leniÊncia do judiciÁrio ao apreciar atos de …

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1 LENIÊNCIA DO JUDICIÁRIO AO APRECIAR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA LENIENCE OF THE JUDICIARY TO APPRECIATE ACTS OF ADMINISTRATIVE IMPROBITY Marcos Vinicius Marinho da Silva 1 Armando Soares de Castro Formiga 2 RESUMO O referente artigo encontra ensejo na impunidade dos agentes políticos e públicos frente ao Poder Judiciário, orquestrando atos que originaram maiores ônus que propriamente benefícios, eis que pode-se observar que a verba pública é consumida com atos de motivação fútil e imoral, finalidade diversa do interesse público e em total transgressão á razoabilidade administrativa, havendo grande desproporcionalidade entre o erário despendido e os benefícios auferidos pela coletividade. A insensatez presente nas ações de tais administradores evidencia a existência de algo mais grave e preocupante, a decadência do caráter de muitos os que ascendem à gestão do interesse público. Onde, independente de investidura ou causas endêmicas, resultando uma inevitável interação com um meio viciado. PALAVRAS-CHAVE: Agentes públicos. Improbidade administrativa. Impunidade. Judiciário. ABSTRACT The article finds opportunity in the impunity of political and public agents outside the Judiciary, orchestrating acts that led to greater burden itself benefits, it can be observed that the public budget is consumed with acts of futile and immoral motivation, diverse public interest purpose and transgression to reasonableness, with large administrative disproportionality between the money spent and the benefits received by the collective. The folly in the actions of such administrators highlights the existence of something more serious and worrying, the decline of the character of many who ascend to the management of the public interest. Where, independent of investiture or endemic causes, resulting in an inevitable interaction with a kind of addict. 1 Acadêmico do curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins; [email protected] 2 Professor da Faculdade Católica do Tocantins; doutorando em Ciências Jurídico-Históricas pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra; editor da Revista FACTUM; [email protected]

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LENIÊNCIA DO JUDICIÁRIO AO APRECIAR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

LENIENCE OF THE JUDICIARY TO APPRECIATE ACTS OF ADMINISTRATIVE IMPROBITY

Marcos Vinicius Marinho da Silva1

Armando Soares de Castro Formiga2

RESUMO O referente artigo encontra ensejo na impunidade dos agentes políticos e

públicos frente ao Poder Judiciário, orquestrando atos que originaram maiores

ônus que propriamente benefícios, eis que pode-se observar que a verba pública

é consumida com atos de motivação fútil e imoral, finalidade diversa do interesse

público e em total transgressão á razoabilidade administrativa, havendo grande

desproporcionalidade entre o erário despendido e os benefícios auferidos pela

coletividade. A insensatez presente nas ações de tais administradores evidencia

a existência de algo mais grave e preocupante, a decadência do caráter de

muitos os que ascendem à gestão do interesse público. Onde, independente de

investidura ou causas endêmicas, resultando uma inevitável interação com um

meio viciado. PALAVRAS-CHAVE: Agentes públicos. Improbidade administrativa. Impunidade. Judiciário.

ABSTRACT The article finds opportunity in the impunity of political and public agents outside the Judiciary, orchestrating acts that led to greater burden itself benefits, it can be observed that the public budget is consumed with acts of futile and immoral motivation, diverse public interest purpose and transgression to reasonableness, with large administrative disproportionality between the money spent and the benefits received by the collective. The folly in the actions of such administrators highlights the existence of something more serious and worrying, the decline of the character of many who ascend to the management of the public interest. Where, independent of investiture or endemic causes, resulting in an inevitable interaction with a kind of addict.

1 Acadêmico do curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins; [email protected] 2 Professor da Faculdade Católica do Tocantins; doutorando em Ciências Jurídico-Históricas pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra; editor da Revista FACTUM; [email protected]

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KEY-WORDS: Improbity administrative. Impunity. Judiciary. Public agents.

SUMÁRIO: Introdução. 2 Autonomia Constitucional Da

Improbidade Administrativa. 3 Lei De Improbidade

Administrativa. 3.1 Estrutura Normativa Da Improbidade

Administrativa. 3.2 Improbidade Administrativa E

Enriquecimento Ilícito. 3.3 Prejuízo Ao Erário. 3.4 Atos Que

Atentam Contra Os Princípios Da Administração. 4 Controle

Judicial do Ato de Improbidade Administrativa. 5 Ação De

Improbidade Administrativa Versus Agentes Políticos. 6

Espécies de Sanções. 6.1 Perda Da Função Pública. 6.2

Ressarcimento Ao Erário. 6.3 Multa Civil. 6.4 Contratar Com O

Poder Público. 6.5 Proibição De Receber Benefícios Ou

Incentivos Fiscais Ou Creditícios. 6.6 Indisponibilidade Dos

Bens. 7 Critério De Aplicação Das Sanções. 8 Prescrição E

Decadência. Considerações Finais. Referências.

INTRODUÇÃO

Em consonância com o autor De Plácido e Silva, probo e probidade derivam do

latim probus, probitas, aquilo que é reto, leal, justo, honesto, podendo ser

interpretado também como uma "maneira criteriosa de proceder”. Decorrente de

improbitas que significa, imoralidade, malícia, desonestidade, má conduta e

índole. Ainda seguindo o ilustre autor supracitado, ímprobo “é o perverso,

corrupto, devasso, desonesto, falso, enganador” (PLÁCIDO E SILVA, 2016 p.

432;454). Em outra descrição, o autor Antônio Geraldo da Cunha, no Do

dicionário etimológico da língua portuguesa assim a define ,”probo refere-se a

quem apresenta caráter íntegro” (CUNHA, 2011, p. 522.), ou seja, em sentido

inverso, ímprobo é quem se encontra em estado de integridade. Em

igual raciocínio, Garcia e Alves salientam: “probus" quer dizer "o que brota

bem" (pro+bho – da raiz bhu, nascer, brotar)” (2011, p. 109).

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Portanto, probidade se define como, o comportamento honesto, baseado na

retidão do caráter íntegro e em segundo plano, o surgir do bem, manter-se leal

ao proceder nas atitudes. Improbidade administrativa, em compêndio, elucida o

comportamento que rompe a honestidade e a lealdade que se espera ao gerir

da coisa pública, independente da atribuição de agente público ou de

correligionário privado. Improbidade administrativa traduz a mais alta

desconfiguração da fidelidade assumida por quem faina com bens e poderes

cujo tem como titular último o povo.

A história e a filosofia nunca obliteraram a improbidade, tanto dos homens da

sociedade quanto dos homens do Estado. Sendo aquela a improbidade comum,

intrínseca da humanidade de forma geral; Locke em sua obra Dos Tratados de

Governo Civil desperta a sociedade a caucionar-se contra qualquer atentado,

mesmo dos legisladores, sempre que se mostrassem levianos ou maldosos e

regessem planos contra a liberdade e propriedade dos indivíduos. E esta, a

improbidade que alcança os valores morais da maior parte da sociedade,

empregados ao Estado, tem-se Maquiavel que em seu livro O Príncipe aduz

dentre as várias lições sobre a melhor conduta a ser adotada pelos soberanos,

aconselhava o príncipe a não manter-se fiel às suas promessas quando

suprimida a causa, eis que seu cumprimento poderia gerar gravame, uma vez

que nem todos os homens eram bons.

Os desvios comportamentais que postergam a normatividade estatal, ou os

valores morais de determinado grupo em troca de uma vantagem correlata,

manifestar-se-ão como principal via de degradação dos padrões ético-jurídicos

que devem manear o comportamento individual nas esferas pública e privada.

Segundo a história, especificamente a do Brasil, mostra que a corrupção tem

suas entranhas na colonização do país. A Monarquia à época foi a base para a

edificação do sistema colonial português, onde o monarca que detinha total

poder, a exemplo, a Constituição de 1824, em que estabelecia 4 (quatro) poderes

constituintes, o Poder Executivo, gerido pelo monarca, o Poder Legislador,

formado por deputados, o Poder Judiciário, formado por juízes e ministros; e por

último, talvez mais importante, o Poder Moderador, que detinha controle sobre

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todos os outro, também chefiado pelo monarca (VICENTINO; GIANPAOLO;

2012).

Com a chegada da família real ao Brasil, o modelo aplicado por D. João VI para

aproximar-se e conseguir apoio político e financeiro da elite local foi à

concessão de honrarias e títulos de nobreza à época, transmutando a

importância dos títulos de acordo com a intensidade do retorno e fortalecimento

declinados à Coroa. Somente em oito anos, D. João VI distribuiu mais títulos de

nobreza que Portugal nos trezentos anos anteriores. (GOMES. 2007, p. 196-

197). Essa elite que se formou com esse exemplo, desprovida de valores éticos

e instigada pelo espírito do "é dando que se recebe", ascendeu ao poder e

sedimentou um verdadeiro cancro na estrutura administrativa. O tesoureiro de

D. João VI Bento Maria Targini, foi nomeado barão e depois

visconde, imortalizando-se na célebre frase "Quem furta pouco é ladrão, quem

furta muito é barão, quem mais furta e esconde, passa de barão a visconde"

(CAVALCANTI, 2011 p. 46).

Diante desse cenário implantado, já no começo do século XIX, as distorções

comportamentais não permaneciam restritas aos detentores de poder, mostrava-

se disseminadas dentro do ambiente social. Thomas Lindley descreve em sua

narrativa “Narrativa de uma viagem ao Brasil” assim aos comerciantes baianos

da época: "[e]m seus negócios, prevalece à astúcia mesquinha e velhaca,

principalmente quando efetuadas a s transações com estrangeiros, aos quais

pedem o dobro do preço que acabarão aceitando por sua mercadoria, ao passo

que procuram desvalorizar o que terão de obter em troca, utilizando-se de todos

os artifícios ao seu alcance, Numa palavra, salvo algumas exceções, são

pessoas inteiramente destituídas do sentimento de honra, não possuindo aquele

senso geral de retidão que deve presidir a toda e qualquer transação entre os

homens." Destacando que ética e honestidade já não eram valores que gozavam

de grande prestígio à época.

Essas distorções auferidas no Brasil à época de sua colonização continuaram a

expandir quando tornou-se Reino, e institucionalizada durante a República, e

absurdamente vivo nos dias atuais, leva-nos a uma descrença de solução e uma

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verdadeira crise de valores morais, éticos e políticos fazendo-me lembrar de um

trecho da obra O Príncipe de Nicolai Maquiavel, onde escreve "também aqui,

como dizem os médicos sobre a tuberculose, no início o mal é fácil de curar e

difícil de diagnosticar. Mas, com o passar do tempo, não tendo sido nem

reconhecida nem medicada, toma-se fácil de diagnosticar e difícil de curar. O

mesmo sucede nos assuntos de Estado. Prevendo os males que nascem, o que

só é permitido a um sábio, estes são curados rapidamente. Mas quando se

permite que cresçam, por não havê-los previsto, todos os reconhecem, porém

não há mais remédio".

2 AUTONOMIA CONSTITUCIONAL DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

O tema a ser tratado é tão antigo quanto à comunhão humana em sociedade e,

ao mesmo tempo, abriga tamanha importância nos dias de hoje, eis que com a

evolução da sociedade para o Estado Democrático de Direito, tal

questionamento tornou-se de crucial importância.

Para se compreender o referido estudo, é fulcral assimilar o contexto

de construção da Improbidade Administrativa, ressaltando a autonomia

constitucional. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência sustentam

três instâncias de responsabilidade jurídica inseridas pela Constituição da

República Federal do Brasil e na ordenação jurídica, sendo: civil, criminal e

administrativa.

A responsabilidade civil tem por origem o próprio Direito, nas relações em que

tem por elementos a conjuntura jurídica que rodeie qualquer hipótese de

responsabilização de um indivíduo: sabendo ser a conduta objetiva ou subjetiva,

ou por nexo causal e dano.

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Como a responsabilidade criminal, tem respaldo no Direito Penal, destaca-se a

estrutura que reconhece a tipicidade dos comportamentos que findam em penas,

e que podem chegar a cercear a liberdade humana.

Já a responsabilidade administrativa, tem como objeto as relações jurídico-

administrativas, ou seja, estabelecem elos entre o Estado e o cidadão, onde

qualquer deste encontra-se potencialmente submetido a situações jurídicas

estabelecidas em lei. Ora de sujeição especial, nos quais alguns cidadãos

encontram-se submetidos de maneira forçosa ou espontânea.

No direito positivo, o exercício do ato ímprobo deve ser esboçado como um

sistema de responsabilização autônomo, por demonstrar os componentes, o

tipo, a infração, a sanção, o bem jurídico, o processo e por não valer-se a outro

sistema normativo para ser implementado.

A constituição explana a responsabilidade como algo imprescindível pelo qual o

direito reage ao ilícito do agente público e na medida em que a configuração de

um ilícito adjunto a uma determinada sanção, estabelecida em razão da proteção

do bem jurídico e por força do devido processo legal a ser imposto pelo processo

administrativo judicial, temos então presente, o sistema de responsabilidade.

Evidencia-se, portanto que a probidade é o bem jurídico protegido, mas

encontrando-a estabelecida dentro dos moldes constitucionais e não o que a

sociedade determina, como mero caráter de honestidade. O artigo 37, §4º da

CRFB tem um caráter bem maior, o que implica em interpretação dentro da nova

realidade constitucional do Brasil, não se referindo a um ordinário sistema de

combate ao enriquecimento ilícito, constituindo-se como um sistema de

responsabilidade por improbidade administrativa, que é implantado pela Lei nº

8.429/92.

A Lei nº 8.429/92 surgiu para regulamentar o artigo 37, § 4º, da Constituição da

República Federativa do Brasil, que coligiu três categorias de atos de

improbidade administrativa, são elas: atos que importam em enriquecimento

ilícito do agente (artigo 9º da referida lei), atos que causam lesão ao erário

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público (artigo 10º da já mencionada lei) e atos que vão contra os princípios da

administração pública (artigo 11º da mesma lei em questão).

Sabido que no que tange aos atos administrativos os princípios são premissas

que estruturam o ordenamento jurídico, ostentando a forma de interpretação do

direito. Onde a Lei nº 8.429/92 em seu artigo 11º, caput, o legislador fez um

importante trabalho ao salientar a insistência doutrinária na valorização de tais

princípios.

Em razão do referido diploma legal, vale lembrar o que já afirmava Celso Antônio

Bandeira de Melo, em Curso de Direito Administrativo, 1996: "violar um princípio

é muito mais grave que violar uma norma isolada, pois os efeitos do gravame

são, sem dúvida, muito maiores, devido à generalidade e raio de ação dos

princípios".

O artigo 4ª da Lei nº 8.429/92, determina que: "os agentes públicos de qualquer

nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios

de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos

que lhe são afetos.". Onde este, conjugado com o artigo 37, caput, da CRFB: "A

administração pública direta, indireta, ou fundacional, de qualquer dos poderes

da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos

princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência...".

Mostrando tamanha importância e relevância destes para o funcionamento

adequado do Estado Democrático de Direito.

O ilustre autor Celso Antônio Bandeira de Melo, em sua já mencionada obra

Curso de Direito Administrativo, pp. 43/62, salienta que "além dos princípios já

elencados pela constituição de forma expressa, existem outros, sejam eles, o

princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, princípio da

finalidade, princípio da razoabilidade, princípio da proporcionalidade, princípio da

motivação, princípio do controle judicial dos atos administrativos e princípio da

responsabilidade do Estado por atos administrativos".

Com a juntura do Direito Sancionador a um capítulo independente do Direito

Administrativo, foi possível estabelecer a harmonização de conceitos,

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instituições, um regime jurídico próprio e qualificado para compulsar infrações e

suas respectivas sanções, facilitando a compreensão e sistematização nas

relações de direito público.

Na Constituição Federal de 1988, a nomenclatura improbidade administrativa

aparece primeiramente em seu artigo 15, que alude a cassação de direitos

políticos, cuja perda ou suspensão dar-se-á de acordo com inciso V do mesmo,

por prática do predito ato. E outra vez em seu artigo 37, § 4º, quando aduz, “Os

atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos

políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o

ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da

ação penal cabível”.

A autonomia constitucional da responsabilização por improbidade administrativa

não se limita nestes artigos, pelo contrário tem seu marco e incremento em

leitura sistemática e pontual da Constituição da República Federativa do Brasil.

Pode-se constatar tal afirmação ao observar o artigo 1º da CRFB, o texto

normativo transmite os princípios fundamentais e atesta o Brasil como

República, introduzindo o princípio republicano, sendo assim, ao avultar a res

publica, ou seja, o agir em nome do que é público é uma atuação também em

nome da sociedade e não devendo se possuir por interesse pessoal. E por esse

princípio ter como base a responsabilidade que é intento fundador do atual

Estado de Direito Democrático e Social do Direito, avir-se que a improbidade

administrativa tem verdadeira autonomia enquanto instância de

responsabilidade. Enfim, Improbidade Administrativa tem seu conceito definido

como um desvio de conduta que transgride a honestidade e a lealdade na

maneira de conduzir a coisa pública, independente da condição de agente

público ou parceiro privado. Em síntese, representa a falta de integralidade por

parte de quem lida com os bens e poderes cujo possui como único titular o povo.

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3 LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

O sistema judiciário deve manter seu caráter punitivo primário. Tendo aquele,

dificuldade de assegurar o cunho punitivo, por se enveredar em uma sanção que

resultará em mera imposição da multa civil ou uma imposição da proibição de

contratar, precisando resgatar o objetivo primário, deixando o efeito secundário,

ressarcitório, a multa pecuniária, de lado e mostrando que o direito positivo

evoluiu.

A legislação específica que tratada da improbidade administra traz em seu

bojo três hipóteses de improbidade administrativa. Artigos 9º, 10º e 11 da Lei nº

8.429/92 (LIA).

São conceptualizados como atos de improbidade administrativa, as condutas

dolosas ou culposas, sejam elas omissivas ou comissivas, que culminam em

enriquecimento ilícito, que geram prejuízo ao erário público ou que atentem

contra os princípios da Administração Pública.

3.1 ESTRUTURA NORMATIVA DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Os atos de improbidade administrativa tem previsão na Lei nº 8.429/92 sob três

espécies. Os atos que importam em enriquecimento ilícito (art. 9º), os que

causam lesão ao erário (art. 10º) e os que atentam contra os princípios da

administração pública (art.11). Na tipificação deste a lei utilizou de dois modelos

de técnica legislativa para sua aplicação. O emprego de conceitos jurídicos

indeterminados e outros de conteúdo mais específicos e determinado

observados nos incisos dos artigos de cada espécie de improbidade.

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No caput dos artigos, a lei preceituou tipos amplos como: (i) auferir qualquer tipo

de vantagem patrimonial indevida; (ii) provocar lesão ao erário por qualquer ação

ou omissão que enseje perda patrimonial; (iii) praticar qualquer ação ou omissão

que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às

instituições. Essa amplitude permite o enquadramento de situações de fato

mesmo diante da evolução dos métodos de infrações logrado aos princípios da

administração pública, dando "flexibilidade normativa aos mecanismos punitivos,

de tal modo a coibir manobras formalistas conducentes à impunidade" (OSÓRIO.

2010. p. 328).

Tal método reforça o papel do Judiciário a quem compete decidir sobre a

aplicação das sanções por improbidade e que irá desabrochar nos casos em

julgamento os conceitos indeterminados, examinados os parâmetros legislativos

e administrativos de incorporação. O outro modelo adotado na lei preconiza de

maneira específica os tipos legais, a exemplo, "receber vantagem econômica de

qualquer natureza, direta ou indiretamente, para omitir ato de ofício, providência

ou declaração a que esteja obrigado" (art. 9º, X); "conceder benefício

administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais ou

regulamentares aplicáveis à espécie" (art. 10º, VII); e "frustrar a licitude de

concurso público" (art. 11, V).

O sistema tripartite de improbidade detém um vínculo entre eles, de modo que

todo ato de ímprobo já revela uma violação aos princípios da administração (art.

11), antes de poder ser classificado como lesão ao erário (art. 10º) ou

enriquecimento ilícito (art. 9º). É comum nas ações de improbidade a

desclassificação do fato imputado na petição inicial para outro. Para sanar tal

abertura de depreciação, o STJ já firmou entendimento que não "infringe o

princípio da congruência a decisão judicial que enquadra o ato de improbidade

em dispositivo diverso do indicado na inicial, eis que deve a defesa ater-se aos

fatos e não à capitulação legal" (REsp nº 842428. Rel. Min. Eliana Calmon).

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3.2 IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E ENRIQUECIMENTO ILÍCITO

Os tipos que traduzem enriquecimento ilícito estão previstos no art. 9º, da Lei

nº 8.429/92.

São os atos que manifestam qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida

e reproduzem maior gravidade, sancionadas com maior seriedade pelo

legislador. Por isso, as sanções para quem é tipificado nessa conduta se

amoldam no artigo 12, inciso I, da LIA. As penalidades possuem a opção de

serem aplicadas de formas isoladas ou em conjunto e constituem: perda dos

bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio; o ressarcimento integral

do dano, quando identificado; a perda da função pública; a suspensão dos

direitos políticos de oito a dez anos; o pagamento de multa civil de até três vezes

o valor do acréscimo patrimonial e a proibição de contratar com o Poder Público

ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente,

ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo

prazo de dez anos. Tudo isso, sem dependência das sanções penais, civis e

administrativas previstas na legislação específica.

O reconhecimento do enriquecimento ilícito não

implica necessariamente produção de dano ao erário. Algumas figuras típicas

refletem o dano ao erário (art. 9° II, III, IV, VI, XI e XII) e outras não exigem o

dano (art. 9º, caput, I, V, VII, VIII, IX e X). Compete evidenciar que certos tipos

trazem a necessidade de exame do ato administrativo onde se deve identificar a

ofensa à legalidade ou juridicidade para integrar a norma sancionatória (art. 9º,

II, III, VI, X).

O Judiciário Brasileiro tem alicerçado entendimento que nos casos de atos que

contrariem os Princípios da Administração Pública e que corroboram em

enriquecimento ilícito somente haverá punição se comprovado o dolo. Para os

casos de atos que ocasionam prejuízo ao erário basta a culpa.

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Neste sentido:

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ALEGAÇÃO DE IRREGULARIDADES NA DISPENSA DE LICITAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVA QUE DEMONSTRASSE O PREJUÍZO AO ERÁRIO E O DOLO DO AGENTE. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Não houve prejuízo ao Erário, tampouco dolo na conduta do agente, o que afasta a incidência do art. 11 da Lei 8.429/92 e suas respectivas sanções; esta Corte Superior de Justiça já uniformizou a sua jurisprudência para afirmar que é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado no dolo, para os tipos previstos nos arts. 9o. e 11 e, ao menos, na culpa, nas hipóteses do art. 10 da Lei 8.429/92” (REsp. 1.261.994/PE, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 13/04/12)."

Ou seja, a conduta para se enquadrar no art. 9º requer dolo, a consciência pelo

agente de sua ilicitude.

3.3 PREJUÍZO AO ERÁRIO

Os tipos que prescrevem prejuízo ao erário estão contidos no art. 10º, da Lei nº

8.429/92.

O referido ato é tido com gravidade intermediária, por não enriquecerem

ilicitamente o agente, e sim provoca lesão aos cofres públicos, quer seja pela

ação ou omissão dolosa ou culposa. As penalidades também podem ser

impostas isolas ou em conjunto e constituem: ressarcimento integral do dano,

perda dos bens acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se convergirem esta

circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco

a oito anos, o pagamento de multa civil pode chegar até duas vezes o valor do

dano e acarretar a proibição de contratar com o Poder Público ou receber

benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que

por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de

cinco anos. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas

previstas na legislação.

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As condutas sui generis dos incisos do art. 10º podem ser associadas através

de dados comuns e que não estão presentes em norma geral e outros que

refletem sua especificação, como: (i) o enriquecimento ilícito de terceiro (art. 10,

I, II, III, XII, XIII); (ii) as fraudes em licitações (IV, V); (iii) a desídia na concessão

de benefícios e na arrecadação tributária (VII, X) e, (iv) a gestão irregular de

recursos e negócios públicos (VI, IX, XI).

O STJ possui jurisprudência consolidada no entendimento de que o "ato de

improbidade administrativa previsto no art. 10º da Lei nº 8.429/92 exige a

comprovação do dano ao erário" (REsp 1151884/SC, Rel. Min. Castro Meira).

Assim, é primordial que haja prejuízo patrimonial efetivo, o que fica evidente pela

obrigatoriedade de ressarcir integralmente o dano previsto no art. 12, II para o

caso do art. 10º e nas demais possibilidades de ressarcimento quando houver.

3.4 ATOS QUE ATENTAM CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO

Os tipos que prescrevem ofensa aos princípios da administração pública estão

contidos no art. 11, da Lei nº 8.429/92.

Estes são tidos como atos de “menor gravidade”, eis que não causam

enriquecimento ilícito ou dano ao Erário, mas depreciam os princípios da

Administração Pública. Assim como as outras penalidades, também podem

implicar na aplicação isolada ou em conjunto e constituem: ressarcimento

integral do dano se houver perda da função pública, suspensão dos direitos

políticos de três a cinco anos, o pagamento de multa civil de até cem vezes o

valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o

Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio

majoritário, pelo prazo de três anos. Tudo isso, independentemente das sanções

penais, civis e administrativas previstas na legislação específica.

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Ressaltando que o desrespeito aos princípios da Administração Pública, por si

só, enseja a propositura da ação de improbidade administrativa.

A norma do art. 11 caput estabelece um tipo abrangente de ação ou omissão

que viola os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às

instituições.

Podendo operar a função secundária, porque a conduta funcional, ilegal, e

parcial não tipificada nesses incisos poderá ser subsumida na norma aludida ou

atuará como norma de reserva, já que mesmo a conduta não ocasionando danos

ao patrimônio público ou enriquecimento ilícito do agente, a improbidade ainda

poderá se configurar sempre que restar demonstrada a inobservância dos

princípios que norteiam a atividade estatal. Coincidindo com o dever de

observância dos agentes públicos no tocante aos princípios da legalidade,

impessoalidade, moralidade e publicidade expostos no art. 40 da CRFB com os

deveres que exprimem o princípio da moralidade de honestidade,

imparcialidade, legalidade e lealdade presentes no art. 11.

As atividades que importarem enriquecimento ilícito (artigo 9º) ou afrontarem os

princípios da Administração Pública (artigo 11) somente estarão tipificadas se

ficar demonstrado o dolo do agente, a vontade livre e consciente da prática do

ato. Entretanto, se for o caso de dano ao Erário, à demonstração da culpa do

agente, quer seja por negligência, imprudência ou imperícia, já será o suficiente.

4 CONTROLE JUDICIAL DO ATO DE IMPROBIDADE

A instituição responsável pelo combate à corrupção tem como uma das

principais formas a ação judicial aplicada à prática do ato de improbidade que

transcorre pelo rito ordinário, devendo ser proposta pelo Ministério Público ou

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pessoa jurídica interessada. Não foi assegurada legitimidade ao cidadão para

propositura da ação.

Entretanto, qualquer pessoa capaz poderá propor representação direcionada à

autoridade administrativa responsável para que seja instaurada investigação

para apurar a prática de ato de improbidade.

Far-se-á necessário a distinção entre improbidade formal e improbidade

material: a primeira exige-se a acomodação da situação de fato à previsão legal

de violação aos princípios da administração (art. 11). Calhando utilizar o recurso

à integração das leis regedoras do conteúdo da matéria e dos pressupostos de

validade do ato administrativo (art. 2º da Lei nº 4.717/65 - lei da ação popular),

eis que grande parte dos tipos da lei de improbidade remetem a uma avaliação

da ilegalidade do ato. A conduta deve ser apreciada no cotejo com os princípios

da administração, pois, antes de configurarem enriquecimento ilícito a conduta é

ofensiva a princípios da administração. Constatada a ilegalidade ou

injuridicidade e classificada a conduta como ofensiva a princípio da

administração deve-se mensurar se houve dano ao erário ou enriquecimento

ilícito que justifique eventual mudança de classificação jurídica da conduta para

o art. 9º ou art. 10º. Na segunda, tem-se como análise da conduta sob a ótica da

ofensa relevante aos bens jurídicos tutelados nos artigos. 9º, 10º e 11, em

concretização ao art. 37, da Constituição Federal Brasileira. Preza-se aqui pela

conferência do desvalor da ação e do resultado no caso concreto para distinguir

a relevância material da agressão criminosa pela conduta ilícita, de modo ao

englobar o ato de interpretação para constatar o elemento axiológico no caso e

que autoriza a tipificação material. Já com o caso concreto, ocupa-se mostrar a

reduzida capacidade da ação em produzir ofensa ao bem jurídico tutelado. O

próximo ponto é a aferição do elemento subjetivo para averiguar se houve dolo

ou culpa na conduta. O dolo é exigido para os tipos dos artigos 9º, 10º e 11, e a

culpa apenas para o art. 10º.

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5 AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA VERSUS AGENTES

POLÍTICOS

Maria Silvia Zanella Di Pietro aduz que: “São, portanto, agentes políticos, no

direito brasileiro, apenas os Chefes dos Poderes Executivos federal, estadual e

municipal, os Ministros e Secretários de Estado, além de Senadores, Deputados

e Vereadores.”.

Em outras palavras, a Lei nº 8.429/92 prossegue aplicável para os agentes

públicos e políticos que não possuem foro por prerrogativa de função conforme

trata o artigo 102, I, “c”, da Constituição da República Federativa do Brasil.

Sendo este o desígnio pelo qual os prefeitos, são submetidos à lei de

improbidade administrativa, e à ação penal por crime de responsabilidade,

seguindo o entendimento do Decreto-lei nº 201/67, em decorrência do mesmo

fato.

6 ESPÉCIES DE SANÇÕES

A sanção lícita é a sequela que deve atingir o gestor público que não cumpre

formalmente o que está expresso em norma jurídica que tem por finalidade,

proteger a probidade administrativa. O art. 37, § 4º, da Constituição Federal da

República do Brasil faz alusão as seguintes hipóteses de penalidade: (i) perda

da função pública; (ii) suspensão dos direitos políticos; (iii) ressarcimento ao

erário; e, (iv) indisponibilidade de bens. Esta última, mesmo contendo previsão

no ordenamento jurídico ao lado das demais citadas, apresenta âmago diverso

de uma sanção jurídica, qualificando-se como uma medida acautelatória a ser

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decretada nos termos do art. 7º, da LIA.

A Lei de Improbidade Administrativa a respeito de ter conteúdo civil, solidifica-se

em um regime jurídico coercitivo na defesa da probidade administrativa e soma

às sanções constitucionais, as seguintes: (i) perda de bens ou valores acrescidos

ilicitamente; (ii) multa civil; (iii) proibição de contratar com o Poder Público; e, (iv)

proibição de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.

6.1 PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA

Imputada somente aos administradores públicos que assumam a

incumbência de exercer um composto de atribuições públicas fixadas por lei,

com o intuito de que seja realizado o interesse público.

O propósito desta punição é a extinguir o elo jurídico existente entre o agente

público e o Poder Público. Alcançando aos titulares de cargos efetivos,

permanentes, comissionados, os empregados públicos e os que têm mandato

administrativo.

6.2 RESSARCIMENTO AO ERÁRIO

Por ter ação reparatória, não pode ser taxada como uma sanção pura, o que

resultaria em aplicação cumulativa com pena jurídica prenunciada no art. 12 da

LIA. Logo, os bens podem ser penhoráveis por aplicação acertada da Lei

8009/90, art. 3º, inciso VI.

6.3 MULTA CIVIL

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18

Tara-se de uma pena pecuniária, que tem a opção de ser convertida em favor

do prejudicado e não somente a previsão a que se refere o art. 13 da Lei nº

7.347/85. Tem escopo em punir o agente ímprobo. Por ser de caráter positivo

obstrui a solidariedade e trespassa à pessoa do condenado. Por força do art. 20

da LIA, aplicando-se as regras do processo civil para a execução provisória do

julgado e não exige o transito em julgado.

6.4 CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO

Essa sanção vai da pessoa física à jurídica e tem como fim interpor barreiras nas

relações bilaterais com o Poder Público. Caso esteja em vigência um contrato

administrativo onde uma pessoa jurídica foi considerada ímproba, a abertura de

um processo administrativo far-se-á necessário para que no final cumule na

própria extinção unilateral do mencionado contrato. Agora, no que tange a fase

licitatória, o agente corrompido deve ser inabilitado. Essa é a inteligência exalada

nos artigos 32, par. 2º, 78, I, e 79, I, todos da Lei n. 8666/93.

6.5 PROIBIÇÃO DE RECEBER BENEFÍCIOS OU INCENTIVOS FISCAIS OU

CREDITÍCIOS

Almeja dificultar ao agente ímprobo que agiu de má fé para com o Poder Público

possa se valer de benefícios da legislação em vigor. Assim, temos os casos com

moratória, do parcelamento de débitos tributários, da isenção tributária, da

anistia, entre outros.

6.6 INDISPONIBILIDADE DOS BENS

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19

De exórdio acautelatória e disciplinada pelo Art. 7º, da LIA; não se trata

verdadeiramente de uma sanção jurídica, condigno, ao seu conteúdo e regime

jurídico.

7 CRITÉRIO DE APLICAÇÃO DAS SANÇÕES

Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade encontram-se firmados

em qualquer estrutura de um sistemática jurídica punitiva pois, fazem o possível

para a individualização da sanção aplicada; assumindo a personagem o papel

de responsável pela adequação da sanção da improbidade administrativa e as

circunstâncias de cada ilícito configurado.

Tal qual jurisprudência do STJ, essas penalidades não requerem

necessariamente aplicação de forma cumulativa, neste sentido:

“Incumbe ao magistrado ministrar as sanções com base

na feição, gravidade e consequências do ato. É

elementar, sob pena de nulidade, a demonstração das

razões para a aplicação de cada uma delas, levando em

consideração os princípios da proporcionalidade e da

razoabilidade”(REsp 658.389, Rel. Min. ELIANA

CALMON).

8 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA

Em observância ao princípio da segurança jurídica, não é plausível descartar a

prescrição, afora nos casos em que o Constituinte decida estabelecer a

estratégia da imprescritibilidade, conforme art. 37, § 5º, CRFB em que a ação de

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20

ressarcimento do dano gerado pela improbidade é imprescritível, nos termos do

dispositivo citado. Tanto o conteúdo da prescrição quanto ao tema diz respeito à

pretensão punitiva estatal e não à extinção da ação. Seguindo o mesmo

entendimento que José Carvalho dos Santos Filho, para quem a pretensão

nasce com a violação do direito, sendo a ação a conduta positiva para fazer valer

a pretensão que formalmente se desenvolve com a propositura de uma ação

judicial. (CARVALHO FILHO, 2012. p. 109.)

A LIA, em seu art. 23 decreta em dois incisos as hipóteses de prescrição, sendo

que o inciso um se caracteriza pela transitoriedade, veja: (i) - até cinco anos após

o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de

confiança; enquanto que o inciso dois se mantém pontual: (ii) - dentro do prazo

prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com

demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou

emprego.

O prazo aceitável ao agente político é o idêntico aos particulares relacionados

ao ato ímprobo e que por ele poderão responder ao lado do agente público. E

também no caso de o co-réu ser um particular, o ressarcimento de danos é

imprescritível. O termo inicial da contagem coincide com o momento em que

legitimado ativo apto a propositura da ação tem consciência inequívoca do ato

ímprobo, conforme Superior Tribunal de Justiça.

A prescrição é cessada pela notificação válida do requerido para apresentar a

sua manifestação preliminar (art. 17, § 7º, da LIA), atentando-se, ao artigo 219

do CPC e o artigo 202 do Código Civil. Caso não ocorra notificação prévia, é a

citação que terá a força interruptiva da prescrição. Ademais, nos termos da

Súmula 106 do STJ: “Proposta ação no prazo fixado para o seu exercício, a

demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da justiça, não justifica

o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência".

O prazo prescricional deve ser contado exclusivamente, de acordo com as

condições de cada réu, por disposto e a própria essência subjetiva da pretensão

sancionatória e do instituto em tela (CARVALHO FILHO. 2012. p. 120 e 121).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os processos que correm em primeira instância da Justiça Federal ou na esfera

Estadual, com fundamento na Lei 8.429/92 estão encalhados em obstáculos

procedimentais sem perspectiva de julgamento ou que sá uma futura

condenação. As ações, que entopem o judiciário na tentativa de protelar uma

condenação certa, eis que resta provada a existência do ato de improbidade,

disseminadas por diversas varas militam a favor dos acusados.

Considerando que nesses processos, as sanções dos artigos. 9º, 10º e 11, da

Lei de Improbidade Administrativa, podem acarretar em suspensão dos direitos

políticos, o ressarcimento ao erário por lesões de vulto e diversas interdições de

direito, o tempo já decorrido desde a apuração dos fatos e o ajuizamento das

ações, até o indefinido presente, deixa no ar uma desoladora sensação de

impunidade que, acredita-se, não se concretizar.

Além do encravo que a violação dos princípios administrativos nos traz, a

negação da eficácia da Lei nº 8.429 e, por conseguinte, do artigo 37 §4º da

Constituição da República Federativa do Brasil, ao incidirem sobre personagens

públicos de destaque. Leva-se a acreditar que são inúteis a esperança

germinada no povo brasileiro por esses dispositivos políticos-jurídicos, quando

se trata de uma Administração Pública proba, transparente e impessoal.

A impunidade e a frustração da crença popular na realização da justiça têm sido

ao longo da História a radiação da fragilização da democracia e o adubo que

fertiliza o desprezo pelas leis e pela confiança popular. Para não dizer a

perpetuação de um vício tão devastador que é a subversão das finalidades do

Estado, direcionando o poder para a satisfação de interesses privados.

Tal Leniência tem adequação perfeita ao ditado que os mais antigos sempre

dizem ao ver à agitação de algum jovem para concluir logo uma atividade

qualquer: “a pressa é inimiga da perfeição”, e hoje, dentro deste contexto, a

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lentidão passa a ser a mais forte aliada da imperfeição e atua contra a realização

de uma justiça igualitária a todos.

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REFERÊNCIAS

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GOMES,Laurentino.1808 - Como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma

corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e do

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LINDLEY,Thomas.Narrativa de uma viagem ao Brasil.Editora:Brasiliana;

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MAQUIAVEL,Nicolau.O Príncipe.São Paulo. Universo dos Livros – 2009;

MELLO, Celso Antônio Bandeira De.Curso De Direito Admistrativo.Editora:

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OSÓRIO, Fábio Medina. Teoria da Improbidade Administrativa. 2º ed. São Paulo:

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_______.LEI Nº 8.429, DE 2 DE JUNHO DE 1992;

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_______.Supremo Tribunal de Justiça. SÚMULA 106;

CALMON, Rel. Min. Eliana. REsp nº 842428;

_______.Resp nº 658.389;

GONÇALVES, Rel. Min. Benedito. REsp. 1.261.994/PE;

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MEIRA, Rel. Min. Castro. REsp 1151884/SC;