da Traição (PB).Foi com a Internet que conseguimos estarmais conectados com a sociedade envol-vente, tomando conhecimento de tudo

que acontece fora de nossas aldeias, emuma amplitude maior do que a televisãoe o rádio nos proporcionam. Com essemeio de comunicação é que também foipossível estabelecer uma relação maispróxima com outros povos indígenas e,dessa forma, fortalecer o nosso movi-mento.

“Estar conectado à Internet ajuda a encurtar asdistâncias entre nós e outros povos”.

Poran Potiguara

É através da Internet que podemos di-vulgar a realidade em que vivemos, com

a criação de comunidades em redes so-ciais, participação em programas de ba-te-papo, sites, blogs, entre outros espa-ços virtuais.Executamos esse trabalho de divulga-ção desde 2005, quando alguns jovensde nosso povo começaram a participardo site Índios Online (www.indiosonline.org.br) uma rede colaborativa onde nós,

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17INTERNET EM NOSSAS ALDEIAS

povos indígenas, somos os protagonistase autores de nossa própria história. Fa-zendo parte desse espaço conseguimosrepassar para muitas pessoas um poucoda nossa realidade e também denunciaras irregularidades dentro de nossa área.

“Através da Internet nós conseguimos divulgaro que acontece em nossas aldeias e também de-

nunciar algum problema que esteja acontecen-do, como é o caso da casa de farinha da aldeiaCarneira que, apesar de ter o dinheiro, não foifinalizada e está parada, pois não tem forno.”

Ybotyra Potiguara

Também temos uma comunidade noOrkut chamada Sou Potiguara, com o in-tuito de reunir nessa rede social os Poti-guara online e também as pessoas quesimpatizam e são colaboradores de nossopovo, que já conta com a participação de

aproximadamente 250 membros.Mais recentemente estamos construindoum blog intitulado Guerreiros Potiguara(http://guerreirospotiguara.wordpress.com), um ambiente onde nosso objeti-vo maior é o de estar divulgando a nos-sa história e cultura desmistificando aimagem que as pessoas fazem do que é

ser índio e denunciar também situaçõesde descaso dos poderes públicos contrao nosso povo. Queremos um canal Poti-guara aberto para o mundo, onde todosconheçam quem somos, onde estamos ecomo vivemos.Muitos podem pensar que o contato comas novas tecnologias, entre elas a Inter-net, nos torne “menos índios”, e tambémnos distancie da nossa cultura, mas ameu ver isso não ocorre. Esse pensamen-to existe porque as pessoas ainda têm emmente um estereótipo de índio do pas-sado, aquele que andava nu e vivia nomato, e nos ver hoje, com as mudanças

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o conheciMento é nossa arMa

Hoje sabemos que o conhecimento e oaprendizado trazem para nós um gritode liberdade. Através do conhecimentopodemos dialogar com outras pessoas ecom os poderes públicos também, parabuscar condições de vida melhor paranosso povo.Os nossos pais e avós contam que estu-

dar no tempo deles era muito difícil e quehoje a facilidade é maior. Quase todas asaldeias têm escola, seja do município oudo estado, e isso ajuda as crianças a es-tudar sem sair do lugar onde moram. Oensino é diferenciado, ou seja, além deestudarmos o conteúdo que o não índioestuda, também aprendemos mais sobre

a história do nosso povo. Temos aula deetnohistória, de língua tupi, arte e cultu-ra potiguara. A força das palavras podecolaborar muito em nossas vidas.Nós Potiguara sa-bemos que aindaexistem poucasoportunidades decompletar cursostécnicos e supe-riores, mas nãodesistimos de ten-tar ocupar esseslugares que sãoimportantes para

pelas quais passamos, incomoda.Como seria se ficássemos alheios a tudo,o mundo evoluísse e nós permanecêsse-mos intactos• ‰ esposta simples: Sería-

mos engolidos por essa chamada globa-lização.O intuito de estarmos cada vez mais bus-cando saber e nos apropriar das tecno-logias da “sociedade globalizada” é deconseguir mecanismos para lutar pelosnossos direitos, conhecer tudo o que noscerca e dessa forma preservar o nossomodo de vida e o nosso território.

Irem bé Potiguara• Magna im apotiguara¬ indiosonline.org.br

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19O CONHECIMENTO É NOSSA ARMA

nós.Hoje temos um grandenúmero de parentes donosso povo estudandonas universidades, masnão foi fácil conseguir.Persistimos, reivindica-mos e mostramos que te-mos o direito de receberuma educação de quali-dade, capaz de melhorar

a vida do nosso povo Po-tiguara.Na Universidade de Bra-sília temos quatro paren-tes, dois estudam Nutri-ção, um estuda Engenharia Florestal e ooutro cursa Agronomia. Apesar de esta-rem longe das aldeias, todos eles têm o

compromisso de voltar e colocar em prá-tica o que aprenderam. Na UniversidadeFederal da Paraíba e em outras univer-sidades particulares temos muitos pa-

rentes estudando.Já durante o cur-so eles trabalhamdentro das nossasaldeias, mostran-do o que aprende-ram.Eu sou formadaem técnico de En-fermagem e tra-balho com o meu

povo há alguns anos. Também estou cur-sando Pedagogia, sempre visando ajudarnosso povo no que eles precisarem. Acho

muito importante contribuir na minha al-deia, pois assim eu consigo repassar osconhecimentos que adquiri e aplicá-los.Somos pessoas que precisam de forma-ção nas diversas áreas com as quais nosidentificamos. Só assim contribuiremospara diminuir as necessidades das nos-sas aldeias, assistindo-as da melhor ma-neira.

Michele Benedito da Silva

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21O CONHECIMENTO É NOSSA ARMA

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23A LAGOA ENCANTADA

a laGoa encantada

A ’ agoa Encantada é uma das belezasnaturais guardadas pelo nosso povo eestá localizada na aldeia ’ agoa do Mato.A origem do seu nome se deve às muitashistórias que existem sobre a lagoa, quecontam da magia que envolve o local.Muitos dizem que existe um navio nofundo das águas e que a sua âncora estápresa em uma árvore na nascente da la-

goa. Falam ainda que se as pessoas seempolgam no banho se distanciando dasmargens são surpreendidas por algo quepuxa suas pernas.Entre essas tantas versões dos encanta-mentos da lagoa „ ona Maria Ant nia,moradora da aldeia, conta o que aconte-ceu com ela.

Quando ela era jovem catava mangabana beira da ’ agoa Encantada e em umadessas idas ela estava com uma ami-ga quando viu um caranguejo grandee bonito sair das águas da Encantada.Quando „ ona Maria corria para pegar ocaranguejo ele aparecia em outro local.Ela tentou junto com a amiga por tempos

pegar o caranguejo, mas não conseguiu,pois ele desapareceu dentro das águasnovamente.„ ona Maria diz também escutar dos maisvelhos que no local existe ouro no fundoda lagoa e também que quem toma ba-nho com algum objeto de ouro ele acaba

desaparecendo.Essas e tantas outras histórias sobre oencantamento da lagoa só fortalecem acrença de que algo existe para que elatenha recebido esse nome. Independen-te da versão que se escolha acreditar, oumesmo que não acredite em nenhumadelas, algo misterioso existe no lugar.Independente de nossas histórias Po-tiguara todos concordam que o lugar émaravilhoso e nos convida a contemplar

a magia da natureza.Bruno Potiguara• C aci ue C om adre• essé Potiguara• Irem bé Potiguara•

Maria A nt nia• aíssa Potiguara

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24 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

a criança PotiGuara

Ser uma criança Potiguara para mim éfazer parte de uma comunidade familiarpois vivemos entre laçosfamiliares.Penso que no futuro pora maioria das pessoasda minha comunidadeserem humildes possoajudá-los na sua saúde,

pois planejo me formarem medicina.Faço parte de um povohistórico, povo sofrido,mas que vem aprenden-do buscar seu lugar nasociedade. Somos povoguerreiro e não desisti-

mos dos nossos ideais.Sei que vou enfrentarvários obstáculos na mi-nha vida, mas „ eus estácomigo lutando contratodos eles, pois ele temalgo de especial prepa-rado para mim. Não vou

desistir de ser médica,pois pretendo ajudar o meu povo e ou-tras pessoas que precisem dos meus ser-viços profissionais.Acho que toda criança Potiguara sonhaem ter uma boa profissão, ser atuante navida de seu povo, ter uma família linda e

 juntos compartilhar do fruto que foi plan-tado.Tenho sangue indígena e tenho orgulhode ser Potiguara.

Agradeço a minha mãe por estar me aju-dando e torcendo pelo meu sucesso navida profissional.

„ ath… lia aldino• † ‡ anos

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25A CRIANÇA POTIGUARA

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26 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

os PeriGos da luta

O movimento indígena é marcado pelosinúmeros casos de violência contra as li-

deranças que buscam reivindicar os di-reitos de seus povos. Pessoas que doamsuas vidas para a luta pelo direito à saú-de, educação e a demarcação de seusterritórios.Podemos citar vários casos de violênciacontra os povos indígenas, tais como a

prisão do cacique Babau e da cacique® aldelice do povo Tupinambá, o assassi-nato do cacique ¯ icão ¯ ukuru e a tenta-tiva de assassinato do seu filho Marcos, oatual cacique desse povo.Nós Potiguara não ficamos alheios a essaviolência, também sofremos muito com opreconceito e as ameaças vindas de não

índios. „ urante as retomadas nossas li-deranças receberam muitas ameaças de

usineiros, e mesmo depois da terra de-marcada os latifundiários ainda tentamse infiltrar em nossa área.Um caso muito marcante para nós foi oatentado sofrido pelo cacique Aníbal,grande liderança Potiguara, represen-

tante da aldeia Jaraguá.Na noite de 22 de março de 200° o ca-cique estava em sua casa com a esposae os filhos quando foi surpreendido pordois homens encapuzados e armadosque dispararam contra ele. Aníbal sofreuquatro tiros e ficou caído no chão de suacasa enquanto os bandidos fugiram.

Seu filho caiu ao seu lado gritando de-sesperado pedindo para que ele nãomorresse. Sua esposa foi pedir socorro.A notícia se espalhou rapidamente entrenosso povo enquanto o cacique era le-vado às pressas para João Pessoa. Todosacreditavam que Aníbal morreria, mas

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27OS PERIGOS DA LUTA

com as bênçãos de nosso pai Tupã ele foise recuperando aos poucos, passou poralgumas cirurgias e com o tempo foi me-lhorando.

As lideranças Potiguara buscaram ar-ticular-se com as entidades e políticosparceiros para lutar por justiça no casoAníbal. Ele teve que sair de sua aldeia eser escondido em outro lugar enquanto asituação “estava muito quente”.Ainda em recuperação, no dia š ° de

Abril de 200° o cacique encontrava-seentre seus parentes no grande Toré naaldeia São Francisco com a participa-ção de todas as aldeias Potiguara. Essefoi um momento de grande emoção paranosso povo.No decorrer do ano de 200° foram insis-tentes as reivindicações do nosso povo e

de todos os nossos parceiros por justiçae pela prisão dos bandidos que tentarammatar o cacique Aníbal. As pessoas nasaldeias e as próprias lideranças já tinhamseus suspeitos, mas a Polícia Federal nãoagia.Com o apoio do deputado federal ’ uizCouto, grande parceiro do povo Poti-

guara, e a comissão de „ ireitos Huma-nos da Universidade Federal da Paraíba,da qual a liderança Capitão Potiguara émembro, conseguimos articular a Secre-taria Especial de „ ireitos Humanos daPresidência da ‰ epública para discutir asituação do cacique Aníbal.

® árias audiências foram realizadas naaldeia Jaraguá para discutir o andamen-to dos trabalhos sobre o caso e tambémsobre as medidas de proteção que de-

viam ser tomadas para que o caciquepudesse viver em sua aldeia com tran-

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28 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

quilidade. Aníbal foi incluído no serviçode apoio e proteção aos defensores de di-reitos humanos, mas mesmo assim conti-nuou a receber ameaças.Ele ainda vive com receio de que algopossa acontecer com ele ou com sua

família e por isso não pode voltar paracasa. Atualmente mora dentro da aldeia,mas em um local mais protegido.O tempo passa e os bandidos que realiza-ram o atentado contra o cacique Aníbalnão foram presos. A justiça dos homensé lenta, mas a justiça divina não falha eestamos certos de que um dia tudo será

solucionado e eles pagarão pelo mal quefizeram.Se pensaram que com isso intimidariamnosso povo, enganaram-se, pois isso sónos fortaleceu e nos uniu ainda mais.A nossa luta não para e estaremos incan-sáveis buscando o melhor para nós Po-

tiguara, doa a quem doer. Somos guer-reiros do ’ itoral Norte paraibano e nãopararemos lutar por dignidade e por ofe-recer um futuro melhor a nossas crian-

ças.Bruno Potiguara• essé Potiguara• Irem bé

Potiguara• I saías Potiguara• aíssa Potiguara

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29RETOMANDO O QUE É NOSSO

retoMando o que é nosso

O início para a grande retomada da al-deia Três ‰ ios foi no ano de š ° ° ° , quan-

do fechamos a B‰ que dá acesso à cidadede ‰ io Tinto. Tivemos reunião com o juizda comarca de ‰ io Tinto, a UniversidadeFederal da Paraíba e o comandante da

Polícia Militar do município de Maman-guape. A polícia pressionou muito paranão fazermos plantação e também paraque desocupássemos a área, mas resisti-

mos com o apoio dos nossos parceiros epermanecemos na nossa terra.Em agosto de 200± demos continuida-de ao trabalho. Na manhã do dia ² eu,

Capitão, fui comunicadopelo cacique Bel que osusineiros tinham manda-do arrancar a roça quehavia na aldeia. „ iantedisso, nosso povo, comoforma de impedir que osusineiros arrancassema roça e para pressionara demarcação de nossaárea, apreendeu alguns

veículos da usina. Acio-nei os Procuradores ’ u-ciano Maia e „ uciranFarena e também a Co-missão de „ ireitos Hu-manos da Universidadee a imprensa.Construímos barracas

e ficamos acampadosdurante meses. Nessetempo sempre enviamosdocumentos para as au-toridades do governo epara organizações inter-nacionais, relatando nos-

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30 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

Relato de  J osecy 

Meu nome é Josec³ , souvice-cacique da aldeia Três‰ ios. Já t na luta com mais

de treze anos e a retomadaaqui, que hoje a gente vive,foi muito difícil pra nós,como ainda está sendo.Numa segunda-feira, às 5horas da manhã, entramosaqui na retomada com pou-ca gente, mas a gente ficou

até hoje.„ epois foi chegando o pes-soal de Monte-mór e Ja-raguá, foi quem deu umapoio. O pessoal lá do For-te, Capitão com a família,Caboquinho com a famíliadele, e mais outras lideran-ças. E a gente ficou aquiarrancando toco de cana,plantando lavoura e daí agente começou.Tivemos apoios dos ór-gãos que até hoje nosapoiam: CIMI, Procurado-ria, Universidade, FUNAI,FUNASA também, que

deu apoio na saúde. „ aí agente foi sempre com essepensamento de ficar. An-tes, todos os índios quemoram hoje dentro de Três‰ ios moravam todos na ci-dade.

sa situação e pedindo pela demarcaçãode nossa terra.„ urante esse período os capangas da

usina rodeavam

o acampamento eatiravam, semprede madrugada. Agente mantinha avigilância e tam-bém pedimos aoprocurador quenos desse o míni-mo de segurançae ele encarregoua Polícia Federal

de nos dar apoio.Com o intuito de pressionar o governopara agilizar o processo demarcatório,ocupamos a sede da FUNAI, em João

Pessoa. Através dessa ação e tambémda articulação que realizamos em Brasí-lia com o deputado federal ’ uiz Couto,o deputado estadual ‰ anieri Paulino, etambém nas reuniões da Comissão Na-cional de Política Indigenista, da qualfaço parte, fomos vitoriosos. Em dezem-bro de 200› o então Ministro da Justiça,

Tarso Genro, assinou a Portaria de de-marcação da Terra Indígena Potiguarade Monte-Mór.

C ap itã o Potiguara

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31RETOMANDO O QUE É NOSSO

Eu passei noventa dias sem ir na minha casa.O pessoal da minha comunidade que moraaqui, todo mundo me conhece, sabe onde eumoro, onde eu nasci. Ameaça não falta deter, chamada de juiz a gente sempre tem, agente vai para defender aqui o nosso povo,nosso território, que é a terra. E daí semprelutando com o apoio de nossos parentes, via-

 jando para Brasília com apoio dos deputa-dos.Mas a quem a gente ia lá fora procurar semter conhecimento• Com quem a gente ia fa-lar• Mas a gente tinha duas pessoas impor-

tantes aqui de nossa terra, o cacique geralCaboquinho e Capitão, essas pessoas sãomuito importantes na luta.Nós aqui dentro somos ameaçados, o caci-que que tá de frente vive sempre sendo malvisto pela usina. Faz até medo a gente sairfora de hora, a gente tem sempre que andaracompanhado.

Nós somos as lideranças que brigam pelonosso povo, pelo direito do nosso povo. Oque se vê aqui hoje foi através de nossa luta.A gente não podia andar aqui dentro com oscapangas tudo armado de “doze”. Hoje es-tamos livres.Hoje, aqui dentro de Três ‰ ios temos umabase de duzentas famílias trabalhando.Como é que a gente ia sobreviver se não ti-

nha emprego• Ia pra São Paulo e ‰ io comoera antes• Não. Nós que temos que viveraqui dentro, dar valor a nossa terra.Somos nós que é filho natural daqui, que temque sobreviver desta terra e não o povo defora. Nós entramos na luta e estamos aí.

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32 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

teMPo de sofriMento

A aldeia Jaraguá é marcada até hojepela presença da Companhia de Tecidos

‰ io Tinto, que tem como donos a família’ undgren. Foi um tempo de muita a´ içãopara nossos parentes que moravam emJaraguá, porque não podiam dizer queeram índios. Se dissessem eram ameaça-dos de morte. Os que trabalhavam na fá-brica de tecidos moravam em casas quea Companhia cedia aos trabalhadores,mas só enquanto eles fossem funcioná-rios. Quando eram dispensados, só re-cebiam a remuneração se entregassema chave da casa onde estavam moran-do. Muitos parentes nossos trabalhavampara os ’ undgren. No século passado, afamília ’ undgren construiu um casarão

dentro do nosso território que muitos di-zem ter sido para receber o nazista Hi-tler. Foi nesse casarão que aconteceramdiversos episódios de massacre contra osnossos parentes Potiguara. Nele funcio-nava a sala de julgamento, onde casti-garam muitos dos nossos, porque dificil-mente um índio era inocentado. Naquele

período, quando nossos parentes tenta-ram invadir o casarão, houve um derra-mamento de sangue muito grande. Mui-tos Potiguara foram queimados dentrode suas casas, sem poder fazer nada parase defender. Até pouco tempo atrás nósnão tínhamos acesso ao casarão, mesmo

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33TEMPO DE SOFRIMENTO

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35TEMPO DE SOFRIMENTO

ele estando em nossa terra. Mas com ademarcação pudemos tomar posse delee usá-lo para outros fins. Hoje o casarãoserve de espa-

ço para reuniõesdo nosso povo etambém de escolapara nossas crian-ças. Seu José con-ta um pouco doque sabe:

A Companhia ‰ ioTinto não queria quedissesse assim: Eusou índio. Se dissesseque era índio e ela soubesse, ou mandava matarou mandava retirar aquela pessoa de qualquer

 jeito. Quem µtava doido de dizer•

Tinha um cab co chamado Horácio que moravacá em cima e chegou seu Anilo, que era pessoa

do coroné, um revolvão do lado e o coroné comrevólver também. O velho, doente, deitado numarede, aí ele disse assim:

Anilo: „ iga cab co safado, de quem é isso aqui•

Horácio: É da Companhia.

Anilo: Queria que você dissesse que era dos ín-dios que eu ia dar a carga desse revólver todinhona sua boca.

E eu assim em pé escutando. Ele disse que aquinão queria ver nenhum cab co. Com uns dias ovelho Horácio morreu.

Quando eu entrei na fábrica tava com catorzeanos. Eu fui trabalhar de tecelão. Tinha muitoíndio que trabalhava na fábrica. Eu trabalhavana seção de caldeira quando disseram que um

contínuo trabalhador tinha roubado dinheiro

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36 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

contínuo ¶trabalhador· tinha roubado dinheiroda fábrica ‰ io Tinto. Aí pegaram esse contínuo,prenderam e levaram para caldeira. „ izem que

 jogaram ele dentro, mas eu não vi.

Tinham doze vigias perigosos só pra essas coisas.

Meu tio mesmo saiu da ® ila Monte-mór em š ° ± 0.Ele foi morar na Grupiuna. Eles pegaram dozevigias e levaram pra meu tio dizer que a terradele era da Companhia ‰ io Tinto.

„ urou quarenta e dois anos essa questão, meutio com a Companhia. O que é que valia meu tio•Meu tio era um cab co, não podia pagar um car-ro pra ir pra João Pessoa. Mas no meio dessesvigias tinha um conhecido do meu tio que avisa-va: Seu Paulo, o senhor saia de casa porque meianoite nós vem buscar o senhor. Eu venho porquesou obrigado, a gente vem pra lhe levar.

Meu tio se escondia na mata quando dava a horacerta. „ e oito pra dez da noite, riscava o cami-nhão caçando ele. Quando eles foi embora, meutio saiu. Meu tio foi pra João Pessoa a pé atrásdo „ r. José Fernandes. O „ r. fazia um precató-

rio ¶carta· e mandava ele levar pra companhia.Aí eles passavam um tempo sem mexê com meutio. „ epois de muito tempo quem ganhou foi meutio. Eu saí da fábrica em 5 de Santana ¶julho· deš ° 52.

essé Potiguara• ̂ osé Medeiros

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37JUVENTUDE ATUANTE

Juventude atuante

A participação dos jovens indígenas Po-tiguara atualmente é decorrente dos co-nhecimentos adquiridos na relação comos anciões e da vivência dentro das al-

deias.É desse conhecimento, e percebendo aslideranças mais velhas como exemplo aser seguido, que a juventude Potiguaraestá mais envolvida com o movimentoindígena e a partir daí cada vez mais atu-ante na revitalização de sua cultura paranão deixá-la morrer.

Os jovens antes não tinham direito de seposicionarem sobre os diversos assuntosrelacionados às questões Potiguara, fi-cando isso a cargo das lideranças. Mascom o passar do tempo e com o apren-dizado adquirido pela juventude nósfomos ocupando espaço para contribuir

cont‰ p … g‰ Š †

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39JUVENTUDE ATUANTE

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com o nosso povo.

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41JUVENTUDE ATUANTE

com o nosso povo.Hoje a juventude Potiguara tem ganha-do mais visibilidade, pois está se orga-nizando para contribuir na luta. Exem-

plo disso é a OJIP-PB (Organização dosJovens Indígenas Potiguara da Paraíba),espaço de articulação e discussão da ju-ventude Potiguara. Com isso, percebe-seo maior envolvimento dos jovens na áreada educação, política, saúde, questõesterritoriais e em várias outras.Para os mais velhos, as crianças e jovens

são o futuro do nosso povo, pois são elesque darão continuidade à trajetória Poti-guara. Mas como jovem eu vejo que nãosomos apenas o futuro, somos tambémparte do presente. Se não despertarmose nos envolvermos com o movimento in-dígena hoje, como será a formação de

nossas lideranças mais adiante•Também vejo, como jovem indígena, quecom cada criança que nasce dentro donosso povo surge um novo guerreiro ouuma nova guerreira. As aldeias devemperceber sua obrigação de contribuirpara a formação dos jovens para que es-tes saibam dos seus direitos e deveres.

Somente assim eles poderão continuar acaminhada com a força que os Potiguaratêm.

aissa Potiguara

as aldeias p or você •

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42 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

C heguei p ra ‹alar das aldeias ue devo ‹alar 

os índios p ede a terra de volta•e algué m nã o uer dar‰Boa Œ ista• até T racueira•tam bé m t… na listaSanta ita e Sã o F ranciscodevem os adorar‰„ o alego• o C aci ue a uelem p rim eiro lugar‰

Œ ou ao F orte• a sede central• ue nos p ode ap oiar‰T ram ataia• C am urup im •Ž… é beira do m ar‰Silva e Bento•ˆ acaré de Sã o‘ om ingos

eu tam bé m voup ra l… ‰ rup iuna• ’ stivaŒ elha•o m eu p ovo é de‹é ‰ˆ acaré de C é “ ar•os teus ‹este-

Žos tê m m uitam ulher‰Œ ou na vila• rece-ber a m ensagemdo m eu Sã oMiguel‰  aranŽeira• p assei

m as ainda vou lhe”p anhar com ‹rutos doces

ue a nature“ a e a terrad…C um aru• de um p ovohum ilde•p ois eu sou de l… ‰

’ uís Benedito da Silva

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43AS ALDEIAS

soMos caPazes 

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44 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

de construir

Œ ocê p recisa conhecer o

C um aru‰„ a hum ildade• é igualm eu coraç ã o‰„ ã o tem os m … uinasp ara lim p e“ a dos rios•”tam os cavando com asnossas p r p rias m ã osMas m esm o assim o

C um aru se m ani‹esta‰F a“ suas ‹estas do Žeito ue o p ovo uer‰– s p escadores vã op escar o cam arã o nop antanalbrigando com Žacaré ‰A energia chegou sem n s esp erar F oi um a luta trabalhando m esm o assim ‰C om vinte hom ens nadandoarrastando um p oste uase m orrendo no p oç o do A ngelim ‰Mas a p icada dessa linda energia•a engenheira• a F alcã o• vou ap resentar•‹oi doutora ‹oice• cham ada beira

m olhada ue ‹e“ o curso com m iolo do Žuc… ‰’ u agradeç o a ̂ esus• p rim eiram ente•Segundo — F A C ue nos aŽudou tam bé m˜ universidade trabalhou p elo m eup ovo•p or isso hoŽe estam os de p arabé ns‰

’ uís Benedito da Silva

Meio aMbiente Baía da Traição (PB), e deságua no Oce-

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45MEIO AMBIENTE

Nós Potiguara temos ummeio ambiente riquís-

simo, com uma imensabiodiversidade. A lestetemos nossa terra banha-da pelo Oceano Atlânti-co, a presença de man-guezais enriquece aindamais essa beleza. É dosmanguezais que tiramos

parte de nossa alimenta-ção diária (caranguejos,ostras, mariscos e etc.).As aldeias são todas ba-nhadas por rios, e o prin-cipal deles é o Sinimbu,

não apenaspelo seutamanho,mas porsua con-t r ibu içãosocioeco-n m i c a .O mesmo

nasce nasa l d e i a sTracoeira eSão Fran-cisco, am-bas no mu-nicípio de

ano Atlântico, junto ao estuário do ‰ ioMamanguape, em Coqueirinho, Marca-ção (PB), dentro do Território Indígena

Potiguara.Ao norte está localizado nosso pântano,situado na aldeia Cumaru. Nele encon-tramos muito jacarés, camarão, cobras,enfim, todo pântano possui uma diversi-dade enorme. É dele que os moradorestiram o sustento com a pesca daquilo queé mais precioso aos Potiguara, o cama-

rão. Ainda existe uma grande comunida-de de jacarés presente no pântano, masisso não atrapalha em nada, pelo contrá-rio, só o torna mais belo. Temos também,algumas matas, recheadas de caça e umagrande variedade de árvores. Algumaspossuem “furnas” (espécie de caverna),enriquecendo ainda mais o ambiente.As lagoas têm enriquecido nossos olhos,pois suas belezas naturais são inquestio-náveis, sem falar em seus contos, comoé o caso da ’ agoa Encantada. Enfim, opovo Potiguara tem uma riqueza inesti-mável e, como todos os povos indígenasdo mundo, somos abençoados pela natu-

reza e vivemos em plena harmonia comela.

Poran Potiguara

Plantas Para curar ainda fazem uso das plantas para melho-úd i d t bé

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A nossa terra é muito rica e além das ár-vores frutíferas também temos plantas

que usamos para curar as doenças.Este conhecimento de usar plantas e er-vas como remédio entre nós Potiguaraé passado de pai para filho desde muitotempo. Nas rodas de conversa, os maisvelhos sempre falam de como usavam e

rar a saúde, e assim podemos também,quando necessário, utilizar esses remé-dios caseiros a nosso favor.

Os anciões de nossas aldeias conhecembem essas histórias. „ ona Maria Josémora na aldeia São Francisco e com seus° 0 anos tem muita coisa a ensinar. Elasempre conta das suas experiências comas ervas e plantas medicinais e nós guar-

damos na memória paraquando for preciso usar.

Ela sempre tem uma re-ceita para passar à famí-lia ou às demais pesso-as da aldeia que pedemseus conselhos.Conforme seu conhe-cimento, louro, capimsanto e erva cidreira sãocalmantes. A primeiratambém é usada paraaliviar dor de barriga ea segunda contra disen-teria. Urtiga branca ser-ve para vista¸ cebolinhabranca para fazer lam-

bedor¸ sabugueiro parafebre e tosse. E o saiãotambém serve para tos-se. Col nia serve parafazer banho contra osmales da febre e sinusite,a aroeira e o babatimão

são anti-in´ amatórios.Para as crianças a alfa

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47PLANTAS PARA CURAR

Para as crianças, a alfa-vaca é para dar banhocontra a gripe, enquanto

os adultos tomam o chá.Malva rosa e alecrim sãousados para debelar a fe-bre.E ainda existe uma imen-sidão de plantas, taiscomo a amora e vassou-rinha de botão para ma-

chucado, quina-quina,pata de vaca, oiticica eguajiru (também chama-da de guajuru) para con-trole do diabetes, mastodas elas devem serusadas sempre com o de-vido cuidado e com o co-nhecimento necessário.A raiz do catolé minhaavó disse que usou parao meu av se curar dapróstata e ajudou muito.O caroço do abacate e otrapiá ajudam com os problemas na colu-

na, o fedegoso é usado para esfregaçãoe o caldo santo colabora para melhorara asma. O macaçá ajuda a curar dor deouvido. Outras doenças mais sérias tam-bém podem ser curadas ou amenizadas,a exemplo do A® C, que para combaterseus males pode-se usar o caroço do pi-

nhão branco.

É dessa forma que „ ona Maria José etantas outras pessoas mais velhas do nos-so povo Potiguara vivem com boa saúdee qualidade de vida e ainda cumprem olindo papel de passar esses ensinamen-tos adiante ajudando muitos parentes.Acreditamos que nossos ancestrais dei-

cultivando coM aMorxaram para nós exemplos de sabedoriasobre o valoroso conhecimento das plan

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48 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

É de grande importância o cultivo dashortas orgânicas porque delas retiramos

verduras, legumes e frutas de qualidade.Nas nossas hortas orgânicas somente uti-lizamos adubos e sementes naturais. Eusempre irrigo minha horta com a água dopoço artesiano.Existem várias vantagens para quemconsome e cultiva produtos orgânicos. Aprincipal delas é a prevenção de doen-

ças. Eu cuido da minhahorta todos os dias e issoé muito bom para mim.Sinto como se fosse mi-nha terapia, pois me fazrelaxar tanto fisicamentecomo mentalmente. As-sim tenho dias com maissaúde.A minha horta fica noquintal da casa e nelaplantamos coentro, to-mate, cebolinha, couve,pimentão, hortelã miúdo,alface e mamão. Isso é

bom, porque quando eupreciso de alguma coisa,é só ir ao quintal buscare já economizo dinheiro.Nós que trabalhamoscom horta orgânica nãoutilizamos agrotóxicos

sobre o valoroso conhecimento das plan-tas que curam. Essa transmissão de umpara o outro faz parte da cultura tradicio-

nal do nosso povo. ® alorizando a impor-tância do poder das plantas em forma decura contribuímos para continuar nossahistória melhorando a vida do povo Po-tiguara.

Irem bé Potiguara• „ atali aldino

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49CULTIVANDO COM AMOR

vendemos. Os compradores gostam mui-to de verduras sadias e frescas colhidasna hora.

Maria de ourdes

nem conservantes químicos, tudo é natu-ral. Amamos mexer com a terra, plantan-do, cuidando e colhendo alimentos na-turais. Conseguimos assim manter umaalimentação mais saudável para todanossa família.Quando a produção é farta nós também

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50 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

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51CULTIVANDO COM AMOR

surf e tradição ticipar.„ estacando-se nesse esporte nossos pe-

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52 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

Muitos povos indígenas sofrem precon-ceitos pelo simples fato de serem índios,

morarem em aldeias, andar nus. Os in-dígenas da região Nordeste são alvo depreconceito justamente por não se en-quadrarem no perfil do índio idealizadopela sociedade brasileira.Nós índios somos muitos povos, com cul-turas diversas, vivenciando processoshistóricos diferentes¹ Então, não somos

iguais. Nossa diversidade é o que enri-quece a cultura indígena e consequen-temente a cultura brasileira. Não esta-mos mais isolados nas aldeias, vivemosno mundo em que todos vivem. Podemosfazer tudo que o não índio faz sem es-quecer nossas raízes.Um exemplo disso é a prática do sur‹ pelopovo Potiguara. Quem disse que sur‹ nãoé programa de índio• Para o nosso povoesse esporte já virou parte do cotidianodas pessoas.As crianças desde pequenas brincavamna praia de pegar onda com pedaços demadeira. ® ivendo próximos da socieda-

de envolvente, relacionaram-se com elae conheceram e se interessaram pelo sur‹ profissional.Aos poucos a brincadeira de criança pas-sou a ficar séria e com a realização decampeonatos nas praias das aldeias, al-guns jovens Potiguara começaram a par-

p pquenos surfistas Potiguara viram umsonho se tornar realidade. Atualmente

temos jovens Potiguara em diversas mo-dalidades profissionais do sur‹. Este éo caso de Elivelton Santos da Silva, deš ² anos, e Edjane de Oliveira Terto, de

š 5 anos. Ambos reconhecem o valor dacultura e tradição de nosso povo e não

Sur‹ é p rogram a de índio™

Edjane: Agora é, mas antigamente não.Elivelton: É coisa de índio desde algum tempo

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53SURF E TRADIÇÃO

acreditam que o sur‹ faz com que eles seesqueçam de suas origens. Eles dizem o

que sentem com relação a isso nas pala-vras a seguir:

Elivelton: É coisa de índio, desde algum tempo.Antes as pessoas surfavam com tauba ¶tábua· ehoje é com prancha.

Œ ocê so‹re ou Ž… so‹reu p reconceito p or ser Poti-guara e surš sta™

Edjane: Já sofri, as pessoas me chamavam de ho-mem, porque eu surfava. Muitos acham estranhoter índia surfista e quando eu chego em algumcampeonato sempre perguntam se na aldeia tempraia e se tem muito índio surfista.Elivelton: Ainda não. As pessoas valorizam o sur‹ 

do índio. Eles dizem que eu tenho habilidade eestilo.

C om o você consegue conciliar a evoluç ã o do sur‹com a tradiç ã o do nosso p ovo™

Edjane: Não é difícil conciliar, tem um limite paracada coisa. Não é porque eu surfo que vou es-quecer da minha tradição. Eu já era índia antesde surfar.Elivelton: Não atrapalha. As pessoas reconhecemtanto o índio como o surfista. É fácil.

› ual a im p ortœ ncia da cultura do nosso p ovo p ravocê s™

Edjane: A cultura do meu povo é importante por-que nós tivemos a sorte de nascer com sangue deíndio, e viver nossa tradição. Apesar dos muitosmassacres sofridos nós ainda resistimos e temosque valorizar isso.

Elivelton: Eu participo do Toré que tem na aldeiae acho importante manter a cultura Potiguara.

Œ ocê recebe incentivo dos nossos p arentes p aracontinuar no sur‹™

Edjane: No começo poucos incentivavam, masquando eu comecei a sair da aldeia e participar

o tuPide campeonato eles viram que tinha resultado efuturo.Elivelton: As pessoas incentivam e gostam quan-

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54 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

O Tupi era a língua falada pelos nossosguerreiros ancestrais Potiguara. Com a

chegada dos invasores, a partir de š 500,começou o massacre, e tudo foi mudan-do de uma forma monstruosa. Os invaso-res proibiram os nossos parentes de falarsua própria língua. Massacraram, espan-caram e mataram muitos Potiguara. To-maram nossas terras e roubaram nossasriquezas, mas não roubaram nossa digni-

dade, nosso sangue e nossa cultura.„ urante muitos anos ficamos na espe-rança de conseguir falar novamente nos-sa língua ancestral, até que o sonho se

tornou realidade. Apare-ceu um professor e pes-quisador da USP (Uni-versidade de São Paulo),Eduardo Navarro de Al-meida, que nos auxiliouna revitalização de nossalíngua Tupi. Ele formouum grupo de professorespara que esses fossemmultiplicadores junto aos

demais parentes, fazen-do com que a língua pu-desse ser retomada pelosPotiguara.Eu tinha apenas š ± anos,mas já era um guerreiroPotiguara, e fui o primei-

Elivelton: As pessoas incentivam e gostam quando eu chego na aldeia e digo que ganhei umcampeonato.

› uais sã o as suas ež p ectativas ‹uturas com osur‹™

Edjane: Pretendo continuar surfando, buscandomeus objetivos de ganhar campeonatos e ajudarminha família. Eu quero levar o nome dos Poti-guara para fora fazendo com que meu povo seorgulhe de mim.Elivelton: Continuar e manter meu estilo de sem-pre. Meu sonho de hoje é ser campeão brasileiroda categoria mirim. ® ou ser campeão e meu povovai gostar.

Bruno Potiguara• Irem bê Potiguara

Nessa escola, ensinei Tupi às criançascomo voluntário em 200º e 200° e em20 0 f i id d l i T i

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55O TUPI

20š 0 fui convidado a lecionar Tupi noscolégios estaduais indígenas Índio Pedro

Maximo de ’ ima (aldeia Três ‰ ios) e „ r.José ’ opes ‰ ibeiro (aldeia Monte-mór).Estou muito feliz por poder partilhar oque aprendi e ao mesmo tempo aprendernovamente com todo o alunado.A língua Tupi é parte indispensável danação Potiguara e espero que todos osparentes do nosso povo guerreiro se inte-

ressem pela recuperação da nossa línguaoriginal e de toda a cultura com carinhoe amor, porque um povo sem língua esem cultura não é um povo.Enquanto jovem Potiguara agradeço aoprofessor Eduardo por nos ter trazido aoportunidade de conhecer nosso idiomae também a todos nossos parentes quebuscam manter a língua Tupi viva. Esta-rei sempre à disposição para defender,preservar e praticar nossa cultura Poti-guara. T up ã - t-o- Ÿ¡ iandé irunam o » que„ eus esteja conosco¼

I saías Potiguara

ro adolescente a me interessar em apren-der o Tupi. Eu estava muito apaixonadopela cultura do povo ao qual pertenço epelo qual tenho muito orgulho, carinho

e amor. Interessei-me mais e mais peloTupi e consegui aprender o básico. Nãoquis ficar só para mim. Na aldeia Forteexiste uma associação da qual faço parte,a Toré Forte. Junto com todos os outrosmembros, formamos a ½ Escolinha Crian-ça Feliz¾ (nhem bo esaba p ytanga soryb).

forMatura indíGena

A minha formatura em dezembro de

Camaratuba. Participar desse evento éobrigatório para todos os formandos.O ambiente natural na Barra de Camara

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56 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

A minha formatura, em dezembro de200° , foi a primeira a se realizar na Bar-

ra de Camaratuba. A maneira como re-alizamos as nossas formaturas procu-ra fortalecer a nossa cultura Potiguara.„ ela participam tanto os alunos da es-

cola indígena Pedro Poti, como tambémas mães e os pais dos mesmos. Temos as

formaturas dos concluintes do nono anodo fundamental, e os da terceira série doensino médio.A formatura da turma do nono ano acon-tece sempre no Terreiro Sagrado da al-deia São Francisco, enquanto a forma-tura da terceira série ocorre na Barra de

O ambiente natural na Barra de Camara-tuba é muito lindo. A formatura acontece

em uma ilha que surge com a maré baixaem um local onde as águas do rio e domar se encontram. O ar é purificado pe-las árvores que tornam o ambiente ainda

mais agradável para umaexperiência espiritual.O discurso do diretorda escola abre a come-

moração, seguido pelosprofessores. Um dos mo-mentos mais importantesé o juramento dos alunos,primeiro em tupi, depoisem português. Um alu-no faz o juramento, e osdemais repetem as pala-vras. Todo o juramentoé voltado para o respei-to com a nossa cultura ea natureza. ’ ogo depoissão entregues os certi-

ficados de conclusão do curso. Por fim,vem a dança do Toré, com todos reunidos

com um só objetivo: viver a cultura indí-gena, valorizando a nossa identidade.

essé Potiguara

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57FORMATURA INDÍGENA

íba), a OIP (– rgani“ aç ã oIndígena Potiguara daPara ba) o COMIP ( on

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58 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

orGanização interna 

do Povo PotiGuaraAtualmente o Povo Potiguara está orga-nizado em um total de ± 2 aldeias, sendoque cada qual tem sua liderança ou ca-cique. Temos o cacique geral, um poti-guara como coordenador técnico da FU-NAI local e o capitão da nação Potiguara.

Pelo outro lado, as associações locais fa-zem parte da organização das diversasaldeias. Todas elas são lideradas por in-dígenas, como, por exemplo, a OPIP (– r-gani“ aç ã o dos Pro‹essores Indígenas Po-tiguara da Paraíba), a OJIP (– rgani“ aç ã odos ˆ ovens Indígenas Potiguara da Para-

Paraíba), o COMIP (C on-selho das Mulheres Indí-

gena Potiguara da Paraí-ba), a SESAI (Secretariade Sa¢ de Indígena Poti-guara). As mesmas têm afunção de elaborar pro- jetos e alocar recursos ouverbas, para a realizaçãode várias ações em nos-

sas al-deias.C o messa for-ma deo r g a n i -

zação do povo Potigua-ra a realidade local to-

mou um novo rumo e aatuação das liderançasse tornou mais eficaz edirecionada. Cada caci-que local responde pelasua aldeia, enquanto ocacique geral é respon-

sável por todas elas. Hátambém o coordenadortécnico, que é encarre-gado de administrar oPIN (Posto Indígena Po-tiguara) e procurar resol-ver problemas internos

sempre em anuência com as liderançase cacique geral.Por discutirmos e debatermos sempre to-

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59ORGANIZAÇÃO INTERNA DO POVO POTIGUARA

Por discutirmos e debatermos sempre todas as questões relacionadas ao convívio

em nossas aldeias, a nossa organizaçãoconseguiu ser valorizada com grande re-conhecimento. Antes da fundação dessasorganizações a nossa realidade era com-pletamente diferente. Tudo o que recebí-amos do governo federal sempre vinhade cima para baixo e tinha que ser exe-cutado, caso contrário os recursos vol-

tavam aoscofres dogoverno.Nossa for-ma de or-g a n i z a -ção é vistacomo um

modelo. Opresidenteda FUNAI,M á r c i oMeira, afir-mou du-rante uma

assembléiana Pousadadas Ocas,em Baíada Traição(PB), quese trata de

uma política de organização que deveriaser referência para todo povo indígena

do País. A ilton Silva de im a

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60 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

toré PotiGuara

O “Toré” para a nação Potiguara não se

ciques, pajé, chefe, etc.). Os tocadoressempre no meio entoam maravilhososcantos, sempre acompanhados do bom-

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61TORÉ POTIGUARA

p ç gresume apenas a uma expressão cultu-

ral, uma dança. O Toré é muito mais queisso. No decorrer do tempo ele tem sido aforça do povo. É nele que buscamos con-solo para os momentos tristes, força paraenfrentar os combates. „ ançamos o Torépara comemorar algo, em homenagem aalguém ou até mesmo nos momentos deluto.

O ritual do Toré Potigua-ra tem suas particulari-dades. Não apenas porsuas belíssimas músicas,mas pela forma que édançado. Nós somos oúnico povo que dança-mos em forma de com-

plemento, ou seja, dan-çamos em círculo, um defrente para o outro e noritmo da música vamosdançando e sempre com-plementando nosso ir-mão Potiguara. No nosso jeito diferente de dançar,formamos três círculos:mais centralizado e pró-ximo aos tocadores ficamas crianças, mais exter-no, a comunidade, e nocentro, as lideranças (ca-

p pbo, caixa e ´ auta. O nosso Toré maior se

realiza todo ano no dia š ° de abril, naaldeia São Francisco. ‰ eúne o maior nú-mero de pessoas possível e passamos odia todo em ritual, honramos a memóriade nossos guerreiros que já partiram epedimos força para o nosso povo.

Poran Potiguara

que “graças a „ eus as crianças nasceramcom saúde, nenhuma delas morreu”.“Nesses mais de vinte anos como partei-

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62 ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS – POTIGUARA

Parteiras tradicionais PotiGuara

Uma atividade muito importante exis-tente nas nossas aldeias é a das partei-ras. Elas têm grande importância para opovo Potiguara e essa prática é preserva-da entre nós com muito carinho, apesardos avanços da modernidade.A senhora Maria Gabriel da Concei-ção, conhecida como „ ona Estela, tem5º anos e desde jovem é uma das tantasmulheres que exerce a função de partei-ra no nosso povo. Sobre os partos que járealizou, „ ona Estela fala com orgulho

ra já perdi a conta de quantos meninos e

meninas eu ajudei a vir ao mundo”, afir-ma „ ona Estela.No passado, o trabalho das parteiras nopovo Potiguara era essencial e muito re-conhecido, mas atualmente, com hospi-tais mais acessíveis, muitos médicos nãovêem com bons olhos essa prática.Com o intuito de fortalecer e preservar

o trabalho das parteiras Potiguara essasmulheres criaram a A ssociaç ã o das Par-teiras T radicionais Indígenas Potiguara que reúne parteiras de todas as aldeias.Atualmente elas buscam apoio para con-tinuar atuando dentro do território donosso povo.Com a associação, as parteiras almejam

adquirir financiamento de projetos paraaplicar em benefício do nosso povo. „ eacordo com a vice-coordenadora da as-sociação, a Cacique Comadre, a associa-ção preparou um projeto para custear arealização de encontros e palestras sobreo assunto e compra de material com oobjetivo de melhorar a qualidade do tra-balho das parteiras.Unidas e organizadas as parteiras Po-tiguara ao longo do tempo conseguemmanter vivo esse traço da nossa cultura.

Bruno Potiguara• I rem bé Potiguara

a reza

Nós povo Potiguara temos muitas cren-é é

a menina ficar curada de vez tinha quepassar pela mão de três rezadores e foi oque fizeram. Com isso a menininha ficou

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63A REZA

ças, entre elas a cura através da fé. Em

nossas aldeias existem rezadeiras e re-zadores que são pessoas de fé e grandeforça espiritual que, com sua prática, co-laboram para curar nossos parentes queprecisam de ajuda.„ ona Nin , mulher Potiguara, é catadorade mangaba, artesã e rezadeira. “Tudoque eu sei foi minha mãe que me ensi-

nou antes de ela morrer”, afirma.„ ona ’ uzia Maria da Conceição, mãe de„ ona Nin , era uma pessoa de muita fé esempre estava com as portas de sua casaabertas para receber quem precisasse deauxílio.Com o falecimento de sua mãe, „ onaNin recebeu a tarefa de continuar o tra-

balho com a reza.“Faz três anos que eu rezo, e sempre queprecisam os meus parentes me procu-ram”, diz a rezadeira. “A cura não estáem mim, e sim, na crença e na fé”, acres-centa.Um dia sua sobrinha amanheceu comum problema nos olhos que lhe impediade enxergar direito. “Quando a meninaacordou não enxergava bem porque umramo ¶vento mau· bateu no olho dela,mas eu rezei e ela foi melhorando”, diz„ ona Nin .Nesse caso, conforme „ ona Nin , para

curada.

Crenças como essa fortalecem a nossa fée a cultura do nosso povo, pois as reza-deiras e rezadores são parte da históriamilenar de nós Potiguara.

Bruno Potiguara• Irem bé Potiguara

Os Potiguara têm se apropriado das novas tecnologias de informação e comunicação para expres-sar suas realidades, buscar seus direitos, aprender, ensinar e se relacionar melhor com o mundoglobalizado. Foi assim que, em 2006, a ONG Thydêwá começou a interagir com o povo Potiguara

através de sua participação em duas das nossas iniciativas: ARCO DIGITAL e ÍNDIOS ON-LINE.

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 A Thydêwá agradece a divulgação das realidades indígenas.

Os outros títulos da coleção estão disponíveis para download livre em www.indigenasdigitais.org.

A Thydêwá está feliz de ter facilitado a publicação deste titulo, 15° da premiada coleção

ÍNDIOS NA VISÃO DOS ÍNDIOS .

www.indiosonline.org.br Prêmio Mídia Livre 2009

Prêmio Mídia Livre 2010Prêmio Rodrigo Melo Francode Andrade 2004 e 2009

Prêmio «Somos Patrimônio» 2008

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Com este livro desejamos mostrar a verdadeira face do nosso povo, rompendo com a ima-gem equivocada que muitas pessoas têm sobre os povos indígenas. Esperamos que esse tra-balho colabore para que se estabeleça um diálogo sobre igualdade e respeito às diferenças.

Irembé Potiguara

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