izael bezerra de sousa - portal.trf1.jus.br...6 sgreccia, elio. manual de bioética. fundamentos e...

66
CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA - CESB INSTITUTO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA IESB BACHARELADO EM CIÊNCIAS JURÍDICAS As relações entre a manipulação genética humana e o Direito Penal Izael Bezerra de Sousa Brasília, 10 de maio de 2008

Upload: others

Post on 10-Aug-2021

10 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA - CESB

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA – IESB

BACHARELADO EM CIÊNCIAS JURÍDICAS

As relações entre a manipulação genética humana e o Direito Penal

Izael Bezerra de Sousa

Brasília, 10 de maio de 2008

Page 2: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

1

IZAEL BEZERRA SOUSA

AS RELAÇÕES ENTRE A MANIPULAÇÃO GENÉTICA HUMANA E O

DIREITO PENAL

Artigo apresentado como exigência

parcial ao grau de Bacharel em Direito,

do Instituto de Educação Superior de

Brasília (IESB).

________________________________________

Orientador: Prof. Bruno André da Silva Ribeiro

Instituto de Educação Superior de Brasília

__________________________________________

Avaliador: Prof. Luiz Carlos Bivar Corrêa Júnior

Instituto de Educação Superior de Brasília

Page 3: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

2

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABREVIATURAS

Art. - por artigo

Cf. - por conforme ou confira

Id. - por idem

Ibid. - por ibidem

Org. - organizador

n. - número

SIGLAS

ADN - Ácido Desoxirribonucléico

ARN - Ácido Ribonucléico

CDC - Código de Defesa do Consumidor

CF - Constituição Federal

CFM - Conselho Federal de Medicina

CQB - Certificado de Qualidade em Biossegurança

CT - Células-tronco

CTNBio - Comissão Técnica Nacional de Biossegurança

DNA - Ácido Desoxirribonucléico

EIA - Estudo de Impacto Ambiental

EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

EUA - Estados Unidos da América

HIV - Síndrome de Imunodeficiência Adquirida

IDEC - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor

OGM - Organismo Geneticamente Modificado

PROCON - Procuradoria do Consumidor

RIMA - Relatório de Impacto do Meio Ambiente

RNA - Acido Ribonucléico

UNICAMP - Universidade de Campinas

Page 4: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

3

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO __________________________________________________________ 4

Capítulo 1 _______________________________________________________________ 6

Genética, Bioética e Direito _________________________________________________ 6

1.1 A Genética Humana: Conceitos Fundamentais ___________________________ 6

1.2 A Bioética __________________________________________________________ 8

1.3 A intervenção do Direito _____________________________________________ 10

1.3.1 O Respeito à Dignidade Humana como Paradigma do Estado Democrático de

Direito ______________________________________________________________ 12

1.4 Estatuto Jurídico do Nascituro ________________________________________ 14

Capítulo 2 ______________________________________________________________ 16

Modernas Técnicas de Manipulação Genética ________________________________ 16

2.1 Reprodução Humana Assistida _______________________________________ 17

2.1.1 A Fecundação “in vitro” ou Fecundação com Embryo-Transfer (FIVETE) ____ 18

2.2 Diagnóstico Genético ________________________________________________ 20

2.2.1 Eugenia ________________________________________________________ 21

Capítulo 3 ______________________________________________________________ 23

3.1 Finalidade e Abrangência da Lei n. 11105/05____________________________24

3.2 Fiscalização e Responsabilidade Civil Objetiva____________________________27

Capítulo 4______________________________________________________________30

A Tutela Penal da Manipulação Genética______________________________________30

4.1 Conceito e Missão do Direito Penal____________________________________30

4.2 Bem Jurídico-Penal__________________________________________________32

4.3 Direito Penal e Constituição____________________________________________34

4.4 O Capítulo III da Lei 11.105/2005 - Lei de Biossegurança____________________38

4.5 A Criminalidade Genética_____________________________________________42

CONCLUSÃO __________________________________________________________ 44

REFERÊNCIAS ________________________________________________________ 46

ANEXO _______________________________________________________________ 49

LEI Nº 11.105, DE 24 DE MARÇO DE 2005._________________________________48

Page 5: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

4

INTRODUÇÃO

As procriações artificiais vieram revelar aos juristas diversos dados negligenciados

e que estão a exigir reais avaliações: de um lado, os progressos científicos comprovaram a

lacuna jurídica - ou a incompletude da ordem jurídica - nestas matérias; de outro, fizeram

rever princípios clássicos, fazendo-se necessária a interferência jurídica, não só para

compatibilizar o controle da atuação científica (evitando inaceitáveis abusos) com a

necessidade de investigação biológica (da genética e de certas doenças), mas também para

solucionar conflitos gerados por questões ainda não resolvidas.

As pesquisas genéticas centradas na reprodução humana assistida, reprodução in

vidro., foi o tema do desdobramento da biotecnologia escolhidos para o aprofundamento da

pesquisa, apresentando os primeiros frutos e os expondo à crítica. Pretende-se, mesmo de

maneira até breve e não muito profunda, estabelecer maior intimidade com as técnicas de

manipulação genética, com o intuito de poder verificar a repercussão dos avanços nessas

áreas.

Houve maior preocupação com o objetivo de relacionar o progresso da ciência e

das ciências jurídicas, ressaltando-se que é pontual, já que se ocupa de um objeto muito

preciso: o Direito Penal e a manipulação genética, chamando a atenção para a importância

crescente da biotecnologia, nos seus aspectos econômicos, políticos e sociais, enfatizando

o papel da informação e do conhecimento científico no processo de desenvolvimento

econômico e, principalmente, a responsabilidade política e social dos cientistas no domínio

da genética e na função que ela pode ter na explicação dos fenômenos sociais e culturais.

Mesmo deparando-se com a escassez de obras sobre o assunto no Brasil, bem como

nos outros países e na nossa pobre legislação, no que tange à regulamentação do tema,

buscou-se analisar a Lei n. 11.105/95, que regulamenta os incisos II e V, do §1º, do art.

225, da Constituição Federal, que estabelece normas para o uso das Técnicas de

Engenharia Genética com a participação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança

(CTNBio) e, também a Resolução do Conselho Federal de Medicina, de n.° 1.358/92, que

tratam de maneira tênue sobre o tema.

No campo específico do Direito Penal, depois da definição e as delimitações acerca

do bem jurídico-penal que entendeu-se ser digno de proteção da arma mais coercitiva

Page 6: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

5

presente no nosso Estado Democrático de Direito, cumpre estabelecer-se em que quantum

deve ser mensurada essa interferência do Estatuto Repressor na tutela da nova genética.

Nessa sentido, questiona-se as figuras delitivas presentes na Lei de Biossegurança e os

critérios que, numa análise correlata, foram utilizados pelo legislador.

O que torna poderosa a Engenharia Genética é a conseqüente manipulação e

transferência de material genético, interferindo na complexidade da vida e da saúde

publica, sendo possível, por exemplo, que surjam novas formas de discriminação na

composição genética das pessoas, temendo-se a discriminação de indivíduos considerados

geneticamente inadequados e a poluição biológica pode vir a ser pior do que a poluição

química.

É bem por isso que se deve atentar, com seriedade, para o novo tipo de

criminalidade – a criminalidade genética -, que deve ser estudada com profundidade e que

demanda uma normatização internacional, para se evitar refúgios ou paraísos genéticos, e

uma normatização interna enquanto não houver a sempre esperada ordem supra-estatal.

Vale no entanto enfatizar que não se pode partir para uma criminalização sem peias,

pois a criação indiscriminada de tipos penais, em matéria genética, máxime em relação a

condutas que não adquiriram ainda a necessária visibilidade, pode conduzir a um

refreamento total da pesquisa e um conseqüente dano ao progresso científico.

Assim, a consciência da provisoriedade pode justificar uma interferência do

legislador contrária às premissas de consenso e gradualidade, com a finalidade de

evitar prejuízos graves e irreparáveis nos desdobramentos ainda não bem conhecidos

de determinadas atividades ligadas à biotecnologia, mas ao mesmo tempo ajustando-

se para que não se interponham freios e obstáculos sem paralelo com o emprego de

atividades benéficas. Deve-se harmonizar de forma efetiva o progresso científico com a

dignidade da pessoa humana, conforme preceitua a Constituição Federal, nesta contínua e

gratificante tarefa de sempre pensar dinamicamente o Direito.

Page 7: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

6

Capítulo 1

GENÉTICA, BIOÉTICA E DIREITO

1.1 A Genética Humana: Conceitos Fundamentais

Historicamente, a humanidade sempre revelou intensa preocupação com a questão

da fecundidade e, inversamente temeu o risco da esterilidade, motivo de degradação no

grupo familiar e social, principalmente entre os hebreus, gregos e romanos. As primeiras

manifestações de arte, que remontam à época primitiva, representam a mulher fecunda,

grávida, capaz de gerar novos seres à exemplo da mãe natureza1.

Reza a cultura judaica que, ao se questionar quem é judeu, a resposta vem pronta e

indelével: o filho de mãe judia!. O que lembra o aforismo - mater semper certa est, pater

autem incertus - a mãe é sempre certa, o pai presumido.

Gregor Mendel (1822-1884) é considerado o “pai da genética”, pois em seus

experimentos com ervilhas de jardim publicados em 1866, foi o primeiro a considerar os

resultados em termos de características individuais, contando e classificando as ervilhas

resultantes de cruzamentos e formulou hipóteses para explicar essas diferenças.

No século XX, a engenharia genética foi uma das áreas do conhecimento que

apresentou um dos mais vertiginosos crescimentos, sobretudo a partir da década de 70.

Possibilitou a combinação dos genomas de plantas, animais e microorganismos, genes de

organismos distantes, antes incompatíveis. Contudo o uso desse conhecimento requer

prudência, limites legais e, sobretudo, mais conhecimento. Não só da biologia, mas dos

sentimentos, do pensamento e das relações humanas.2

A Genética Humana engloba hoje duas questões fundamentais expressas por

duas expressões latinas: generare e genus. Generare significa procriação, ou seja,

todas as técnicas que levam à procriação em laboratório, ou mesmo a uma procriação

em face da infertilidade do casal. Genus significa patrimônio, significa espécie, isto é,

1 QUEIROZ, Carla de.; FERRAZ, Sylvia Barboza.; PINTO, Virgílio. História da civilização. São Paulo:

Companhia Editora Nacional, 1984, pp. 35-83. (Coleção Sérgio Buarque de Hollanda). 2 Revista Super Interessante, n. 134. São Paulo: Abril, nov. de 1998, p. 4.

Page 8: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

7

a possibilidade de alteração ou de investigação sobre o patrimônio genético. Essas são

as principais vertentes de investigação e estudo em genética3.

As indagações acerca do DNA4 e RNA

5, a partir da demonstração monumental

em 1953 pelo americano James Watson e o inglês Francis Crick, da imagem da

molécula de DNA, em que se situa o gene, ou seja, o determinante genético,

encontrado nos cromossomos e responsável pelos caracteres hereditários como cor da

pele, dos olhos, do cabelo, foram fatores determinantes no desenvolvimento da

genética. Sendo assim, a genética é uma ciência de potenciais, tratando da

transferência de informação biológica de célula para célula, dos pais para os filhos, de

geração para geração, preocupando-se com as formas e as razões dessas

transferências, que são a base para certas diferenças e semelhanças reconhecidas nos

diversos grupos de seres vivos.

Não existe ainda um consenso acerca da terminologia utilizada nessas modalidades

de intervenção sobre a vida, principalmente por não se conhecerem bem as possibilidades

dessas técnicas, bem como o dinamismo e atualidade do assunto. O que apresenta a

necessidade de fazer o esclarecimento de dois importantes conceitos, o de manipulação

genética, tratada como uma designação bastante genérica e significando uma intervenção

qualquer (manipular: manusear, transformar com as mãos) sobre o patrimônio genético

(conjunto de todos os genes formadores do complexo bioquímico formador dos pares de

DNA) e a engenharia genética: “um conceito mais preciso, entendido como o conjunto de

técnicas que tendem a transferir para a estrutura da célula de um ser vivente algumas

transformações genéticas que de outro modo não teria tido”6.

O esclarecimento desses conceitos e o interesse na preservação do patrimônio

genético justificam-se pela possibilidade de por intermédio da manipulação genética se

“construir” um ser vivo, o que acarreta implicações éticas, médicas e jurídicas. Revela-se o

3 Cf. ESER, Albin. Genética Humana: aspectos jurídicos e sócio-políticos. Revista Portuguesa de Ciência

Criminal, Ano 2, fasc. 1, p. 45, 1992. Nesse sentido FRANCO, Alberto Silva. Genética Humana e direito.

Bioética. Brasília:Conselho Federal de Medicina, 1996. n. 4, p. 17-29. 4 “DNA - Ácido Desoxirribonucléico: designação comum a vários ácidos nucléicos dos quais, pela hidrólise,

se obtém desoxirribose e que se encontram especialmente em núcleos das células e como um dos

constituintes principais da cromatina. Sigla: ADN ou DNA”. Michaelis. Moderno dicionário da língua

portuguesa. São Paulo: Melhoramentos, 1999, p. 41. 5 “RNA - Ácido Ribonucléico: diz-se de vários ácidos nucléicos, dos quais se obtém ribose pela hidrólise, e

que são encontrados no citoplasma e em alguns núcleos”. Michaelis. Op. cit. p. 1844. 6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996.

p. 213.

Page 9: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

8

sonho de Adous Huxley, quando imaginou seu Admirável mundo novo7 em uma sociedade

utópica onde o progresso da ciência atinge de sobremaneira os seres humanos, concebidos

e gestados em laboratório, sob controle de cientistas do Estado.

A possibilidade de enfrentamento dessas questões cruciais acerca do que fazer com

as tecnologias que atingem o ser humano, estão mais atuais do que nunca e apontam como

uma maneira de debater o assunto e buscar uma solução humanitária para a matéria.

1.2 A Bioética

O desenvolvimento das modernas tecnologias de reprodução traz à baila estudos

interdisciplinares que açambarcam, dentre outros, a medicina, a biologia, o Direito e a

ética.

Leo Pessini e Christian de Paul de Barchifontaine.8 Segundo Elio Sgreccia

9, a

tese original da reflexão bioética, como “ponte para o futuro”, é de que é impossível

separar os valores éticos (ethics values) dos valores biológicos (biological facts); daí a

explicação para a composição grega do neologismo: “bio” representa a ciência dos

seres viventes, e “ethike”, o conhecimento dos sistemas de valores humanos.

A Bioética tem implicações ético-morais decorrentes das descobertas e técnicas

oriundas da Medicina e da Biologia. Dessa maneira assinala Matilde Carone Conti: “Busca

entender o significado e alcance dessas descobertas, com intuito de lançar regras que

possibilitem o melhor uso dessas novas tecnologias”10

.

Em episódios como o Julgamento de Nuremberg11

, em 1945, a opinião pública

mundial teve conhecimento dos abusos contra a humanidade realizados em nome da

ciência e da tecnologia nos campos de concentração nazistas. Fatos como a utilização de

homens, mulheres e crianças como animais de laboratório, não permitiram um progresso

7 HUXLEY, Aldous. Admirável mundo novo. 15 ed. São Paulo: Abril cultural, 1981.

8 PESSINI, Léo & BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problemas atuais de bioética. 4 ed. rev. e

amp. São Paulo: 1997, p. 14. 9 SGRECCIA, Elio. Op cit., p. 24.

10 CONTI, Matilde Carone Slaibi. Ética e direito na manipulação do genoma humano. Rio de Janeiro:

Forense, 2001, p. 10. 11

Após a 2ª Guerra Mundial, foram considerados como criminosos de guerra, vinte médicos pela prática de

experimentos realizados em seres humanos. O julgamento foi realizado pelo Tribunal de Nuremberg (um

tribunal de exceção, criado pelas circunstâncias brutais da guerra) e condenou alguns dos referidos médicos,

inclusive à pena de morte. Através do documento Relatório de Nuremberg, essas informações foram

divulgadas, assim como as primeiras recomendações éticas internacionais na pesquisa em seres humanos.

Page 10: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

9

científico válido e legítimo. Nesta perspectiva, a manipulação do material genético,

derivado de microorganismos, de vegetais, de animais ou de seres humanos, coloca em

evidência questões como a preservação ecológica, dos animais e da saúde humana na busca

da promoção do desenvolvimento econômico concomitantemente com a preservação da

qualidade de vida.

Pela primeira vez na história humana, tecnologias foram capazes de revelar e

alterar a dinâmica temporal e espacial da estrutura de qualquer ser vivo,

modificando as regras naturais de composição dos sistemas biológicos. Mas, será que

de fato, podemos modificar a composição genética dos seres vivos? Será que

desejamos assumir os riscos decorrentes das atividades de engenharia genética?

Questões como estas rondam o nosso imaginário. As especulações filosóficas e

jurídicas vêm estabelecendo os limites inerentes ao respeito à vida, à dignidade humana, à

liberdade, à igualdade e à segurança. Ao lado dessas limitações surgem as questões da

deontologia12

profissional e dos códigos supranacionais.

Visando atender as solicitações, tanto da comunidade científica como da sociedade,

começando as atenções a se voltarem para as incertezas e riscos inerentes às inovações

tecnológicas, foram formulados os princípios da Bioética.

Para Vicente de Paula Barretto, desde o primeiro momento a bioética procurou

formular princípios gerais que pudessem servir de mandatos de otimização na criação de

normas aplicáveis à pesquisa e tecnologia genética. Os princípios seriam normas que

determinam a realização ou não de algo dentro das possibilidades existentes. A otimização

a que se refere são assim chamadas, devido ao fato de poderem ser cumpridos em

diferentes graus, sendo que a medida do grau de cumprimento dependerá das

possibilidades reais e jurídicas que cercam o ato, o que se ajusta exatamente nas ordens

jurídicas que estão em construção13

.

Pode-se concluir então que esses princípios constituem-se em instrumentos de

regulação e são utilizados quando não se encontram respostas no direito positivo para os

problemas decorrentes das inovações científico-tecnológicas, durante o processo de

constituição e criação das normas. Assim, os princípios são considerados como um espaço

12

“Deontologia: Parte da filosofia que trata dos princípios ou fundamentos das ciências éticas; estudo dos

deveres profissionais”. DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. São Paulo: Saraiva, 1998. v. 2, p. 59.

Page 11: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

10

normativo anterior ao direito positivo, apto a suprir as lacunas do direito. Nota-se,

portanto, que a construção dos princípios da Bioética não teve como foco o exercício das

virtudes, mas a necessidade de preenchimento do vazio dogmático encontrado no contexto

da pesquisa científica, expressando seus valores éticos aceitos14

.

Os traços desses princípios da Bioética, foram riscados baseando-se no caráter

deontológico, onde prevê o respeito a vontade do paciente, levando-se em conta seus

valores morais e religiosos, ou seja reconhece o domínio do paciente sobre a própria vida,

demanda ainda o atendimento médico dos interesses do paciente envolvidos, de maneira a

evitar qualquer tipo de dano e por fim demanda a imparcialidade na distribuição dos riscos

e benefícios, onde os iguais deverão ser tratados igualmente 15

.

A nova realidade suscitou dúvidas, que não foram resolvidas pelo sistema jurídico

existente, provocando o surgimento de uma dogmática paralegal. Essa dogmática se

materializou por princípios da bioética a diferentes casos não previstos em lei, criados por

organismos não judiciais, como os conselhos de medicina e de forma crescente, os comitês

de ética dos hospitais e diversos institutos de pesquisa.

Caberia, portanto, à bioética, estabelecer limites racionais para a construção de um

novo sistema jurídico - o biodireito - a fim de disciplinar as relações entre o homem e a

ciência, ao mesmo tempo evitando tornar-se um empecilho para o progresso das ciências

biomédicas.

1.3 A intervenção do Direito

É bastante notório, para os juristas, a existência de uma dificuldade em transpor os

obstáculos ao analisar uma realidade nova, sobretudo quando o surgimento desta estiver

condicionado aos avanços científicos ou tecnológicos.

13

BARBOSA, Heloísa Helena; BARRETTO, Vicente de Paulo (Org.). Temas de biodireito e Bioética. Rio

de Janeiro: Renovar, 2001, p. 45. 14

Idem. Ibidem, p. 49. 15

O princípio da autonomia prevê o respeito à vontade do paciente, levando-se em conta seus valores

morais e religiosos, ou seja, reconhece o domínio do paciente sobre a própria vida. O princípio da

beneficência demanda o atendimento pelo médico dos mais importantes interesses das pessoas envolvidas

nas práticas médicas, de maneira a evitar qualquer tipo de dano. Já ao princípio da não-maleficência,

acrescenta-se a obrigação de não acarretar dano intencional. Por fim, o princípio da justiça, determina a

imparcialidade na distribuição dos riscos e benefícios, onde os iguais deverão ser tratados igualmente. Cf.

PESSINI, Léo & BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Bioética: do principialismo à busca de uma

perspectiva latino-americana, In Iniciação à bioética, (vários autores). CFM, 1998, p. 82-3.

Page 12: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

11

Nesse progresso, apareceram os novos protagonistas genéticos, como os doadores

de espermas e óvulos, ampliando a relação bilateral existente entre os pais e as equipes

médicas, na voz de Eduardo de Oliveira Leite:

À medida que o desejo de ter filhos se vulgarizou e ficou facilitado

pelo aperfeiçoamento de tecnologias e descobertas inusitadas, o

processo se tornou mais complexo e criou uma série de desafios

aos estudiosos dos mais diversos campos do conhecimento: os

métodos colocados em ação criaram “sub produtos” preocupantes

(esperma, óvulos, embriões congelados) sobre os quais ainda não

se definiram os direitos de propriedade e sobre os quais, as opiniões

ainda se encontram longe de uma provável harmonia. 16

A Bioética relaciona-se com o Direito, em decorrência das exigências morais

indispensáveis ao desenvolvimento da vida humana, com qualidade, para que a sociedade

possa garantir os mecanismos concretos de efetividade dos seus paradigmas e

pressupostos.

José de Oliveira Ascensão, afirma que esse é um trabalho interdisciplinar,

constituído pela Ética, pela Biologia e o Direito: “Em matéria de Bioética, esse parentesco

é reforçado pela aproximação que tem havido da doutrina e dos direitos do homem.

Procura-se descobrir o que caracteriza essencialmente o homem e daí concluir sobre as

exigências éticas”17

. Nesse âmbito, da inter-relação da bioética com o direito, surge no

léxico contemporâneo o termo biodireito, que no dizer de Maria Helena Diniz: “é o estudo

jurídico que, tomando por fontes imediatas a bioética e a biogenética, teria a vida por

objeto principal”18

. O objetivo dessa matéria seria justamente ofertar uma feição legal às

especulações éticas, criando obrigatoriedade no seu cumprimento.

A necessidade de ingerir na matéria torna-se clara quando a alternativa de se

recorrer a órgãos como os Comitês de Ética ou Regulamento da Associações, por exemplo,

não prosperam, uma vez que se apresentam ineficazes, como as Resolução 1.358/9219

do

Conselho Federal de Medicina e vinculando todos os componentes do corpo médico. São

16

LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p.

199. 17

ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito e bioética. In: Direito na saúde e bioética. Obra coletiva. Lisboa:

LEX Edições Jurídicas, 1991,p. 9 et seq. 18

DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. In: Op. Cit.. v. 1,p. 416. 19

Essa resolução do CFM dispõe acerca das normas técnicas utilizadas na Reprodução Assistida. Disponível

em: <http://www.cfm.org.br>. Acesso em: 20.nov.2008.

Page 13: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

12

normas que carecem de juridicidade, permitindo apenas o questionamento acerca da

conduta do médico, mas que pode acarretar no máximo, sanções de caráter disciplinar.

O controle e prevenção da realização de interferências na reprodução humana

assistida, in vidro, comportam a declaração legal de sua licitude. Uma vez estabelecido

esse marco, torna-se imprescindível determinar os bens jurídicos, valores ou interesses, que

podem ser afetados por essas intervenções. A primeira pergunta que podemos fazer como

cidadãos que buscamos o mínimo de segurança é como uma sociedade em profunda

transformação, com um grande numero de excluídos e com um poder econômico

concentrado em nível global na mão de poucos, vai reagir diante das fantásticas

possibilidades que oferece a biomédica e a biotecnologia no momento da concepção

humana.

Existem princípios gerais baseados na dignidade, inviolabilidade, respeito,

integridade e proteção ao ser humano, exigindo garantias judiciais à manutenção dessas

conquistas, diante de toda a exploração e utilização dos seres humanos e seu corpo para

experimentos.

1.3.1 O Respeito à Dignidade Humana como Paradigma do Estado Democrático de

Direito

Por ser a Ciência Penal eminentemente valorativa, faz-se necessário fixar-se

concretamente quais os bens e valores jurídicos fundamentais em uma sociedade, de

maneira a embasar as criminalizações a que venham envolver as condutas abusivas ligadas

à genética.

As doutrinas humanistas das últimas décadas vêm dando especial e notório

reconhecimento à dignidade do ser humano e ao livre desenvolvimento da personalidade,

como valores individuais de primeira grandeza.

Em seu preâmbulo, a Constituição Federal de 1988 determina a instituição de um

Estado Democrático de Direito objetivando assegurar o exercício dos direitos sociais e

individuais. Declara ser o Estado um órgão destinado a garantir a liberdade, a segurança, o

bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, valores supremos em uma

sociedade. Ao falar em seu artigo 1º, III, da dignidade da pessoa humana, coloca-a como

Page 14: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

13

fundamento da atividade estatal, o que significa centralizar o homem no centro de toda a

atividade pública e sustentáculo dos direitos fundamentais.

Nas palavras de Alexandre de Moraes:

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se

manifesta singularmente na autodeterminação consciente e

responsável da própria e que traz consigo a pretensão ao respeito

por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo

invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo

que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao

exercícios dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar

a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres

humanos.20

Por sua vez, os direitos fundamentais do homem representam situações

reconhecidas juridicamente sem as quais o homem é incapaz de alcançar a sua realização e

pleno desenvolvimento. Norberto Bobbio21

Diante das inovações tecnológicas foram criados problemas de tal ordem que o

Direito, forçosamente, sob pena de alteração genéticas, se veria instado a apresentar

soluções, propondo limites e regulamento às pesquisas e usos de dados com vistas à

preservação do patrimônio genético. Com isso, o Direito não estaria protegendo só o

homem enquanto indivíduo, mas como membro de uma espécie. Nas palavras de Norberto

Bobbio:

Mas já se apresentam novas exigências que só poderiam chamar-se

direitos de quarta geração, referentes aos efeitos cada vez mais

traumáticos da pesquisa biológica, que permitirá manipulações do

patrimônio genético de cada indivíduo. Quais os limites dessa

possível (e cada vez mais certa no futuro) manipulação?.22

Devemos perseguir uma ética baseada na dignidade da pessoa humana, conforme

positivado pelo constituinte de 1988. O que sobreleva em importância esse princípio, é que

restou inarredável a decisão de contemplar o respeito ao homem só pelo fato de ele ser

homem, beneficiado pelo direito de levar uma vida digna, não podendo conseqüentemente

ser usado como instrumento para algo, estando aí presente a sua dignidade.

20

MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 60. 21

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992, pp. 18-19. 22

Idem. Ibidem, p. 6.

Page 15: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

14

Ademais, por força do inc. IV do § 4º do art 60, os direitos e garantias individuais

se consolidam entre as cláusulas pétreas, elidindo qualquer deliberação sobre proposta de

emenda tendente à sua abolição. Para Maria Helena Diniz: “os bioeticistas devem ter como

paradigma a dignidade da pessoa humana, que é o fundamento do Estado Democrático de

Direito (CF, art. 1º, III) e o cerne de todo ordenamento jurídico”23

.

Também compartilhamos deste pensamento, pois se defendemos que a dignidade

da pessoa humana é o elemento aglutinador dos Direitos e Garantias Fundamentais e que o

Estado existe em função da sociedade, é indubitável que este princípio não é uma criação

constitucional, mas sua positivação é o reconhecimento de sua existência e da necessidade

de sua proteção.

Nas doutas palavras de Ingo Wolfgang Sarlet:

O que se percebe em última análise, é que onde não houver respeito

pela vida e pela integridade física do ser humano, onde as

condições mínimas para uma existência digna não forem

asseguradas, onde a intimidade e identidade do indivíduo forem

objeto de ingerências indevidas, onde sua igualdade relativamente

aos demais não for garantida, bem como onde não houver limitação

do poder, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana, e

esta não passará de mero objeto de arbítrio e injustiças. A

concepção do homem-objeto, como visto, constitui justamente a

antítese da noção da dignidade da pessoa humana. 24

Assim, alguns novos bens jurídicos como a integridade, diversidade e

intangibilidade do patrimônio genético, mencionados posteriormente, são em nosso

entendimento, nada mais do que derivativos do princípio à dignidade humana e o seu

reconhecimento é imperativo num Estado que se proclama Democrático de Direito (CF,

art. 1º, caput).

1.4 Estatuto Jurídico do Nascituro

Como controvérsia, surgem os temas relacionados às conseqüências das novas

técnicas e procedimentos, referente ao nascituro, posto que é hodiernamente suscetível de

intervenções científicas.

23

DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 17.

Page 16: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

15

Em seu art. 5º, caput, a Constituição Federal de 1988, assegura o direito à vida,

essencial ao ser humano e que condiciona os demais direitos da personalidade. Sendo

assim, é fato que deve ser protegida contra tudo e contra todos, concretizando um dever

erga omnes, ao qual a ninguém é lícito desobedecer. De maneira que a criação de um

estatuto jurídico para o embrião lhe daria segurança na defesa desses direitos.

Maria Helena Diniz, assim declara sobre o tema:

Na vida intra-uterina, ou mesmo in vitro, tem personalidade

jurídica formal, relativamente aos direitos de personalidade,

consagrados constitucionalmente, adquirindo personalidade

jurídica material apenas se nascer com vida, ocasião em que será

titular dos direitos patrimoniais, que se encontravam em estado

potencial.25

Destarte, se mostra imprescindível determinar com clareza a partir de que instante

deve compreender essa proteção ao ser humano, levando-se em conta as diversas razões

biológicas, éticas e jurídicas que somam e delimitam o momento da efetiva concepção

(introdução do espermatozóide no óvulo) e suas fases posteriores.

No cenário penalista, doutrinadores como Nélson Hungria e Mirabete encaram a

vida como um tema único, que não importa gradações nem fases, de maneira que a

destruição de um embrião quer no útero materno ou fora dele, exatamente porque é vida,

torna-se passível de sanção26

e afastam qualquer hipótese de que só ocorreria crime após a

nidação27

. Para essa corrente, não há qualquer espécie de aumento qualitativo que se possa

diferenciar graus diversos de desenvolvimento.

Não há duvida que a matéria bastante fecunda e ainda objeto de questionamentos,

sendo de importância a toda humanidade e merece proteção jurídica, visto que o titular

desse bem jurídico há de ser toda a humanidade, pois é devido a sua preservação que se

estabelece a proteção desse material genético.

24

SARLET. Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado,

2003, p. 25. 25

DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 9. 26

HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal, vol. 6. 6 ed., Rio de Janeiro: Companhia Editora

Forense, 1981, p. 499. 27

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal. 6 ed. São Paulo: Editora Atlas, 1991, p. 75.

Page 17: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

16

Capítulo 2

MODERNAS TÉCNICAS DE MANIPULAÇÃO GENÉTICA

A manipulação genética torna-se bastante complexa quando inserida no Direito

Penal. Para que se possa fazer uma melhor análise da repercussão da genética nesse ramo

do Direito, é preciso identificar no que consistem efetivamente essas técnicas científicas,

pelo fato de que, com freqüência surgem muitas dúvidas a respeito de modalidade tão

especializada e as possíveis conseqüências de sua utilização, conhecendo exatamente o que

as ciências jurídicas devem regular e o Direito Penal interferir.

O tratamento da infertilidade masculina ou feminina é a grande mola propulsora do

desenvolvimento de técnicas que buscam a solução dos problemas ligados à fecundidade.

A escolha do tratamento, fazendo-se uma investigação da localização do problema e a

reprodução, ato íntimo do casal, representam o lançamento destes num ambiente de grande

participação, permeado pela família, os médicos e grandes centros de reprodução humana e

as técnicas mais propagadas com esse intento, são as chamadas técnicas de Reprodução

Assistida.

Faz-se necessário observar, até para efeito de possíveis conseqüências no Direito

penal, a modalidades de terapia gênica28

, baseadas no nível de intervenção sobre os genes,

em duas áreas bastante divergentes: a linha somática e linha germinal.

A primeira são experimentos em que se introduz no corpo do paciente células

geneticamente manipuladas objetivando a correção de células defeituosas. A terapia gênica

pode ser definida como aquela referente à cura ou prevenção de enfermidades devida a

causas genéticas atuando diretamente nos genes modificando ou substituindo estes.

Através dessa terapia são tratados defeitos genéticos hereditário, não hereditários por

28

No momento atual, as intervenções sobre o genoma (patrimônio genético) humano realizam-se

introduzindo no corpo do paciente células geneticamente manipuladas, objetivando a correção de células

defeituosas. A terapia gênica pode ser definida como aquela referente à cura ou prevenção de enfermidades

devido a causas genéticas, atuando diretamente nos genes, modificando ou substituindo estes. Através dessa

terapia, são tratados defeitos genéticos hereditários; não-hereditários, como anomalias por erros imprevistos

nas células sexuais; e congênitos, quando ocorrem no desenvolvimento embrionário devido a essas mutações.

Vislumbra-se, a possibilidade de incluir genes ausentes ou substituir genes defeituosos, evitando

enfermidades que têm raízes genéticas. A possibilidade de conseqüências, dirigem-se ao que tange à

modificação do patrimônio genético do ser humano, consistente na substituição de células humanas do

paciente, com cultivo in vitro, modificadas geneticamente, supondo um intervenção em caráter “invasivo”, o

Page 18: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

17

anomalias e erros imprevistos nas células sexuais, quando ocorrem no desenvolvimento

embrionário devido as mutações. A terapia gênica somática não tem relevância de caráter

jurídico-penal, pois trata-se de intervenção somente sobre as próprias células somáticas,

não afetando o patrimônio genético hereditário da pessoa que a ela é submetida, por não

transmitir as modificações realizadas à descendência daquela, já que não são responsáveis

pela reprodução29

. A terapia gênica germinal, nesta, vislumbra-se a possibilidade de incluir

genes ausentes ou substituir genes defeituosos, evitando enfermidades que tem raízes

genéticas. A possibilidades de conseqüências, dirigem-se ao que tange à modificação do

patrimônio genético do ser humano, consistente na substituição de células humanas do

paciente, com cultivo in vitro, modificadas geneticamente supondo uma intervenção em

caráter “invasivo”, o que poderia alterar a estrutura e função do patrimônio genético.

Assim a terapia gênica germinal incide sobre as células ligadas à reprodução

(óvulo, espermatozóide, pré-embrião), objetivando curar patologias genéticas mediante a

introdução de genes em células que se encontram em processo germinativo e ainda não

alcançaram uma fase de desenvolvimento celular diferenciado, sendo capazes de produzir

um ser humano completo, afetando, portanto, toda a sua descendência (patrimônio genético

hereditário)30

.

2.1 Reprodução Humana Assistida

As técnicas de reprodução humana assistida consistem no conjunto de intervenções

no processo de procriação, com o intuito de unir os gametas feminino (óvulo) e masculino

(espermatozóide), dando origem a um ser humano. Essas modernas atividades trazem

consigo uma carga de conflitos para os quais nosso ordenamento jurídico ainda não oferece

soluções adequadas. Alguns autores, inclusive, chegam a afirmar que o progresso científico

e técnico pode traduzir-se na mais profunda revolução que o Direito já sofreu até hoje31

.

No Brasil, auxilia a matéria, Resolução n. 1.358/92, do Conselho Federal de Medicina.

Essa modalidade classifica-se, no que tange à origem dos gametas, em homóloga e

heteróloga. A homóloga se refere àquela realizada com a doação ou recepção de material

que poderia alterar essencialmente a estrutura e função do patrimônio genético. Cf. SOUZA, Paulo Vinícius

Spoleder de. Op cit, pp. 40-41. 29

SOUZA, Paulo Vinícius Spoleder de. Op cit., pp. 41-42. 30

Idem. Ibidem, pp.41-43.

Page 19: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

18

genético, do próprio casal, sem a participação de um terceiro. A Heteróloga se caracteriza

pela concepção a partir dos gametas provenientes de ao menos um doador, diferente do

casal ou pessoas em união estável. Opondo-se à adoção, que compreende um direito

devidamente regulamentado, a procriação é um remédio que comporta uma finalidade

médica: atenuar a esterilidade do casal.

Já a inseminação artificial heteróloga, diferencia-se apenas no que tange ao

esperma, que pertence a um doador estranho ao casal, geralmente armazenado em bancos

de esperma e mantidos criopreservados (baixa temperatura).

A Resolução do CFM (1.358/92), em seu artigo 7º, da Seção IV - Doações de

gametas ou pré-ambriões, assim determina: ”As clínicas, centros ou serviços que

empregam a doação devem manter, de forma permanente, um registro de dados clínicos de

caráter geral, características fenotípicas e uma amostra de material celular dos doadores.”

As questões que surgem no âmbito jurídico a respeito da utilização homóloga do

método, situam-se, basicamente, em relação à necessidade de consentimento de ambos os

cônjuges, se casados, para o emprego do método e ainda quanto às responsabilidades civis

e penais advindas de possíveis experiências. Já na modalidade heteróloga há uma

preocupação com o status jurídico do filho, que não deve ser perturbado por futuros

desentendimentos entre os pais.

Uma questão que surge é a procriação post mortem, ou seja, utilização do sêmen do

marido, após a morte deste. Os principais problemas decorrem no âmbito do direito de

família, nas questões correspondentes à filiação e os efeitos da sucessão, que no momento

não são o objetivo precípuo do trabalho.

2.1.2 A Fecundação “in vitro” ou Fecundação com Embryo-Transfer (FIVETE)

A fecundação in vitro, pode ser entendida como a obtenção dos gametas femininos

e masculinos, a posterior fertilização dos mesmos em laboratório (in vitro), e a

transferência dos embriões obtidos diretamente ao aparelho reprodutor feminino. Uma

característica dessa modalidade é justamente o fato de que além do espermatozóide o óvulo

pode ser doado por terceiro, operando-se como na modalidade de inseminação artificial de

31

Cf. GONÇALVES, Denise Willhelm. Reprodução assitida, clonagem terapêutica e o direito. Revista

Jurídica Consulex, Brasília, ano VII, n. 152, maio 2003, p. 42.

Page 20: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

19

maneira homóloga (doadores são o próprio casal) e heteróloga (terceiros). É recomendada

às mulheres que têm má formação das trompas de falópio ou ovários e esterilidade

masculinas, como impotência e não produção de sêmen32

.

O grande diferencial aqui é o momento da transferência, que se dá após a

segmentação do zigoto, óvulo fecundado, quando é denominado embrião.

Atualmente há um domínio quase total sobre essa técnica, residindo a controvérsia

na prática corrente de proceder-se à fecundação de mais embriões, uma vez que o estímulo

à sua produção é utilizado com fulcro em maiores chances de obter êxito, o que incorre

muitas vezes na gravidez múltipla. O que anima as discussões acerca do destino dos

embriões não utilizados.

Alguns médicos do porte de Edson Borges e Roger Abdelmassih, especializados em

reprodução humana, entendem que o armazenamento desse material não constitui ainda

vida humana, sendo apenas um amontoado de células. O reconhecimento da vida humana

se daria quando existe a nidação do gameta até o útero, isto é, quando ele se fixa no útero

materno e registram-se os primeiros batimentos cardíacos, o que ocorre por volta da quinta

semana da gestação33

.

Ademais, a Resolução 1.358 (CFM), assim determina:

V- CRIOPRESERVAÇÃO DE GAMETAS OU PRÉ-EMBRIÕES

1. As clínicas, centros ou serviços podem criopreservar

espermatozóides, óvulos e pré-embriões.

2. O número total de pré-embriões produzidos em laboratório será

comunicado aos pacientes, para que se decida quantos pré-

embriões serão transferidos a fresco, devendo o excedente ser

criopreservado, não podendo ser descartado ou destruído.

3. No momento da criopreseervação, os cônjuges ou companheiros

devem expressar sua vontade, por escrito, quanto ao destino que

será dado aos pré-embriões criopreservados, em caso de divórcio,

doenças graves ou de falecimento de um deles ou de ambos, e

quando desejam doá-los.

Cabe salientar que não existe determinação acerca do tempo em que os embriões

permanecerão criopreservados.

32

SOUZA, Paulo Vinícius Spoleder de. Op cit. pp. 48-49.

Page 21: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

20

2.2 Diagnóstico Genético

O estudo dos antecedentes familiares se torna importante, principalmente quando

na história da família já existam casos registrados e a pesquisa nos descendentes pode

detectar a predisposição para uma doença genética, só não sabendo precisar quando e em

que intensidade se manifestará.

Nas doutas palavras de Paulo Vinícius Spoleder de Souza:

refere-se às informações prestadas pelo médico (geneticista) ao

casal ou alguém que deseja ter filhos - antes da efetiva realização

da gravidez - bem como da advertência sobre os riscos de se

conceber um filho com enfermidades ou más-formações de origem

genética (hereditária ou não hereditária).34

O aconselhamento genético se mostra importante também no âmbito da saúde

pública, quando se propõe a atuar com grupos populacionais de risco, sendo assim

considerados aqueles grupos étnicos que possuem incidência significativa de enfermidades

(anemia falciforme, fibrose cística, etc) e as mulheres grávidas (principalmente com

histórico de enfermidades na família e em idade avançada).

Essa consulta genética tem a finalidade de conformar a existência ou não de

enfermidades genéticas e fornecer todas as informações sobre os riscos, problemas e os

limites dos exames existentes.

Todo esse diagnóstico, a priori, nos aparece como uma dádiva da tecnologia, mas

pode revelar-se em um método de indução ao aborto (tipificado em nosso Código Penal)

seletivo no caso de diagnóstico não-favorável, pois a indicação de descarte é tão freqüente

que pode se levar a pensar que é conseqüência da diagnose35

e também traz à tona a

questão da eugenia, como veremos a seguir.

33

Depósitos de embriões. Jornal do Brasil. Rio de janeiro: Revista de Domingo n. 1.346, 17/02/2002.

Disponível em: <http://www.pesq.jb.com.br>.Acesso em 20.nov.2008. 34

Idem. Ibidem., p. 54. 35

Cf. SGRECCIA, Elio. Op. Cit., p. 268.

Page 22: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

21

2.2.1 Eugenia

Quando retomamos a história da formação dos povos, podemos perceber que os

povos gregos, fenícios e algumas culturas indígenas da América do Sul, tinham como

prática comum a eliminação de pessoas mal-formadas, doentes ou que apresentassem

alguma característica desconhecida.

O desenvolvimento das técnicas de reprodução assistida e de diagnóstico genéticos

podem vir a potencializar um retorno a essa prática, originando demandas inéditas em

razão da falhas ou abusos que podem desencadear uso indiscriminado dessa tecnologia e

recrudescer o debate. Ao se erradicar defeitos genéticos, pode haver interferência no

patrimônio genético da humanidade, o que provoca a refutação dessas idéias por médicos,

filósofos e sociólogos.

O intento de se selecionar os embriões, quer alterando-os ou os reproduzindo,

buscando o melhoramento da espécie humana é o grande perigo que esses avanços trazem.

A escolha de características desejáveis em busca de uma “raça perfeita” é um dado que já

assustou a história moderna.

Cumpre lembrar o ocorrido na Alemanha Nazista de Adolf Hitler, onde foram

editadas as leis de Nuremberg36

, erigidas nos ideais da pureza da “raça ariana”, onde o

sangue constituía um elemento central dentro da concepção nazista, considerado como

responsável pela transmissão de caracteres racionais e nacionais, o que não passou de

falácia racista37

e discriminatória.

O desenvolvimento desse ideário se revela em uma problemática a ser discutida nos

diversos âmbitos da sociedade, buscando-se evitar o “determinismo genético” advindo

desse aconselhamento e já imaginado em obras de ficção-científica como o excelente

Gattaca38

.

36

Editada em 1935 com duas leis: uma sobre “A cidadania Alemã” e a outra sobre a salvaguarda do sangue e

da honra Alemã “. Com elas, os judeus estavam proibidos de ter qualquer direito ou participação política e

não podiam portar a cidadania alemã. Estava também vetado o casamento entre alemães arianos e judeus, sob

pena de prisão nos campos de concentração nazistas. Cf. http://www.eifo.com.br/culhol3.html. Acesso em:

15.fev.2004. 37

Existe certa deturpação acerca dos termos biológicos - raça e eugenia - e uma conceituação interessante a

ser consultada é a do professor Oswaldo Frota-Pessoa. Cf. FROTA-PESSOA, Oswaldo. Temas

incandescentes. In: DE BONI, L.. A; JACOB, G.; SALZANO, F. (Org). Ética e genética. Porto Alegre:

EDIPUCRS, 1998, pp. 135-159. 38

Gattaca, sigla das primeiras letras dos nucleotídeos do DNA (Guanina, Adenina, Timina e Citosina), é o

filme do neozelandês Andrew Niccol, que faz a narrativa sobre um futuro em que as grandes corporações

Page 23: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

22

No tocante ao âmbito de empreendimento particular da eugenia, no Brasil, a

Resolução 1358/92 (CFM) proíbe que as técnicas de reprodução assistida sejam aplicadas

com a intenção de selecionar sexo ou qualquer outra característica biológica do futuro

filho, exceto quando se procure evitar doenças ligadas ao sexo do bebê. Contudo, como a

resolução não possui força de lei e somente vincule médicos e clínicas, torna-se imperativo

que estabeleça um estudo jurídico adequado, regulando esse tipo de conduta, de modo a

evitar o uso desregrado dessa “seleção artificial”.

tornam-se mais poderosas que o Estado e a manipulação genética cria uma hierarquia social legitimada pela

ciência. Gattaca. EUA, 1997, distribuição: Columbia Tristar.

Page 24: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

23

Capítulo 3

A LEI NACIONAL DE BIOSSEGURANÇA

A proteção ao ambiente e o direito a um meio ambiente equilibrado são matérias

que a Constituição Federal de 1988 prevê no capítulo VI do título VIII, determinando no

artigo 225, o direito de todos a um ambiente ecologicamente sadio e em seu § 1º e incisos

II e V, assevera que:

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder

Público:

II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético

do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e

manipulação do material genético;

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de

técnicas, métodos e substâncias que comportem riso para a vida, a

qualidade de vida e o meio ambiente.

Nota-se que trata de um direito difuso, ou seja, transindividual, acrescentando a isso

uma característica notabilíssima: o direito ao meio ambiente das futuras gerações,

denotando a preocupação do constituinte com preservação e a garantia de usufruto dessa

dádiva aos que ainda estão por vir.

Visando regulamentar o artigo acima elencado, tratou o legislador de editar a Lei n.

11105 em 2005, regulamentando o uso das diversas técnicas de engenharia genética e a

liberação no ambiente de organismos geneticamente modificados.

3.1 Finalidade e Abrangência da Lei n. 11105/2005

Em seu art. 1º delimita seu objetivo, qual seja, o de estabelecer normas e

mecanismos de fiscalização no uso das técnicas de engenharia genética, deixando implícito

a necessidade de acompanhar o desenvolvimento dessas atividades, posto antever seus

riscos inerentes. Os verbos utilizados para caracterizar as ações nesse campo: construção,

cultivo, manipulação, transporte, a transferência, a importação, a exportação, o

armazenamento, a pesquisa, comercialização, consumo, liberação e descarte de organismo

geneticamente modificado.

Page 25: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

24

Há a delimitação dos interesses salvaguardados, o que engloba os animais, as

plantas e o homem, não havendo hierarquia entre eles e apresenta como bens jurídicos

tutelados: “a vida, a saúde pública e o meio ambiente”39

.

No seu art. 2º, § 2º determina a quem estão vedadas as atividades de manipulação

genética: “as atividades e projetos de que trata este artigo são vedados a pessoas físicas em

atuação autônoma e independente, ainda que mantenham vínculo empregatício ou qualquer

outro com pessoas jurídicas”. As atividades de pesquisa (inclusive ensino), relacionados a

manipulação de organismos vivos, à pesquisa cientifica, ficam restritas ao âmbito de

entidades de direito público ou privado.

Revela-se de incomensurável importância essa atitude, visto que exclui totalmente

qualquer atividade autônoma do profissional habilitado à manipulação, procurando evitar o

uso desregrado dessa tecnologia.

Importante salientar em seu art. 2º § 3º, que os interessados em realizar atividade

prevista nesta Lei deverão requerer autorização à Comissão Técnica Nacional de

Biossegurança – CTNBio. Assim observa –se no seu § 4º que As Organizações públicas e

privadas, nacionais, estrangeiras ou internacionais, financiadoras ou patrocinadoras de

atividades ou de projetos devem exigir a apresentação de Certificado de Qualidade em

Biossegurança, emitido pela CTNBio,, uma vez que poderão ser co-responsáveis eventuais

efeitos do descumprimento.

A própria norma traz conceitos acerca da matéria (art. 3º):

I – organismo: toda entidade biológica capaz de reproduzir/

transferir material genético, incluindo vírus, e outras classes que

venham a ser conhecidas;

II - ácido desoxirribonucléico (ADN), ácido ribonucléico (ARN):

material genético que contém informações determinantes dos

caracteres hereditários transferíveis à descendência;

III - moléculas de ADN/ARN recombinante: aquelas manipuladas

fora das células vivas, mediante a modificação de segmentos de

ADN/ARN natural ou sintético que possam multiplicar-se em uma

célula viva, ou ainda, as moléculas de ADN/ARN resultantes dessa

multiplicação. Consideram-se, ainda os segmentos de ADN/ARN

sintéticos equivalentes aos de ADN/ARN natural;

39

VARELLA, Marcelo Dias.; FONTES, Eliana.; ROCHA, Fernando Galvão da. Biossegurança e

biodiversidade: contexto científico e regulamentar. Belo Horizonte: Del Rey, 1999, p. 104.

Page 26: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

25

IV - engenharia genética: atividade de manipulação de moléculas

ADN/ARN recombinante

V - organismo geneticamente modificado (OGM): organismo cujo

material genético (ADN/ARN) tenha sido modificado por qualquer

técnica de engenharia genética; Entre outros conceitos.

A conceituação é importante no corpo da lei, de modo a delimitar a abrangência da

norma e evitar maiores deliberações acerca do nível de ingerência nas atividades de

manipulação genética, definindo seu objeto. Cumpre observar que a lei ainda é falha, por

ter deixado de fora importantes conceitos, constantes no artigo 4º, como mutagênese,

dentre outros A falta de zelo do legislador pode implicar prejuízo para a sociedade. É

muito importante a disseminação dos mesmos, podendo dar ensejo a disputas judiciais nos

casos de pouca familiarização dos advogados, membros do ministério público e

magistratura.

Em seu artigo 20, a Lei n. 11.105/05 determina”40

: Sem obstar à aplicação das

penas previstas nesta lei, é o autor obrigado, independentemente da existência de culpa, a

indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua

atividade. Deve-se observar ainda que a lei menciona ainda trata-se de infração

administrativa toda ação ou omissão que viole as normas previstas nesta lei, estabelecendo

ainda no seu Parágrafo único. Que “as infrações administrativas serão punidas na forma

estabelecida no regulamento desta Lei, independentemente das medidas cautelares de

apreensão de produtos, suspensão de venda de produto e embargos de atividades, com as

seguintes sanções:

I – advertência;

II – multa;

III – apreensão de OGM e seus derivados;

IV – suspensão da venda de OGM e seus derivados;

V – embargo da atividade;

VI – interdição parcial ou total do estabelecimento, atividade ou

empreendimento;

VIII – cancelamento de registro, licença ou autorização;

IX – perda ou restrição de incentivo e benefício fiscal concedidos pelo governo;

40

Artigo 20, lei 11.105

Page 27: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

26

X – perda ou suspensão da participação em linha de financiamento em

estabelecimento oficial de crédito;

XI – intervenção no estabelecimento;

XII – proibição de contratar com a administração pública, por período de até 5 (cinco) anos.” Podendo ainda serem aplicadas multas cumulativamente com as demais sanções.

3.2 Fiscalização e Responsabilidade Civil Objetiva

Caberá aos órgãos e entidades de registro e fiscalização do Ministério da

Saúde, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Ministério do Meio

Ambiente, e da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República

entre outras atribuições, no campo de suas competências, observadas a decisão técnica da

CTNBio, as deliberações do CNBS e os mecanismos estabelecidos nesta Lei e na sua

regulamentação, dentre outros de acordo com o art. 16 da lei 11.105/200541

:

IV - engenharia genética: atividade de manipulação de moléculas

ADN/ARN recombinante

V - organismo geneticamente modificado (OGM): organismo cujo

material genético (ADN/ARN) tenha sido modificado por qualquer

técnica de engenharia genética; Entre outros conceitos.

I – fiscalizar as atividades de pesquisa de OGM e seus derivados;

II – registrar e fiscalizar a liberação comercial de OGM e seus derivados;

III – emitir autorização para a importação de OGM e seus derivados para uso

comercial;

VI – aplicar as penalidades de que trata esta Lei;

VII – subsidiar a CTNBio na definição de quesitos de avaliação de

biossegurança de OGM e seus derivados.

§ 1o Após manifestação favorável da CTNBio, ou do CNBS, em caso de

avocação ou recurso, caberá, em decorrência de análise específica e decisão

pertinente:

I – ao órgão competente do Ministério da Saúde emitir as autorizações e

registros e fiscalizar produtos e atividades com OGM e seus derivados

destinados a uso humano, farmacológico, domissanitário e áreas afins, de

acordo com a legislação em vigor e segundo o regulamento desta Lei;

(...)

III – ao órgão competente do Ministério do Meio Ambiente emitir as

autorizações e registros e fiscalizar produtos e atividades que envolvam OGM e

seus derivados a serem liberados nos ecossistemas naturais, de acordo com a

legislação em vigor e segundo o regulamento desta Lei, bem como o

licenciamento, nos casos em que a CTNBio deliberar, na forma desta Lei, que o

OGM é potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente;

41

Artigo 16, lei 11.105 inc. I, II, III, VI, VII, VIII, §1 inc I. e III e § 3o

, § 4o,

, § 5o , § 6

o , § 7

o

Page 28: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

27

§ 3o A CTNBio delibera, em última e definitiva instância, sobre os casos em que

a atividade é potencial ou efetivamente causadora de degradação ambiental,

bem como sobre a necessidade do licenciamento ambiental.

§ 4o A emissão dos registros, das autorizações e do licenciamento ambiental

referidos nesta Lei deverá ocorrer no prazo máximo de 120 (cento e vinte) dias.

§ 5o A contagem do prazo previsto no § 4

o deste artigo será suspensa, por até

180 (cento e oitenta) dias, durante a elaboração, pelo requerente, dos estudos ou

esclarecimentos necessários.

§ 6o As autorizações e registros de que trata este artigo estarão vinculados à

decisão técnica da CTNBio correspondente, sendo vedadas exigências técnicas

que extrapolem as condições estabelecidas naquela decisão, nos aspectos

relacionados à biossegurança.

§ 7o Em caso de divergência quanto à decisão técnica da CTNBio sobre a

liberação comercial de OGM e derivados, os órgãos e entidades de registro e

fiscalização, no âmbito de suas competências, poderão apresentar recurso ao

CNBS, no prazo de até 30 (trinta) dias, a contar da data de publicação da

decisão técnica da CTNBio.

O desrespeito a essas obrigações constitui infração administrativa e enseja

responsabilidade civil do agente infrator, independentemente das medidas cautelares de

apreensão de produtos, suspensão de venda de produto e embargos de atividades. À

exceção dos atos descritos dos artigos seguintes, que constitui crime, tipificado na lei

11.105/2005:

(...)

Art. 25. Praticar engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano

ou embrião humano: 42

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

(...)

Art. 27. Liberar ou descartar OGM no meio ambiente, em desacordo com as

normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e

fiscalização:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

§ 1o (VETADO)

§ 2o Agrava-se a pena:

I – de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se resultar dano à propriedade alheia;

II – de 1/3 (um terço) até a metade, se resultar dano ao meio ambiente;

III – da metade até 2/3 (dois terços), se resultar lesão corporal de natureza grave

em outrem;

IV – de 2/3 (dois terços) até o dobro, se resultar a morte de outrem.

(...)

42

Artigo 25, 27, lei 11.105/2005

Page 29: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

28

Art. 29. Produzir, armazenar, transportar, comercializar, importar ou exportar

OGM ou seus derivados, sem autorização ou em desacordo com as normas

estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização:

43

Pena – reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.

43

Artigo 25, 27, 29, lei 11.105/2005

Page 30: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

29

Capítulo 4

A TUTELA PENAL DA MANIPULAÇÃO GENÉTICA

O progresso tecnológico advindo do desenvolvimento dos diversos ramos da

indústria, genética, energia nuclear, informática, entre outros, teve e tem repercussões

diretas no bem-estar individual das pessoas. O progresso técnico dá lugar à adoção de

novas técnicas como instrumento que lhe permite produzir resultados especialmente

lesivos, de maneira a surgir modalidades delitivas dolosas de novo cunho que se projetam

sobre os espaços abertos pela tecnologia44

.

Como já salientado no início do trabalho, a dignidade humana, bem como outros

bens (valores, princípios e interesses) estão diretamente ligados a ela na configuração dos

novos bens jurídicos fundamentais, trazendo a necessidade de individualizar os bens

jurídicos dela decorrentes, de maneira a delinear a esfera e os limites de ilicitude da nova

genética, verificando o que pode ou não, ser tutelado penalmente.

A necessidade desse controle se faz necessário por entendermos que os sistemas

jurídicos extrapenais revelam-se insuficientes e inadequados na tutela de bens jurídicos da

mais alta hierarquia constitucional. Particularmente o Direito Penal terá de ser

desenvolvido45

e toda a problemática da criminalidade genética deverá estar condizente

com os valores que se buscará resguardar.

4.1 Conceito e Missão do Direito Penal

Historicamente o Direito Penal se revela um disciplinador das regras indispensáveis

ao convívio entre os indivíduos e logo vêm à nossa mente o propósito de sua denominação.

Na Ciência do Direito Penal, Artemio Zanon46

destaca três momentos:

44

SÁNCHEZ, Jesus-María Silva. A expansão do Direito Penal: aspectos da política criminal nas sociedades

pós-industriais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. (Série as ciências criminais do século XXI;

v. 11), p. 29. 45

É o entendimento de André Ramos Tavares. Cf. BASTOS, Celso Ribeiro; TAVARES, André Ramos. Op.

Cit., p. 622-647, p. 622. 46

ZANON, Artêmio. Introdução à ciência do Direito Penal. Florianópolis: Ed. OAB/SC, 2000, p. 31.

Page 31: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

30

a) exegético: procura-se entender, esclarecer, interpretar as normas legais e a sua

elaboração conceitual;

b) dogmático: característica da ciência jurídica, partindo das normas jurídicas, define

os princípios, organizando-os em institutos, coordena-os em unidade, ou seja, em

um sistema. Ocupa-se com e dos pontos fundamentais e indiscutíveis;

c) crítico: inspira-se não só nos princípios próprios da dogmática, mas também na

Política Criminal e nas ciências causais-explicativas do crime e considera os

elementos do sistema positivo vigente em confronto com as novas exigências

práticas jurídico-científicas.

Conforme leciona Basileu Garcia, a expressão “Direito Penal” sofria críticas porque

não dava ênfase à pena e não abrangia as medidas de segurança, que visam não a punição

do agente que cometeu um injusto penal, mas sim ao seu efetivo tratamento. Continua o

ilustre autor que muitos sustentavam ser “mais apropriado dizer Direito Criminal,

porquanto as mencionadas medidas visam a evitar os crimes e pressupõem, em regra, que

seu destinatário tenha praticado algum”47

.

Nesse contexto quando se refere à matéria, o conspícuo Aníbal Bruno assevera: “O

conjunto das normas jurídicas que regulam a atuação estatal nesse combate ao crime,

através de medidas aplicáveis aos criminosos é o Direito Penal”48

.

O Direito Penal, no sentido formal, é um conjunto de normas que determina os

crimes e suas sanções respectivas, tendo como enfoque social funcionar como instrumento

de controle.

Deve-se ao Direito Penal a missão de desenvolver o conteúdo dessas regras

jurídicas de maneira sistemática e interpreta-las, amparando os valores elementares para a

vida em sociedade. Nas práticas palavras de Nilo Batista “a missão do direito penal é a

proteção de bens jurídicos, através da cominação, aplicação e execução da pena”49

. Nesse

diapasão, a pena seria o instrumento de coerção de que se vale o Direito Penal para a

proteção dos valores e interesses considerados significativos para a sociedade.

47

GARCIA, Basileu. Instituições de direito penal. São PAULO: Max Limonad, 1973, v. I, t. I, p. 7. 48

BRUNO, Aníbal, Direito Penal - Parte Geral. Rio de Janeiro:Forense, p. 11-12. 49

BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 1996.

Page 32: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

31

Por conseguinte, na visão de Luiz Flávio Gomes: “na atualidade vem o Direito

penal cumprindo pelo menos duas funções ilegítimas: a) promocional (uso exagerado do

Direito penal para promover certos bens jurídicos e b) simbólica (utilização do Direito

penal para acalmar a ira da população, transmitindo a sensação de que com ele todos os

problemas sociais serão resolvidos”50

. Sendo essa disciplina, o instrumento de controle

mais drástico com que conta o Estado (por possuir os meios coativos mais gravosos) a

preocupação que vem à tona é a constituição dos limites ao exercício desse poder e em

razão de proteger os bens jurídicos mais importantes contra as formas mais graves de

agressão, praticamente não encontra oposição.

Diante desse quadro parece-nos bastante oportuno aprofundar o estudo sobre a

definição de bem jurídico, pedra angular da atuação criminal, pois mediante a atuação

abusiva das novas técnicas de manipulação genética, é possível colocar em perigo bens

jurídicos fundamentais do indivíduo e da sociedade, relacionados principalmente com a

dignidade humana.

4.2 Bem Jurídico-Penal

Em razão do grau de intervenção representado pelo Direito Penal, filósofos e

penalistas passaram a desenvolver teses e teorias objetivando determinar as situações em

que o Estado deveria utilizá-lo, concebendo-se que um dos institutos criados para tal fim

foi o do bem jurídico.

Os entendimentos acerca do bem jurídico-penal sofreram inúmeras variações e

continuam distantes de assentamento51

.

Sua concepção, no Estado moderno, decorre de limitações impostas ao direito penal

e deve ser compreendida a partir dos princípios e valores que determinam esse tipo de

estrutura política.

Historicamente os doutrinadores afirmam ter sido Paul Feuerbach o primeiro

estudioso a limitar o recurso ao Direito Penal à proteção de um direito subjetivo ou de

interesse a um sujeito específico. Fundou seu pensamento no contrato social, tendo para si

50

GOMES, Luiz Flávio. Direito penal-parte geral. 25 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 23. 51

Cf. BIANCHINI, Alice. Pressupostos materiais mínimos da tutela penal. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2002, p. 37. (Série as ciências criminais do século XXI, vol. 7.). Nesse sentido também: PRADO,

Luiz Regis. Bem jurídico-penal e constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 35-36.

Page 33: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

32

que os homens , ante a inseguridade social que se impõe, decidem organizar-se em

sociedade e confiar, ao Estado, a conservação da nova ordem criada52

.

Esse recurso do direito subjetivo, enquanto objeto da tutela penal, impede que sua

aplicação ocorra de forma arbitrária, independentemente de qualquer lesão, tendo

constituído, À época, uma reação do iluminismo ao arbítrio que imperava.

Foi, porém, com Birnbaum, que o conceito de bem jurídico começou a ser formado,

ainda que essa expressão não tenha por ele sido utilizada. Segundo Janaína Conceição

Paschoal: “Propõe Birnbaum, que o Direito penal não visa à defesa de direitos subjetivos e

sim de bens, já que o direito subjetivo não pode ser lesionado, mantendo-se incólume,

enquanto se lesiona o objeto sobre o qual o direito subjetivo recai”53

. Portanto, o autor não

via o bem jurídico como um direito, mas sim como um bem garantido pelo poder do

Estado. Ainda segundo a autora: “ao mesmo tempo em que Binding partiu da idéia de bem

formulada por Birnbaum, para criar uma concepção de bem jurídico eminentemente

formal, Liszt, utilizando também a noção de bem, iniciou a análise do bem jurídico sob

uma perspectiva material”54

.

No Brasil, vários autores discorreram sobre a teoria jurídico-penal, liderados por

Heleno Cláudio Fragoso, tendo este traçado um esboço completo e extremamente rico em

detalhes de todas as teorias, concluindo que, além do objeto material do delito, há também

um objeto formal, “constituído pela ofensa sempre irrogada pela ação delituosa, ao direito

público subjetivo do Estado à observância do preceito penal”55

. O autor assevera ainda

que, se a norma penal impõe um dever, o crime consiste sempre na violação desse dever

imposto pela norma.

São várias as definições de bem jurídico. Aníbal Bruno destaca que os bens

jurídicos “são valores da vida individual ou coletiva, valores da cultura. Por sua vez, Assis

Toledo determina:”bens jurídicos são valores ético-sociais que o Direito seleciona, com o

objetivo de assegurar a paz social, e coloca sob sua proteção para que não sejam, expostos

a perigo de ataque ou a lesões efetivas”. Na visão de Heleno Cláudio Fragoso, “o bem

jurídico é um bem protegido pelo Direito: é, portanto, um valor da vida humana que o

52

BIANCHINI, Alice. Op. cit., p. 37. 53

PASCHOAL, Janaína Conceição. Constituição, criminalização e direito penal mínimo. São Paulo: Editora

Revista dos Tribunais, 2003, p. 29. 54

Idem. Ibidem. p. 30. 55

FRAGOSO, Heleno Cláudio. Direito penal e direitos humanos. Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 57.

Page 34: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

33

Direito reconhece, e a cuja preservação é disposta a norma”. Por fim, Magalhães Noronha

define como “bem-interesse protegido pela norma penal”.56

Segundo Luiz Régis Prado:

Os valores fundamentais devem ter referência constitucional, e o legislador

ordinário está obrigatoriamente vinculado à proteção de bens jurídicos prévios ao

ordenamento penal, cujo conteúdo é determinado em conformidade com os já

citados valores. O bem jurídico nesse contexto, é concebido como uma valiosa

unidade de função social (unidade de função viva), indispensável para a

sobrevivência da comunidade e que tem a norma constitucional como parâmetro

basilar.57

Todavia, não basta a simples constatação da importância abstrata de um bem

jurídico; será preciso e é exigível um concreto grau de afetação do mesmo, de modo que o

conceito de bem jurídico possa nos oferecer um meio de entender a formação do Sistema

da Parte Especial. Dessa forma, os bens jurídicos protegidos pelo Direito Penal, ao refletir

sobre aqueles interesses, valores e bens que a própria sociedade considera imprescindíveis

para que se possa desenvolver a via de relação social num determinado momento

histórico, devem derivar-se de um amplo acordo e consenso social, num Estado pluralista

e democrático.

Sendo assim, as constituições servem de critério e fundamento para o legislador

penal na hora de elaborar determinada criminalização, e constituem, portanto, na razão de

ser do bem-jurídico a ser tutelado pelo Direito Penal, no caso em comento, centrado na

dignidade da pessoa humana.

4.3 Direito Penal e Constituição

Da conjugação do Direito Penal com a Constituição, podem ser retirados princípios

constitucionais penais que dão harmonização às demais regras básicas de construção do

sistema penal. A necessidade de identificar quais os interesses irão embasar determinados

tipos penais, é a mola propulsora desse estudo.

Segundo leciona Luiz Flávio Gomes, todos esses princípios estão ancorados no

princípio-síntese do Estado Constitucional e Democrático de Direito, tendo como

56

Todos os conceitos mencionados foram citados por PRADO, Luiz Regis. Op. Cit., p. 38. 57

Idem. Ibidem. p. 45.

Page 35: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

34

incontestável a forma normativa do princípio da dignidade humana (CF, art. 1º, III)58

.

Nenhuma ordem jurídica pode contrariá-lo, pois é a base dos demais princípios.

Para que esse tormento não se torne excessivo, nem desnecessário, a ponto de

ofender a dignidade da pessoa humana; para que o processo não se poste como indesejável

ameaça à liberdade ou — aí de fato uma grave ameaça — à harmonia social, é preciso,

pois, reduzir sua abrangência ao estritamente necessário, àquele mínimo imprescindível

para a segurança coletiva. Quanto menos processos penais houver, mais saudável será a

sociedade. Quanto maior a salubridade social, menos crimes existirão. Não é que o Estado

deva deixar de proceder à persecução criminal quando isto pareça adequado e essencial,

mas que a maior parte do esforço estatal seja destinada à prevenção e à profilaxia dos

fatores que levem ao crime.

Assim, a defesa da criminalização das condutas relacionadas à manipulação

genética não busca contrariar os defensores de um direito penal de intervenção mínima e

suas prerrogativas, mas sim a defesa de bens de maior relevo e merecedores de atenção

especial do Direito Penal, lembrando a finalidade precípua do Direito Penal hodierno, que

reside na proteção de bens jurídicos reconhecidos como essenciais não apenas ao

indivíduo, mas também à toda a coletividade. Nesse sentido é a lição de César Roberto

Bittencourt:

O princípio da intervenção mínima, também conhecido como ultima ratio,

orienta e limita o poder incriminador do Estado, preconizando que a

criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para

a proteção de determinado bem jurídico. Se outras formas de sanções ou outros

meios de controle social revelarem-se suficientes para a tutela desse bem, a sua

criminalização será inadequada e desnecessária. Se para o restabelecimento da

ordem jurídica violada forem suficientes medidas civis ou administrativas, são

estas que devem ser empregadas e não as penais.59

Destarte, a legitimação do Direito Penal apenas se dará nos casos em que houver

lesão efetiva ao bem jurídico, ressaltam-se as características da indispensabilidade e

essencialidade. Daí a necessidade de ter sempre presente uma atitude crítica tanto frente

aos bens jurídicos protegidos quanto à forma de protegê-los penalmente.

58

GOMES, Luiz Flávio. Op cit., p. 112. 59

BITENCOURT, Cezar Roberto. Lições de direito penal - Parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais,

1997, p. 65.

Page 36: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

35

O princípio da lesividade, para Nilo Batista, transporta para o terreno penal a

questão geral da exterioridade e alteridade (ou bilateralidde) do Direito: ao contrário da

moral coloca face a face pelo menos dois sujeitos.

No Direito Penal, a conduta do sujeito autor do crime deve relacionar-se, como

signo de outro sujeito, o bem jurídico (que era objeto da proteção penal e foi ofendido pelo

crime – por isso chamado bem jurídico do crime). Conforme bem determina Paulo de

Souza Queiroz, “crime, enfim, do ponto de vista material, outra coisa não pode ser, senão

ato humano lesivo de interesse juridicamente protegido (lesivo de bem jurídico) de

outrem”60

. Também chamado de princípio da ofensividade, o fato cometido, para se

transformar em fato punível, deve afetar concretamente o bem jurídico protegido pela

norma; não há crime sem lesão ou perigo concreto de lesão ao bem jurídico tutelado –

nullum crimen sine iniura.

Determina o Código Penal em seu artigo 1º: “Não há crime sem sei anterior que o

defina. Não há pena sem prévia cominação legal”. Formula taxativamente esquemas ou

tipos, em que descreve com precisão os comportamentos humanos passíveis de repressão

penal.

Destarte, observadas as características desses princípios, importa observar que um

dos objetos primordiais dessa análise é o de limitar o ius puniendi estatal. Na visão de

Janaína Conceição Paschoal, quando a doutrina, a princípio, partidária de um direito penal

mínimo, passa a enxergar na Constituição não só um limite, mas um fundamento ao jus

puniendi do Estado, está na verdade contribuindo para o seu alargamento.61

É certo que os doutrinadores, em sua maioria partidários da Constituição enquanto

limite/fundamento do direito penal, não se contentam com o reconhecimento

constitucional de um determinado bem para fundamentar, com exclusividade, a utilização

da tutela penal para sua proteção. Exige, igualmente, que as condutas lesivas aos bens

reconhecidos constitucionalmente não possam ser coibidas por outro meio (princípio da

subsidiariedade). E ainda, que tais condutas, apenas aquelas mais gravosas sejam

criminalizadas (princípio da fragmentalidade).

60

QUEIROZ, Paulo de Souza. Do caráter subsidiário do direito penal. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p.

110. 61

PASCHOAL, Janaína Conceição. Op. Cit., p. 71. Nesse sentido Paulo de Souza Queiroz, apesar de

defensor do direito penal mínimo concorda com a tese de que a Constituição não só limita como fundamenta

o Direito Penal. Cf. QUEIROZ, Paulo de Souza. Op. Cit., p. 72.

Page 37: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

36

Nesse sentido, a pergunta que fazemos é se deve o Direito Penal ser convocado

para a tutela de bens jurídicos lesados ou postos em perigo por estas novas técnicas

genéticas, e como isso deve ser feito.

Nesse sentido existem duas posições distintas: de um lado os que defendem a

intervenção de um Direito Penal de caráter preventivo, com o fim de salvaguardar os bens

do indivíduo ou da coletividade, que podem ser afetados pela genética abusiva62

e de outro

lado, há os que consideram que não basta que se reconheça a dignidade penal de certos

bens, interesses e valores que são objetos da genética, mas é mister comprovar a

necessidade de tutela penal nessa área como último meio para a preservação da vida em

sociedade.

Há a necessidade de buscar um meio termo na penalização das modernas técnicas

de manipulação genética, partindo do entendimento de que a intervenção penal deve

dirigir-se somente contra certas condutas forem consideradas situações-limite, que serão

objeto de análise e põe em risco e afetam os bens jurídicos fundamentais dignos de tutela

penal. A tarefa seria determinar precisamente quais as condutas e os bens jurídicos

atingidos pelas diversas intervenções da biotecnologia sobre o ser humano e decidir quais

os instrumentos jurídico-penais deverão ser utilizados para uma efetiva proteção, segundo

sua importância e formas de agressão que podem causar, e quando o apelo ao Direito

Penal seja realmente necessário e oportuno.

Ademais, várias condutas que a literatura científica descreve são admitidas

teoricamente ou hipoteticamente, mas podem não ser tecnicamente realizáveis, o que

suscita maiores questionamentos sobre a função preventiva do Direito Penal. Entendemos

que a normatização coercitiva dessas práticas é necessária, quando se estiver em jogo a

dignidade da pessoa humana devendo o Estado intervir, na proteção do bem jurídico

vulnerável.

62

Cf. MANTOVANI, Ferrando. Sobre o genoma humano e manipulações genéticas. In: ROMEO

CASABONA, Carlos Maria (org). Biotecnologia, direito e bioética. Belo Horizonte: Del Rey e PUC Minas,

2002, p. 156-165.

Page 38: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

37

4.4 O Capitulo III da Lei de 11.105/2005 – lei de Biossegurança

Desse modo, definido o conceito de Direito Penal, expostas as técnicas de

manipulação genética e feitos esclarecimentos sobre a Lei de Biossegurança, seguimos à

análise de alguns tipos penais instituídos por essa lei editada especificamente para tratar da

matéria.

Para que uma conduta humana seja considerada criminosa, deve apresentar

determinados pressupostos estabelecidos pela teoria do delito. Essa teoria se subdivide em

teoria unificada e estratificada. Para a primeira, delito é uma infração punível. No entanto,

para respondermos o que faz uma conduta ser uma infração punível, precisamos identificar

os caracteres que essa infração deverá apresentar para ser considerada como tal.

Atualmente, a teoria estratificada é predominante no saber penal. É aquela que apresenta,

mediante estratos, os caracteres que devem estar presentes em qualquer ação delituosa,

constituindo um conjunto de requisitos.

Partimos da afirmação que o crime é sempre uma conduta humana, porém é

evidente que nem toda conduta humana é criminosa. Para que seja considerada criminosa

deve estar no elenco daquelas escolhidas pelo legislador para integrarem a lei penal. A

conduta, além de ser típica, deve ser antijurídica, ou seja, deve ser contrária à ordem

jurídica e, para parte da doutrina, culpável. Assim passaremos por algumas penalidade da

lei 11.105/2005, no qual faremos um breve passeio desse aspecto da teoria do delito, a

imprecisão jurídica dos tipos constantes nos artigos (...), 25, (...), 27, (...), 29 da Lei de

Biossegurança.

O tipo penal é um instrumento legal e logicamente necessário para a averiguação

do caráter delitivo de uma conduta humana. Conforme ensina Zaffaroni, o tipo penal é

eminentemente descritivo, são os elementos dessa natureza que individualizam a conduta,

sendo o verbo o elemento principal que é precisamente a palavra que serve

gramaticalmente para conotar uma ação63

.

Os tipos também podem ser abertos ou fechados. Os tipos fechados descrevem uma

conduta proibida sem a necessidade do juiz realizar qualquer tarefa para completá-lo, os

abertos são os que não apresentam a descrição típica completa. Neles o mandamento

63

ZAFFARONI, Eugenio Raúl & PIERANGELI, José Henrique. OP. Cit., p. 444.et seq.

Page 39: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

38

proibitivo não observado pelo sujeito não surge de forma clara, necessitando ser

pesquisado pelo julgador no caso concreto64

. Assim, nos casos dos tipos abertos podemos

antever violação ao princípio da legalidade, devendo ser evitados (preocupação com a

precisão técnica) no nosso ordenamento jurídico.

Os elementos do fato típico são: a conduta humana, o nexo causal, o resultado

obtido pela conduta e a tipicidade. No que se refere ao liame subjetivo que caracteriza a

conduta (dolo ou culpa em diversas modalidades), varia sua aplicação de acordo com a

teoria do delito a ser utilizada. Passemos então, à análise das atividades tidas como

criminosas na Lei n. 11.105/2005.

É importante salientar que a lei 11.105/2005 onde a sua técnica, como muito bem

destaca Alberto Silva Franco, é falha, trazendo dificuldades na sua aplicabilidade e

interpretação65

.

Assim continua o doutrinador:

O legislador foi capaz de criar outros disparates na área técnica legislativa. Onde.

Qualquer um poderia, em princípio realizar os tipos penais. O contra-senso é

manifesto. Uma atividade dessa ordem exige uma sofisticada técnica que não

está ao alcance de qualquer pessoa. Exige em verdade, uma especial capacitação

profissional, que é própria do médico, do paramédico, do biólogo ou do

pesquisador. O rol docapítulo III da Lei 11.105/2005 prevê, na realidade, a

existência de crimes próprios e não de crimes comuns. Lamentável que o

legislador, ao invadir a área penal, não tenha percebido isso e, por tal motivo,

não tenha explicitamente indicado quais as pessoas que poderiam ser sujeitos

ativos desse crime.66

Em seu art. 25 a Lei. 11.105/2005, prevê a figuras criminosa, e constituem crime

de perigo comum com penas que variam de 1 a 4 anos e multa.

Art. 25. Praticar engenharia genética em célula germinal humana, zigoto

humano ou embrião humano:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

64

JESUS, Damásio de. Direito Penal - Parte geral. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 194. 65

FRANCO, Alberto Silva. Op cit., p. 24. 66

Idem. Ibidem., p. 25.

Page 40: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

39

Os artigos mensionados a seguir, ou seja 25, 27, e 29 mencionam crimes de perigo.

Perigo é a probabilidade de lesão de um bem ou interesse tutelado pela lei penal. O perigo

pode ser:

a) individual ou comum;

b) presumido ou concreto;

Perigo abstrato é o considerado pela lei em face de determinado comportamento

positivo ou negativo. É o que a lei presume júris et de jure, não precisa ser provado

O perigo comum ou coletivo, neste caso, é o que expõe ao risco de dano interesses

jurídicos de um número indeterminado de pessoas.

Sujeito ativo: qualquer pessoa (física) independe de qualquer qualidade ou condição

pessoal, pois é crime comum.

Sujeito passivo a humanidade.

Conduta: a conduta incriminada é comissiva e consiste em praticar (realizar,

efetuar) engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano ou embrião

humano.

É necessário destacar que como mencionado antes, humano é embrião no primeiro

estágio de desenvolvimento imediatamente após a fecundação que acontece com a fusão

dos dois gametas masculino e feminino, dando origem a um patrimônio genético diplóide

específico.

Ação penal é pública incondicionada.

Não definiu em que consiste “Praticar engenharia genética” células geminais

humanas, preferindo substituir a descrição típica (verbo, sujeito ativo e passivo, objeto,

meios e modos de execução) por um nome genérico da ação tida como criminosa.

Fazendo-se análise de todos os conceitos até aqui estudados é que se pode chegar à

atividade que o tipo pretende evitar, qual seja aquela que implique necessariamente na

alteração da estrutura genética dos cromossomos, ou seja, um novo ser vivo.

A proteção estabelecida se direciona para as características genéticas da célula

germinativa, in casu, a integridade do patrimônio genético da célula germinativa humana.

Não existe consenso acerca da figura culposa. Paulo Affonso Leme Machado

entende só haver configuração do crime se o (s) autor (es) agir (em) com dolo, querendo o

Page 41: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

40

resultado ou assumindo o risco de produzi-lo67

(art. 18, I, do CP), por outro lado, há quem

admita a modalidade culposa, por acreditar ser o crime em comento ser material, ou seja,

exigindo um resultado naturalístico68

.

Em seu art. 27, a Lei. 11.105/2005, prevê a figuras criminosa, e constituem crime

de perigo com penas que variam de 1 a 4 anos e multa:

Art. 27. Liberar ou descartar OGM no meio ambiente, em desacordo com as

normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e

fiscalização:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Bens jurídicos: o equilíbrio ecológico e a biodiversidade, e, indiretamente a vida, a

integridade física ou saúde e o patrimônio. 69

Sujeito ativo: qualquer pessoa (física), independentemente de qualquer qualidade

ou condição pessoal. É crime comum.

Sujeito passivo: a coletividade e o meio ambiente (natural); ou ainda,

subsidiariamente, a pessoa (física ou jurídica).

Tratando-se desse inciso, o elemento material do crime é o meio ambiente e

propriedade alheia.

Consumação e tentativa: trata-se de crime de mera conduta, que se consuma com

simples realização da liberação ou descarte de OGM no meio ambiente, em desacordo com

as normas estabelecida pela CTNBio e pelos órgãos e entidade de registro e fiscalização. A

tentativa é inadmissível.

Dolo: representado pela vontade e consciência de realizar o tipo objetivo. O dolo

poder direto ou eventual.

Não há previsão típica de forma culposa

Comina-se pena de reclusão de um a quatro anos, e multa. Todavia, aumenta-se a

pena de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço) até a metade se resultar lesão corporal de natureza

grave em outrem, e de 2/3 (dois terços) até o dobro, se resultar a morte de outrem.

Ação penal pública incondicionada.

67

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Op. Cit., p. 675. 68

VARELLA, Marcelo; FONTES, Eliana; ROCHA, Fernando. Op.cit., p. 191. 69

Souza, Paulo Vinicios Spoleder, direito penal Genético – Lei de Biossegurança- 11.105/2005

Page 42: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

41

Cabe sustentar a diferença entre liberação e descarte. A primeira deve ser entendida

como atividade voltada para a produção da interação dos organismos com o meio

ambiente. Já o descarte, importa a idéia de algo que foi rejeitado, revelando a preocupação

do agente em se livrar de organismos que a ele se apresentam inconvenientes. O que se

busca tutelar é o meio ambiente.

As normas a serem obedecidas na liberação e no descarte de OGM devem estar

contidas na regulamentação da Lei n. 11.105/2005 ou nas regras emanadas da CTNBio.

Este é o caso em que a norma incriminadora necessita de complemento em seu conteúdo e

a peculiaridade desta lacuna a caracterizaria como norma penal em branco.

O legislador entendeu por bem ainda incriminar a liberalização ou o descarte de

OGM no meio ambiente como proveniente de culpa. Levando-se em conta que os tipos

culposos são considerados tipos abertos por fazerem referência exclusiva à produção de um

resultado indesejado, a liberação de OGM não constitui resultado algum, pois a finalidade

protetiva da norma se dirige ao meio ambiente e este não pode sofrer qualquer dano ou

perigo com a liberação ou descarte.

Destarte, após análise dos crimes acima delimitados e notada a abordagem

imprecisa e distantes dos objetos a que se buscam assegurar com a tutela penal genética (já

devidamente explanados), optamos pelo desenvolvimento ou criação de novos tipos

ligados aos avanços da biotecnologia, reforçando as modalidades delituosas previstas na

Lei n. 11.105/2005.

Em seu art. 29, a Lei. 11.105/2005, prevê a figuras criminosa, e constituem crime

de perigo com penas que variam de 1 a 2 anos e multa.

Art. 29. Produzir, armazenar, transportar, comercializar, importar ou exportar

OGM ou seus derivados, sem autorização ou em desacordo com as normas

estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.

A disposição do art. 29, desta lei, produzir, armazenar, transportar, comercializar,

importar ou exportar OGM, abrange as manipulações genéticas como outros tipos de

intervenção que tenham por objeto os embriões humanos. Pretende-se evitar

principalmente que estes embriões sejam produzidos e manipulados para tornar-se material

biológico disponível ou que se criem “bancos de sêmen humanos”, sem autorização ou em

Page 43: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

42

desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de

registro e fiscalização:. A lei não previu qualquer exceção para esses comportamentos,

que, portanto, são todos puníveis, tanto na forma tentada como consumada.70

A vida e a saúde humana na perspectiva mais ampla do reconhecimento da sua

dignidade constituem os bens juridicamente pela norma incriminadora.

Ora, as proposições usadas pelo legislador “Produzir, armazenar, transportar,

comercializar, importar”, constituem principalmente o verbo produzir verbos inerentes à

prática da fecundação in vitro, caracterizada pela superovulação, lançando mão de várias

combinações de gametas na tentativa de produzir um embrião viável e os excedentes

costumam ser congelados em nitrogênio líquido, se não forem reclamados pelos pais, serão

destruídos ou doados para casais inférteis (material biológico disponível).

Bens jurídicos: a biodiversidade e a saúde pública.

Sujeito ativo: qualquer pessoa (física), independentemente de qualquer qualidade

ou condição pessoal. É crime comum.

Sujeito passivo: a coletividade e o meio ambiente.

Condutas incriminadoras são comissivas e consistem em produzir, armazenar,

transportar, comercializar, importar e exportar sem autorização ou em desacordo com as

normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização.

Objeto material: é o OGM (microorgnanismo, planta ou animal) ou seus derivados.

Que foram produzidos, armazenados, transportados, comercializados, importados ou

exportados sem autorização ou em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e

pelos órgãos de registro e fiscalização.

Consumação e tentativa: todas as condutas incriminada (produzir, armazenar,

transportar, comercializar, importar ou exportar). Constituem crimes materiais, exigindo-se

a ocorrência de resultado naturalístico para consumação.

Dolo: representa pela vontade e consciência de realizar o tipo objetivo. O dolo pode

ser direto ou eventual.

Modalidade culposa: não há previsão típica da forma culposa.

Ação penal é pública incondicionada.

70

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Op. Cit., p. 676

Page 44: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

43

4.5 A Criminalidade Genética

Autores do porte de Maria Helena Diniz já apontam com a necessidade de um novo

estatuto jurídico-penal voltado à criminalidade genética, diante da evolução biotecnológica

podendo acarretar danos irreversíveis à humanidade e ao ser humano, individualmente

considerado, trazendo um futuro incerto, o que denota a interferência do Direito Penal,

criando novos crimes ligados aos abusos que poderão advir do avanço e do impacto das

ciências biomédicas, provocados pela manipulação genética e as técnicas de reprodução

assistida, não só com o intuito de resguardar a dignidade humana e a identidade genética

como também impor limites à liberdade de investigação científica, que, apesar de tutelados

constitucionalmente (art. 5º, IX), não pode colidir com outros direitos fundamentais

reconhecidos71

.

71

DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001, pp. 503-504.

Page 45: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

44

CONCLUSÃO

No presente trabalho, procuramos desenvolver reflexões sobre o papel da lei penal,

a partir de algumas mudanças advindas da modernidade. A revolução biológica propõe à

humanidade uma série de interrogações inteiramente novas e extremamente urgentes, o que

provoca um repensar dos conceitos do Direito e a sua ingerência em matéria tão

controvertida.

Por isso buscamos relacionar a bioética com o biodireito, notando a necessidade de

impor preceitos éticos à genética e suas inúmeras técnicas de manipulação, em uma

avaliação de que possa corrigir os exageros provocados pela pesquisa científica e o

possível desequilíbrio do meio ambiente, antes da intervenção coercitiva das ciências

jurídicas.

A modernas técnicas de manipulação genética, apresentam-se como uma

biotecnologia revolucionária, que poderá proporcionar a cura de inúmeras doenças, até

então fatais. Assim, podemos perceber que um dos maiores espaços conquistados pela

nova genética é o relacionado às interferências na integridade física da pessoa,

proporcionando a possibilidade do aumento da expectativa de vida ou a modificação

completa da sua qualidade. Não podemos dissociar, contudo, o fato de que a nova genética

está diretamente relacionada à utilização maléfica que se pode fazer dela: é o perigo da

lógica do mercado entressachar suas práticas e da pessoa, enquanto valor supremo, ser

coisificada. A atenção que tem sido dispensada pelos órgãos e governos internacionais

demonstra a enorme preocupação concernente ao tema em nível mundial.

Toda essa preocupação está relacionada ao fato de vivermos globalmente sob

regimes econômicos de cunho liberal e da lógica do mercado imperar, ficando a pessoa

vulnerável. A nova genética não é uma ciência apartada da sociedade. Percebemos seus

reflexos no imaginário social e na relação da política com a ciência, que desperta seus

reflexos no imaginário social mitos intimamente ligados à natureza humana, como por

exemplo, o mito da busca da imortalidade, do homem perfeito e da juventude eterna.

Assim, a nova genética perde o ponto de contato com o real, isto é, deixa de ser uma

aplicação científica como qualquer outra, passível de apropriação de lógica econômica, e

ganha uma conotação de magia, alquimia, afastando, assim, a sociedade.

Page 46: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

45

Essa percepção alcançou níveis mundiais, podendo ser constatada a partir dos

inúmeros documentos elaborados por órgãos e governos da Europa com a finalidade de

regulamentar as práticas advindas da nova genética.

O desenvolvimento de uma biotecnologia de ponta, conjugado com o liberalismo

vigente, demandam a necessidade de se repensar o papel da lei penal, enquanto

instrumento incapaz de coibir determinadas ações. Conseguimos perfazer o campo de

incidência penal e após estudo do capítulo III da Lei 11.105/2005, concluímos pela

necessidade de um melhor arcabouço jurídico penal para a matéria, posto a incompletude e

mal-elaborada legislação presente em nosso ordenamento jurídico.

A dignidade da pessoa humana representa uma parcela essencial do ser humano,

enquanto vetor que garante a expressão e sua condição humana por meio da manifestação

de sua inteligência e vontade. Portanto, todo e qualquer aprimoramento científico e

tecnológico que objetive manipular genes deverá tê-la como pressuposto fundamental.

A tarefa do Direito, especialmente o Direito Penal, em face das novas tecnologias,

em tema de reprodução assistida e de engenharia genética, exige, por parte do legislador e

do intérprete, uma consciência nítida do papel a ser exercido e uma avaliação segura das

atividades postas em prática, como também as conseqüências profundas delas advindas.

Esse é o objetivo: trazer à tona antigos conceitos jurídicos e tentar acoplá-los à nova

realidade, tarefa esta, profundamente espinhosa, porém que não deixamos de fazê-la, sem

ter a mínima pretensão de esgotar o assunto, que se revela à procura de alicerces mais

sólidos e, com certeza, num futuro não muito distante, encontrará respaldo.

Page 47: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

46

REFERÊNCIAS

ASCENSÃO, José de Oliveira (Org). Direito e bioética: Direito na saúde e bioética.

Obra coletiva. Lisboa: LEX Edições Jurídicas, 1991.

BARBOSA, Heloísa Helena & BARRETTO, Vicente de Paulo (org). Temas de biodireito

e Bioética. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

BASTOS, Celso Ribeiro & TAVARES, André Ramos. As tendências do Direito Público

no limiar de um novo milênio. São Paulo: Saraiva, 2000.

BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan,

1996.

Belmont Report. Disponível em: <http://www.fda.gov/oc/ohrt/irbs/belmont.html>. Acesso

em 20.nov.2008.

BIANCHINI, Alice. Pressupostos materiais mínimos da tutela penal. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2002. (Série as ciências criminais do século XXI, vol. 7.).

Biomania. Disponível em: <http://www.biomania.com.br/glossario/>. Acesso em

20.nov.2008.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Lições de direito penal - Parte geral. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 1997.

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

BRUNO, Aníbal. Direito Penal - Parte Geral. Rio de Janeiro: Forense, 1959.

CFM. Disponível em: <http://www.cfm.org.br>. Acesso em: 20.nov.2008.

CONTI, Matilde Carone Slaibi. Ètica e direito na manipulação do genoma humano. Rio

de Janeiro: Forense, 2001.

Page 48: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

47

DE BONI, L. A., JACOB, G. & SALZANO, F. (Org). Ética e genética. Porto Alegre:

EDIPUCRS, 1998.

DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. São Paulo: Saraiva, 1999.

_____. Dicionário jurídico. Vol. 2. São Paulo: Saraiva, 1998.

_____. O estado atual do biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001.

Eifo. Disponível em: <http://www.eifo.com.br/culhol3.html>. Acesso em: 20.nov.2008.

ESER, Albin. Genética Humana: aspectos jurídicos e sócio-políticos. Revista

Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 2, fasc. 1, 992.

FRAGOSO, Heleno Cláudio. Direito penal e direitos humanos. Rio de Janeiro: Forense,

1977.

FRANCO, Alberto Silva. Genética Humana e direito. Bioética. Brasília: Conselho

Federal de Medicina, 1996. n.4.

GARCIA, Basileu. Instituições de direito penal. São PAULO: Max Limonad, 1973, v. I,

t. I.

Gattaca. EUA, 1997. Distribuição: Columbia Tristar.

GOMES, Luiz Flávio. Direito penal - Parte geral. 25 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2004

GONÇALVES, Denise Willhelm. Reprodução assitida, clonagem terapêutica e o

direito. Revista Jurídica Consulex, Brasília, ano VII, n. 152, maio 2003.

HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. vol. 6. 6 ed. Rio de Janeiro:

Companhia Editora Forense, 1981.

HUXLEY, Aldous. Admirável mundo novo. 15 ed. São Paulo: Abril cultural.

JESUS, Damásio de. Direito Penal - Parte geral. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 1992.

Page 49: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

48

Jornal do Brasil. Disponível em: <http://www.pesq.jb.com.br>. Acesso em: 20.nov.2004.

LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1995.

LIMA, Arnaldo Siqueira de. O direito à imagem: proteção jurídica e limites de

violação. Brasília: Universa, 2003.

MACHADO, Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. São Paulo: Malheiros

Editores, 1995.

ROMEO CASABONA, Carlos Maria (Org.). Biotecnologia, direito e bioética. Belo

Horizonte: Del Rey e PUC Minas, 2002.

Michaelis. Moderno dicionário da língua portuguesa. São Paulo: Melhoramentos, 1999.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal. 6 ed. São Paulo: Editora Atlas,

1991.

MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. 3 ed. São Paulo: Atlas,

2000.

NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 1997.

O Estado de São Paulo. Disponível em: <http://www.oestadao.com.br>. Acesso em

20.nov. 2008.

Page 50: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

49

ANEXO

LEGISLAÇÃO

Presidência da República

Casa Civil

Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 11.105, DE 24 DE MARÇO DE 2005.

Mensagem de veto

Regulamento

Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do

art. 225 da Constituição Federal, estabelece

normas de segurança e mecanismos de

fiscalização de atividades que envolvam

organismos geneticamente modificados – OGM

e seus derivados, cria o Conselho Nacional de

Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão

Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio,

dispõe sobre a Política Nacional de

Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974, de

5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória no

2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o,

6o, 7

o, 8

o, 9

o, 10 e 16 da Lei n

o 10.814, de 15 de

dezembro de 2003, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e

eu sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES PRELIMINARES E GERAIS

Art. 1o Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a

construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a

importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a

liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados –

OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de

biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a

observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente.

§ 1o Para os fins desta Lei, considera-se atividade de pesquisa a realizada em

laboratório, regime de contenção ou campo, como parte do processo de obtenção de OGM

e seus derivados ou de avaliação da biossegurança de OGM e seus derivados, o que

engloba, no âmbito experimental, a construção, o cultivo, a manipulação, o transporte, a

transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a liberação no meio ambiente

e o descarte de OGM e seus derivados.

§ 2o Para os fins desta Lei, considera-se atividade de uso comercial de OGM e seus

derivados a que não se enquadra como atividade de pesquisa, e que trata do cultivo, da

produção, da manipulação, do transporte, da transferência, da comercialização, da

Page 51: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

50

importação, da exportação, do armazenamento, do consumo, da liberação e do descarte de

OGM e seus derivados para fins comerciais.

Art. 2o As atividades e projetos que envolvam OGM e seus derivados, relacionados ao

ensino com manipulação de organismos vivos, à pesquisa científica, ao desenvolvimento

tecnológico e à produção industrial ficam restritos ao âmbito de entidades de direito

público ou privado, que serão responsáveis pela obediência aos preceitos desta Lei e de sua

regulamentação, bem como pelas eventuais conseqüências ou efeitos advindos de seu

descumprimento.

§ 1o Para os fins desta Lei, consideram-se atividades e projetos no âmbito de entidade

os conduzidos em instalações próprias ou sob a responsabilidade administrativa, técnica ou

científica da entidade.

§ 2o As atividades e projetos de que trata este artigo são vedados a pessoas físicas em

atuação autônoma e independente, ainda que mantenham vínculo empregatício ou qualquer

outro com pessoas jurídicas.

§ 3o Os interessados em realizar atividade prevista nesta Lei deverão requerer

autorização à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, que se manifestará

no prazo fixado em regulamento.

§ 4o As organizações públicas e privadas, nacionais, estrangeiras ou internacionais,

financiadoras ou patrocinadoras de atividades ou de projetos referidos no caput deste

artigo devem exigir a apresentação de Certificado de Qualidade em Biossegurança, emitido

pela CTNBio, sob pena de se tornarem co-responsáveis pelos eventuais efeitos decorrentes

do descumprimento desta Lei ou de sua regulamentação.

Art. 3o Para os efeitos desta Lei, considera-se:

I – organismo: toda entidade biológica capaz de reproduzir ou transferir material

genético, inclusive vírus e outras classes que venham a ser conhecidas;

II – ácido desoxirribonucléico - ADN, ácido ribonucléico - ARN: material genético

que contém informações determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à

descendência;

III – moléculas de ADN/ARN recombinante: as moléculas manipuladas fora das

células vivas mediante a modificação de segmentos de ADN/ARN natural ou sintético e

que possam multiplicar-se em uma célula viva, ou ainda as moléculas de ADN/ARN

resultantes dessa multiplicação; consideram-se também os segmentos de ADN/ARN

sintéticos equivalentes aos de ADN/ARN natural;

IV – engenharia genética: atividade de produção e manipulação de moléculas de

ADN/ARN recombinante;

V – organismo geneticamente modificado - OGM: organismo cujo material genético –

ADN/ARN tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia genética;

VI – derivado de OGM: produto obtido de OGM e que não possua capacidade

autônoma de replicação ou que não contenha forma viável de OGM;

Page 52: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

51

VII – célula germinal humana: célula-mãe responsável pela formação de gametas

presentes nas glândulas sexuais femininas e masculinas e suas descendentes diretas em

qualquer grau de ploidia;

VIII – clonagem: processo de reprodução assexuada, produzida artificialmente,

baseada em um único patrimônio genético, com ou sem utilização de técnicas de

engenharia genética;

IX – clonagem para fins reprodutivos: clonagem com a finalidade de obtenção de um

indivíduo;

X – clonagem terapêutica: clonagem com a finalidade de produção de células-tronco

embrionárias para utilização terapêutica;

XI – células-tronco embrionárias: células de embrião que apresentam a capacidade de

se transformar em células de qualquer tecido de um organismo.

§ 1o Não se inclui na categoria de OGM o resultante de técnicas que impliquem a

introdução direta, num organismo, de material hereditário, desde que não envolvam a

utilização de moléculas de ADN/ARN recombinante ou OGM, inclusive fecundação in

vitro, conjugação, transdução, transformação, indução poliplóide e qualquer outro

processo natural.

§ 2o Não se inclui na categoria de derivado de OGM a substância pura, quimicamente

definida, obtida por meio de processos biológicos e que não contenha OGM, proteína

heteróloga ou ADN recombinante.

Art. 4o Esta Lei não se aplica quando a modificação genética for obtida por meio das

seguintes técnicas, desde que não impliquem a utilização de OGM como receptor ou

doador:

I – mutagênese;

II – formação e utilização de células somáticas de hibridoma animal;

III – fusão celular, inclusive a de protoplasma, de células vegetais, que possa ser

produzida mediante métodos tradicionais de cultivo;

IV – autoclonagem de organismos não-patogênicos que se processe de maneira

natural.

Art. 5o É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco

embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não

utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições:

I – sejam embriões inviáveis; ou

II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta

Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três)

anos, contados a partir da data de congelamento.

§ 1o Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.

Page 53: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

52

§ 2o Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com

células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e

aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa.

§ 3o É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua

prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.

Art. 6o Fica proibido:

I – implementação de projeto relativo a OGM sem a manutenção de registro de seu

acompanhamento individual;

II – engenharia genética em organismo vivo ou o manejo in vitro de ADN/ARN

natural ou recombinante, realizado em desacordo com as normas previstas nesta Lei;

III – engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano e embrião

humano;

IV – clonagem humana;

V – destruição ou descarte no meio ambiente de OGM e seus derivados em desacordo

com as normas estabelecidas pela CTNBio, pelos órgãos e entidades de registro e

fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, e as constantes desta Lei e de sua

regulamentação;

VI – liberação no meio ambiente de OGM ou seus derivados, no âmbito de atividades

de pesquisa, sem a decisão técnica favorável da CTNBio e, nos casos de liberação

comercial, sem o parecer técnico favorável da CTNBio, ou sem o licenciamento do órgão

ou entidade ambiental responsável, quando a CTNBio considerar a atividade como

potencialmente causadora de degradação ambiental, ou sem a aprovação do Conselho

Nacional de Biossegurança – CNBS, quando o processo tenha sido por ele avocado, na

forma desta Lei e de sua regulamentação;

VII – a utilização, a comercialização, o registro, o patenteamento e o licenciamento de

tecnologias genéticas de restrição do uso.

Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, entende-se por tecnologias genéticas de

restrição do uso qualquer processo de intervenção humana para geração ou multiplicação

de plantas geneticamente modificadas para produzir estruturas reprodutivas estéreis, bem

como qualquer forma de manipulação genética que vise à ativação ou desativação de genes

relacionados à fertilidade das plantas por indutores químicos externos.

Art. 7o São obrigatórias:

I – a investigação de acidentes ocorridos no curso de pesquisas e projetos na área de

engenharia genética e o envio de relatório respectivo à autoridade competente no prazo

máximo de 5 (cinco) dias a contar da data do evento;

II – a notificação imediata à CTNBio e às autoridades da saúde pública, da defesa

agropecuária e do meio ambiente sobre acidente que possa provocar a disseminação de

OGM e seus derivados;

Page 54: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

53

III – a adoção de meios necessários para plenamente informar à CTNBio, às

autoridades da saúde pública, do meio ambiente, da defesa agropecuária, à coletividade e

aos demais empregados da instituição ou empresa sobre os riscos a que possam estar

submetidos, bem como os procedimentos a serem tomados no caso de acidentes com

OGM.

CAPÍTULO II

Do Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS

Art. 8o Fica criado o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, vinculado à

Presidência da República, órgão de assessoramento superior do Presidente da República

para a formulação e implementação da Política Nacional de Biossegurança – PNB.

§ 1o Compete ao CNBS:

I – fixar princípios e diretrizes para a ação administrativa dos órgãos e entidades

federais com competências sobre a matéria;

II – analisar, a pedido da CTNBio, quanto aos aspectos da conveniência e

oportunidade socioeconômicas e do interesse nacional, os pedidos de liberação para uso

comercial de OGM e seus derivados;

III – avocar e decidir, em última e definitiva instância, com base em manifestação da

CTNBio e, quando julgar necessário, dos órgãos e entidades referidos no art. 16 desta Lei,

no âmbito de suas competências, sobre os processos relativos a atividades que envolvam o

uso comercial de OGM e seus derivados;

IV – (VETADO)

§ 2o (VETADO)

§ 3o Sempre que o CNBS deliberar favoravelmente à realização da atividade

analisada, encaminhará sua manifestação aos órgãos e entidades de registro e fiscalização

referidos no art. 16 desta Lei.

§ 4o Sempre que o CNBS deliberar contrariamente à atividade analisada, encaminhará

sua manifestação à CTNBio para informação ao requerente.

Art. 9o O CNBS é composto pelos seguintes membros:

I – Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República, que o

presidirá;

II – Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia;

III – Ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário;

IV – Ministro de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento;

V – Ministro de Estado da Justiça;

VI – Ministro de Estado da Saúde;

Page 55: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

54

VII – Ministro de Estado do Meio Ambiente;

VIII – Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;

IX – Ministro de Estado das Relações Exteriores;

X – Ministro de Estado da Defesa;

XI – Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República.

§ 1o O CNBS reunir-se-á sempre que convocado pelo Ministro de Estado Chefe da

Casa Civil da Presidência da República, ou mediante provocação da maioria de seus

membros.

§ 2o (VETADO)

§ 3o Poderão ser convidados a participar das reuniões, em caráter excepcional,

representantes do setor público e de entidades da sociedade civil.

§ 4o O CNBS contará com uma Secretaria-Executiva, vinculada à Casa Civil da

Presidência da República.

§ 5o A reunião do CNBS poderá ser instalada com a presença de 6 (seis) de seus

membros e as decisões serão tomadas com votos favoráveis da maioria absoluta.

CAPÍTULO III

Da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio

Art. 10. A CTNBio, integrante do Ministério da Ciência e Tecnologia, é instância

colegiada multidisciplinar de caráter consultivo e deliberativo, para prestar apoio técnico e

de assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação da

PNB de OGM e seus derivados, bem como no estabelecimento de normas técnicas de

segurança e de pareceres técnicos referentes à autorização para atividades que envolvam

pesquisa e uso comercial de OGM e seus derivados, com base na avaliação de seu risco

zoofitossanitário, à saúde humana e ao meio ambiente.

Parágrafo único. A CTNBio deverá acompanhar o desenvolvimento e o progresso

técnico e científico nas áreas de biossegurança, biotecnologia, bioética e afins, com o

objetivo de aumentar sua capacitação para a proteção da saúde humana, dos animais e das

plantas e do meio ambiente.

Art. 11. A CTNBio, composta de membros titulares e suplentes, designados pelo

Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, será constituída por 27 (vinte e sete) cidadãos

brasileiros de reconhecida competência técnica, de notória atuação e saber científicos, com

grau acadêmico de doutor e com destacada atividade profissional nas áreas de

biossegurança, biotecnologia, biologia, saúde humana e animal ou meio ambiente, sendo:

I – 12 (doze) especialistas de notório saber científico e técnico, em efetivo exercício

profissional, sendo:

a) 3 (três) da área de saúde humana;

b) 3 (três) da área animal;

Page 56: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

55

c) 3 (três) da área vegetal;

d) 3 (três) da área de meio ambiente;

II – um representante de cada um dos seguintes órgãos, indicados pelos respectivos

titulares:

a) Ministério da Ciência e Tecnologia;

b) Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento;

c) Ministério da Saúde;

d) Ministério do Meio Ambiente;

e) Ministério do Desenvolvimento Agrário;

f) Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;

g) Ministério da Defesa;

h) Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República;

i) Ministério das Relações Exteriores;

III – um especialista em defesa do consumidor, indicado pelo Ministro da Justiça;

IV – um especialista na área de saúde, indicado pelo Ministro da Saúde;

V – um especialista em meio ambiente, indicado pelo Ministro do Meio Ambiente;

VI – um especialista em biotecnologia, indicado pelo Ministro da Agricultura,

Pecuária e Abastecimento;

VII – um especialista em agricultura familiar, indicado pelo Ministro do

Desenvolvimento Agrário;

VIII – um especialista em saúde do trabalhador, indicado pelo Ministro do Trabalho e

Emprego.

§ 1o Os especialistas de que trata o inciso I do caput deste artigo serão escolhidos a

partir de lista tríplice, elaborada com a participação das sociedades científicas, conforme

disposto em regulamento.

§ 2o Os especialistas de que tratam os incisos III a VIII do caput deste artigo serão

escolhidos a partir de lista tríplice, elaborada pelas organizações da sociedade civil,

conforme disposto em regulamento.

§ 3o Cada membro efetivo terá um suplente, que participará dos trabalhos na ausência

do titular.

§ 4o Os membros da CTNBio terão mandato de 2 (dois) anos, renovável por até mais

2 (dois) períodos consecutivos.

Page 57: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

56

§ 5o O presidente da CTNBio será designado, entre seus membros, pelo Ministro da

Ciência e Tecnologia para um mandato de 2 (dois) anos, renovável por igual período.

§ 6o Os membros da CTNBio devem pautar a sua atuação pela observância estrita dos

conceitos ético-profissionais, sendo vedado participar do julgamento de questões com as

quais tenham algum envolvimento de ordem profissional ou pessoal, sob pena de perda de

mandato, na forma do regulamento.

§ 7o A reunião da CTNBio poderá ser instalada com a presença de 14 (catorze) de

seus membros, incluído pelo menos um representante de cada uma das áreas referidas no

inciso I do caput deste artigo.

§ 8o (VETADO)

§ 8o-A As decisões da CTNBio serão tomadas com votos favoráveis da maioria

absoluta de seus membros. (Incluído pela Lei nº 11.460, de 2007)

§ 9o Órgãos e entidades integrantes da administração pública federal poderão solicitar

participação nas reuniões da CTNBio para tratar de assuntos de seu especial interesse, sem

direito a voto.

§ 10. Poderão ser convidados a participar das reuniões, em caráter excepcional,

representantes da comunidade científica e do setor público e entidades da sociedade civil,

sem direito a voto.

Art. 12. O funcionamento da CTNBio será definido pelo regulamento desta Lei.

§ 1o A CTNBio contará com uma Secretaria-Executiva e cabe ao Ministério da

Ciência e Tecnologia prestar-lhe o apoio técnico e administrativo.

§ 2o (VETADO)

Art. 13. A CTNBio constituirá subcomissões setoriais permanentes na área de saúde

humana, na área animal, na área vegetal e na área ambiental, e poderá constituir

subcomissões extraordinárias, para análise prévia dos temas a serem submetidos ao

plenário da Comissão.

§ 1o Tanto os membros titulares quanto os suplentes participarão das subcomissões

setoriais e caberá a todos a distribuição dos processos para análise.

§ 2o O funcionamento e a coordenação dos trabalhos nas subcomissões setoriais e

extraordinárias serão definidos no regimento interno da CTNBio.

Art. 14. Compete à CTNBio:

I – estabelecer normas para as pesquisas com OGM e derivados de OGM;

II – estabelecer normas relativamente às atividades e aos projetos relacionados a

OGM e seus derivados;

III – estabelecer, no âmbito de suas competências, critérios de avaliação e

monitoramento de risco de OGM e seus derivados;

Page 58: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

57

IV – proceder à análise da avaliação de risco, caso a caso, relativamente a atividades e

projetos que envolvam OGM e seus derivados;

V – estabelecer os mecanismos de funcionamento das Comissões Internas de

Biossegurança – CIBio, no âmbito de cada instituição que se dedique ao ensino, à pesquisa

científica, ao desenvolvimento tecnológico e à produção industrial que envolvam OGM ou

seus derivados;

VI – estabelecer requisitos relativos à biossegurança para autorização de

funcionamento de laboratório, instituição ou empresa que desenvolverá atividades

relacionadas a OGM e seus derivados;

VII – relacionar-se com instituições voltadas para a biossegurança de OGM e seus

derivados, em âmbito nacional e internacional;

VIII – autorizar, cadastrar e acompanhar as atividades de pesquisa com OGM ou

derivado de OGM, nos termos da legislação em vigor;

IX – autorizar a importação de OGM e seus derivados para atividade de pesquisa;

X – prestar apoio técnico consultivo e de assessoramento ao CNBS na formulação da

PNB de OGM e seus derivados;

XI – emitir Certificado de Qualidade em Biossegurança – CQB para o

desenvolvimento de atividades com OGM e seus derivados em laboratório, instituição ou

empresa e enviar cópia do processo aos órgãos de registro e fiscalização referidos no art.

16 desta Lei;

XII – emitir decisão técnica, caso a caso, sobre a biossegurança de OGM e seus

derivados no âmbito das atividades de pesquisa e de uso comercial de OGM e seus

derivados, inclusive a classificação quanto ao grau de risco e nível de biossegurança

exigido, bem como medidas de segurança exigidas e restrições ao uso;

XIII – definir o nível de biossegurança a ser aplicado ao OGM e seus usos, e os

respectivos procedimentos e medidas de segurança quanto ao seu uso, conforme as normas

estabelecidas na regulamentação desta Lei, bem como quanto aos seus derivados;

XIV – classificar os OGM segundo a classe de risco, observados os critérios

estabelecidos no regulamento desta Lei;

XV – acompanhar o desenvolvimento e o progresso técnico-científico na

biossegurança de OGM e seus derivados;

XVI – emitir resoluções, de natureza normativa, sobre as matérias de sua

competência;

XVII – apoiar tecnicamente os órgãos competentes no processo de prevenção e

investigação de acidentes e de enfermidades, verificados no curso dos projetos e das

atividades com técnicas de ADN/ARN recombinante;

XVIII – apoiar tecnicamente os órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos

no art. 16 desta Lei, no exercício de suas atividades relacionadas a OGM e seus derivados;

Page 59: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

58

XIX – divulgar no Diário Oficial da União, previamente à análise, os extratos dos

pleitos e, posteriormente, dos pareceres dos processos que lhe forem submetidos, bem

como dar ampla publicidade no Sistema de Informações em Biossegurança – SIB a sua

agenda, processos em trâmite, relatórios anuais, atas das reuniões e demais informações

sobre suas atividades, excluídas as informações sigilosas, de interesse comercial, apontadas

pelo proponente e assim consideradas pela CTNBio;

XX – identificar atividades e produtos decorrentes do uso de OGM e seus derivados

potencialmente causadores de degradação do meio ambiente ou que possam causar riscos à

saúde humana;

XXI – reavaliar suas decisões técnicas por solicitação de seus membros ou por

recurso dos órgãos e entidades de registro e fiscalização, fundamentado em fatos ou

conhecimentos científicos novos, que sejam relevantes quanto à biossegurança do OGM ou

derivado, na forma desta Lei e seu regulamento;

XXII – propor a realização de pesquisas e estudos científicos no campo da

biossegurança de OGM e seus derivados;

XXIII – apresentar proposta de regimento interno ao Ministro da Ciência e

Tecnologia.

§ 1o Quanto aos aspectos de biossegurança do OGM e seus derivados, a decisão

técnica da CTNBio vincula os demais órgãos e entidades da administração.

§ 2o Nos casos de uso comercial, dentre outros aspectos técnicos de sua análise, os

órgãos de registro e fiscalização, no exercício de suas atribuições em caso de solicitação

pela CTNBio, observarão, quanto aos aspectos de biossegurança do OGM e seus

derivados, a decisão técnica da CTNBio.

§ 3o Em caso de decisão técnica favorável sobre a biossegurança no âmbito da

atividade de pesquisa, a CTNBio remeterá o processo respectivo aos órgãos e entidades

referidos no art. 16 desta Lei, para o exercício de suas atribuições.

§ 4o A decisão técnica da CTNBio deverá conter resumo de sua fundamentação

técnica, explicitar as medidas de segurança e restrições ao uso do OGM e seus derivados e

considerar as particularidades das diferentes regiões do País, com o objetivo de orientar e

subsidiar os órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, no

exercício de suas atribuições.

§ 5o Não se submeterá a análise e emissão de parecer técnico da CTNBio o derivado

cujo OGM já tenha sido por ela aprovado.

§ 6o As pessoas físicas ou jurídicas envolvidas em qualquer das fases do processo de

produção agrícola, comercialização ou transporte de produto geneticamente modificado

que tenham obtido a liberação para uso comercial estão dispensadas de apresentação do

CQB e constituição de CIBio, salvo decisão em contrário da CTNBio.

Art. 15. A CTNBio poderá realizar audiências públicas, garantida participação da

sociedade civil, na forma do regulamento.

Page 60: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

59

Parágrafo único. Em casos de liberação comercial, audiência pública poderá ser

requerida por partes interessadas, incluindo-se entre estas organizações da sociedade civil

que comprovem interesse relacionado à matéria, na forma do regulamento.

CAPÍTULO IV

Dos órgãos e entidades de registro e fiscalização

Art. 16. Caberá aos órgãos e entidades de registro e fiscalização do Ministério da

Saúde, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Ministério do Meio

Ambiente, e da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República

entre outras atribuições, no campo de suas competências, observadas a decisão técnica da

CTNBio, as deliberações do CNBS e os mecanismos estabelecidos nesta Lei e na sua

regulamentação:

I – fiscalizar as atividades de pesquisa de OGM e seus derivados;

II – registrar e fiscalizar a liberação comercial de OGM e seus derivados;

III – emitir autorização para a importação de OGM e seus derivados para uso

comercial;

IV – manter atualizado no SIB o cadastro das instituições e responsáveis técnicos que

realizam atividades e projetos relacionados a OGM e seus derivados;

V – tornar públicos, inclusive no SIB, os registros e autorizações concedidas;

VI – aplicar as penalidades de que trata esta Lei;

VII – subsidiar a CTNBio na definição de quesitos de avaliação de biossegurança de

OGM e seus derivados.

§ 1o Após manifestação favorável da CTNBio, ou do CNBS, em caso de avocação ou

recurso, caberá, em decorrência de análise específica e decisão pertinente:

I – ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento emitir as autorizações e

registros e fiscalizar produtos e atividades que utilizem OGM e seus derivados destinados a

uso animal, na agricultura, pecuária, agroindústria e áreas afins, de acordo com a legislação

em vigor e segundo o regulamento desta Lei;

II – ao órgão competente do Ministério da Saúde emitir as autorizações e registros e

fiscalizar produtos e atividades com OGM e seus derivados destinados a uso humano,

farmacológico, domissanitário e áreas afins, de acordo com a legislação em vigor e

segundo o regulamento desta Lei;

III – ao órgão competente do Ministério do Meio Ambiente emitir as autorizações e

registros e fiscalizar produtos e atividades que envolvam OGM e seus derivados a serem

liberados nos ecossistemas naturais, de acordo com a legislação em vigor e segundo o

regulamento desta Lei, bem como o licenciamento, nos casos em que a CTNBio deliberar,

na forma desta Lei, que o OGM é potencialmente causador de significativa degradação do

meio ambiente;

Page 61: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

60

IV – à Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República emitir

as autorizações e registros de produtos e atividades com OGM e seus derivados destinados

ao uso na pesca e aqüicultura, de acordo com a legislação em vigor e segundo esta Lei e

seu regulamento.

§ 2o Somente se aplicam as disposições dos incisos I e II do art. 8

o e do caput do art.

10 da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, nos casos em que a CTNBio deliberar que o

OGM é potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente.

§ 3o A CTNBio delibera, em última e definitiva instância, sobre os casos em que a

atividade é potencial ou efetivamente causadora de degradação ambiental, bem como sobre

a necessidade do licenciamento ambiental.

§ 4o A emissão dos registros, das autorizações e do licenciamento ambiental referidos

nesta Lei deverá ocorrer no prazo máximo de 120 (cento e vinte) dias.

§ 5o A contagem do prazo previsto no § 4

o deste artigo será suspensa, por até 180

(cento e oitenta) dias, durante a elaboração, pelo requerente, dos estudos ou

esclarecimentos necessários.

§ 6o As autorizações e registros de que trata este artigo estarão vinculados à decisão

técnica da CTNBio correspondente, sendo vedadas exigências técnicas que extrapolem as

condições estabelecidas naquela decisão, nos aspectos relacionados à biossegurança.

§ 7o Em caso de divergência quanto à decisão técnica da CTNBio sobre a

liberação comercial de OGM e derivados, os órgãos e entidades de registro e

fiscalização, no âmbito de suas competências, poderão apresentar recurso ao CNBS,

no prazo de até 30 (trinta) dias, a contar da data de publicação da decisão técnica da

CTNBio.

CAPÍTULO V

Da Comissão Interna de Biossegurança – CIBio

Art. 17. Toda instituição que utilizar técnicas e métodos de engenharia genética ou

realizar pesquisas com OGM e seus derivados deverá criar uma Comissão Interna de

Biossegurança - CIBio, além de indicar um técnico principal responsável para cada projeto

específico.

Art. 18. Compete à CIBio, no âmbito da instituição onde constituída:

I – manter informados os trabalhadores e demais membros da coletividade, quando

suscetíveis de serem afetados pela atividade, sobre as questões relacionadas com a saúde e

a segurança, bem como sobre os procedimentos em caso de acidentes;

II – estabelecer programas preventivos e de inspeção para garantir o funcionamento

das instalações sob sua responsabilidade, dentro dos padrões e normas de biossegurança,

definidos pela CTNBio na regulamentação desta Lei;

III – encaminhar à CTNBio os documentos cuja relação será estabelecida na

regulamentação desta Lei, para efeito de análise, registro ou autorização do órgão

competente, quando couber;

Page 62: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

61

IV – manter registro do acompanhamento individual de cada atividade ou projeto em

desenvolvimento que envolvam OGM ou seus derivados;

V – notificar à CTNBio, aos órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos no

art. 16 desta Lei, e às entidades de trabalhadores o resultado de avaliações de risco a que

estão submetidas as pessoas expostas, bem como qualquer acidente ou incidente que possa

provocar a disseminação de agente biológico;

VI – investigar a ocorrência de acidentes e as enfermidades possivelmente

relacionados a OGM e seus derivados e notificar suas conclusões e providências à

CTNBio.

CAPÍTULO VI

Do Sistema de Informações em Biossegurança – SIB

Art. 19. Fica criado, no âmbito do Ministério da Ciência e Tecnologia, o Sistema de

Informações em Biossegurança – SIB, destinado à gestão das informações decorrentes das

atividades de análise, autorização, registro, monitoramento e acompanhamento das

atividades que envolvam OGM e seus derivados.

§ 1o As disposições dos atos legais, regulamentares e administrativos que alterem,

complementem ou produzam efeitos sobre a legislação de biossegurança de OGM e seus

derivados deverão ser divulgadas no SIB concomitantemente com a entrada em vigor

desses atos.

§ 2o Os órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei,

deverão alimentar o SIB com as informações relativas às atividades de que trata esta Lei,

processadas no âmbito de sua competência.

CAPÍTULO VII

Da Responsabilidade Civil e Administrativa

Art. 20. Sem prejuízo da aplicação das penas previstas nesta Lei, os responsáveis

pelos danos ao meio ambiente e a terceiros responderão, solidariamente, por sua

indenização ou reparação integral, independentemente da existência de culpa.

Art. 21. Considera-se infração administrativa toda ação ou omissão que viole as

normas previstas nesta Lei e demais disposições legais pertinentes.

Parágrafo único. As infrações administrativas serão punidas na forma estabelecida no

regulamento desta Lei, independentemente das medidas cautelares de apreensão de

produtos, suspensão de venda de produto e embargos de atividades, com as seguintes

sanções:

I – advertência;

II – multa;

III – apreensão de OGM e seus derivados;

IV – suspensão da venda de OGM e seus derivados;

Page 63: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

62

V – embargo da atividade;

VI – interdição parcial ou total do estabelecimento, atividade ou empreendimento;

VII – suspensão de registro, licença ou autorização;

VIII – cancelamento de registro, licença ou autorização;

IX – perda ou restrição de incentivo e benefício fiscal concedidos pelo governo;

X – perda ou suspensão da participação em linha de financiamento em

estabelecimento oficial de crédito;

XI – intervenção no estabelecimento;

XII – proibição de contratar com a administração pública, por período de até 5 (cinco)

anos.

Art. 22. Compete aos órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos no art. 16

desta Lei, definir critérios, valores e aplicar multas de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$

1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais), proporcionalmente à gravidade da

infração.

§ 1o As multas poderão ser aplicadas cumulativamente com as demais sanções

previstas neste artigo.

§ 2o No caso de reincidência, a multa será aplicada em dobro.

§ 3o No caso de infração continuada, caracterizada pela permanência da ação ou

omissão inicialmente punida, será a respectiva penalidade aplicada diariamente até cessar

sua causa, sem prejuízo da paralisação imediata da atividade ou da interdição do

laboratório ou da instituição ou empresa responsável.

Art. 23. As multas previstas nesta Lei serão aplicadas pelos órgãos e entidades de

registro e fiscalização dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Saúde,

do Meio Ambiente e da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da

República, referidos no art. 16 desta Lei, de acordo com suas respectivas competências.

§ 1o Os recursos arrecadados com a aplicação de multas serão destinados aos órgãos e

entidades de registro e fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, que aplicarem a multa.

§ 2o Os órgãos e entidades fiscalizadores da administração pública federal poderão

celebrar convênios com os Estados, Distrito Federal e Municípios, para a execução de

serviços relacionados à atividade de fiscalização prevista nesta Lei e poderão repassar-lhes

parcela da receita obtida com a aplicação de multas.

§ 3o A autoridade fiscalizadora encaminhará cópia do auto de infração à CTNBio.

§ 4o Quando a infração constituir crime ou contravenção, ou lesão à Fazenda Pública

ou ao consumidor, a autoridade fiscalizadora representará junto ao órgão competente para

apuração das responsabilidades administrativa e penal.

Page 64: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

63

CAPÍTULO VIII

Dos Crimes e das Penas

Art. 24. Utilizar embrião humano em desacordo com o que dispõe o art. 5o desta Lei:

Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Art. 25. Praticar engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano ou

embrião humano:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Art. 26. Realizar clonagem humana:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Art. 27. Liberar ou descartar OGM no meio ambiente, em desacordo com as normas

estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

§ 1o (VETADO)

§ 2o Agrava-se a pena:

I – de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se resultar dano à propriedade alheia;

II – de 1/3 (um terço) até a metade, se resultar dano ao meio ambiente;

III – da metade até 2/3 (dois terços), se resultar lesão corporal de natureza grave em

outrem;

IV – de 2/3 (dois terços) até o dobro, se resultar a morte de outrem.

Art. 28. Utilizar, comercializar, registrar, patentear e licenciar tecnologias genéticas

de restrição do uso:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Art. 29. Produzir, armazenar, transportar, comercializar, importar ou exportar OGM

ou seus derivados, sem autorização ou em desacordo com as normas estabelecidas pela

CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.

CAPÍTULO IX

Disposições Finais e Transitórias

Art. 30. Os OGM que tenham obtido decisão técnica da CTNBio favorável a sua

liberação comercial até a entrada em vigor desta Lei poderão ser registrados e

comercializados, salvo manifestação contrária do CNBS, no prazo de 60 (sessenta) dias, a

contar da data da publicação desta Lei.

Page 65: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

64

Art. 31. A CTNBio e os órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos no art.

16 desta Lei, deverão rever suas deliberações de caráter normativo, no prazo de 120 (cento

e vinte) dias, a fim de promover sua adequação às disposições desta Lei.

Art. 32. Permanecem em vigor os Certificados de Qualidade em Biossegurança,

comunicados e decisões técnicas já emitidos pela CTNBio, bem como, no que não

contrariarem o disposto nesta Lei, os atos normativos emitidos ao amparo da Lei no 8.974,

de 5 de janeiro de 1995.

Art. 33. As instituições que desenvolverem atividades reguladas por esta Lei na data

de sua publicação deverão adequar-se as suas disposições no prazo de 120 (cento e vinte)

dias, contado da publicação do decreto que a regulamentar.

Art. 34. Ficam convalidados e tornam-se permanentes os registros provisórios

concedidos sob a égide da Lei no 10.814, de 15 de dezembro de 2003.

Art. 35. Ficam autorizadas a produção e a comercialização de sementes de cultivares

de soja geneticamente modificadas tolerantes a glifosato registradas no Registro Nacional

de Cultivares - RNC do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Art. 36. Fica autorizado o plantio de grãos de soja geneticamente modificada tolerante

a glifosato, reservados pelos produtores rurais para uso próprio, na safra 2004/2005, sendo

vedada a comercialização da produção como semente. (Vide Decreto nº 5.534, de 2005)

Parágrafo único. O Poder Executivo poderá prorrogar a autorização de que trata o

caput deste artigo.

Art. 37. A descrição do Código 20 do Anexo VIII da Lei no 6.938, de 31 de agosto de

1981, acrescido pela Lei no 10.165, de 27 de dezembro de 2000, passa a vigorar com a

seguinte redação:

"ANEXO VIII

Código Categoria Descrição Pp/gu

........... ................ .............................................................................................................. .............

20 Uso de

Recursos

Naturais

Silvicultura; exploração econômica da madeira ou lenha e

subprodutos florestais; importação ou exportação da fauna e flora

nativas brasileiras; atividade de criação e exploração econômica de

fauna exótica e de fauna silvestre; utilização do patrimônio genético

natural; exploração de recursos aquáticos vivos; introdução de

espécies exóticas, exceto para melhoramento genético vegetal e uso

na agricultura; introdução de espécies geneticamente modificadas

previamente identificadas pela CTNBio como potencialmente

causadoras de significativa degradação do meio ambiente; uso da

diversidade biológica pela biotecnologia em atividades previamente

identificadas pela CTNBio como potencialmente causadoras de

significativa degradação do meio ambiente.

Médio

........... ................ ............................................................................................................... .............

Page 66: Izael Bezerra de Sousa - portal.trf1.jus.br...6 SGRECCIA, Elio. Manual de bioética. Fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Edições Loyola, 1996. p. 213. 8 sonho de Adous Huxley,

65

Art. 38. (VETADO)

Art. 39. Não se aplica aos OGM e seus derivados o disposto na Lei no 7.802, de 11 de

julho de 1989, e suas alterações, exceto para os casos em que eles sejam desenvolvidos

para servir de matéria-prima para a produção de agrotóxicos.

Art. 40. Os alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou

animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGM ou derivados deverão conter

informação nesse sentido em seus rótulos, conforme regulamento.

Art. 41. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 42. Revogam-se a Lei no 8.974, de 5 de janeiro de 1995, a Medida Provisória n

o

2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o, 6

o, 7

o, 8

o, 9

o, 10 e 16 da Lei n

o 10.814, de

15 de dezembro de 2003.

Brasília, 24 de março de 2005; 184o da Independência e 117

o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Márcio Thomaz Bastos

Celso Luiz Nunes Amorim

Roberto Rodrigues

Humberto Sérgio Costa Lima

Luiz Fernando Furlan

Patrus Ananias

Eduardo Campos

Marina Silva

Miguel Soldatelli Rossetto

José Dirceu de Oliveira e Silva