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MESA DE DEBATES DO IBDT DE 20/02/2020 Integrantes da Mesa: Dr. Luís Eduardo Schoueri Dr. Fernando Aurélio Zilveti Dra. Martha Toríbio Leão Dr. João Francisco Bianco Dr. Rodrigo Maito Dr. Salvador Cândido Brandão Dr. José Maria Arruda Dr. Pedro Adamy Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Bom dia, vamos dar início a nossa mesa de debates. Hoje com a alegria de contarmos na nossa Mesa também com o Dr. Pedro Adamy, do Instituto Tributário, nosso grande parceiro. Bem-vindo aqui à Casa. Pequeno expediente, algum comunicado? Santiago, você já tem as informações sobre o curso que vai ser feito com a Fipecafi? Orador Não Identificado [00:00:59]: Já está na rede. [falas sobrepostas] Orador Não Identificado: Não, é que eu não entrei na rede. Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Quer dizer, sobre o curso, então, com a Fipecafi, Fernando você tem informações concretas, ou o Bruno, não sei. Sr. Bruno Fajerztajn: Estou pegando aqui. Texto sem revisão dos participantes A presente transcrição apenas visa ampliar o acesso à Mesa de Debates. O INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO TRIBUTÁRIO não recomenda que a transcrição seja utilizada como fonte de referência bibliográfica, dada a natureza informal dos debates, a possível emissão de opiniões preliminares não conclusivas e a falta de revisão.

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MESA DE DEBATES DO IBDT DE 20/02/2020

Integrantes da Mesa:

Dr. Luís Eduardo Schoueri

Dr. Fernando Aurélio Zilveti

Dra. Martha Toríbio Leão

Dr. João Francisco Bianco

Dr. Rodrigo Maito

Dr. Salvador Cândido Brandão

Dr. José Maria Arruda

Dr. Pedro Adamy

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Bom dia, vamos dar início a nossa mesa de debates. Hoje com a alegria de contarmos na nossa Mesa também com o Dr.

Pedro Adamy, do Instituto Tributário, nosso grande parceiro. Bem-vindo aqui à Casa. Pequeno expediente, algum comunicado? Santiago, você já tem as informações sobre o curso que vai ser feito com a Fipecafi?

Orador Não Identificado [00:00:59]: Já está na rede.

[falas sobrepostas]

Orador Não Identificado: Não, é que eu não entrei na rede.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Quer dizer, sobre o curso, então, com a Fipecafi, Fernando você tem informações concretas, ou o Bruno, não sei.

Sr. Bruno Fajerztajn: Estou pegando aqui.

Texto sem revisão dos participantes

A presente transcrição apenas visa ampliar o acesso à Mesa de

Debates.

O INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO TRIBUTÁRIO não

recomenda que a transcrição seja utilizada como fonte de referência

bibliográfica, dada a natureza informal dos debates, a possível

emissão de opiniões preliminares não conclusivas e a falta de revisão.

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[falas sobrepostas]

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Tem o Curso de Normas Internacionais de Contabilidade e Tributação, começa no dia 2 abril, as inscrições já estão

abertas. É uma parceria que nós temos com a Fipecafi. E dizer da importância em nome de contabilidade para quem mexe com direito tributário é assim, desnecessário, então essa é uma recomendações para se inscrever e fazer esse

curso que é bem lembrado.

Sr. Salvador Cândido Brandão: No pequeno expediente, se me permite, Schoueri, é o seguinte, eu sei que na semana passada, aquela minha exposição

causou discussões, mas isso está no imaginário de todos os advogados tributaristas e vai permanecer no imaginário e na dúvida durante alguns anos a questão de tributação e contabilização do ICMS na base de cálculo.

Mas eu queria trazer um caso curioso que faz parte do meu hobby, eu já disse

que todo fim de semana eu vejo os balanços, mas eu vi um realmente que confirma aquilo que mais ou menos tinha transmitido. Mas eu vou trazer só

como curiosidade.

Essa empresa aqui, a Neoenergia apresentou o balanço dela, tudo isso aqui é um balanço. Na verdade, é um desperdício para o país isso aqui, porque o presidente fez um medida provisória dispensando isso, porque realmente eu posso ter

acesso eletrônico, não preciso gastar papel de impressão, derrubar duas árvores para fazer isso aqui, porque pouca gente lê. Esse é o balanço da Neoenergia.

Então, o que eles fizeram? Eles comunicaram que ganharam R$ 3,2 bilhões na

exclusão do PIS/Cofins da base de cálculo do ICMS, e contabilizaram como ativo e disseram o seguinte: Vai ficar numa conta de passivo porque nós vamos devolver isso aos consumidores. Portanto, o resultado neutro, se é resultado

neutro quando se faz isso, quando a pessoa não devolve para o consumidor, significa que é uma receita nova. E eu vou ler até...

[falas sobrepostas]

Sr. Salvador Cândido Brandão: Não, não, não é para a gente discutir, não faz

parte da Pauta, eu só quero ler a curiosidade.

Sr. Pedro Adamy: Em nome do equilíbrio econômico financeiro eles devolveram na tarifa.

Sr. Salvador Cândido Brandão: Não, não, mas se devolvesse não tinha, concorda? Aqui tem a nota explicativa.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: O Pedro está lembrando que como se trata de uma concessionária é uma situação um pouco diferente, porque ela tem que acertar uma tarifa futura para manter o equilíbrio econômico financeiro,

então não é uma situação de qualquer empresa.

Sr. Salvador Cândido Brandão: Ah, mas qualquer empresa poderia fazer isso.

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Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Não, é que no caso dela, ela é realmente obrigada a manter um lucro constante, e qualquer tipo de ganho tem que acertar

a tarifa mesmo.

Sr. José Maria Arruda: Com a ressalva, se me permite, que isso é a partir do momento que o governo ajusta a legislação. Porque hoje está... o litígio remanesce, o equilíbrio financeiro em relação a mudanças tributárias é a partir

do momento que elas estão instauradas. Hoje... A gente poderia, depois da decisão do STF, ter feito uma medida provisória para simplesmente excluir o

ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins e estancar a sangria dos custos fiscais dessa derrota. E eles não fizeram isso. Um, estamos falando daqui para frente; dois, em relação à recuperação que uma empresa vai ter, que não é uma

discussão de equilíbrio econômico financeiro, não. Mas aí eu também não vou adentrar ao assunto.

Sr. Salvador Cândido Brandão: Calma. Só por curiosidade, não é para toda essa

questão assim. Porque é o seguinte, na minha opinião, realmente esse valor, mesmo no sistema não acumulativo, não justifica você dizer que é ter uma coisa que você passou, quanto se creditou, o negócio ficou maluco. Então, está na

nossa cabeça desse jeito.

E diz assim: Março 17, o STF... A União Federal apresentou, pá, pá... Ajuizado Mandado de Segurança, resultado das ações da Coelba, e respectivamente essas ações pleiteavam restituição do ICMS, período tal, e foi apurado um resultado de

R$ 3.282.501.000,00, e passivo do mesmo montante. O líquido de honorários... Os honorários até que foram baixos. Totalizando o passivo no montante de R$

3,276 bilhões. A constituição do passivo decorre do entendimento de que os montantes a serem apropriados por meio de compensação dos créditos fiscais reconhecidos deverão ser integralmente repassados aos consumidores nos

termos das normas legais e de acordo com as compensações.

Então, ele fez até o demonstrativo. PIS a recuperar, PIS e Cofins a serem restituídos. Efeito, contabilização do passivo, tal, zero, zero, zero. Resultado: zero.

Então, não tem tributação nenhuma, está destinando o valor aos consumidores.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Fernando.

Sr. Fernando Aurélio Zilveti: Brandão, primeira coisa, não teve frisson na questão trazida para o IBDT. O que teve foi uma discordância absolutamente própria da Mesa de Debates. Então, da questão se gasta ou não gasta, se gasta

ou não gasta papel, essas coisas são científicas.

A questão é o seguinte, você trouxe uma questão que foi rejeitada pela maioria dos presentes, e agora você trouxe de novo, insistindo em uma questão que não é

como você está colocando. E ela continua sendo rejeitada. Agora, se existe um inconformismo, não tem problema. Agora, na Mesa de Debates isso foi discutido, o Bruno não estava, a opinião de quase totalidade dos presentes foi contrária ao

que você sustentou. Isso é normal. Não há nenhuma... nenhuma relação entre isso. Agora, é uma coisa importante de debater, e você trouxe uma questão

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relevante para o debate, isso é importante, é relevante. Quando você traz a questão é relevante. Não tira uma vírgula do você que falou, você trouxe debate

para a gente pensar sobre isso, talvez melhorar o entendimento.

Só isso o que a gente está discutindo aqui se é uma despesa nova, se é uma receita nova ou foi um custo. Ficou concluído que era um custo. Então, não tem cara de receita nova. E não é porque está publicado no balanço que vai ser

receita nova. O balanço não muda a natureza das coisas.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Fernando, o que Brandão quis mostrar é que já existe no mercado esse entendimento, e trouxe um elemento novo, que

até o Zé Maria já trouxe interessante, para saber se no caso específico de concessionárias que tenham algum tipo de obrigação de repasse, se haveria um tratamento tributário distinto por conta disso.

Eu acho que como questão... pequeno expediente não cabe muito adiante, mas

como ideia é algo para a gente até pensar um pouco sobre isso, qual é o reflexo que tenho se eu tiver, o Zé Maria disse que não tem, mas se eu tiver obrigação de

considerar isso no meu equilíbrio econômico financeiro. Uma pergunta interessante.

Sr. Fernando Aurélio Zilveti: Como é uma concessionária de serviço público, ela tem por obrigação trazer essa isso no balanço. É simples assim, ela tem que

trazer o que foi... como foi feita a consideração.

Sr. Salvador Cândido Brandão: Schoueri, só para... Veja assim, essa situação... o dinheiro está sendo tirado do povo brasileiro, o povo todo, e desenvolvido aos

consumidores que também é povo brasileiro. Quer dizer que na verdade quem ganhou dinheiro aqui foi só o advogado? Porque vai tirar do governo para dar para o consumidor... Não tem sentido ter o risco de ter uma perda, uma

concessionária agir dessa forma. E ela agiu corretamente, muitas das empresas fazem dessa forma. A Klabin, por exemplo, eu sei que ela fez dessa forma com os

consumidores, nos consumidores, então, que são diretas.

Então, que sentido tem uma estatal entrar com uma ação judicial correndo todos os riscos e depois dizer: não, eu vou repassar para o consumidor e não tenho receita, não tenho nada. Vou tirar do governo, do orçamento geral do governo, o

Zé Maria entende bem das finanças públicas, vou tirar do governo, por numa taxa, e devolver para o consumidor.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: No pequeno expediente era só um

comunicado.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Pequeno expediente. Zé Maria.

Sr. José Maria Arruda: Só para noticiar, que todos acompanharam, que foi instaurada a Comissão Mista para acompanhar a reforma tributária, Comissão Mista composta por deputados e senadores. Então, eles vão trabalhar nos

próximos dias para tentar uma convergência entre o projeto da PEC nº 45/2019,

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Baleia Rossi, e a PEC nº 110, que estava no Senado. A PEC nº 110 avançou bastante por conta aí dos relatórios da CCJ. Então eles vão tentar aí, adiantar.

E a notícia que a gente é que o Governo Federal parece que abriu mão de

apresentar projeto próprio, que seria só da parte de PIS e Cofins. Então só essa notícia.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Ainda no pequeno expediente, alguém?

Sr. Salvador Cândido Brandão: Eu não vi os detalhes, mas parece que o Carf vai

colocar... foi feita uma medida provisória, um adendo na medida provisória do contribuinte legal... Não, essa que deu... que era para o melhorar a relação fisco-contribuinte, que débitos abaixo de 67 mil o Carf não vai mais examinar, termina

na primeira instância. Foi publicado que na Medida Provisória foi feito um aditivo nesse sentido.

Orador não identificado: Sessenta e sete?

Sr. Salvador Cândido Brandão: É... 80 salários mínimos.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Seria projeto de conversão? Eu sei que a

Medida Provisória nº 899 é a do contribuinte legal, eu sei que ontem...ontem iria sair o relatório final do projeto de conversão, talvez seja essa a informação.

Mais alguma coisa no pequeno expediente? Podemos entrar, então, na Ordem do Dia? Primeiro idem do dia, a Dra. Martha Leão nos traz quebra do sigilo

bancário, posição do Supremo Tribunal Federal. Martha tem a palavra.

Sra. Martha Toríbio Leão: Obrigado, Professor. Bom dia.

Bom, então, apenas para contextualizar, o Prof. Zilveti, na semana passada, me chamou, enfim, a conversar um pouco sobre o artigo que eu escrevi na Revista

42, que saiu no final do ano passado. E eu escrevi um artigo, e é até bom contextualizar, que eu escrevi esse artigo ainda na iminência do acórdão final, enfim, do julgamento do sigilo bancário em termos de direito penal. Então, esse

artigo foi escrito apenas com a liminar que tinha sido proferida pelo Ministro Dias Toffoli. Então, eu vou só contextualizar para explicar um pouco o que

aconteceu.

Em 2015 o Supremo julgou a constitucionalidade do art. 6º da Lei Complementar nº 105 de 2001, que previa a possibilidade da Fazenda Pública acessar o sigilo bancário dos contribuintes sem decisão judicial. Então, permitia que, dentro de

um processo administrativo, fossem requeridos os dados bancários dos contribuintes, ainda que sem uma decisão judicial autorizando essa quebra.

Isso foi julgado em 2015 sob a relatoria do ministro Dias Toffoli, e isso alterou a

jurisprudência do próprio Supremo, que em 2010 tinha um julgamento exatamente sobre a mesma matéria, sobre uma lei que previa exatamente a mesma coisa, e tinha julgado pela inconstitucionalidade dessa lei por violar o art.

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5º, inciso XII, da Constituição, que diz que é inviolável o sigilo de dados, salvo decisão judicial para fins de persecução penal.

Então, em 2015 o Supremo altera a sua própria jurisprudência para dizer que

essa regra, enfim, esse dispositivo do art. 5º, inciso XII, deveria ser ponderado com outras finalidades e, especialmente, o interesse da fiscalização, a necessidade de criar meios para combater a sonegação fiscal.

Apenas o Ministro Marco Aurélio é vencido, o ministro Celso de Melo não

participa do julgamento, e se estabelece uma maioria de nove a um, no sentido da constitucionalidade desse dispositivo.

E aí, ano passado, para minha surpresa, em 2015 o Toffoli, julgando esse tema,

mesmo dispositivo, em uma ação penal, em que os dados fiscais do contribuinte tinham sido partilhados com o Ministério Público para fins de início de uma ação penal sem decisão judicial, isso vai para o Supremo, enfim, porque um senador

se torna interessado nessa causa que já tinha repercussão geral, senador importante da República, e isso vai, cai com o Toffoli, e ele relator do caso, dá

uma liminar no sentido de suspender todos os processos penais no Brasil em que tivesse havido o compartilhamento desses dados sem autorização judicial, no entendimento, ainda que em liminar, ainda que preliminar e precário, no sentido

de que o art. 5º não autorizaria sem decisão judicial esse compartilhamento.

E essa decisão me causou bastante estranheza em virtude dessa jurisprudência de 2015 no âmbito tributário, porque as duas envolviam exatamente a

interpretação do mesmo dispositivo e, por coincidência, com o mesmo relator que havia sido bastante enfático no julgamento de direito tributário no sentido de que esses seriam... o art. 5, inciso XII, seria princípio e deveria, sim, ser objeto de

ponderação tendo em vista o interesse do Estado na fiscalização, enfim, da correção no comportamento dos contribuintes e também, claro, para fins de crimes contra a ordem tributária. E aí ele dá essa decisão, que é contraditória

com relação àquilo que havia sido decidido em 2015

Então, o artigo foi escrito nesse meio tempo. E em dezembro isso é pauta do Tribunal Pleno, e isso vai a julgamento no Supremo Tribunal Federal. E aí, o

ministro Alexandre de Moraes abre uma divergência com relação ao Toffoli e vota no sentido de que seria, sim, constitucional a Fazenda Nacional dividir esses dados com o Ministério Público para fins penais. E os ministros, a maioria vai

acompanhando... O acórdão ainda não foi publicado, mas alguns votos já estão disponíveis. Os ministros vão acompanhando essa decisão do Alexandre de

Moraes, salvo Marco Aurélio e Celso de Mello, e aí o próprio Toffoli muda a decisão dele, altera, para acompanhar a maioria, para se vincular a essa maioria quando ele viu que realmente ia perder, enfim, não ia se declarar

inconstitucionalidade disso para fins penais. E o Supremo acaba, em dezembro, reiterando a sua jurisprudência no sentido de que pode, sim, partilhar esses dados e usa, assim, o mesmo eufemismo que usou na decisão tributária no

sentido de que isso não seria quebra de sigilo. Seria transferência do sigilo, eu estou transferindo o sigilo da Fazenda também para o Ministério Público, porque,

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afinal, não pode ser publicado nos jornais, e se algum funcionário público divulgar essas informações, ele vai ser punido pela divulgação. Então, sequer

haveria quebra, não se poderia falar violação ao art. 5º nesse sentido.

Então, enfim, as minhas conclusões, assim, preliminares com relação a isso. Quando a gente quer criticar uma decisão do Supremo tem que ser rápido, porque a gente nunca sabe quanto tempo ela vai durar, então, tem que escrever

rápido. Então assim, saiu, escreve já porque a gente nunca sabe se daqui um mês o Supremo vai ou não vai manter aquela decisão. Como a gente viu, o

Ministro Dias Toffoli, em cinco meses, reviu a sua própria decisão.

E, claro, esse é o meu entendimento, que não é um entendimento compartilhado com todas pessoas que, enfim, interpretam essa decisão, para mim é uma decisão equivocada do ponto de vista do texto constitucional, mas pelo menos

parece que o Supremo tenha sido coerente com o erro, porque talvez mais esquisito seria ele ter duas decisões interpretando o mesmo dispositivo de forma

absolutamente divergente, uma dizendo constitucional e a outra dizendo é inconstitucional, para os mesmos fins, enfim, com a mesma ponderação de princípios que é o que ele acabou fazendo aqui.

Então, aparentemente, pelo menos ele manteve a coerência na sua interpretação,

embora para mim seja uma interpretação incompatível com o texto da Constituição. Eu acho que de início era isso.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Fernando Zilveti.

Sr. Fernando Aurélio Zilveti: Bom, eu achei, primeiramente, muito bacana o

artigo da Martha. E uma das coisas boas que tem na revista é você poder reler os textos publicados, que, no meu caso, eu releio porque eu vejo primeiro numa triagem informal, depois... aliás, mais focada na questão editorial da revista,

depois eu leio quando está publicado.

Então, nesse ponto eu falei com a Martha, primeiro eu estava conversando com ela sobre a questão da coerência e questão da estabilidade. Que são dois temas

interessantes para a gente colocar num debate como esse. E um assunto que também me chama atenção que, graças a esse artigo muito bom da Martha, e não envelheceu também esse debate, é a questão de você considerar

constitucional um artigo de lei e depois você, de alguma forma, ainda que oblíqua, considerar o mesmo dispositivo inconstitucional.

Então, a gente teria aqui dois... alguns aspectos. Primeiro, se é possível uma

declaração de constitucionalidade ser revista adiante pela mesma corte. Então, se eu, numa ADIn ou em uma ADC, eu considero constitucional uma norma, ou seja, ela passa a ser compatível com o sistema normativo constitucional, se

depois de um tempo o Tribunal poderia simplesmente analisar o mesmo dispositivo ou uma questão levantada por um senador ou qualquer pessoa que possa levantar essa demanda, e o Tribunal, sem nenhuma... nenhum aviso

prévio, interpretasse de uma outra maneira.

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A interpretação constitucional mutante é possível, né, não existe a regra de mutabilidade das decisões constitucionais. Mas até em questão da estabilidade

isso já foi muito debatido no Supremo, e a gente precisava ver se é possível você mudar sem antes levantar a questão e porque isso estaria sendo alterado. Então, isso é a primeira questão que me leva a debater o artigo da Martha.

A segunda questão que tem a ver com o que ela chamou de incoerência

argumentativa. Porque, no primeiro momento eu falei, bom, isso aqui está mais relacionado com estabilidade. Mas o que eu entendi, depois de reler o artigo da

Martha, é que o que ela chama de incoerência argumentativa é o seguinte: eu não fui coerente na interpretação, conforme a Constituição, da Lei Complementar nº 105. Ou seja, na apreciação do Supremo houve uma incoerência, por que? Ela

não levou em consideração aspectos relevantes do sigilo fiscal, e entendeu, de alguma forma, que não haveria quebra de sigilo ou que o sigilo pudesse ser relativizado.

Agora, um pouco diferente, por essa decisão do Supremo, foi no voto divergente do Alexandre de Moraes, haveria um sigilo entre órgãos da administração, ou seja, não haveria quebra de sigilo, que é o posicionamento de alguns

constitucionalistas brasileiros e até estrangeiros, se o sigilo institucional seria, vamos dizer, estanque, um órgão da administração não pode compartilhar dados com outro órgão da administração, ou mesmo, que é uma questão que a gente

está discutindo no mestrado profissionalizante, que vai começar agora no IBDT, se você não pode pactuar com outras jurisdições para que esse dado seja

compartilhado e isto, ainda assim, não infrinja o sigilo fiscal.

Então esse é um debate que me parece que ainda não está, de forma coerente, analisado pelo Supremo. Então nós temos dois problemas: uma questão de estabilidade, porque você mudar, falar que é constitucional e depois falar que é

inconstitucional, depois voltar a falar que é constitucional, mesmo que exista um tempo. Porque na questão da prisão em segunda instância se inventou uma ideia

de tempo. Não, muito recente, quer dizer, então, o que é suficiente para você mudar o entendimento? É um ano, dois anos? Dois anos e meio, dois anos e seis meses, dois anos e sete meses? O que é tempo? Então, essa é uma questão que é

importante a gente debater para o lado obviamente que a gente está trazendo tributário, para dar segurança jurídica, que é a estabilidade.

Então, pode haver alteração? Sempre. Pode haver alteração frequente? Não. Qual

é a questão da frequência? O que está envolvido na estabilidade, que é um tema constitucional, processual? E a coerência é o que a Martha trouxe no artigo dela, que é: Eu preciso concatenar os meus argumentos com aquilo que eu tenho

como paradigma. Se é a ordem internacional, certo, que são tratados internacionais, se são direitos humanos, que é outra questão que é discutida até pelo Tércio, se direitos humanos, eles entram num outro plano, vamos dizer, de

constitucionalidade, ou de prevalência sobre o ordenamento interno, que é uma questão que o Schoueri defende, ou se cada um decide como é, e depois você vê

como fica na relação internacional.

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Então eu achei bem importante trazer esse debate aqui para todos, e ver se tem aí uma divergência construtiva.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Pedro Adamy.

Sr. Pedro Adamy: Muito obrigado. É sempre uma alegria estar aqui com os

amigos.

Eu tenho uma provocação para a minha amiga Martha. Eu li o artigo de grande proveito. E, veja, vai um pouco na direção do que o Zilveti falou com outras

razões.

Precedente não é eterno. Precedente pode estar errado, estar certo, a gente segue, não segue. Nós legalizamos ou institucionalizamos o fenômeno do overriding no

novo Código de Processo Civil, então agora nós sabemos que é possível não cumprir precedentes.

E aqui entra, talvez, Martha, a minha provocação. O problema nesse caso não é um problema de coerência. Ele é um problema de razões. O que o Supremo não

fez, é: ele não ofereceu razões suficientes para não cumprir ou cumprir a sua própria jurisprudência. Ser incoerente, nesse caso, é simplesmente não oferecer razões. Não, você está sendo incoerente. Sim, mas eu tenho 47 razões para não

cumprir a decisão passada. Eu só não vou cumprir a minha decisão. Bom, isso talvez, dependendo do conceito de coerência, a gente possa colocar.

Então, coerência é um problema de ônus argumentativo, se a gente olhar lá no

[ininteligível], enfim, no Unlawyer reason tem dezenas de páginas sobre conceito de coerência e tal. Mas aqui é um problema, me parece, de não apresentação de razões suficientes para rever as suas próprias razões ofertadas na decisão

passada.

E o problema, obviamente, do precedente, é que ele também gera um problema de aplicabilidade. Se as razões fáticas... se a situação fática é a mesma e se a

situação jurídica é a mesma.

Nós estávamos tratando de sigilo bancário num caso e sigilo fiscal no outro. Então, tem que ver se, de fato, aqui a gente está tratando de coerência efetivamente, no sentido de que as razões são as mesmas, eu não tive mudança,

ou simplesmente de ônus argumentativo não apresentado ou não satisfeito pelo nosso Excelentíssimo Ministro Toffoli.

Eu teria outras considerações sobre sigilo, eu tenho uma cruzada contra o uso de

informações fiscais no processo penal. Escrevei três artigos no último ano sobre isso, agora o último na Revista Brasileira de Ciências Criminais no último mês. A gente está caminhando numa coisa absolutamente perigosa no sentido do sigilo

fiscal ser compartilhado.

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E agora só, a Martha falou que não pode ser publicado pelas autoridades, mas veja, denúncias criminais são públicas, se eu compartilho o sigilo bancário, sigilo

fiscal e depois ser denunciado criminalmente, a denúncia é pública. Sem autorização judicial? E aqui o meu ponto principal é: e o direito ao silêncio, no direito penal? É garantia constitucional. Eu posso não apresentar razões ou

informações fiscais com base no futuro, talvez eu venha ser acusado criminalmente, então eu não vou apresentar razões, informações fiscais? Não,

deveres instrumentais do contribuinte. Eu sou obrigado a apresentar. Alteração de finalidade, de informação fiscal. Eu informo para saber quanto tributo eu devo, e pago o meu tributo. Aí, no meio do caminho, aquilo não é mais utilizado

para saber, poderia utilizar para me condenar criminalmente.

Eu vejo assim, eu tenho seis razões nos artigos. Aqui eu gostaria simplesmente de discutir coerência, porque me parece... eu tendo a concordar contigo, eu só queria fazer uma provocação. Obrigado.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Martha.

Sra. Martha Toríbio Leão: Bom, sim, eu acho que é um problema de coerência no sentido de que o Supremo estava, nos dois casos, analisando a interpretação, o que seria o dispositivo do art. 5º, inciso XII. E nesses três momentos distintos,

porque eu acrescentaria que num primeiro momento, em 2010, quando ele julgou uma lei que dizia exatamente a mesma coisa que a lei julgada em 2015, ele interpretou de forma abstrata, isso tudo envolvia a ADIns, então, declarações

sobre a correta interpretação de um dispositivo da Constituição. Em 2010 ele faz uma interpretação no sentido de que sim, esse uso pela Receita, esse acesso pela

Receita aos dados bancários do contribuinte quebra o sigilo, portanto não é compartilhamento dentro da estrutura, então, isso era violação do sigilo, em 2010. E aí, em 2015, quando ele julga com base exatamente no mesmo

dispositivo, um dispositivo legal que trazia o mesmo texto, ele diz que isso não é quebra.

É assim, eu sei que esse é um dado interessante que, na mesma semana em que

isso foi julgado em 2015, na mesma semana, foi a semana em que o Supremo, pela primeira vez, também alterou a sua jurisprudência sobre a prisão em segunda instância.

Então, coincidentemente ou não, naquela semana o Supremo muda duas

orientações jurisprudenciais sem que tenha havido mudança no texto da Constituição nesse meio tempo, de 2010 para 2015. A questão da prisão em

segunda instância, em 2016 foi publicado, professor, mas em 2015 foi o julgamento. Pelo menos foi quando começou. Então, ele muda a sua orientação sem uma mudança de texto constitucional.

O voto do Marco Aurélio, aliás é muito interessante, eu não sei como ele não

enfarta aquele dia, se procurarem na TV justiça, que ele disse: De novo? Ontem a gente mudou a orientação da jurisprudência sobre prisão em segunda instância,

agora, de novo, a gente vai mudar outra orientação do Supremo sem que tenha

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havido nenhuma mudança no texto constitucional? Ele: Eu perdi alguma coisa. Eu dormi durante esses anos, e eu perdi alguma coisa que aconteceu com a

Constituição nesse tempo, porque não vejo razões.

E aí, claro, eu tenho, lógico, problemas de razões, eu concordo plenamente com o Pedro, porque eu não tenho pelo menos um ônus argumentativo de mudar o precedente. É óbvio que eu posso mudar orientação de uma corte constitucional,

mas eu tenho um ônus de explicar porque há cinco anos essa mesma corte constitucional, com base no mesmo texto constitucional, disse exatamente algo

em sentido contrário do que aquilo que está sendo dito nesse momento. Então, eu preciso superar o precedente. E superar o precedente depende da existência de razões que levem à superação do precedente. E isso não foi feito no acórdão,

no julgamento isso não é apresentado.

Assim, lógico que é trazido... são trazidas razões no sentido de: O Brasil se comprometeu internacionalmente. E, claro, imagino que isso seja discutido aqui

no mestrado também, existem razões de ordem internacional que levam a essa necessidade de acesso aos dados. Eu não estou dizendo que é bom ou ruim ser inviolável, eu só estou dizendo que a Constituição diz que é inviolável, salvo

decisão judicial. Então, claro que a gente pode criticar essa escolha do constituinte, mas a questão é: O Supremo não teria que dar razões para superar o seu próprio entendimento?

E aí, ano passado, em 2019, essa decisão do Toffoli em sede liminar que, claro,

depois é superada, mas essa decisão do Toffoli acaba enfrentando o mesmo dispositivo novamente. Claro, a gente pode enfrentar se não haveria um outro

contexto. Sim, há um contexto de direito penal, mas são as mesmas informações que eu estou tratando e é a violação do mesmo dispositivo. Então, no final do dia, eu estaria dando 2010, 2015 e 2019 três interpretações distintas, vai, não vai,

vai com relação ao mesmo dispositivo. Para mim isso é um problema de consistência na interpretação de Constituição e, portanto, um problema sim, de

coerência.

Claro que se eu tivesse razões para explicar essas mudanças, eu poderia, enfim, estar mais de acordo com relação ao problema de coerência superado, mas não me parece que o Supremo tenha apresentado essas razões nesses três

julgamentos.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Fernando Zilveti.

Sr. Fernando Aurélio Zilveti: Então, Martha, eu citei o Tércio, porque ele tem uma... Eu já falei semana passada, ele tenho uma ideia de legitimidade que ele

chama de jogo sem fim, que cujas regras não devem ser alteradas, senão por alguma ação externa ao jogo. Então, aí vem a questão da coerência. O que acontece? Nós temos uma dinâmica. De fato, a dinâmica constitucional faz com

que a gente abandone a ideia de um direito constitucional estático, imexível, como diria o Magre. Mas ele tem uma força normativa que faz com que temas de

evolução valorativa, axiológica, possam influenciar inclusive na forma da corte

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constitucional enxergar o mesmo dispositivo constitucional. A gente vê isso no exemplo da suprema corte americana quando fala de liberdade de expressão. Na

história da suprema corte tem várias alterações na liberdade de expressão.

Então, quando o Pedro chamou a atenção na questão da imutabilidade, você tem o stare decisis. Então o stare decisis, ele é non queta move, ou seja, ele não vai

ser alterado. Não, ele vai ser alterado na medida em que as questões constitucionais sejam passíveis de revisão por uma pressão valorativa, por uma pressão axiológica. Então, se a gente está falando: Olha, o sigilo bancário e fiscal,

sigilo fiscal, diante de uma nova ordem internacional precisa ser relativizado? Aí provocando o Pedro que está me olhando com cara aqui: O que será o que ele vai aprontar aqui? Ele precisa ser relativizado? Existe mesmo esta, vamos dizer, esse

jeitinho, que não é brasileiro, mas esse jeitinho de entender que a transferência de dados entre instituições do mesmo estado ou de estados contratantes não é

violação de sigilo? Esse seria um jeitinho encontrado pela nova ordem internacional? Então, em nome... Que até a Martha colocou esse ponto no artigo dela, muito bem colocado. Será que tem uma nova ordem internacional a

pressionar as jurisdições a reverem a questão do sigilo, e elas estão forçadas a rever ou relativizar o sigilo fiscal?

Eu entendo que não. Não. A relação de direitos fundamentais poderia ser em

relação a crimes contra a humanidade, crimes de tortura, importante que se diga isso nesse momento, porque parece que não existe isso. Então, crime de tortura, esses crimes de lesa humanidade são tratados internacionais que os países

aderiram pela importância do tema, como crimes de guerra, etc. Mas não, que eu saiba, em matéria fiscal, que ela é protetiva do cidadão, e, muitas vezes, a gente está esquecendo disso. E ela também entra nos direitos fundamentais.

Então, por isso aqui quando eu citei o Schoueri, ele defende a questão da prevalência dos tratados ao direito interno, enfim... Desculpa, vai, o sombreamento dos tratados internacionais em relação ao direito interno... Não

vou ficar repetindo aqui, teoria da máscara, teoria da luva, etc. etc., isso ele já faz muito bem há muitos anos.

Então, o que eu diria é isso, então eu não vejo que essa pressão internacional sobre o compartilhamento de dados possa trazer, vamos dizer, esta nova regra do

jogo que vai forçar uma mudança de legitimidade da norma constitucional. Por isso que eu já... eu entendi nesse trabalho da Martha, que já era incoerente

antes, já era incoerente quando relativizou, e agora quando passa por uma não relativização e depois volta a relativizar de novo, continua incoerente do ponto de vista de análise constitucional.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Rodrigo Maito.

Sr. Rodrigo Maito: Bom dia a todos.

Esse tema é um tema bastante complexo porque ele transcende o direito tributário, por óbvio, como foi colocado aqui. E os constitucionalistas hoje em dia têm uma atuação bastante crítica em relação ao papel do Supremo Tribunal

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Federal. Nós temos o Prof. Conrado aqui na faculdade, e muitos outros que têm criticado a postura do Supremo. O Supremo é um tribunal político, não há

dúvidas disso.

Mas, em relação à matéria tributária, que é o que nos toca aqui, essa incoerência, por falta de razões que a gente verifica, ela também se dá não de uma forma direta, mas pelas manobras processuais que nós bem sabemos que

acontecem. Então, ações diretas de constitucionalidade que são manejadas para ‘by-passar’ um recurso extraordinário que já está com maioria consignada. A

gente viu isso no caso dos lucros no exterior, por exemplo.

Voltando para o ponto que o Zilveti bem colocou, o Brasil é signatário de tratados de trocas de informações que pressupõem uma reciprocidade em relação ao sigilo fiscal. Então, o Brasil está disposto a ceder informações fiscais dos seus

contribuintes na medida em que o outro país se comprometa também a fazê-lo.

E no âmbito internacional a gente tem visto aí alguns problemas surgindo, troca de informações Estados Unidos e Japão. Houve um vazamento de dados de uma

empresa multinacional americana.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Aloe Vera.

Sr. Rodrigo Maito: Aloe Vera, muito bem colocado, no Japão. Então isso vem... essas discussões, elas vêm surgindo, até que ponto que realmente essa troca automática, que no caso dos tratados prescinde de uma decisão judicial,

portanto, poderia estar em conflito com a norma constitucional que a gente está discutindo aqui... até que ponto isso seria válido.

Então, pelo menos no meu sentir, o que eu entendo é que realmente, na linha do

que o Zilveti está colocando, não deveria haver um caráter automático dessas trocas em nome da prevenção de crimes de terrorismo, etc. Eu acho que deveria haver um controle maior, sob pena de, de fato, escancarar a vida de todos os

cidadãos.

Lembrando também que a Lei Complementar nº 105, ao prever que qualquer autoridade fiscal pode quebrar o sigilo, nós estamos falando não é só autoridade

fiscal federal, nós estamos falando de estados e municípios. E, bem recentemente, o estado do Rio de Janeiro editou uma lei avançando sobre o sigilo bancário dos seus contribuintes.

Então assim, só para mostrar e colocar a coisa num contexto mais tributário, nós

temos um desafio muito grande, quer dizer, razões para acabar com... ou superar esse precedente como colocou a Martha, nós temos vários. O que eu acho que

nós precisamos é, talvez, de uma... não só esperar do Supremo uma atitude correta em relação ao entendimento, já está mais do que mostrado que provavelmente isso não vai acontecer, então, talvez o caminho seja legislativo

mesmo, ou seja, esperarmos que haja um amadurecimento no sentido de colocar freios e contrapesos a essa tendência de total abertura de dados sem um cuidado maior.

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Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Pedro tinha pedido a palavra antes, eu estava até preparado aqui, viu. É porque o que o Rodrigo trouxe, nesse infeliz

precedente do Supremo com relação à quebra do sigilo, ele é infeliz em quase tudo. Mas houve em elemento, eu quero lembrar, foi discutida longamente a questão de estados e municípios se também seria possível a quebra de sigilo

bancário para estados e municípios. Naquele ponto se dizia: Olha, somente se esse estado ou se esse município tiverem um aparato para garantir que se

preserve o sigilo de tal modo como a União o faz.

Somemos isso ao caso Aloe Vera... O caso Aloe Vera, quer dizer basicamente que os Estados Unidos deu informações para o Japão, e uma autoridade japonesa, num congresso, num seminário, começa a projetar o balanço das informações da

Aloe Vera que foram dadas. Porque no Japão não existia qualquer tipo de sigilo, esse foi o caso concreto.

Então, para nos dizer que trocas de informações internacionais, mesmo que

previstas em tratados, devem estar sujeitas, o que me parece, à reserva que o Supremo fez com relação à ordem interna. Ou seja, se o nosso parceiro não oferece condições, garantias de sigilo, é inconstitucional o envio de qualquer tipo

de informação. Se o Supremo tiver o mínimo de coerência, Martha, pelo menos esse ponto deveria ser explorado. Pedro, por favor.

Sr. Pedro Adamy: A gente está falando de coerência. O Supremo é incoerente. Ponto. Parágrafo. Mas nós temos o conceito de coerência na teoria do direito.

Coerência é diferente consistência. Coerência é coerência com razões apresentadas e conduta atual, conduta... consistência temporal não é material.

Veja, talvez eu sou chato da terminologia, eu e Zilveti já tivemos discussões, mas eu concordo que o Supremo é incoerente, tem razões políticas, como disse Maito, todos nós lemos os 11, não é? A gente está vendo que o Supremo está

trabalhando, enfim, por caminhos tortos, talvez não chegando na verdade como Deus, mas... Assim, me parece que os tratados são relevantes. Ótimo. Ainda sim,

eles não se sobrepõem a um direito fundamental. A gente tem que talvez fazer controle de constitucionalidade de tratados. Não é razoável que nós façamos transferências diretas a país que não têm sigilo fiscal, onde esses dados são

acessados publicamente. Não me parece que seja constitucional um tratado imposto dessa forma, no qual a transferência de dados sigilosos seja colocada à disposição de qualquer pessoa, ainda que seja em japonês, vai ser possível se

acessar.

E, de novo, eu não sei se a gente tem problema de coerência aqui, talvez seja um problema de ausência de razões, simplesmente. Se a gente quer chamar isso de

coerência está bem, mas é coerência do quê? Coerência consigo próprio? Porque ele está sendo coerente, talvez no erro, mas ele só não está dizendo porque ele não está seguindo a sua decisão anterior. Enfim, é isso.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Por favor. Diga seu nome também, por

favor.

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Sr. Caio Morato: Bom dia, meu nome é Caio Morato, sou mestrando aqui da Casa, orientando do Prof. João Bianco. Em 2018, no final de 2018, eu fiz um

trabalho sobre a troca de informações internacionais, convidado até pela Editora Almedina para publicar, tenho aqui. E a minha crítica principalmente era quando o Brasil começou a assinar esses acordos internacionais que permitiam a

troca de informações, em especial de forma automática. Porque, na minha cabeça, naquele momento, o Brasil tinha uma jurisprudência... Aliás eu nem

gosto de chamar jurisprudência. O primeiro ponto é que os Tribunais Superiores aqui no Brasil os que mais têm precedentes, são decisões importantes, mas não jurisprudência, que são uma coleção de decisões no mesmo sentido.

Então, eu via uma posição dos Tribunais Superiores muito mais restritas à

quebra de sigilo bancário, inclusive, porque o art. 5º, inciso X e XII eles tratam de sigilo, do direito pessoal à intimidade, e à violação de correspondência, e isso me incomodava bastante.

Em 2015, a decisão do Dias Toffoli foi bastante pautada na questão desses acordos que vinham crescendo de maneira bastante relevante. Acho que a principal questão aí é: hoje, não vejo como colocar o Brasil fazendo troca de

informações automáticas, e vejo muita dificuldade em realizar uma alteração simplesmente legislativa, porque a nossa Constituição Federal não permite quando coloca esses dois incisos como direitos fundamentais do cidadão e do

contribuinte brasileiro.

E vejo também uma posição até de retorno anterior dos países do exterior, no seguinte sentido: Há, não só o vazamento do caso Aloe Vera entre Brasil e Japão,

mas há diversos casos de vazamentos de informações das pessoas, sejam de ordem bancária, ou de outras situações, por provedores que estão no exterior, e isso começa a causar um certo alvoroço na Europa, nos Estados Unidos, e pelo

mundo.

A questão é: E a responsabilização quanto a isso? O trabalho que eu tenho, inclusive, aponta nesse sentido. Há uma necessidade de responsabilização do

Estado quando realiza essas trocas, porque podem estar ali na pessoa física vazamento de informações pessoais, lugares que frequenta, analisando extrato bancário, algumas declarações, podem ter na questão empresarial vazamento de

estratégias, quem são fornecedores, compradores e outras situações do tipo. Então eu acho bastante importante debater a responsabilidade.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Caio, com relação à troca automática de

informações eu vejo um problema seriíssimo de due processo of law. Ou seja, eu troco, eu dou uma chance para o contribuinte se opor. Agora, especificamente com relação ao sigilo, eu vou provocá-lo, as informações na troca automática, só

da automática, são muito pífias, elas são quase só um início, não são aquelas informações das operações com clientes etc., etc.. Você pode depois ter outras

informações, mas a troca automática dá informações muito aglutinadas.

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Então, eu acho que você vai precisar elaborar um pouco para mostrar que esse tipo de informação, em si, já feriu esse direito fundamental, enquanto troca

automática, enquanto informações globais. Insisto, eu me oponho às trocas automáticas por conta do due processo f law, essa é outra questão. A Martha queria completar a pergunta. Pode ajudar.

Sra. Martha Toríbio Leão: Não, eu só queria complementar no sentido de: Eu tenho direito de ser noticiado sobre início de fiscalização contra mim dentro do Brasil, e eu não sou informado de que vai haver uma troca das minhas

informações com outra jurisdição.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Esse problema parece concreto, mas que é um outro problema.

Sr. Caio Morato: É, esse também é um problema que eu trago, porque aqui no

Brasil a gente tem algumas características especiais. E os acordos que o Brasil vem assinando, ele se sobrepõe à legislação interna. E isso é uma crítica muito...

Sra. Martha Toríbio Leão: Mas aí a gente teria que ver se isso não se sobrepõe ao devido processo legal na forma como interpretado na Constituição,

independentemente da legislação interna não se sobrepõe à Constituição.

Sr. Caio Morato: É mais um direito fundamental brasileiro que acaba por ser violado. E sobre a troca de informações, eu acho que até houve uma evolução no

tempo, quando a OCDE trouxe um formulário, um padrão, como seriam feitas essas trocas no âmbito do acordo.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: O tema ficou bastante aquecido, eu tenho o João Bianco, eu tenho o Pedro Adamy, mas eu quero lembrá-los que nós

temos o segundo tema da pauta, e nós temos que cumprir os dois temas. Então, o tema é bastante interessante. Os dois falam.

Caio se você quiser... depois disso, achar o tema ainda interessante, eu o convido

a inscrever esse tema para nós continuarmos o debate. Mas, se você permitir, eu vou passar a palavra para os dois, vou encerrar e vou entrar no segundo tema, senão não vamos terminar o tema do dia.

Sr. Caio Morato: Só pedir desculpa. Quanto à mutação de jurisprudência, no dia

30 de abril o Supremo vai julgar um Recurso Extraordinário com repercussão geral para entender o que acontece com as questões julgadas inconstitucionais e

que houve posterior modificação.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Perfeito. Bom, então, Caio... João.

Sr. João Francisco Bianco: Na verdade, é mais uma provocação, talvez para o Caio elaborar nos futuros estudos dele. Mas a minha dúvida é a seguinte: O art. 5º da Constituição, ele trata da proteção dos direitos e garantias individuais. As

pessoas jurídicas estão alcançadas pelo art. 5º?

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Porque veja, eu não estou dizendo que não estão. Mas o que eu estou dizendo é o seguinte: qualquer fiscal, qualquer fiscal, de qualquer esfera de governo, ele entra

na pessoa jurídica tributada pelo lucro real, e ele pede o extrato bancário para fazer conciliação de extrato bancário com contabilidade. Nunca vi nenhuma empresa se negando a entregar o extrato bancário da pessoa jurídica ou só

entregando extrato bancário mediante ordem judicial porque imediatamente se não houver entrega de extrato bancário, o fiscal aplica o regime do lucro

arbitrado, ele vai desclassificar a escrita e vai arbitrar o resultado.

Então, falar em sigilo bancário da pessoa jurídica tributada pelo lucro real, e até do lucro presumido, imagino, é um negócio complicado,. Não existe, não é? Não existe.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Pedro.

Sr. Pedro Adamy: Eu estou lendo o 198. Você vê que é um tema que eu estou

um pouco apaixonando no momento, mas já vou largar essa paixão.

Há um problema de competência, nesse problema, nessa questão, que é a legislação complementar, o CTN determinou que há uma autoridade competente

para definir se há indício de crime ou não. Essa autoridade não é Judiciário, não é o Ministério Público, é autoridade fiscal, que tem competência na lei complementar para fazer a famosa representação fiscal para fins penais. E

somente a autoridade fiscal tem essa competência. Logo, a gente tem mais essa barreira para ultrapassar. Caso haja indícios de crime não é o MP que tem que

ver isso, tem que ver primeiro com base nas informações fiscais, de acordo com a legislação complementar, é a autoridade fiscal.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Bom, então, Caio, fica o convite, se quiser inscreva o tema, reapresente o tema, e nós continuamos isso. Mas hoje na

pauta temos também a alegria de ouvirmos o Miguel Gutierrez, que vai nos falar sobre a sentença proferida pelo juiz da 4ª Vara Federal de Caxias do Sul, que

trata de questões relativas ao planejamento tributário e simulação. Miguel Gutierrez tem a palavra.

Sr. Miguel Delgado Gutierrez: Bom, bom dia a todos.

Eu vou tratar aqui da sentença do juiz de Caxias do Sul, da 4ª Vara. E a gente se acostumou ultimamente a discutir planejamento tributário só no Carf, quando

discussões geralmente são no Carf, e às vezes quando acaba, a empresa entra no parcelamento, então essa discussão pouco chega no Judiciário.

Então aqui é bem interessante, eu fiquei feliz com a decisão, porque abordou de

uma forma assim, bastante minudente a questão, e eu achei bem importante a gente, então, analisar aqui no IBDT.

Bom, o caso concreto é uma ação anulatória de uma decisão proferida pelo Carf, envolvendo a empresa... a cisão parcial da empresa Trans-Pinho Madeiras Ltda.

Essa empresa, em 2005 e 2007, ela entregou imóveis para integralização de capital na constituição e posterior aumento de capital da Saiqui

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Empreendimentos Imobiliários Ltda. Então, houve uma cisão parcial, foi criada a Saiqui Empreendimentos Imobiliários. Posteriormente a Saiqui vendeu os imóveis

incorporados a ela, em 2006 e 2008 com redução da tributação. A diferença tributária é que o seguinte, como os imóveis estavam no ativo permanente imobilizado da Trans-Pinho, a venda seria considerada lucro... ganho de capital,

à alíquota de 34% entre imposto de renda e contribuição social sobre o lucro. Como a venda foi feita na Saiqui, que estava sujeita ao lucro presumido, aplicou-

se uma base de cálculo de 8% para o imposto de renda e 12% para contribuição social sobre o lucro líquido. Então, teve uma redução substancial.

A Fazenda entendeu que a cisão teve como único objetivo a redução do pagamento de tributos, sendo que essa... a pessoa jurídica da Saiqui não teria

qualquer propósito negocial.

Então, a questão que se discutiu na sentença foi se a operação configurou planejamento tributário lícito ou simulação. E aqui é importante a discussão,

porque o que se discutiu basicamente foi a ocorrência da simulação ou não. Então não se examinou propósito negocial, abuso de formas, fraude à lei, nenhum outro instituto. Se examinou simplesmente se houve a simulação ou

não.

Aliás, a decisão fala que a glosa de práticas fraudulenta e dissimulatórias por parte do Fisco encontra amparo no art. 116, parágrafo único do CTN, em combinação com o 149, VII, do CTN, Então a legislação abordou... a legislação

em vigor, nada que não esteja na legislação.

E a discussão, então, foi sobre se havia simulação ou não. Lógico, essa prática, essa prova, é sempre indireta através de indícios. Então, a Fazenda alegou que

haveria simulação porque a Saiqui está no mesmo endereço da Trans-Pinho, compartilha materiais e conta com apenas dois funcionários. O valor obtido com a venda dos imóveis foi distribuído como lucro aos sócios sem reinvestimento na

empresa, nem reposição de estoque. Desde sua constituição, em 2005 até 2010, a Saiqui lançou como receita operacional apenas os valores das vendas desses

imóveis.

E para... na sua defesa, a Trans-Pinho diz que não houve simulação nem fraude, porque a constituição da Saiqui para exercer atividade de comércio de imóveis se deveu ao instituto de racionalizar a atividade empresarial da Trans-Pinho para

centrar-se em sua atividade de produção. Foram utilizados instrumento lícitos na operação. E um outro argumento importante é que a Saiqui continuou em

atividade e realizou a venda de outros imóveis além dos recebidos em virtude da cisão da Trans-Pinho. E a Saiqui mantém estoque de imóveis, tendo adquirido imóveis em 2008 e 2011, que ainda não foram alienados. E, finalmente, não há

irregularidade no fato de duas empresas integrantes do mesmo grupo econômico compartilharem a mesma estrutura física.

A sentença que, ela foi, como eu disse, se aprofundou bastante, citou até o voto

do nosso colega aqui, Luís Flávio Neto, proferido no Carf, voto vencido, na

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Câmara Superior de Recursos Fiscais, segundo o qual teria havido legítima reorganização patrimonial e planejamento tributário oponível ao Fisco.

E também o que acontece? Nesse processo houve uma antecipação de tutela, a

Fazenda recorreu para o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que manteve a decisão da antecipação de tutela. Então, a sentença foi só confirmatória da antecipação de tutela.

Então, basicamente, concluindo, a sentença entendeu que a criação da Saiqui

não constitui, por si, ilicitude, então duvidosa imputação de fraude pela administração, e ela observa também, o que é interessante, que o auto de

infração não buscou fundamento no art. 116 do CTN, provavelmente porque se entendeu que o tal... o Parágrafo Único do 116, do CTN, necessita de... não é aplicável diretamente, porque ele necessita daquela lei ordinária que estabeleça

os procedimentos a serem observados para sua efetivação.

Então, o que eu fiquei bastante feliz é que o auto de infração, ele se focou na análise do que está previsto na nossa legislação. E, nesse sentido, lembrando aí o

saudoso Prof. Gerd, o princípio da segurança jurídica, que é muito importante, e aqui reforça essa segurança jurídica porque ele não analisou questões que não estão na legislação. Talvez até... talvez o Luís Flávio possa explicar melhor,

porque no auto de infração não se levantou essa questão... questão de propósito negocial ou outros institutos não presentes na legislação, apesar de que pelo que eu vi, a decisão do Carf se fundou, sim, na questão do propósito negocial.

Então, para iniciar seria isso.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Em debate. Rodrigo Maito.

Sr. Rodrigo Maito: Miguel, na decisão houve menção ao tempo entre a cisão e a venda dos imóveis? Chegou a ver isso ou não?

Sr. Miguel Delgado Gutierrez: Na decisão em si não se entrou muito nesse ponto. Na decisão do Carf, sim, eu acho que nas alegações da Trans-Pinho se

chegou a alegar isso, o tempo entre a integralização dos imóveis e a alienação deles.

Sr. Rodrigo Maito: A minha pergunta vem sem prejuízo das outras questões que

foram colocadas. A empresa que foi cindida realmente passou a atuar no ramo imobiliário, vendendo outros imóveis, o que é relevante, até eu conversava com o Schoueri sobre isso, e ele levantou isso.

Agora, existe, no âmbito da Receita Federal, algumas soluções de consulta na

linha de que a reclassificação contábil... Saindo aqui da história da cisão, ou seja, a empresa poderia ter feito uma reclassificação contábil do imóvel para

deslocar o tratamento tributário de ganho de capital para presumido dentro das margens de lucro ou, enfim, e com impactos eventuais para fins de PIS/Cofins. Mas o que eu chamo atenção é que a Receita Federal, embora, ao que pareça, no

passado, convivia com a ideia de uma reclassificação contábil em função da mudança da destinação... Ou seja, o empresário resolve mudar a destinação de

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determinado imóvel e isso é absolutamente legítimo dentro da atividade de empreender.

Só que sai uma solução de consulta, e eu só estou trazendo isso para contribuir

com o debate, a 251, no finalzinho de 2018, em que a Receita se posiciona dizendo: Olha, ainda que tenha havido a reclassificação contábil, você tem que tributar como ganho de capital. Então, a Receita Federal aperta aqui o cerco, traz

o entendimento talvez um pouco intransigente, e é bom saber que tem uma decisão judicial como essa que você colocou, que ao que me parece,

corretamente, relativiza essa presunção de que houve... teria havido uma simulação.

Não tem simulação nenhuma, nada está escondido, o que há é uma mudança de rumos. E essa mudança de rumos, até onde eu saiba, não tem nenhum

impedimento normativo e, portanto, tratamento tributário deve ser seguido em conformidade com o que efetivamente feito.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Pediram a palavra Luís Flávio e Bruno.

Sr. Luís Flávio Neto: Luís Flávio. Eu sempre me recusei a comentar casos que

eu participei de julgamento enquanto era conselheiro do Carf, mas agora eu posso. Mas obviamente eu não vou entrar em nenhum detalhe que conste no auto de infração e que não tenha sido refletido na decisão publicada.

O que me chama atenção nesse caso é que atualmente nós temos uma discussão

de... inclusive alguns professores amigos nossos, que falam que nós precisamos abandonar a discussão sobre princípios, pois, afinal de contas, princípios não

solucionam questões concretas, especialmente no Carf, matéria de planejamento tributário. Vamos parar de falar sobre princípios. Então nós temos essas ideias que tem sido trazidas para o IBDT e os nossos congressos.

Esse é um caso que mostra como é preciso nós falarmos de princípios realmente.

A decisão foi baseada em dever fundamental de pagar tributos e princípio da solidariedade. Esse é o voto vencedor no Carf em que a discussão foi realmente

alterada no Poder Judiciário para enfrentar se houve simulação no caso concreto ou não, que foi... Na verdade, eu acho que a questão que deveria ter sido discutida no Carf. Então, me parece que qualquer discussão se houve simulação

ou não, ela seria vencida sob a perspectiva de que o contribuinte deveria, sim, contribuir aos cofres públicos e tributar na maior medida do possível, mantendo esses imóveis na empresa originária e não fazer a redução de capital para

constituição de uma pessoa jurídica.

Então, houve uma constituição da pessoa jurídica, essa pessoa jurídica recebeu patrimônio de uma outra pessoa jurídica originária, que era tributada pelo lucro

real, me parece, Rodrigo, de cabeça, tá, faz algum tempo que eu trabalhei no caso, três anos depois da constituição dessa pessoa jurídica houve a venda dos imóveis nessa pessoa jurídica tributada pelo presumido, eram bem do estoque,

então foi tributada conforme a sistemática do lucro presumido pelas margens de presunção.

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E aí, eu me lembro que esse caso... Eu sempre procurei manter bastante a cordialidade nos votos, mas esse caso é um caso que me deixou consternado. E

eu me lembro que eu falei: Olha, eu provavelmente recomendaria esse planejamento, muito provavelmente alguns planejamentos, não apenas tributários, mas sucessórios, estão sendo realizados por uma série de questões. E

esse caso foi também apenado com uma multa de 150%. E essa multa foi mantida no Carf. Eu me lembro de ter feito um comentário, que talvez eu me

arrependa, falei: Olha, essa multa de 150% talvez ela esteja conduzido também representação fiscal para fins criminais. Imaginemos que um parente nosso hoje esteja fazendo um planejamento sucessório e integralizando capital da pessoa

física em pessoa jurídica, para que essa pessoa jurídica explore a atividade imobiliária. E foi uma decisão do legislador que a pessoa jurídica tenha opção, opção fiscal, de tributar essa atividade imobiliária pelo lucro presumido.

Originalmente apenas pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real poderiam explorar atividade imobiliária e o legislador tomou uma decisão consciente,

tomou opção fiscal.

Então, será que nós iremos olhar para a nossa avó e mandá-la para a cadeia por fazer um planejamento sucessório? Eu lembro que eu fiz esse comentário, talvez tenha me arrependido. Mas é fugir da realidade do que realmente o legislador

permite e do que o país inteiro faz em questões legítimas de planejamento sucessório.

E aí eu me lembro que até por eu ter ficado consternado, procuradores, presentes

e outros conselheiros que votaram para a manutenção da multa de 150% vieram falar comigo e disseram: Olha, mas isso é um caso diferente. Nós não entendemos que uma redução de capital, uma constituição de uma pessoa

jurídica, para que a atividade de exploração de bens imóveis seja realizada pelo lucro presumido esteja errado. Não. Aqui o problema é que o lucro dessa

atividade foi distribuída aos sócios e não e não foi reinvestido na própria atividade da empresa. Aí eu fiquei um pouquinho mais consternado, porque qual é a função de uma pessoa jurídica ao não ser a geração de lucros e em que local

da legislação existe o dever de reinvestimento na atividade?

Então, me parece que a discussão sobre princípios e a devida colocação do tema é sim fundamental, pois eu tenho aqui a tomada de um princípio de solidariedade, dever fundamental de pagar tributos como fundamento para a

criação de requisitos inexistentes na legislação.

Eu tomei conhecimento dessa sentença almoçando com o Pedro, lá em Porto Alegre, naquela aula do IET, e é uma decisão aqui da sua região, e não

acompanho os casos, mas fiquei bastante satisfeito em ver que o Poder Judiciário nesse caso específico está dando uma devida condução à questão.

E também, uma última observação, há condenação de honorários de sucumbência a União. Então, é óbvio que planejamentos tributários que

redundem em evasão fiscal devem ser combatidos, isso, além de ser crime é moral, mas também me parece bastante imoral sob a perspectiva do contribuinte

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aqui vos fala, que eu agora, nesse momento, tenha que contribuir ajudando a União a pagar honorários de sucumbência em razão de um caso que não deveria

ter sido levado aos extremos. Então, me parece que a condução desses casos de planejamentos tributários legítimos ao Poder Judiciário irão acabar com condenações à União Federal que, ao final da história, prejudica todos nós.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Bruno Fajersztajn.

Sr. Bruno Fajersztajn: Bom dia. Fazer mais uns comentários adicionais aqui

também. É interessante, a decisão é bem curtinha, é uma característica das decisões judiciais serem mais diretas e precisas. Lá no Carf eu tenho certeza que

esse voto aí deve ter umas 60 páginas, e depois tem o vencido, etc. O que tem o lado bom também, porque a gente perde no Carf, mas os argumentos são enfrentados, e muitas vezes se recorre a princípios abstratos quando a regra não

permite atender o objetivo do julgador na decisão que ele tomou.

O curioso aqui é o seguinte: eu queria falar duas coisas. Primeiro que é uma decisão pós Carf, então nós vamos começar a ter jurisprudência sob

planejamento tributário, que não tinha por conta dos Refis. Esse aqui provavelmente é um contribuinte que não vai incluir o débito no Refis, se houver um Refis no futuro, porque ele já tem um boa decisão de primeira instância. E

essas decisões... essa decisão, apesar de ser curtinha, ela tinha como premissa toda discussão que passou pelo Carf. Então estavam lá os princípios apontados como fundamento da decisão, estava a questão da regulamentação do 116, e o

julgamento foi em cima da existência ou não de simulação. E ele ponderou. O curioso aqui até na forma como a decisão colocou, ele pondera os princípios... os

indícios de simulação e os indícios de não simulação, e toma uma decisão em cima disso. Ele diz: Olha, é verdade, a empresa é dos mesmos sócios, tem a mesma sede, ocupa o mesmo espaço físico, tem compartilhamento de custos,

etc., mas, por outro lado, também é verdade que a empresa tem outros empreendimentos, continuou fazendo atividade imobiliária. Tem até aqui um

projeto residencial que ela está fazendo.

Então, nesse contexto, ele reconheceu que existiam duas pessoas jurídicas separadas e que a cisão e a transferência desses ativos não era hipótese de simulação, ele foi na linha de simulação. Então realmente é um decisão muito

interessante. Ela chama também atenção que ela cita vários precedentes do TRF da 4ª Região sobre o assunto, também para fundamentar a ideia de que a

economia fiscal é válida, salvo nas hipóteses de simulação. Então, uma forma indireta também de questionar aplicação do Parágrafo Único do 116 no caso. Ou entendendo aqui, eu consigo extrair que ele conclui que não adianta apenas não

haver propósito negocial, embora a gente possa também entender que no caso tinha propósito negocial. Não tem problema nenhum eu começar um novo negócio e transferir um ativo para ele, e a partir dele continuar o negócio.

Propósito negocial é explorar a atividade imobiliária, até poderia. Ele não foi por essa linha, ele concluiu que não era uma simulação. Então também muito

interessante a decisão nesse ponto.

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E, por fim, as multas, realmente a gente pode até admitir que existe uma controvérsia doutrinária e principiológica sobre o limite do planejamento

tributário. Existe. Agora, nesse cenário de controvérsia doutrinária clara, ausência de jurisprudência clara, por conta dos Refis, etc., e falta de regulamentação do 116, como admitir que alguém que praticou alguma coisa

baseado em umas das teorias está atuando com fraude? Como... Você pode até discutir aqui se o 116 precisa de regulamentação ou não, mas alguém que

entendeu que ele precisa e que o caso aqui não é de fraude, pode ter praticado um crime contra a ordem tributária.

Então, a multa qualificada, realmente ela ficou prejudicada, que não foi discutida, mas é um ponto que a gente precisa discutir, porque é absolutamente

inconcebível o dolo em uma situação de planejamento tributário, ainda que se entenda que é agressivo. Claro, sonegação, uma simulação crassa é uma coisa, agora, aplicar uma das teorias, nunca pode gerar multa qualificada.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Martha.

Sra. Martha Toríbio Leão: Bom, primeiro que orgulho do Rio Grande do Sul, sim. Eu ia fazer um comentário no mesmo sentido do Bruno, no sentido de que felicidade que finalmente essas questões de planejamento tributário estão

alcançando o Judiciário. Já existem algumas sentença sobre ágio também nesse mesmo sentido, enfim, afastando autuações da Receita baseadas apenas na ideia do dever fundamental de pagar tributos e, enfim, no princípio da solidariedade.

E eu diria até que, na verdade, aqui a gente não precisa recorrer nenhum princípio para resolver essa questão, existem regras suficientemente no nosso ordenamento jurídico que resolvem esse tema sem a necessidade de que a gente

vá para princípios, para questões mais abstratas.

Eu não sei se nessa sentença também, mas nessas sentenças de ágio que tem saído de alguns casos, inclusive bastante discutidos no âmbito do Carf, várias

delas inclusive tem admitido de que a empresa fez aquelas operações com o intuito maior de economizar tributos e, de fato, de aumentar sua geração de lucro. E essas sentenças dizem exatamente que isso não é um problema. Ou seja,

finalmente a gente está amadurecendo essa ideia de que, como o Luís Flávio bem colocou, a ideia de uma empresa é de gerar lucro e, portanto, ela adotar operações lícitas, operações que são inclusive informadas à Receita Federal nesse

sentido, não leva à violação de nenhuma regra do ordenamento e, portanto, não deveria levar a nenhum tipo de autuação.

Eu ia fazer também comentário sobre a multa, que como o Bruno bem já colocou,

essa, assim, essa vinculação automática que as autuações fiscais fazem da existência de simulação para o 71, 72, 73 da lei no sentido de que havendo uma simulação, eu já teria um dolo, fraude, ou um conluio que justificaria a multa

gravada, é um pulo argumentativo absolutamente equivocado do ponto de vista do ordenamento jurídico. Essas... toda... Eu imagino que nesse caso e,

certamente a partir dessa sentença, não há dúvida disso, de que todas essas

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informações, todas essas operações foram sempre informadas à Receita Federal e, portanto, qual é a fraude existente aqui? Qual é a enganação? Qual é a criação

de uma realidade inexistente que eu fiz, se eu sempre comuniquei todas essas operações à Receita Federal?

Então, o fato de eu não concordar que isso não deu... chegar à conclusão de que isso não poderia ter sido feito por violar a capacidade contributiva e que,

portanto, a capacidade contributiva ali teria sido manifestada em maior medida e eu teria que alcançar essa capacidade, me levariam à autuação e à cobrança do

tributo, mas jamais à imposição de multa qualificada.

Assim eu achei até... o Luís Flávio conseguiu uma paciência para fazer apenas esse comentário da avó. Parabéns, Luís Flávio, por ter se mantido, porque realmente assim, essa autuação e com multa gravada assim, é difícil de lidar.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Pedro Adamy.

Sr. Pedro Adamy: São três comentários breves. Primeiro é uma pena que eu

tenha perdido esse julgamento, porque eu adoraria ver o meu amigo Luís Flávio tão sempre calmo, polido, fidalgo, consternado... Queria saber como ele fica

consternado.

O segundo comentário é que a decisão é boa também porque veio de um colegiado bastante duro no TRF da 4ª Região. Então, esse é um excelente sinal, que ele é um colegiado que vitórias do contribuinte são... não são raras, mas

também não são assim, não vêm às mãe cheias.

E a terceira a Martha já adiantou, há uma alteração, a sentença nota que há uma alteração no fundamento da autuação que depois vem por planejamento

tributário abusivo. Um conceito tirado da cartola. De alguma forma a gente está discutindo esse conceito sem saber o que ele significa, sem saber da onde ele vem, sem saber a sua origem normativa. E a gente está legitimando isso. Já

temos o Judiciário agora notando isso.

E então, eu vou fazer coro a Martha: talvez a gente tenha, meu caro Luís Flávio, de parar de discutir princípios e dizer que essa discussão é indevida e ilegítima, e

que a gente tem que olhar é para as regras. E sempre que alguém levantar a mão e falar “solidariedade social”, a gente joga o livro da Martha nele, na pessoa, e fala: ‘Toma’. Porque parece que a gente vai perder sempre a discussão de

princípio quando alguém jogar solidariedade na nossa frente. A gente não tem como ser contra a solidariedade. Ninguém é contra. Ninguém. A gente só é contra

a aplicação dela com determinados efeitos, isso sim, mas a gente vai perder, porque o outro lado vai dizer... vai ter o Brandão dizendo: Coitado do povo. Vai ter que devolver o dinheiro agora para o contribuinte. E a gente vai perder,

inclusive com a ajuda do Brandão.

[risos]

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Mais alguém? Bruno, Miguel.

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Sr. Bruno Fajersztajn: Um comentário sobre o comentário do Rodrigo da reclassificação só para acrescentar também ao debate. Claro, o Rodrigo sabe, que

no caso não precisou discutir reclassificação, porque ele transferiu para uma outra sociedade, então, é outra... aquela... começou naquela sociedade já como imobiliário. E essa solução de consulta que existe para... Claro, se não

houvesse... Talvez possa ser um argumento subsidiário: Olha, ainda que a empresa fosse simulada, enquanto muito aqui, então ela mudou sua atividade e

essa única empresa também é imobiliária e teria havido uma reclassificação. Um bom argumento de defesa.

Mas quanto esse tema de reclassificação, ele citou a solução de consulta, que é um compilado, não sei formalmente, mas ela reflete o entendimento da

jurisprudência atual do Carf também, que também no passado admitia a reclassificação e atualmente está dizendo que a regulamentação - isso está até na Instrumento Normativa nº 1.700 - que a reclassificação contábil não altera a

característica original do bem. Então você tem que tributar ganho de capital se foi adquirido para ser usado nas atividades, o que é um equívoco.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Miguel.

Sr. Miguel Delgado Gutierrez: Então, conforme o Pedro falou, foi mencionado

na decisão essa questão do planejamento tributário abusivo, que foi considerado pelo Carf, mas na decisão não se discorreu sobre isso, e realmente foi a questão analisada sobre a simulação ou não.

E uma notícia aqui que o colega que acabou de sair, deu, o Tribunal manteve, teve apelação e já foi julgada a apelação, e o Tribunal, o TRF da 4ª Região manteve a decisão.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Eu tenho uma pergunta para vocês.

Ainda temos dez minutos. Rodrigo, realmente nesse caso, com tudo que é dado, não dá para falar em simulação, mas só para provocar, e se não fosse esse

histórico, ou seja, se a empresa tivesse sido constituída apenas com os dois imóveis, colocados em estoque, e uma vez vendidos os dois estoques, a empresa tivesse sido extinta no mesmo dia? Eu queria mudar um pouquinho o fato, e eu

gostaria de ouvir daqueles que tiveram posição bem rapidamente, se nesse outro fato... Começaria pelo Luís Flávio, só que como o Luís Flávio julgou, se tivesse esse... é um fato diferente, ou seja, constituí a empresa, pus no estoque, vendi os

dois imóveis e extingui a empresa.

Sr. Pedro Adamy: Um registro retroativo ainda?

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Não, não, não. Eu quero colocar claramente, eu constituí a empresa, não tinha ninguém para comprar imóvel,

mas eu falei: Puxa, eu quero vender isso, eu vou ser tributado, cria uma empresa imobiliária cujo estoque são dois imóveis, vende os dois... Eu queria saber como é que você julgaria, só para ouvir se isso muda muito. Como tem dez minutos,

vou pedir para ser bem breve cada um,

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Sr. Luís Flávio Neto: Eu, particularmente, penso que é muito difícil de analisar uma situação de uma maneira genérica sem olhar o caso a caso, não é? Então, o

Schoueri nos trouxe aqui uma situação, o Pedro está colocando um detalhe a mais no caso. Então, vamos trabalhar com umas duas ou três opções aqui. Eu, particularmente, tenho uma dificuldade em imaginar em simulação da pessoa

jurídica em si, porque a pessoa jurídica, ela tem um regramento próprio para ser constituído, você tem critérios formais de constituição da pessoa jurídica. Então,

eu prefiro falar em simulação dos atos praticados pela pessoa jurídica e não simulação da pessoa jurídica em si.

Então, vamos lá, a pessoa jurídica foi constituída, eu tive uma integralização de capital na pessoa jurídica, e quanto tempo passou? Talvez a questão do tempo

seja relevante. Houve uma integralização de capital, no d-zero, no d-zero a venda ocorreu, e no d-zero a pessoa jurídica foi extinta.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Já que eu criei o caso, deixa eu fazer o

caso direitinho. Não, não foi no d-zero, senão você poderia dizer que o imóvel já tinha sido vendido. Então, levou um tempo razoável para conseguir vender aqueles dois imóveis.

Sr. Luís Flávio Neto: Então a negociação começou após a constituição?

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Sim. A negociação começou após, mas

eu quero só enfrentar desse modo.

Sr. Luís Flávio Neto: E a pessoa jurídica então, que realizou... a pessoa jurídica que recebeu esse ativo, ela foi a mercado, ela negociou, ela realizou a venda, e

após a realização da venda, aqueles sócios entenderam que não havia mais razão para explorar aquela atividade. Eles resolveram virar chefe de cozinha e foram para outra atividade. Onde há simulação aqui? Nenhuma.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Eu queria ouvir um pouquinho de cada

um, só isso.

Sr. João Francisco Bianco: Eu acho que essa situação de fato que está sendo proposta pelo Schoueri, aqui, ela guarda alguma semelhança com algumas

alterações que foram feitas de redução de capital de imóvel para venda na pessoa física. E eu lembro que os... eu acho que são dois fatores que eles influenciam na conclusão da decisão. Primeiro, é se a negociação de venda de imóvel começou

antes ou começou depois de ter sido feita a cisão ou redução de capital. E o segundo fator, que eu acho que influencia a decisão, é o que foi feito com o

dinheiro. Se o dinheiro da venda depois volta para a pessoa jurídica original ou se ele depois é dado uma destinação inversa. Eu acho que esses dois fatores aí que podem influenciar a decisão.

Sra. Martha Toríbio Leão: Eu quero votar.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Martha quer votar.

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Sra. Martha Toríbio Leão: Eu acompanho o relator, felicíssima, Luís Flávio. E isso queria dizer, esses requisitos, embora de fato sejam usados nas últimas

decisões do Carf com relação a essas questões das pessoas físicas, não tem nenhuma previsão legal nesse sentido, então...

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Ou seja, mesmo que capitalizasse de volta a pessoa jurídica original...

Sra. Martha Toríbio Leão: Sim, não tem uma exigência legal nesse sentido. Eu

vou usar qual fundamento legal vai ser da autuação?

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Bom, eu adiciono ao caso então, o que o Bianco colocou, ou seja, vendeu o imóvel e o dinheiro voltou para a pessoa

jurídica.

Sr. Pedro Adamy: Voltou. Não, aí está tudo bem. Eu vou com o relator, está tudo certo. É difícil pensar assim, veja, assim claramente, eu vendo o imóvel no meu nome, transfiro depois, passo... São coisas simples. Agora, como saber se a

alienação foi feita em nome da nova pessoa jurídica, se os sócios são os mesmos, qual é o tipo de prova que eu consigo fazer de que houve atuação da pessoa

jurídica A, que é... Não, da pessoa jurídica B, que é a nova proprietária dos imóveis e não da A, se os sócios são os mesmos. Todos os atos praticados pela B teriam sido praticados se fosse a A. É simplesmente um e-mail que eu gerei de

diferente... De novo assim, é uma questão que é difícil ser analisada de forma abstrata se não houver como fazer comprovação de que a nova pessoa jurídica

que está negociando ou não.

Com relação à destinação do dinheiro, bom, aí eu vou discordar veemente do querido amigo João Francisco, porque não... O dinheiro que vai para o sócio é do sócio, não precisa voltar para a pessoa jurídica, ele pode comprar relógio, pode

comprar vinho, pode comprar um apartamento, pode apostar corrida com o Dr. Schoueri, pode... enfim, o dinheiro é dele e a função social da empresa já foi

respeitada.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Nós temos seis minutos. Quem mais se inscreveu? Salvador, Bruno, Miguel e Rodrigo.

Sr. Salvador Brandão: Realmente a questão de voltar o dinheiro para a empresa exatamente tem uma, viu, Martha, a questão do porque você pode reduzir o

capital. São duas hipóteses só permitidas no Código Civil, que é em caso de prejuízo e em caso de você dizer que o seu capital está em excesso em relação às

suas atividades. Se você diz isso, que o seu capital está em excesso, depois volta, então porque aí realmente não justifica a...

[falas sobrepostas]

Sr. Salvador Brandão: Mas é...

[falas sobrepostas]

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Sr. Salvador Brandão: Agora, uma coisinha só, com referência à questão da multa gravada. É claro que, infelizmente, todo mundo, o empresário em geral, a

gente sabe disso, o bom empresário, sofre auto de infração a todo tempo, e o medo é sempre o chamado inquérito policial. Ninguém gosta porque... Chama o presidente, traz o presidente aqui, fala o investigador. Então, a pessoa, às vezes,

acaba entrando no Refis por causa disso. Mas o Supremo tem uma decisão, um acórdão, dizendo assim: Se o contribuinte agiu de acordo com uma posição

doutrinária séria, ele vai ser condenado a pagar o imposto e a multa, mas não sofrerá punição criminal.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Bruno.

Sr. Bruno Fajersztajn: Eu vou colocar um contraponto, pedindo vista, mas votando contra, vou divergir dos doutos aí. Concordo que não tem simulação no

aspecto de vício de vontade, de realidade dos fatos. Mas essa situação não é muito semelhante a do casa e separa? Será que eu tenho realmente uma

sociedade? Será que eu não estou abusando no direito... abuso no exercício do direito de contratar sociedade? Eu poderia contrapor e dizer: Não, essa é uma sociedade com propósito específico, venda de um imóvel. Não é vedado pelo

ordenamento realizar venda de um único imóvel.

Mas pode haver aí uma questão em relação ao abuso no exercício do direito de contratar sociedade, que essa sociedade aí só existe para fazer uma venda. Ou então, vício de causa do negócio jurídico, aí poderia ser simulação. Jamais com

multa qualificada, mas poderia ter um vício de causa. Afinal de contas, a sociedade, em princípio, ela surge para ser perene. Não é comum fazer uma

sociedade com prazo limitado quando se envolve esses outros elementos de economia tributária e etc. Por que não continuou essa sociedade? Então peço vistas aí. Mas já adiantando o meu voto, que eu voto contra.

Quanto à redução de capital é diferente porque tem uma norma específica lá

autorizando a redução de valor de mercado.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Miguel.

Sr. Miguel Delgado Gutierrez: Bom, então, a questão posta pelo Prof. Schoueri é muito difícil, porque a questão da simulação é difícil realmente, a prova indireta,

não é... ninguém escreve lá: Não, eu simulei. Ponho um carta escrita: Não, realmente, depois a gente vai desfazer tudo. É sempre uma prova indireta, por indícios e tal.

Então, o que me deixou bastante feliz nessa sentença foi justamente que eles discutiram que seria ou não simulação. Até o resultado poderia ter sido diferente, eles poderiam até ter dito: Não, há uma simulação e desconsiderada a operação.

O que me deixou feliz e que dá uma segurança jurídica é que não foram alegados princípios, princípio da solidariedade social, dever de contribuição para despesas públicas, etc., porque aí a questão fica mais subjetiva ainda.

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Então, se discutiu: houve simulação? Quais são os indícios da simulação e quais são os indícios da não simulação? Um exemplo aí do Prof. Schoueri, já fica mais

difícil dizer que não há simulação, mas eu voto com o relator, com o Luís Flávio também, eu concordo.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: Rodrigo Maito.

Sr. Rodrigo Maito: Sem a pretensão de ser o último a falar sobre o assunto, mas pelo visto é o que vai acontecer, eu acho que a questão da venda de dois imóveis

mediante a prévia constituição de uma pessoa jurídica tem que ser vista no contexto em que se pretende, se vem a negociação posterior, se há elementos que

demonstram que realmente existe o intuito de empreender nessa linha imobiliária, não vejo simulação absolutamente nenhuma. Então, nesse sentido, eu acompanho o relator.

Agora, a redução de capital como legitimamente efetuada a valor de livro com

base nas premissas societárias para excesso de capital ou absorção de prejuízo, agora com o retorno imediato do dinheiro para a empresa, me parece que

realmente... eu só reduzi para ter uma tributação mais baixa, sendo que a empresa tem necessidade de caixa. Então, eu acho que sim, seria uma simulação.

Sr. Presidente Luís Eduardo Schoueri: São 10h, encerro a reunião. Agradeço a

presença de todos. Convido-os para o dia 27, quinta-feira de cinzas, nos encontremos aqui.

FIM

Eu, Patrícia Toledo, estenotipista, declaro que este documento, segundo minhas maiores

habilidades, é fiel ao áudio fornecido

REVISADO POR: V.L.