fundamentos filosíficos da mec quântica

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  • 8/4/2019 Fundamentos Filosficos da Mec Quntica

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    Fundamentos Filosficos da Fsica

    QunticaPreliminares MatemticosTexto em elaborao

    (para uso exclusivo em sala de aula)

    Departamento de Filosofia

    Universidade Federal de Santa Catarina

    September 16, 2009

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    i

    c Grupo de Logica e Fundamentos da Ciencia UFSC/CNPq

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    Contedo

    1 A base lgica e matemtica 5

    1.1 Os postulados da lgica elementar clssica . . . . . . . . . . . . . . . . . 6

    1.2 Os postulados de ZFC . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71.3 Deduo em ZFC . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

    2 Noes de lgebra 15

    2.1 Leis de composio e elementos notveis . . . . . . . . . . . . . . . . . 152.2 Relaes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 182.3 Estruturas matemticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

    2.3.1 Ordem de uma estrutura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 202.3.2 Digresso: a cincia da estrutura . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

    2.4 Grupos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 222.4.1 Grupos de permutao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

    2.5 Corpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 253 Espaos Vetoriais 27

    3.1 Combinaes lineares, superposies . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 303.2 Sub-espaos vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 313.3 Espao gerado, base . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 343.4 Espaos vetoriais isomorfos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

    4 Produtos Internos 39

    4.0.1 A condio de normalizao na teoria quntica . . . . . . . . . . 434.1 Ortogonalidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45

    4.1.1 Coeficientes de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

    5 Operadores Lineares 49

    5.1 Representao matricial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 505.2 Matriz de mudana de base . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 535.3 Produto de operadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53

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    CONTEDO 1

    5.3.1 O comutador . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 545.3.2 O espao dos operadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55

    5.4 Funcionais Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55

    6 Autovetores e autovalores, diagonalizao 57

    6.0.1 O papel dos autovetores e dos autovalores na mecnica quntica . 596.1 Diagonalizao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59

    7 Matrizes e operadores ortogonais e unitrios 61

    7.0.1 Operadores de evoluo e hamiltoniano . . . . . . . . . . . . . . 62

    8 Somas, somas diretas e projees 65

    8.1 Resoluo da identidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67

    8.2 A funo trao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 688.3 O valor esperado da medida de um observvel . . . . . . . . . . . . . . . 69

    9 Produto tensorial 71

    10 Apndice A

    Matrizes e operaes com matrizes 73

    11 Apndice B

    Noes de clculo diferencial 79

    11.1 Um pouco de histria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7911.2 Funes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79

    11.3 Limites de funes e de sequncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8311.3.1 Derivadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84

    12 Apndice C

    Noes sobre clculo integral 85

    13 Apndice D

    Noes sobre equaes diferenciais 87

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    2 CONTEDO

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    Prefcio

    Este texto destina-se a estudantes de filosofia, matemtica ou fsica que tenhaminteresse por questes filosficas relacionadas fsica quntica. Como essas dis-cusses tm sentido preciso unicamente luz do formalismo matemtico dessa

    teoria (na verdade, de um conglomerado de teorias), nesta primeira parte daremosateno ao formalismo matemtico unicamente, deixando a discusso filosficapara um segundo volume, ainda que vrias indicaes sobre os vnculos do for-malismo com a fsica sejam apontados no decorrer do texto.

    Por formalismo entenderemos aqui o que usualmente assim denominadonos livros de fsica, a saber, a formulao da teoria quntica em uma parte daAnlise Matemtica denominada de teoria dos espaos de Hilbert. Teremos de-pois que justificar porque, na verdade, pode-se erigir diferentes teorias qunticascom base nessa estrutura. A despeito disso, falaremos de teoria quntica ou demecnica quntica simplesmente, como habitual. Questes atinentes lgica

    e base matemtica dessa teoria (uma teoria de conjuntos) sero comentadas semmuita delonga no Captulo 1. Como a estrutura matemtica que nos interessa ade espao de Hilbert, procuraremos ir o mais rapidamente possvel para esse con-ceito, o que se inicia a fazer no Captulo 2. Resumidamente, um espao de Hilbert um espao vetorial com produto interno que completo relativamente normainduzida por esse produto interno. Para entendermos bem o que isso significa, v-rias definies so necessrias, e procuraremos deixar o texto mais autosuficientepossvel. O leitor que tiver a pacincia de seguir todas as definies e teoremas,chegar quele conceito sem dificuldadepelo menos isso o que se espera.

    A bem do rigor, salientamos que estaremos operando em uma teoria de con-juntos, que pode ser o sistema ZFC (Zermelo-Fraenkel com o Axioma da Esco-

    lha). Isso significa que todos os conceitos que supusermos podem (exceto em casoexplicitado) ser descritos em tal teoria.

    Aqueles alunos que no tm familiaridade com matrizes devem recorrer aoApndice A sempre que necessrio.

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    4 CONTEDO

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    Captulo 1

    A base lgica e matemtica

    A teoria matemtica na qual trabalharemos, e na qual todos os conceitos neces-srios podem ser desenvolvidos, denominada de teoria de conjuntos Zermelo-Fraenkel de primeira ordem, ou simplesmente ZFC. O C refere-se ao Axiomada Escolha, que assumiremos aqui sem comentrios detalhados.

    A linguagem de ZFC, denotada LZFC, constituda pelos seguintes smbolosprimitivos:

    1. Uma coleo enumervel de variveis individuais, que denotaremos porx,y,z, . . . possivelmente com ndices. Mais frente, usaremos outros sm-bolos para denotar elementos especficos (nmeros, vetores, etc.).

    2. Os smbolos lgicos usuais, a saber: conectivos proposicionais , , , , (podemos escolher qualquer conjunto adequado de conectivos, como e por exemplo),1 quantificadores , (um deles podendo ser definido apartir do outro), o smbolo de igualdade, =.

    3. Smbolos de pontuao: parnteses e vrgula.

    4. O smbolo de pertinncia, , entendido como um smbolo de predicado bi-nrio.

    As frmulas deL

    ZFC so definidas por recurso, da seguinte forma: as fr-

    mulas atmicas so expresses da forma x = y e x y, para x e y variveisindividuais. Se A e B so frmulas e se x uma varivel individual, ento as ex-presses da forma A e A B so frmulas; a partir dessas, podemos definir,

    1Sobre conjuntos adequados de conectivos, consultar [Mendelson 1997].

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    6 CAPTULO 1. A BASE LGICA E MATEMTICA

    como usual, AB, AB e A B como abaixo. Finalmente, xA uma frmula,e as nicas frmulas so as obtidas por uma dessas clusulas.

    Admitindo que o leitor tem alguma familiaridade com o uso de parnteses,temos:

    1. A B =def (A B)2. A B =def A B3. A B =def (A B) (B A)4. xA =def xA

    5. x y=

    def (x y)6. x y =def (x = y)7. PxA =def x(P(x) A) (quantificador existencial restrito)8. PxA =def x(P(x) A) (quantificador universal restrito)Os postulados de ZFC podem ser divididos em dois grupos, os da lgica cls-

    sica de primeira ordem, ou lgica elementar clssica, e os de ZFC propriamenteditos, que balizam o predicado . ZFC pode tambm ser formalizada usando-seuma lgica de ordem superior em vez da de primeira ordem, mas aqui seguiremos

    o procedimento que se tornou mais comum e que o mais usado pelos filsofos,quando eles se referem a isso.

    1.1 Os postulados da lgica elementar clssica

    Tendo em vista as convenes lingusiticas e definies vistas acima, so os se-guintes os postulados (axiomas, esquemas de axiomas e regras de inferncia) dalgica elementar clssica, sendo A, B e C frmulas quaisquer e x uma varivelindividual:

    1. A (B A)2. (A (B C)) ((A B) (A C))3. (A B) ((A B) A) (Reduo ao Absurdo)

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    1.2. OS POSTULADOS DEZFC 7

    4. A,A B/B (Modus Ponens)

    5. xA(x) A(y),6. x(A B(x)) (A xB(x))7. A/xA (Generalizao)8. x(x = x) (Reflexividade da Identidade, ou Princpio da Identidade)9. xy(x = y (A(x) A(y)) (Substitutividade da Identidade)

    Os detalhes sobre esse (e outros equivalentes) sistema podem ser vistos em[Mendelson 1997].

    1.2 Os postulados de ZFC

    Os postulados especficos de ZFC sero vistos nesta seo. Daremos uma expli-cao intuitiva de cada um deles e depois a sua descrio simblica.

    (ZFC.1) [Extensionalidade] Quaisquer que sejam os conjuntos x e y, se todos oselementos do conjunto x so elementos do conjunto y e reciprocamente, ou seja,se x e y tm exatamente os mesmos elementos, ento x e y so o mesmo conjunto:

    xy(z(z x z y) x=

    y) (1.1)Ou seja, um conjunto determinado pelos seus elementos. Observe que a re-

    cproca do teorema, qual seja, que conjuntos idnticos tm os mesmos elementos, conseqncia da substitutividade da igualdade vista na seo anterior.2

    (ZFC.2) [Conjunto Vazio] Existe um conjunto que no tem elementos, dito con-junto vazio:

    xy(y x) (1.2)Chamemos por um momento de A o conjunto postulado por este axioma. V-

    se ento que, se A for tambm conjunto que satisfaa o axioma em apreo, resulta2Basta tomar (x) como sendo z(z x z x); sabendo que as restries mencionadas so

    satisfeitas, resulta, pondo y no lugar do segundo x para obter (y), que esta se torna z(z x z y). Da, lembrando que ( ) equivale a se uma tautologia, e de que de e segue , vem o resultado, aqui citado por curiosidade.

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    8 CAPTULO 1. A BASE LGICA E MATEMTICA

    de ZFC.1 que A = A. Ou seja, h um nico conjunto vazio; introduz-se ento,como usual, o smbolo

    para denotar este conjunto; logo, tem-se que

    x(x

    ).

    Observa-se ainda que ZFC.1 impossibilita a existncia de entidades que sejamdestitudas de elementos (tomos) que sejam distintos do conjunto vazio. Comefeito, suponha que x um tomo, isto , um objeto (distinto do conjunto vazio)que no tem elementos; ento z x e z so ambos falsos, e conseqentementeo bicondicional z x z verdadeiro; portanto, luz de ZFC.1, deve-se terx = , o que contraria a hiptese de que x distinto do conjunto vazio.

    O axioma da extensionalidade, juntamente com os axiomas da igualdade dalgica elementar, fornecem a caracterizao do conceito de igualdade na teoria deconjuntos (e, conseqentemente, na matemtica).

    (ZFC.3) [Axioma do Par] Dados x e y quaisquer, existe um conjunto que contmx e y como elementos e somente eles:

    xyzt(t z t= x t= y) (1.3)

    Este conjunto denotado {x,y}, dito par(no ordenado) de x e y. fcil provar(decorre do axioma da extensionalidade) que, para quaisquer x e y, {x,y} = {y, x}.No axioma acima, nada indica que x e y no possam ser o mesmo conjunto, vindoda que o conjunto unitrio de x por definio o conjunto {x} =def {x, x}. Poroutro lado, pomos x,y =def {{x}, {x,y}} para denotar o par ordenado de x e y(nesta ordem); esta definio devida ao matemtico russo C. Kuratowski. H

    outras maneiras de se definir o par ordenado de dois conjuntos; por exemplo,poderamos ter usado x,y =def {{, x}, {{},y}}; qualquer que seja a definio quese adote (a que usamos a mais simples), o que se objetiva que ela permita quese possa provar o seguinte resultado, que expressa a propriedade fundamental dospares ordenados: para quaisquer x,y,z, w, tem-se que

    x,y = z, w see x = z y = w. (1.4)

    Usando-se a definio acima de par ordenado, pode-se introduzir os con-ceitos de tripla, qudrupla, quntupla, . . . n-upla ordenada, do seguinte modo:

    x1, . . . , xn =def x1, . . . , xn1, xn. Ademais, usando-se o conceito de par orde-nado, introduz-se facilmente os conceitos de relao (binria) e de funo, assimcomo definem-se os conceitos de funo injetiva, bijetiva, sobrejetiva, de as rela-es de ordem, boas ordens, etc. (algumas dessas definies sero mencionadas frente).

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    1.2. OS POSTULADOS DEZFC 9

    Dizemos que x subconjunto de y, e escrevemos x y, se todo elemento de x tambm elemento de y. Em smbolos, x

    y =

    def z(z

    x

    z

    y). Diz-se que

    x subconjunto prprio de y, e escreve-se x y, se x y x y.O axioma seguinte assevera que podemos formar um conjunto tomando todos

    os subconjuntos de um conjunto dado, dito conjunto das partes, conjunto potnciaou conjunto dos subconjuntos do referido conjunto.

    (ZFC.4) [Conjunto Potncia]

    xyz(z y z x)

    Este conjunto, que se pode provar ser nico para cada x, denotado P(x).Importante observar uma distino fundamental entre

    e

    , j que x

    P(y)

    x y.O postulado seguinte o Esquema da Separao, tambm denominado de Axi-

    oma dos Subconjuntos. Esse postulado foi introduzido por Zermelo, como ditono captulo anterior; no entanto, como visto, Zermelo no havia caracterizado demodo preciso o significado de proprietat definit, o que foi feito por Skolem (epor Fraenkel) alguns anos depois. Tal definio resulta essencialmente naquela defrmula da linguagem de ZFC.

    Uma frmula de ZFC que no contm variveis livres dita ser uma sen-tena de ZFC. Uma sentena uma assero acerca de determinados conjuntos(na verdade, acerca dos objetos do domnio, que podem no ser conjuntos), aqual podemos (pelo menos em princpio) saber se verdadeira ou falsa. De umafrmula que contenha variveis livres, pelo contrrio, no podemos asseverar nadaacerca de sua verdade ou falsidade, uma vez que no sabemos a quais conjuntosas variveis livres esto se referindo. Por exemplo, falando intuitivamente, dei-xemos x percorrer o conjunto dos nmeros naturais; ento, no podemos saber sex {1, 2, 3} verdadeira ou falsa, pois tal assero depende do que seja x; maspodemos seguramente afirmar que x(x {1, 2, 3}) falsa. No entanto, se atri-bumos uma interpretao para as variveis livres de uma frmula, ela ganha umsignificado, e podemos indagar acerca de sua veracidade para aquela atribuio.Uma frmula que contenha uma s varivel livre x dita ser uma propriedade

    dos objetos que constituem o domnio de x. Em geral, uma propriedade nessesentido representada pela notao P(x), F(x), ou outra letra conveniente.Vem ento o postulado seguinte (a palavra esquema reflete o fato de que na

    realidade a expresso abaixo encerra uma infinidade de axiomas, um para cadafrmula F(x) que se considere):

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    10 CAPTULO 1. A BASE LGICA E MATEMTICA

    (ZFC.5) [Esquema da Separao] Seja F(x) uma frmula de ZF (uma pro-priedade) na qual a varivel y no figure livre. Ento, so axiomas cada uma dasexpresses obtidas do esquema seguinte, mediante F(x)s distintas:

    zyx(x y x z F(x)) (1.5)O conjunto y em geral escrito {x z : F(x)}, que obviamente um subcon-

    junto de z (da a denominao de Axioma dos Subconjuntos dada ao postulado).Intuitivamente, o esquema acima diz que, dado um conjunto z, podemos obter

    um subconjunto de z tomando aqueles dentre os seus elementos que tm umadeterminada propriedade, expressa por uma frmula F(x) de ZF. Por exemplo,uma vez obtido o conjunto dos nmeros naturais, podemos obter o subconjunto

    dos nmeros primos, separando aqueles naturais x primos por intermdio dapropriedade (que pode ser escrita adequadamente por uma frmula de ZFC) x um nmero primo.

    Observa-se que em ZFC no se pode considerar como lcitas quaisquer cole-es, como na teoria intuitiva, que sejam caracterizadas por uma frmula F(x), eque representvamos por {x : F(x)}, devido aos j conhecidos paradoxos. Cole-es da forma {x : F(x)} so chamadas de classes. O postulado acima limita asclasses que podem ser consideradas como conjuntos de ZFC. Este o princpio dalimitao de tamanho de Zermelo, que impe que podemos admitir unicamenteconjuntos de objetos que tenham uma certa propriedade, desde que tais objetosfaam parte de algum conjunto j especificado pela teoria, como j discutimos no

    captulo anterior.Insistindo um pouco: de maneira geral, vamos chamar de classes s colees

    de objetos que satisfazem uma condio F(x) dada. Como vimos, se tomarmoscomo lcita a existncia arbitrria de tais classes, podemos incorrer em contra-dies, como aquela originada quando se toma F(x) para ser x x (o que d oParadoxo de Russell), uma vez que no se formou antes (no sentido do par-grafo anterior) o conjunto de onde tais x deveriam ser separados pelo axiomaacima. H portanto o problema de se saber quais classes realmente representamconjuntos; a resposta, como vimos insistindo, depende dos axiomas que se adota.

    Observa-se ento que o Esquema da Separao no atribui a toda e qualquer

    classe o status de conjunto. Alguns conjuntos so obtidos, pelo Esquema daSeparao, a partir de um conjunto j dado, separando-se dele um subconjuntode objetos que tenham alguma propriedade especificada. As demais maneiras dese obter os conjuntos de ZFC vm dos demais axiomas. O Esquema da Separaoevita que classes muito grandes, formadas por objetos tais que no se possa

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    1.2. OS POSTULADOS DEZFC 11

    especificar de qual conjunto tenham vindo, no so lcitas em ZFC. Deste modo,colees como a coleo de todos os grupos, ou de todos os conjuntos unitriosno so conjuntos de ZFC.

    Seja (x,y) uma frmula de ZFC na qual x e y so variveis livres. Dizemosento que (x,y) uma condio x-funcional se, para cada x, existe um nico y talque (x,y) seja verdadeira. Isto se escreve assim: x!y(x,y).3 Nesta situao,um novo axioma, denominado de Esquema da Susbstituio, vai dizer que dadoum conjunto qualquer z, existe um conjunto w cujos elementos so precisamenteaqueles ts para os quais existe s z tal que (s, t) verdadeira. Em outraspalavras, a coleo das imagens dos ss do conjunto z pela funo tambmum conjunto. Postulamos ento que:

    (ZFC.6) [Esquema da Substituio]

    x!y(x,y) zwt(t w s(s z (s, t)) (1.6)sendo z, w, t, s variveis distintas entre si e distintas de todas as demais variveislivres de , e sendo que w no ocorre em .

    Pode-se provar facilmente que os axiomas do conjunto potncia e da substi-tuio implicam o axioma do par. Com efeito, dados a e b, considere a frmula(s, t, a, b) definida por (s = t= a) (s t= b), que s-funcional, como fcil verificar. Apliquemos o esquema da substituio ao conjunto z = PP(),que obtido por intermdio do axioma do conjunto potncia.4 Vem ento, para

    tal z: wt(t w s(s z ((s = t= a) (s t= b))),ou seja, w o conjunto que tem unicamente a e b como elementos.

    Ademais, tem-se que o Esquema da Substituio implica o Esquema da Se-parao. A prova tambm simples: faamos (x,y) ser x = y (x), sendo (x)uma frmula na qual z no ocorre livre. O antecedente do esquema da substituio ento verdadeiro, de sorte que o seu conseqente torna-se

    zwt(t w s(s z s = t(s))),3

    O leitor deve lembrar que !x(x) (existe um nico x tal que ) abrevia x(x)xy((x)(y) y = x), sendo y varivel que no ocorre em (x).4Note que o conjunto vazio pode ser derivado usando-se o esquema da separao, e este por

    sua vez implicado pelo esquema sa substituio, como veremos na seqncia, de sorte que noh outros axiomas especficos envolvidos na prova deste teorema alm dos dois referidos no seuenunciado.

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    12 CAPTULO 1. A BASE LGICA E MATEMTICA

    e portanto o conjunto w o conjunto cujos elementos so os elementos de tqueso precisamente os ss de z que satisfazem a propriedade .

    Informalmente, podemos descrever o efeito do esquema da substituio di-zendo que a imagem de um conjunto por uma funo (caracterizada pela condiox-funcional do enunciado do postulado) tambm um conjunto. Esse fato parecebvio do ponto de vista intuitivo, mas no pode ser derivado dos demais axiomasde ZFC. A importncia do esquema da substituio, no entanto, reside na sua uti-lidade para partes mais avanadas da teoria dos conjuntos, como na teoria dosordinais. Para os propsitos mais elementares, o esquema da separao se afigurasatisfatrio.

    (ZFC.7) [Conjunto Unio] Este axioma afirma que, dado um conjunto x, existe

    o conjunto unio de x, denotado x, isto , o conjunto cujos elementos so todosos conjuntos que pertencem a pelo menos um dos elementos de x. Em smbolos,

    xyz(z y t(z t t x)) (1.7)O conjunto unio de x denotado

    x. Resulta que

    z

    x t(t x z t).Apesar do smbolo

    estar sendo usado para denotar um certo conjunto, o

    conjunto unio de um certo conjunto de conjuntos, conveniente usar-se umanotao particular para denotar o caso especial desse conjunto de conjuntos terapenas dois elementos. Assim, se te u so os nicos elementos de x, ento x denotado por t u, que se denomina de unio de te u. Em outros termos, a uniode dois conjuntos pode ser ento definida (a existncia e unicidade desse conjunto garantida pelos axiomas precedentes): u v =def

    {u, v}.Munidos dos axiomas acima, estamos agora em condies de provar a exis-

    tncia de conjuntos com trs, quatro, etc. elementos. Com efeito, {x,y,z} =def{x,y} {z}, ao passo que {x,y,z, t} =def {x,y,z} {t}, e assim por diante.

    Usando o Esquema da Separao, podemos agora obter a interseo de doisconjuntos x ey como sendo o conjunto xy =def {z xy : z xz y}. Note queseparamos, de um conjunto previamente obtido (a saber, x y), a coleo cujoselementos so aqueles conjuntos que pertencem simultaneamente a x e a y coma propriedade P(z) definida por z x z y. Pelo Esquema da Separao, talcoleo um conjunto. A sua unicidade decorre do Axioma da Extensionalidade.

    Na definio acima, fizemos uso da notao que emprega { : } (dito abs-trator), que por sinal j havia sido empregada antes. Usando-a, podemos ca-

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    1.3. DEDUO EMZFC 13

    racterizar a unio de x (assim como sua interseo

    x) dos seguinte modo:

    x =def {z : t(t x z t)}, e tambm x =def {z : t(t x z t)},o que nos permite provar todas as propriedades conhecidas envolvendo esses con-ceitos, as quais podem ser vistas nos livros usuais.

    ZFC.8 [O Axioma da Regularidade] Dado um conjunto x, existe um elemento dex que no tem elementos em comum com x.

    x(x y(y x x y = )).

    ZFC.9 [O Axioma do Infinito] Este axioma assegura a existncia de um conjuntocom infinitos elementos.

    x( x y(y x y {y} x)).O ltimo axioma o mais polmico deles, mas foi constatado ser independente

    dos demais em 1963. Isso signifa que o Axioma da Escolha no pode nem serdemonstrado a partir dos demais (supostos consistentes) e nem a sua negaopode ser demonstrada.

    ZFC.10 [Axioma da Escolha] Dado um conjunto x cujos elementos so tembmconjuntos no vazios e dois a dois disjuntos, existe um conjunto que contm comoelementos exatemente um elemento de cada um desses conjuntos de x, ou seja,

    x(yz((y x z x y z) (y y z = )) yz(z x w(y z = {w}))).

    1.3 Deduo em ZFC

    A noo de deduo em ZFC a seguinte. Dizemos que uma frmula A dedu-tvel de um conjunto de frmulas, ou das frmulas em , e representamos estefato por

    A,

    se existe uma sequncia finita de frmulas de LZFC, B1, B2, . . . , Bn, tal que: (1) Bn A, e (2) cada Bi, 1 i n1 um axioma ou pertence a , ou consequncia defrmulas precedentes da sequncia por Modus Ponens ou Generalizao. Nestecaso, dizemos que demonstramos A a partir das premissas ou hipteses em , e

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    14 CAPTULO 1. A BASE LGICA E MATEMTICA

    enunciamos isso usando, como comum em matemtica, a palavra Teoremapara estabelecer o resultado.

    Se = , dizemos que A um teorema formal de ZFC, derivado de seuspostulados sem nenhuma hiptese adicional. Na linguagem matemtica usual,no apresentamos as demonstraes seguindo essa definio, mas meramente umargumento na linguagem natural, suplementada por smbologia da linguagem deZFC, que permite conduzir o leitor a aceitar a demonstrao como lcita. Umatal demonstrao, no entanto, pode ser reduzida ao esquema da definio prece-dente, ainda que isso custasse muito e fosse impraticvel (o que no nos exime deconhecer o que vem a ser uma demonstrao do ponto de vista formal).

    Em ZFC, a noo de verdade intuitiva, e identificada com demonstrao.Assim, as verdades de ZFC so os seus teoremas.

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    Captulo 2

    Noes de lgebra

    Em tudo o que se segue, supomos que trabalhamos na teoria ZFC apresentadano captulo precedente. Iniciaremos com algumas noes bsicas de lgebra, quepodem ser introduzidas em ZFC, no sentido de que todos os conjuntos supostosnas definies a seguir existem por fora dos axiomas dessa teoria.

    2.1 Leis de composio e elementos notveis

    Definio 2.1.1 (Operao Binria) Seja A um conjunto no vazio. Uma opera-

    o binria sobre A uma funo (ou aplicao) : A A A.

    Isso simplesmente um modo matemtico de dizer que estamos tomandodois elementos de A no necessariamente distintos, e operando com eles, ob-tendo assim um (eventualmente) terceiro elemento ainda em A. A imagem do par(a, b) pela funo denotado ab. Assim, na verdade um conjunto de triplasordenadas da forma (a, b, c), com a, b A e c = a b. Uma operao binria so-bre um conjunto A por vezes denominada de lei de composio interna sobre A(interna porque o resultado da operao entre elementos de A permanece sendoum elemento de A).

    Por exemplo, a adio de nmeros reais uma operao binria sobre o con-juntoR dos nmeros reais, e a operao de composio de funes uma operaobinria sobre o conjunto F(R) das funes reais de varivel real, a adio de ma-trizes de ordem m n uma operao binria sobre o conjunto das matrizes dessaordem, e assim por diante.

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    16 CAPTULO 2. NOES DE LGEBRA

    Exerccio 2.1.1 Procure caracterizar cada uma das operaes indicadas no pa-rgrafo anterior como funes, de acordo com a definio. Por exemplo, a adiode nmeros reais uma funo de R R em R que associa, a cada para, b denmeros reais, um nmero real a + b, dito soma de a e b.

    Definio 2.1.2 (Operaes associativa, comutativa, distributiva) Sejam e operaes binrias sobre A. Ento:

    1. associativa se, para todos a, b, c A, temos que a (b c) = (a b) c.2. comutativa se, para todos a, b A, temos que a b = b a.3. distributiva relativamente a se, para todos a, b, c A, temos que

    (a) a (b c) = (a b) (a c) (distributividade direita)(b) (b c) a = (b a) (c a) (distributividade esquerda).

    Evidentemente, se comutativa, sendo distributiva esquerda (direita) rela-tivamente a , ela ser distributiva relativamente a . Por exemplo a multiplicaode nmeros reais distributiva em relao adio de reais.

    Exerccio 2.1.2 (a) Mostre que a adio e a multiplicao de nmeros reais soassociativas e comutativas, e que a multiplicao distributiva relativamente adio. (b) Mostre que a composio de funes associativa, mas no comu-

    tativa, o mesmo se dando com a adio e a multiplicao de matrizes de mesmaordem.

    Definio 2.1.3 (Elemento Neutro) Um elemento e A um elemento neutropara se e a = a e = a para todo a A.

    Teorema 2.1.1 Se admite elemento neutro, ele nico.Demonstrao: Suponha que e e e sejam elementos neutros para . Ento e =e e = e.

    Por exemplo, 0 elemento neutro para a adio de reais, e a funo identi-

    dade o elemento neutro para a composio de funes. Qual o elemento neutrorelativamente adio de matrizes?

    Exerccio 2.1.3 A multiplicao de reais admite elemento neutro? E a operaode multiplicao de matrizes de ordem n?

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    2.1. LEIS DE COMPOSIO E ELEMENTOS NOTVEIS 17

    Observao 1 Ainda que no insistamos neste ponto aqui, conveniente ter-seem mente que uma operao binria pode ter unicamente elemento neutro em umdos lados, e neste caso via de regra no ser nico. Voc pode dar exemplos?Qual a codio necessria e suficiente para que um elemento neutro lateral sejaelemento neutro propriamente dito?

    Exerccio 2.1.4 Seja a operao binria sobre R definida por xy = x+y2 (mdiaaritmtica entre x e y). Verifique se associativa, comutativa, a admite elementoneutro.

    Exerccio 2.1.5 Operaes binrias importantes so as seguintes, que voc deveprocurar detalhar, definindo-as, verificando quais so associativsa, comutativas,

    admitem elemento neutro: (1) adio de vetores; (2) produto vetorial de vetores;(3) unio de conjuntos; (4) interseo de conjuntos; (5) composio de funes;(6) adio de matrizes.

    Definio 2.1.4 (Elemento Inverso) Seja operao binria sobre A e a Aque admita elemento neutro e. Um elemento a A dito ser elemento inverso esquerda de a relativamente a se a a = e. Um elemento a A dito elementoinverso direita de a relativamente a , se a a = e. Um elemento a A elemento inverso de a se a a = a a = e. Neste caso, diz-se que a inversvel.Independentemente da natureza da operao , costuma-se representar o inversode a, quando existe, por a1

    Dito de forma bem coloquial, contrariamente ao que ocorre com o elementoneutro, que um determinado elemento que, composto com qualquer outro dcomo resultado esse outro, o elemento inverso particular a cada elemento consi-derado: cada um tem o seu inverso (no caso de existirem).

    Teorema 2.1.2 Se uma operao associativa, ento cada elemento admiteno mais do que um inverso.

    Demonstrao: Suponha que a e a sejam inversos de a. (Repare que se soinversos, o so tanto direita quanto esquerda.) Ento temos: a = a

    e =

    a (a a) = (a a) a = e a = a.

    Observao 2 Fato semelhante ao indicado na Observao (1) aplica-se no casodo elemento inverso. Voc pode dar os detalhes?

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    18 CAPTULO 2. NOES DE LGEBRA

    Definio 2.1.5 (Operao n-ria) Uma operao n-ria (ou de peso n) sobreum conjunto A uma aplicao de An (o produto cartesiano de A por si mesmo nvezes) em A.

    Assim, uma operao n-ria sobre A associa um elemento de A a cada n-uplax1, . . . , xn de elementos de A.Definio 2.1.6 (Lei de composio externa) Sejam A e B dois conjuntos. Umalei de composio externa esquerda sobre B uma aplicao : A B B.Uma lei de composio externa direita sobre B uma aplicao : BA B.Exemplo 2.1.1 Seja B o conjunto dos vetores do plano e A = R. Ento a opera-o de multiplicao de um vetor ( esquerda) por um nmero real uma lei de

    composio externa ( esquerda) sobre B. Analogamente podemos considerar aoperao direita.

    Exemplo 2.1.2 Seja Rnn o conjunto das matrizes reais de ordem n. A operaodefinida por k.A = [k.ai j], para cada matriz A e cada nmero real k, uma lei decomposio externa sobre o referido conjunto de matrizes. (sobre essa notao,ver mais abaixo).

    Nos exemplos que estaremos interessados, via de regra, quando houver umelemento neutro, ele ser neutro tanto direita quanto esquerda, o mesmo sedando com sa leis externas, motivo pelo qual no mais insistiremos nessas dis-tines, falando simplesmente de elemento neutro e de inverso sem quaisquerqualificaes. Por exemplo, ser til escrever s vezes kem vez de k, sendo um vetor e kum nmero real ou complexo.

    2.2 Relaes

    Definio 2.2.1 (Relaes n-rias) Seja A um conjunto. Uma relao n-ria so-bre A um subconjunto de An.

    Se n = 2, falamos de relaes binrias. Assim, uma relao n-ria sobre A um conjunto de n-uplas ordenadas de elementos de A.

    Exemplo 2.2.1 A relao menor ou igual sobre nmeros reais uma relaobinria sobre R, representada por. Sempre que um para, b pertence a essarelao, escrevemos

    a b.

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    2.3. ESTRUTURAS MATEMTICAS 19

    Perceba a diferena entre uma relao binria e uma operao binria. Essasoperam com os elementos de A, originando novos elementos, enquanto que asrelaes simplesmente relacionam os elementos entre si. Um exemplo de umarelao ternria entre nmeros reais a relao x est entre y e z.

    Fato importante que toda operao n-ria pode ser vista como uma relaode ordem n + 1, como evidenciaremos mais abaixo.

    2.3 Estruturas matemticas

    Mais frente, veremos estruturas matemticas mais gerais do que as apresentadasneste seo e que so de importncia para o desenvolvimento das teorias fsicas.

    Por enquanto, aceitaremos que, informalmente, uma estrutura de primeira ordem constituda por um ou mais conjuntos e por operaes e relaes sobre os ele-mentos desses conjuntos, bem como por eventuais elementos distinguidos que soselecionados desses conjuntos para cumprirem papeis especiais. Por exemplo, te-remos uma estrutura se considerarmos o conjunto dos nmeros reais, munido dasoperaes de adio e de multiplicao entre seus elementos e dos elementos dis-tinguidos 0 e 1, que podemos representar assim:

    = R, +, , 0, 1. (2.1)Mais abaixo faremos uma distino entre espcies de estruturas e estuturas

    propriamente ditas. Vejamos por enquanto algumas das principais estruturas deinteresse.De maneira geral, podemos representar uma estrutura da seguinte forma

    A = D, {ci}iI, {Rj}jJ, {fk}kK,

    onde os ci so elementos distinguidos do domnio D, as Rj so relaes sobre D(subconjuntos de Dn) e as fk so funes (ou operaes) em D (aplicaes de Dn

    em D). possvel considerar tanto os elementos distinguidos quanto as operaescomo relaes particulares (os elementos distinguidos seriam relaes de peso 0,e as funes n-rias seriam relaes de peso n + 1). Dessa forma, uma estrutura

    reduz-se a algo da formaA = D, {Rj}jJ.

    Abaixo veremos alguns exemplos, como grupos, corpos, espaos vetoriais,etc.

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    20 CAPTULO 2. NOES DE LGEBRA

    Definio 2.3.1 (Isomorfismo de estruturas) Duas estruturas A = D, {Rj}jJe B =

    D

    ,{R

    j}jJso isomorfas se existe uma bijeo h : D

    D

    tal que

    Rj(x1, . . . , xn) Rj(h(x1), . . . , h(xn)) para toda relao Rj. Esta definio podeser estendida para estruturas de ordem superior.

    O conceito de isomorfismo entre estruturas pode ser estendido para estruturasde ordem superior, no sentido da seo seguinte.

    2.3.1 Ordem de uma estrutura

    Conceito importante o de ordem de uma estrutura, que aqui veremos de modono muito rigoroso. Vimos acima que uma estrutura possui um domnio, que umconjunto no vazio D. Se as relaes da estrutura tiverem como relacionadosunicamente elementos de D, a estrutura diz-se de primeira ordem. Por exemplo,grupos so estruturas de primeira ordem, como se pode constatar com uma simplesinspeo na seo seguinte.

    No entanto, h estruturas de ordem superior. A propsito, todas as estruturasrelevantes em cincia so estruturas de ordem superior. Um exemplo tpico aestrutura de espao topolgico. Um espao topolgico um par T= D, ondeD um conjunto no vazio (o domnio) e uma colecao de subconjuntos deD, ditos abertos de D. Apenas para seu conhecimento, a definio se completaexigindo-se que sejam satisfeitos os seguintes axiomas:

    1. e D pertencem a

    2. Se A, B , ento A B

    3. Se A1,A2, . . . uma coleo enumervel1 de elementos de , ento A1 A2 . . . pertence a .

    Diz-se que o conjunto uma topologia em D (ou sobre D). Podemos entender como uma relao entre subconjuntos de D; xy se e somente se x e y pertencem topologia . Neste sentido, a relao da estrutura no relaciona elementos do

    domnio; os relata so subconjuntos do domnio. Uma tal estrutura de segundaordem.

    1Um conjunto enumervel se existe uma bijeo entre ele e o conjunto dos nmeros naturais.Alguns autores chamam tais conjuntos de denumerveis. Um conjunto contvel se for finito ouenumervel.

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    2.3. ESTRUTURAS MATEMTICAS 21

    De forma anloga, pode-se ter relaes que envolvam colees de coleesde elementos de D, e assim por diante, de forma a termos estruturas de ordenscada vez mais altas. As estruturas relevantes em cincia, por exemplo em fsica,vo envolver coisas como variedades diferenciveis, certas lgebras, etc., que tmcomo relata entidades de ordem superior aos elementos do domnio (ou dosdomnios) considerado.

    Os filsofos em geral falam de estruturas em cincia como se elas fossem estu-turas de primeira ordem, e se reportam Teoria dos Modelos da lgica elementar(como em [Shoenfield 1967, cap.5], [Chang & Keisler 1980]) para a sua funda-mentao terica. Isso evidentemente constitui erro, pois como vimos as estrutu-ras importantes em cincia no so elementares, e o problema que no dispomosde uma teoria adequada de tais estruturas. Neste particular, o que se necessita

    uma teoria generalizada das estruturas matemticas, o que Newton da Costachama de Teoria de Galois Generalizada [da Costa 2005], [da Costa & Rodrigues 2007].

    2.3.2 Digresso: a cincia da estrutura

    A noo de estrutura central em matemtica e na sistematizao das discipli-nas cientficas. H quem defenda a idia de que a matemtica a disciplina quese ocupa do estudo de estruturas, estas concebidas de um certo modo (como asacima). Em particular, vale lembrar a posio de um clebre grupo de matemticos(principalmente franceses) que teve (e tem ainda) muita influncia na comunidade

    matemtica a partir dos nos 1930, que adota um psudnimo: Nicolas Bourbaki.Sua obra vasta e relevante. No que concerne as estruturas, Bourbaki caracteri-zou como fundamentais as estruturas de trs tipos bsicos (que ele denominava deestruturas mes): as algbricas, as de ordem e as topolgicas. Qualquer estruturamatemtica desse tipo ou uma adequada combinao de estruturas desse tipo,ainda que ele tenha deixado em aberta a questo de se desenvolvimentos ulterio-res da matemtica exigiriam a ampliao do quadro dessas estruturas bsicas. Porexemplo, o corpo dos reais um corpo (estrutura algbrica) ordenado (estruturade ordem) completo (no sentido topolgico, cf. definio dada na pgina 42).

    O que relevante que, de fato, o matemtico lida com estruturas, como

    grupo, corpo, espao vetorial, variedade diferencivel, geometria euclidiana, etc..Da mesma forma, o fsico trabalha com estruturas como a mecnica clssica departculas, a eletrodinmica de Maxwell, a mecnica quntica no relativista, ateoria quntica de campos, etc. Poucas delas se enquadram na Teoria dos Modelosusual. Abaixo, veremos algumas dessas estruturas.

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    22 CAPTULO 2. NOES DE LGEBRA

    2.4 Grupos

    O conceito de grupo, surgido de questes tericas em matemtica, adentrou afsica, tendo se tornado fundamental para a fcisa presente. Mais frente, veremosalguns exemplos de seu uso nessa disciplina.

    Definio 2.4.1 (Grupo) Um grupo uma estrutura G = G, onde G umconjunto no vazio, uma operao binria sobre G satisfazendo as condiesseguintes:

    1. associativa)2. admite elemento neutro e G

    3. Todo elemento a G admite um inverso a G.Se a operao for ainda comutativa, o grupo comutativo ou abeliano (em

    homenagem ao matemtico noruegus Niels Henrik Abel, 1802-1829).Em geral, quando nos referimos ao grupo G, mencionamos unicamente o con-

    junto G (dito domnio do grupo), dizendo (por abuso de linguagem) que G umgrupo com a operao . Isso ser feito para as demais estruturas introduzidasabaixo, em conformidade com a prtica matemtica usual.

    Por exemplo, e usando a notao mencionada, R um grupo quando munidoda operao de adio de reais, o conjunto F(R) um grupo quando munido daoperao de composio de funes, e o conjunto dos vetores geomtricos do

    plano mum grupo quando munido da operao de adio de vetores (regra doparalelogramo).

    Exerccio 2.4.1 (a) Detalhe cada um dos exemplos precedentes. (b) Diga porque o conjunto R dos nmeros reais no um grupo quando considerado com aoperao de multiplicao de reais.

    Um grupo de notvel interesse o chamado grupo de Klein, em honra ao ma-temtico alemo Felix Klein (1849-1925). O dominio o conunto G = {a, b, c, d}e a operao definida pela tabela abaixo:

    * a b c da a b c db b a d cc c d a bd d c b a

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    2.4. GRUPOS 23

    Exerccio 2.4.2 Identifique o elemento neutro do grupo acima e o inverso de cadaelemento.

    Definio 2.4.2 (Isomorfismo entre grupos) Dois grupos G1 = G1, 1 e G2 =G2, 2 so isomorfos se existe uma funo bijetiva H : G1 G2 tal que: (1)h(e1) = e2, sendo e1 e e2 os elementos neutros dos grupos respectivos, e (2) h(a 1b) = h(a) 2 h(b), para todos a, b G1.

    Exerccio 2.4.3 Mostre que o grupo de Klein acima isomorfo ao grupo G =G, , cujo domnio o conjunto G = {1, i, j, k} e a operao dada pelatabela abaixo:

    1 i j k 1 1 i j k i i 1 k j j j k 1 ik k j i 1

    Um modo alternativo de caracterizar grupos a seguinte. Um grupo umaestrutura da forma G = G, , e, , onde G no vazio, uma operao binriasobre G, e G um elemento distinguido e uma funo de G em G, tudo issocumprindo os seguintes postulados:

    1. associativa2. Para todo a G, tem-se que a e = e a = a

    3. Para todo a G, tem-se que a a = a a = e, sendo a a imagem doelemento a pela funo .

    As estruturas desta espcie coincidem com as da espcie anterior, de forma que asformulaes so equivalentes. Porm, neste caso, estamos explicitanto elementosdistinguidos e outros termos.

    Um grupo de fundamental importncia para nossas finalidades o seguinte.

    Considere (informalmente) o plano euclidiano R2

    com suas propriedades usuais,que no necessitam ser aqui explicitadas. Se fixarmos um sistema de coordenadasortogonais (por simplicidade) OXY, ento cada ponto P do plano fica determinadode modo nico por um par ordenado de nmeros reais (x,y), que so as coorde-nadas cartesianas ortogonais. Seja OP o segmento orientado com origem O e

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    24 CAPTULO 2. NOES DE LGEBRA

    extermidade P. Para nossos propsitos, vamos por abuso de linguagem identifi-car este segmento com um vetor (na verdade, geometricamente um vetor umaclasse de segmentos equipolentes). As coordenadas do ponto so portanto as dovetor. Definimos ento uma aplicao T do R2 no R2 do seguinte modo:

    T(x,y) = (x cos y sin , x sin +y cos ).Em linguagem matricial, essa transformao pode ser escrita da forma seguinte:

    T

    x

    y

    =

    cos sin sin cos

    x

    y

    Esta funo (transformao linear) uma transformao ortogonal, conforme

    veremos frente, e sua matriz

    R = cos sin

    sin cos

    uma matriz ortogonal. Intuitivamente, realiza uma rotao de ngulo do vetor(x,y) no sentido anti-horrio. O conjunto de tais transformaes, munido da ope-rao binria de composio de funes conhecido como grupo das rotaes doplano.

    Exerccio 2.4.4 Mostrar que a estrutura mencionada acima de fato um grupo.Identifique o elemento neutro e o inverso de dado elemento do grupo.

    2.4.1 Grupos de permutao

    Seja G = G, um grupo tal que G contm n elementos x1, . . . , xn. Uma funobijetiva f de G em G uma permutao de G. Por exemplo, seja G = {a, b, c}. Aspossveis permutaes de G so indicadas abaixo, onde na primeira linha escreve-mos o domnio das funes e na segunda linha suas imagens:

    f1 =

    a b ca b c

    , f2 =

    a b ca c b

    , f2 =

    a b cb a c

    ,

    f4 = a b c

    b c a , f5 =

    a b c

    c a b , f6 =

    a b c

    c b a .

    O produto (composio) de duas dessas funes ainda uma permutao deG, como fcil perceber. f1 a funo identidade. Munido deste produto, oconjunto das permutaes de G um grupo comutativo, dito grupo simtrico deG, denotado S ym(G).

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    2.5. CORPOS 25

    Exemplo 2.4.1

    1. Ache os produtos f1 f4, f2 f5 e f3 f3.2. Identifique o elemento neutro do grupo acima.

    3. Ache o inverso de cada um dos elementos do grupo.

    Para os interesses da fsica, importa o seguinte caso de permutaes. Suponhaque temos um conjunto D = {x1, . . . , xn}. Definimos a seguinte permutao sobreD, que permuta unicamente os elementos xi e xj, denotada Pi j:

    Pi j(x1, . . . , xi, . . . , xj, . . . , xn) = (x1, . . . , xj, . . . , xi, . . . , xn).

    Mais tarde, D representar uma coleo de objetos qunticos e Pi j aparecercomo um conceito importante de permuta entre dois desses objetos.

    2.5 Corpos

    A outra estrutura que nos interessa a de corpo.

    Definio 2.5.1 (Corpo) Um corpo uma estrutura K= K, +, , 0, 1 onde K um conjunto no vazio (na verdade, deve ter pelo menos dois elementos), + e sooperaes binrias sobre K, e 0, 1

    K so elementos distinguidos. Os seguintes

    postulados devem ser satisfeitos:

    1. K, + um grupo comutativo cujo elemento neutro 0 e o inverso de cadaelemento a K denotado a, dito oposto de a.

    2. K {0}, um grupo comutativo cujo elemento neutro 1, e o inverso decada elemento de K {0} denotado a1, e dito simtrico de a.

    3. distributiva em relao a +.

    Os corpos que nos interessam so alguns corpos numricos, em especial os

    chamados corpo dos (nmeros) reais e corpo dos (nmeros) complexos com asoperaes usuais em cada caso. Indistintamente do caso, os elementos de K sochamados de escalares. Como usual na terminologia matemtica, fala-se queK um corpo, fazendo-se referncia ao domnio da estrutura. tipicamente ocaso dos reais e dos complexos mencionados. O leitor deve entender que isso

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    26 CAPTULO 2. NOES DE LGEBRA

    um abuso de linguagem. s vezes, define-se um corpo como sendo uma estruturacomo a acima somente que a operao

    no comutativa; neste caso, quando

    for comutativa, esses matemticos falam ento em corpo comutativo, ou campo.No entanto, seguiremos com a definio dada. Portanto, quando falarmos queR (ou que C) um corpo, estaremos supondo a estrutura R = R, +, , 0, 1 ouC = C, +, , 0, 1 respectivamente. Obviamente, em cada caso, 0 e 1 representamnmeros reais ou complexos.

    Exerccio 2.5.1 Verifique que o conjuno dos nmeros racionais munido das ope-raes usuais um corpo, que podemos representar porQ = Q, +, , 0, 1.

    Exerccio 2.5.2 Justifique porque a estrutura Z = Z, +, , 0, 1, sendo Z o con-junto dos nmeros inteiros, + e as operaes de adio e de multiplicao deinteiros, 0 e 1 os inteiros zero e um, no um corpo. Essa estrutura tem outronome: anel.

    Exerccio 2.5.3 Verifique que o conjunto A = {0, 1} munido das operaes dadaspelas tabelas abaixo um corpo.

    + 0 10 0 11 1 0

    0 10 0 01 0 1

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    Captulo 3

    Espaos Vetoriais

    Uma estrutura fundamental para o estudo que realizaremos a denominada depr-espao de Hilbert, ou seja, um espao vetorial com produto interno. Essaestrutura central em fsica; os estados dos sistemas fsicos sero descritos porvetores unitrios (de comprimento unitrio) de um adequado espao de Hilbert,e os observveis fsicos (que nos daro a idia do que pode ser medido relati-vamente a um sistema fsico) sero representados por certas funes (operadoreshermitianos) sobre esses espaos. Trata-se ma verdade de um formalismo de umabeleza matemtica sem par, e de uma complicada natureza quanto sua inter-pretao, o que nos brinda com uma riqueza filosfica sem precedentes. Vamosadentrar a esse campo com cautela, inciando com o conceito de espao vetorial.

    Definio 3.0.2 (Espao vetorial) Um espao vetorial uma estrutura

    E = V, K, +, ,

    onde:

    1. V um conjunto no vazio cujos elementos so chamados de vetores. Taiselementos sero designados por letras gregas minusculas , , , . . ., masmais tarde usaremos a notao de Dirac, escrevendo |, |, |, ldots.

    2. K um corpo K= K, +, , 0, 1. Como j dito antes, via de regra falaremosdo domnio K em vez da estrutura K, mas o leitor deve estar atento paraeste fato. Os corpos dos quais faremos uso no que segue sero o corpo dosreais e o dos complexos.

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    28 CAPTULO 3. ESPAOS VETORIAIS

    3. + uma operao binria sobre V, dita adio de vetores, de sorte que

    V, +

    um grupo comutativo. O elemento neutro deste grupo chamado

    de vetor nulo, e designado porO.

    4. uma lei de composio externa (veja definio 2.1.6) sobre V , maisprecisamente, uma aplicao de K V em V, dita multiplicao de vetorpor escalar. Esta operao satisfaz os seguintes postulados, para todos e em V e todos a, b K:

    (a) a ( +) = a + a (b) (a + b) = a + b (c) (a

    b)

    = a

    (b

    )

    (d) 1 =

    Observao terminolgica Algumas observaes de notao so importantes.Doravante, excreveremos simplesmente a para denotar a , bem como ab paraa b. Observe que apesar de usarmos a mesma notao " "tanto para a multipli-cao de vetor por escalar quanto para a multiplicao de escalares, elas no soa mesma operao. Usar smbolos distintos tornaria o texto muito carregado, deforma que prosseguiremos com a prica matemtica usual de, como dizia Poin-car, usar o mesmo nome para coisas diferentes. O contexto, no entanto, deixarclaro quando de trata de uma ou de outra operao. O mesmo se aplica para a

    adio de vetores e para a adio de escalares, ambas denotadas por "+".Quando temos um caso de um espao vetorial E = V, K, +, , dizemos, mais

    uma vez por abuso de linguagem, que V um espao vetorial sobre K, ou que um K-espao vetorial. Nos casos particulares de K = R ou de K = C, falamos deespaos vetoriais reais ou complexos respctivamente.

    A notao de Dirac, I O fsico ingls Paul Adrian Maurice Dirac introduziuuma notao que se tornou universal em se tratando do uso de espaos vetoriaisem fsica quntica. Veremos mais detalhes dessa notao frente, mas por ora, conveniente saber que Dirac representava os vetores assim: |, |, etc., chamadoskets.O ltimo postulado pode parecer o mais estranho e menos evidente de to-dos. Mas ele fundamental. Se escrevemos para denotar o oposto de ,ento parece sensato pedir que = (1). No entanto, para provar este fatonecessitamos do referido axioma. Antes, provamos que 0 = 0. Com efeito,

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    0 = (0 + 0) = 0 + 0, donde 0 = O. Agora, podemos estabelecer o preten-dido: + (

    1) = 1 + (

    1) = (1

    1) = 0 = O. Portanto, dada a unicidade

    do oposto de , = (1).Exemplos importantes de espaos vetoriais so os seguintes.

    Exemplo 3.0.1 Seja Rn = {(x1, . . . , xn) : xi R} o conjunto das n-uplas de n-meros reais. Municiemos este conjunto com as operaes seguintes, onde k R,para obter um espao vetorial real:

    1. (x1, . . . , xn) + (y1, . . . ,yn) = (x1 + y1, . . . , xn + yn) (o leitor deve perceberque, esquerda da igualdade, "+"denota a adio de vetores, mas direitadenota a adio de escalares.

    2. k(x1, . . . , xn) = (kx1, . . . , kxn) (idem observao acima com respeito mul-tiplicao de vetor por escalar esquerda da igualdadee a multiplicaode escalares, direita).

    O espao vetorial do exemplo precedente ser denominado de Rn. De ma-neira semelhante, definimos o espao complexo Cn tomando operaes anlogass acima, somente que consideradas agora sobre C.

    Exemplo 3.0.2 Considere o conjunto F das funes reais de varivel real commesmo domnio, digamos o intervalo [a, b] R. Para f, g F , definimos asoperaes seguintes:

    1. (f + g)(x) = f(x) + g(x)

    2. (k f)(x) = k f(x)

    facil ver que resulta um espao vetorial real, cujo vetor nulo a funo nulan(x) = 0.

    Exemplo 3.0.3 Seja Rnm o conjunto das matrizes reais de ordem n m, munidodas operaes usuais de adio de matrizes e de multiplicao de matriz porescalar real. Neste caso, tem-se um espao vetorial real, cujo vetor nulo amatriz nula n

    m.

    Exerccio 3.0.4 Mostre que temos um espao vetorial real se tomarmos o con-junto R+ dos reais no negativos munido das operaes x + y = xy e kx = xk,para x,y R+ e k R. Veja o paralelo que h entre as operaes definidas e aspropriedades do logaritmo.

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    30 CAPTULO 3. ESPAOS VETORIAIS

    Exerccio 3.0.5 Todo corpo K = K, +, , 0, 1 pode ser visto como um espaovetorial sobre K. Dizemos que todo corpo um espao vetorial sobre si mesmo.Explique este fato.

    Exerccio 3.0.6 Mostre que se tomarmos C como conjunto de vetores e R comoconjunto de escalares, e considerando a adio de nmeros complexos como adi-o de vetores e a multiplicao de nmero complexo por nmero real como amultiplicao de vetor por escalar, resulta um espao vetorial real.

    Exerccio 3.0.7 Mostre que se tomarmos C como conjunto de vetores e o prprioC como conjunto de escalares, e considerando a adio de nmeros complexoscomo adio de vetores e a multiplicao de nmeros complexos como a multipli-cao de vetor por escalar, resulta um espao vetorial complexo.

    Exerccio 3.0.8 Mostre que se tomarmos R como conjunto de vetores e R comoconjunto de escalares, e considerando a adio de nmeros reais como adiode vetores e a multiplicao de nmero reais como a multiplicao de vetor porescalar, resulta um espao vetorial real.

    Exerccio 3.0.9 Justifique porque no resulta espao vetorial se tomarmosR comoconjunto de vetores e C como conjunto de escalares, e considerando a adio denmeros rais como adio de vetores e a multiplicao de nmero real por n-

    mero complexo como a multiplicao de vetor por escalar.

    3.1 Combinaes lineares, superposies

    Uma combinao linearde vetores a soma desses vetores, eventualmente mul-tiplicados por escalares, como = x11 + x22 + + xnn. Uma tal expresso por vezes denominada de superposio desses vetores. Isso ter importncia maistarde. Em especial, estaremos interessados em superposies nas quais se tenha

    ni=1

    |xi|2 = 1,

    que chamaremos de condio de normalizao. O motivo que os escalares xirepresentaro probabilidades, e sua soma dever ser igual unidade.

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    3.2. SUB-ESPAOS VETORIAIS 31

    Definio 3.1.1 (Dependncia e Independncia linear) Um conjunto A = {1, . . . , n}de vetores de um espao vetorial

    E linearmente independente (ou os vetores de

    A so linearmente independentes) se uma combinao linear da forma

    x11 + . . . + xnn = O

    implica x1 = . . . = xn = 0. Caso contrrio, o conjunto A (ou os seus vetores) solinearmente dependentes.

    Equivalentemente, A (ou os seus vetores) linearmente dependente de po-demos encontrar uma combinao linear nula (como a acima) com pelo menosum dos escalares xj diferente de 0. Por exemplo, o conjunto (os vetores) A =

    {(1, 2), (

    1, 1)

    }do R2 linearmente independente, j que

    x1(1, 2) + x2(1, 1) = (0, 0)

    acarreta x1 = x2 = 0. Por outro lado os vetores (1, 3) e (1, 3) so linearmentedependentes, como fcil verificar.

    Conveno Convenciona-se que o conjunto vazio de vetores linearmente in-dependente.

    3.2 Sub-espaos vetoriaisInformalmente, definiremos o que significa restringir uma operao a um con-

    junto. Primeiramente, vejamos o caso de operaes binrias. Seja A um conjuntosobre o qual est definida a operao binria , e seja B A. Como vimos, podeser identificada com o conjunto das triplas ordenadas da forma (a, b, a b), coma, b A. Restrinjamos agora o conjunto dessas triplas, considerando uicamenteaquelas tais que a, b B. imediato que tal coleo uma funo de B B emB, dita restrio da operao (definida sobre A), ao subconjunto B. Da mesmaforma, se uma lei de composio externa sobre A, se restringirmos os ele-mentos considerados a apenas aqueles que pertencem a B, obteremos uma lei de

    composio externa sobre B, tambm dita restrio (a B) da lei .Por exemplo, considere a adio de nmeros reais e agora considere esta ope-rao aplicada unicamente ao subconjunto dos reais que isomorfo ao conjuntodos nmeros inteiros. Temos ento (novamente por abuso de linguagem) umarestrio da operao de adio aos inteiros.

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    32 CAPTULO 3. ESPAOS VETORIAIS

    Definio 3.2.1 (Sub-espao vetorial) Seja E = V, K, +, e W V, W

    . Dizemos que

    W subespao vetorial de

    Vse

    W,K

    , +W

    ,W

    um espaovetorial sobre K, sendo +W e W restries das operaes de + e a W.

    Teorema 3.2.1 Uma condio necessria e suficiente para que W seja subes-pao vetorial de V que, para todos , V e para todo k K, se tenha:

    1. Se , W, ento + W.2. Se W, ento k W.

    Demonstrao: Quanto necessidade dessas condies, ela segue do fato de queum espao vetorial deve ser fechado ralativamente s operaes de adio de ve-tores e de multiplicao de vetor por escalar. Quanto suficincia dessas con-dies, basta verificar que delas resultam as condies da definio de espaovetorial para W, K, +W, W. Por exemplo, como W , existe W , logo = (1) W (pela segunda condio). Analogamente, pela primeira condi-o, 0 = W. Quanto s demais propriedades, em virtude de elas valerempara todos os vetores de V, valero em particular para os vetores de W, ou seja,so "herdadas"por W.

    Exemplo 3.2.1 Sendo W = {O}, sendo O o vetor nulo de V, ento W subes-pao vetorial de V. Este subespao chamado de subespao trivial de V.

    Exemplo 3.2.2 O conjunto das matrizes simtricas de ordem n um subespaodo espao das matrizes reais de ordem n.

    Exemplo 3.2.3 O conjunto das funes reais contnuas no intervalo [a, b] umsubespao do espao vetorial dado no exemplo 3.0.2.

    Exemplo 3.2.4 Consideremos o espao real R3 das triplas ordenadas de nmerosreais (um caso particular do espao Rn do exemplo 3.0.1). Os seguintes subcon- juntos so subespaos do R3 , e sero importantes abaixo para exemplos. Osnomes dados a esses espaos tem em mente (intuitivamente) um sistema de coor-denadas cartesianas para o espao tridimensional.

    1. X = {(x, 0, 0) : x R} ("eixo X").2. Y = {(0,y, 0) : y R} ("eixo Y").3. Z = {(0, 0,z) : z R} ("eixo Z").

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    3.2. SUB-ESPAOS VETORIAIS 33

    4. XY= {(x,y, 0) : x,y R} ("plano XY").

    5. XX= {(x, 0,z) : x,z R} ("plano XZ").6. YZ= {(0,y,z) : y,z R} ("plano YZ").7. P = {(x,y,z) : ax + by + cz = 0, a, b, c 0} (plano passando pela origem).8. R = {(x,y,z) : xa = yb = zc , a, b, c 0} (reta passando pela origem).

    Exerccio 3.2.1 Prove que cada um dos casos do exemplo anterior de fato defineum subespao do R3.

    Transformaes de fase Em fsica, estaremos interessados prioritariamente emespaos vetoriais sobre o corpo C dos nmeros complexos. Suponha ento que{1, . . . , n} uma coleo de vetores de um espao vetorial V, e consideremosa coleo de todas as combinaes lineares (superposies) de vetores desse con-

    junto. Seja um tal vetor. Uma funo (transformao)

    ei,

    para um ngulo dado, denominada de transformao de fase. Veremos depoisque a classe de todos os vetores que esto relacionados por uma transformaodesse tipo so as entidades matemticas que representam os sistemas fsicos. Es-

    sas classes so denominadas de raios (rays) em fsica.Para os fundamentos da fsica quntica, importante observarmos o seguinte.

    Teorema 3.2.2 A interseo de sub-espaos de um espao vetorial ainda umsub-espao desse espao.

    Demonstrao: Sejam W1 e W2 sub-espaos de um K-espao vetorial V, e sejaW = W1 W2. Ento, se e pertencem a W, pertencem a W1 e a W2. Comopor hiptese ambos so subespaos de V, tanto + pertencem a ambos (umsubespao fechado para a adio de vetores). Logo, ambos pertencem a W.Agora, suponha que

    W e que k

    K. Logo

    W1 e

    W2. Como

    so ambos subespaos, segue-se que k pertence a ambos os subsespaos (pelofechamento relativamente multiplicao de vetor por escalar). Logo, k W.

    A unio de subespaos, no entanto, no em geral um subespao (podendo sereventuamente). Por exemplo, seja V = R3, e W1 = {(x, 0, 0) : x R} ("eixo X"),

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    34 CAPTULO 3. ESPAOS VETORIAIS

    enquanto que W2 = {(0,y, 0) : y R} ("eixo Y"), como no exemplo 3.2.4 acima.Ora, W

    1 W

    2=

    {

    R3 :

    W

    1

    W

    2}, o que significa que esses vetores

    esto no eixo X ou no eixo Y (somente o vetor nulo est em ambos). Porm, asoma de dois vetores no nulos quaisquer 1 W1 e 2 W2 no pertence anenhum dos subespaos, logo a unio no fechada para a adio de vetores.

    H porm um menor subespao de V que contm a unio de subespaos, asaber, o espao gerado pela unio.

    3.3 Espao gerado, base

    Seja E = V, K, +, um espao vetorial e A = {1, . . . , n} um conjunto de

    vetores de V. Temos ento:Definio 3.3.1 Chama-se espao gerado por A ao conjunto

    [A] = { V : =n

    i=1

    xii, xi K}.

    Teorema 3.3.1 O conjunto [A] um subespao vetorial de E.Demonstrao: Basta notar que a soma de vetores de [A] ainda um vetor de[A], bem como a multiplicao de qualquer de seus vetores por um escalar (assimcumprindo as condies do teorema (3.2.1).

    Conveno Convenciona-se que [] = {O}.O espao gerado por um conjunto de vetores , portanto, o conjunto de todas as

    combinaes linerares desses vetores. Perceba que se o conjunto for linearmentedependente, alguns de seus vetores podem ser escritos como combinaes linearesdos demais, de forma que, para obter o espao gerado, esses vetores podem sersuprimidos, resultando o seguinte

    Teorema 3.3.2 Dado um conjunto de vetores A, existe sempre um subconjunto deA linearmente independente que gera o mesmo espao que A.

    Demonstrao: Seja A = {1, . . . , n} o conjunto em questo, que supomos serlinearmente dependente. Portanto, h um vetor j que pode ser escrito simplifica-damente como

    j =ij

    kii,

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    3.3. ESPAO GERADO, BASE 35

    ou seja, ele combinao linear dos demais vetores de A. Se [A], ento

    = x11 + . . . + xjj + . . . + xnn = ij

    xii + xjj,

    ou seja, =

    ij

    xii + xjij

    kii =ij

    (xi + ki)i,

    o que mostra ser combinao linear dos vetores de A, exceto j. Se A {j}for linearmente independente, o conjunto procurado. Se ainda for linearmentedependente, h um vetor nesse conjunto que combinao linear dos demais,e o processo pode ser repetido at que restem unicamente vetores linearmente

    independentes, que continuaro gerando o mesmo espao.

    Definio 3.3.2 (Base de um espao vetorial) Uma base para um espao veto-rial E um conjunto A de vetores de V que satisfaz as condies seguintes:

    1. A linearmente independente

    2. A gera E, ou seja, todo vetor de V combinao linear dos vetores de A.

    O conjunto A tem um cardinal, que no caso finito pode ser entendido intuitiva-mente como designando a quantidade de elementos de A. Pode-se demonstrar quetodas as bases de um espao vetorial tm a mesma cardinalidade. Este cardinalchama-se dimenso do espao vetorial.

    Definio 3.3.3 (Dimenso) Chama-se dimenso de um espao vetorial ao car-dinal de uma base desse espao.

    Por exemplo, o espao Rn tem dimenso n, pois tem o conjunto (com n ele-mentos)

    = {1, . . . , n}, (3.1)onde i = (0, . . . , 1, . . . , n) (com o 1 na i-sima posio) como uma base. Estabase dita base cannica do Rn.

    Da mesma forma, se olharmos agora os vertores 1 como formados por n-meros complexos, ento tambm representa uma base (cannica) para o espaocomplexo Cn. Essas bases desempenharo papel relevante frente.

    Um conceito importante o de matriz das coordenadas de um vetor em umabase ordenada. Seja A = {1, . . . , n} uma base ordenada para o espao vetorial

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    36 CAPTULO 3. ESPAOS VETORIAIS

    E = V, K, +, . Se V, podemos escrever = x11 + . . . +xnn. Denomina-sede matriz das coordenadas do vetor beta na base ordenada

    A matriz linha (com

    uma linha e n colunas)[]A = [x1 x2 . . . xn]. (3.2)

    Por exemplo, A = {(1, 1), (1, 2)} uma base ordenada para o R2, como fcil provar ( linearmente independente e todo vetor (x,y) R2 pode ser escritocomo combinao linear desses vetores). Seja = (2, 3). Ento, (2, 3) = x1(1, 1)+x2(1, 2), ou (2, 3) = (x1 x2, x1 +2x2), o que fornece x1 = 7/3 e x2 = 1/3. Assim,

    [(2, 3)]A = [7/3, 1/3].

    Importante o seguinte resultado.

    Teorema 3.3.3 (Unicidade das coordenadas) A matriz das coordenadas de umvetor em uma base ordenada nica.

    Demonstrao: Suponha por absurdo que []A = [x1 x2 . . . xn] e que []A =[y1 y2 . . . yn], para dada base e dado vetor. Ento, pela igualdade de matrizes,segue que xi = yi, para todo i.

    Cabe finalmente observar que, para espaos de dimenso infinita, como o es-pao das funes reais contnuas no intervalo [a, b], no se pode exibiruma base.

    Mas assume-se que elas existem, e isso na verdade pode ser demonstrado para umespao vetorial arbitrrio, a saber,

    Teorema 3.3.4 Todo espao vetorial possui uma base.

    A palavra uma deve ser entendida literalmente, como artigo indefinido, eno como indicando uma nica. Um espao vetorial, com exeo do subespaotrivial constitudo unicamente pelo vetor nulo (cuja base, como vimos, o con-

    junto vazio), admite uma infinidade de bases, todas elas de mesma cardinalidade.A demonstrao do teorema anterior faz uso do Axioma da Escolha (mais preci-

    samente, do Lema de Zorn, que lhe equivalente), e pode ser vista no Apndicede [Halmos 1993] (encontra-se a demonstrao tambm em vrios sites na web).Para as finalidades da fsica, estaremos interessados em bases ortonormais, maspara tanto necessitamos introduzir noes mtricas nos espaos vetoriais, o quefazemos por meio de um produto interno, como veremos no prximo captulo.

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    3.4. ESPAOS VETORIAIS ISOMORFOS 37

    3.4 Espaos vetoriais isomorfos

    Escreveremos E iso F para indicar que os espaos vetoriais E = V, K, +, eF= W, K, +, , ambos sobre o mesmo corpo K= K, +, , 0, 1, so isomorfos,ou seja, existe uma aplicao bijetiva f : V W tal que

    f( +) = f() + f() e f(k.) = k.f() (3.3)

    para todos , V e k K. Pode-se demonstrar (exerccio) que a relao iso uma relao de equivalncia, o quem implica em particular ser transitiva. Assim,se E isomorfo a Fe se F isomorfo a G, ento F isomorfo a G. Disso tudoresulta trivial provar o seguinte resultado (a argumentao precisa, no entanto, dum bom exerccio), extremamente til nas demonstraes:

    Kn iso K1n iso Kn1.

    Note que os conjuntos acima, munidos das respectivas operaes de espaovetorial, constituem espaos vetoriais sobre K. Assim, face o isomorfismo, indiferente (matematicamente falando) se operamos com n-uplas de elementos deK ou com matrizes linha formadas por elementos de K ou com matrizes colunacom tais elementos. Isso traz uma enorme vantagem, pois simplifica em muito asdemonstraes, j que podemos ir de um espao a outro sem maiores detalhes, oraoperando com n-uplas, ora transformando-as em matrizez linha, como se fossema mesma coisa. Os teoremas abaixo usam este fato livremente, e o leitor atendodeveria notar a importncia dessa liberdade.

    Teorema 3.4.1 Todo espao vetorial de dimenso n sobre o corpoK= K, +, , 0, 1 isomorfo ao Kn.

    Demonstrao: Como Kn, o conjunto das n-uplas de elementos de Kmunido dasoperaes usuais, como as definidas para o Rn (veja o exemplo (3.0.1), isomorfoa K1n, o espao das matrizes 1 n com elementos em K(munido das operaescorrespondentes entre matrizes), basta provar que o isomorfismo se d com esseltimo espao. Seja A = {1, . . . , n} uma base ordenada para o espao vetorial

    E=

    V,

    K, +,

    de dimenso n. Ento, para

    V, podemos escrever

    = x11 + . . . + xnn.

    Definimos a aplicao f : V K1n por f() = []A = [x1 xn]. Devemosagora provar que f um isomorfismo, ou seja, que bijetiva e que preserva

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    38 CAPTULO 3. ESPAOS VETORIAIS

    as operaes. Quanto primeira parte, inicialmente mostramos que f injetiva.Com efeito, pela unicidade das coordenadas (teorema (3.3.3)), se , sua matrizdas coordenadas em A distinta da de .1 Quanto a f ser sobrejetiva, dada umamatriz [x1 x2 . . . xn] de escalares de K, haver um nico vetor (de novo, pelaunicidade das coordenadas) tal que = x11 + . . . + xnn.2 Assim, f bijetiva.Agora, com relao a ela manter as relaes das estruturas, a saber, as operaesde espao vetorial. Sejam e vetores de V. Assim, existem nicas []A =[x1 x2 . . . xn] e []A = [y1 y2 . . . yn]. Ora, claro que f( + ) = [ + ]A =[x1 +y1 . . . xn +yn] = [x1 . . . xn] + [y1 . . . yn] = []A + []A = f() + f(), e quef(k.) = [k.x1 . . . k.xn] = k.[x1 . . . xn] = k.f(). Assim, f um isomorfismo.

    Esses resultados tm importncia prtica, por exemplo em situaes como aseguinte. Muitas vezes escrevemos n-uplas de elementos de um conjunto A comolinhas de um matriz, e operamos com essas matrizes, para depois reinterpretar-mos os resultados novamente em termos dos elementos do conjunto A. Um casotpico o de vetores, digamos do R3, que identificamos (via isomorfismos) comtriplas de nmeros reais, suas coordenadas em uma base, digamos a cannica, edepois formamos matrizes colocando essas coordenadas como linhas (ou comocolunas). Assim, se (1, 1, 1), (0, 1, 2) e (0, 1, 3) so coordenadas de trs vetoresrelativamente base cannica do R3, a matriz

    M=

    1 1 10 1 2

    0 1 3

    tem determinante diferente de zero (como se constata) facilmente, o que indicaserem os vetores linearmente independentes. Interpretar vetores por meio de suascoordenadas e coloc-las como linhas ou colunas de matrizes ser um procedi-mento que usaremos muito doravante.

    1Recorde que uma funo f : A B injetiva se x y implica f(x) f(y).2Uma funo f : A B sobrejetiva se para todo y B, existe x A tal que y = f(x).

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    Captulo 4

    Produtos Internos

    Na estrutura de espao vetorial, o mximo que podemos expressar so combina-es lineares (superposies) de vetores. No h como considerar questes m-tricas, como ngulo entre vetores, comprimento de um vetor e outro de mesmanatureza. Para tanto, vamos estender a estrutura E adicionando um produto in-terno. O espao assim obtido denominado de pr-espao de Hibert. Mas, o que um produto interno?

    Definio 4.0.1 (Produto interno) Um produto interno sobre um espao vetorialE = V, K, +, uma aplicao | : VV K tal que, para todos ,, Ve a

    K, se tenha:1

    1. | + = | + |2. |a. = a.|3. | = | (Em fsica, comum denotar o conjungado de um nmero

    complexo z = a + bi no porz = a bi, mas por z. Mais frente, usaremosessa notao).

    4. | 0 e | = 0 se e somente se = O

    Teorema 4.0.2 Dada a definio, temos:

    1. a.| = a.|1H autores que preferem postular as condies 1 e 2 abaixo de forma alternatica, a saber, (1)

    +| = | + | e (2) a.| = a.|. Isso meramente uma questo de convenincia.Aqui, seguimos o procedimento usual dos textos de fsica.

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    40 CAPTULO 4. PRODUTOS INTERNOS

    2. +| = | + |

    Demonstrao: Com efeito,2 a.| = |a. = a.| = a.| = a.|.Quanto ao segundo item, sugerimos que o leitor o faa como um exerccio.

    Daremos agora alguns exemplos de produtos internos que interessaro ao nossoestudo.

    Exemplo 4.0.1 Sobre o espao real Rn, sendo = (x1, . . . , xn) e = (y1, . . . ,yn),a aplicao seguinte um produto interno:

    | =n

    i=1xiyi (4.1)

    Este produto interno denominado de produto interno cannico sobre o Rn.

    Exemplo 4.0.2 Sobre o espao real Cn, sendo = (x1, . . . , xn) e = (y1, . . . ,yn)n-uplas de nmeros complexos, a aplicao seguinte um produto interno:

    | =n

    i=1

    xi yi (4.2)

    onde xi o conjugado de xi, ou se(x)ja, se xi = a + bi, etno xi = a bi. Este

    produto interno denominado de produto interno cannico sobre o Cn.

    Exemplo 4.0.3 Sobre o espao das funes reais (de varivel real) contnuas nointervalo [a, b] (e isto vale para a = , b = +), a aplicao seguinte umproduto interno:

    f|g =b

    af(x)g(x)dx (4.3)

    Exemplo 4.0.4 Seja Cnn o espao vetorial das matrizes complexas de ordem n.Se A denota a conjugada de A, ento a aplicao

    A|B = Tr(AB) (4.4) um produto interno. No caso real (ou seja, se Rn), ento A|B = Tr(ATB).

    2Observamos que, para nmeros complexos z e z, tem-se que z.z = z. z.

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    Definio 4.0.2 Chama-se norma (ou comprimento) em um espao vetorial Va uma aplicao que, a cada vetor associa um escalar, denotado

    ||||, tal que:

    1. |||| 0 e |||| = 0 se e somente se = 0.2. ||k|| = |k|.||||, para k escalar.3. || +|| |||| + |||| (desigualdade triangular)

    Importa aqui, dentre todas as possveis normas, aquela que definida a partirdo produto interno, dita norma advinda do produto interno, a saber, a aplicaotal que

    |||| = | (4.5)Exemplo 4.0.5 Mostre que a aplicao recm definida de fato uma norma.

    A importncia da observao acima, de que a norma definida por (4.5) ad-vinda do produto interno que existem normas (funes que cumprem as con-dies da definio) sem que tenham sido originadas a partir do produto interno.Alguns exemplos sobre R2 so os seguintes (para distingu-las da norma acima,vamos usar subndices): para = (x1, x2), temos

    ||

    ||1 =

    |x1

    |+

    |x2

    |||||2 = max{|x1|, |x2|}.

    Assim, ||(2, 3)||1 = 5, enquanto que ||(2, 3)||2 = 3. O que nos interessar,no entanto, ser a norma induzida pelo produto interno, pois ser com ela que anoo de espao de Hilbert introduzida. Os teoremas que se reportam a normas,no entando, valem para qualquer que seja ela, por exemplo, o seguinte.

    Teorema 4.0.3 (Desigualdade de Cauchy-Schwarz) Para todos e , tem-se:

    |

    |

    | ||

    ||.

    ||

    ||(4.6)

    Demonstrao:

    Definio 4.0.3 (Distncia) Chama-se distncia em um espao vetorial V comproduto interno a toda aplicao d: V V K tal que:

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    42 CAPTULO 4. PRODUTOS INTERNOS

    1. d(, ) = d(,)

    2. d(, ) 0 e d(, ) = 0 se e somente se = .3. d(, ) d(, ) + d(, )

    Teorema 4.0.4 A aplicao d(, ) = || || uma distncia.Demonstrao: Imediata.

    No caso do espao vetorial ser R ou C, costuma-se escrever || em vez de ||||,deste modo confundindo-se a norma de um vetor com o mdulo de um escalar.Do mesmo modo, escrevemos nesses casos | | em vez de || ||.

    Importante notar que, sendo z = a + bi um nmero complexo (ou vetor noespao vetorial dos complexos sobre si mesmo), resulta que

    |z|2 = z|z = zz = (a bi)(a + bi) = a2 + b2 R.

    Dizemos que uma sequncia de vetores 1, 2, . . . de um espao vetorial Vconverge para um vetor se os vetores da sequncia vo ficando cada vez maisprximos de medida em que avanamos na sequncia. Mais precisamente,

    Definio 4.0.4 (Sequncia convergente) A sequncia de vetores 1, 2, . . . deum espao vetorial

    Vconverge para um vetor se, para todo > 0 real, existe

    um nmero natural n tal que, se i > n, resulta que || i|| < .

    Definio 4.0.5 (Sequncia de Cauchy) Uma sequncia de vetores 1, 2, . . . deum espao vetorial V uma sequncia de Cauchy se, para todo > 0 real, existeun nmero natural n tal que, para i, j > n, tem-se que ||i j|| < .

    Intuitivamente, em uma sequncia de Cauchy, os elementos da sequncia voficando cada vez mais prximos uns dos outros medida em que avanamos nasequncia.

    Toda sequncia de Cauchy convergente, como se pode mostrar. O problema

    que uma sequncia pode convergir para um vetor que no pertena ao espaoconsiderado. Quando toda sequncia de Cauchy converge para um vetor ainda noespao, dizemos que o espao (topologicamente) completo. Note que a noode convergncia depende da norma. Caso particularmente importante quando anorma a advinda do produto interno, resultando na seguinte

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    Definio 4.0.6 (Espao de Hilbert) Um espao vetorial com produto interno V um espao de Hilbert se for completo em relao norma induzida pelo produtointerno.

    Ou seja, a norma a ser considerada aquela que se define por meio do produtointerno, vis, |||| = |.

    Definio 4.0.7 Um conjunto A de vetores de um espao E fechado relativa-mente a um subespao W se para todo > 0 real e para qualquer W, existe A tal que d(, ) < . Pode-se em especial falar de um subespao W serfechado (nele mesmo).

    Em um espao fechado, toda sequncia de vetores doDois exemplos notveis de espaos de Hilbert so os seguintes.

    Exemplo 4.0.6 Um espao particularmente importante (que era estudado porHilbert), e sendo uma das razes pelas quais von Neumann batizou essa estruturade espao de Hilbert, formado tomando-se como vetores as matrizes colunacomplexas (e suas operaes correspondentes e com o produto interno cannico,

    =

    z1z2

    ...

    tais que k=1 |zi|2 < . Este espao denominado de 2 e isomorfo a todos os

    espaos de Hilbert separveis.

    4.0.1 A condio de normalizao na teoria quntica

    Um outro espao vetorial real de dimenso infinita que importante o espaoL2 de todas as funes complexas f(x) tomando valores em R, tais que

    |f(x)|2dx < ,

    ditas funes quadrado-integrveis, munido das operaes usuais de adio defunes e de multiplicao de funo por escalar real, e com o produto interno

    f|g =

    f(x)g(x)dx.

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    44 CAPTULO 4. PRODUTOS INTERNOS

    Na mecnica quntica de ondas, um sistema de partculas em uma dimensotem seus estados descritos por uma funo de onda (x, t), que satisfaz

    |(x, t)|2dx = 1. (4.7)

    Podemos entender (x, t) como pertencente a L2, para t(a coordenada tempo-ral) fixado, e (4.7) ento dita condio de normalizao, ou seja, ||(x, t)||2 = 1.Esta condio est associada ao papel desempenhado pelo conceito de probabi-lidade na teoria quntica. Com efeito, segundo a interpretao probabilista dafuno de onda devida a Max Born, dado um intervalo [a, b] da reta real, a pro-babilidade de encontrarmos o valor da medida de um observvel fsico A medidosobre um sistema no estado descrito por (x, t) neste intervalo precisamente

    prob(x,t)[a,b] ( A) =

    [a,b]|(x, t)|2dx.

    Um fato interessante o seguinte, comentado por [Brown 1979]. Os espaos2 e L2 so isomorfos.

    Digamos que o observvel a ser medido para um sistema composto por umapartcula em um espao de dimenso unitria. Assim, a expresso simplificada

    p =b

    a|(x, t)|2dx (4.8)

    designa a probabilidade de encontrar a partcula, representada pela funo de onda

    (x, t) no intervalo [a, b] da reta real.O valor |(x, t)|2 denotado(x, t) (4.9)

    e denominado densidade de probabilidade.

    Exemplo 4.0.7 Suponha (para t fixo), que (x) = 1/x2. A probabilidade de en-contrarmos a partcula em [1, 2], dada por

    p =2

    11/x2dx = [

    x33 ]

    21 = 1/3(1/8 1) = 7/24 = 0, 29.

    Voltaremos a essa e outras questes qunticas mais tarde.

    Definio 4.0.8 Um espao de Hilbert separvel se admite uma base ortonor-mal contvel (finita ou enumevel).

    Grande parte dos espaos usados em fsica so separveis nesse sentido, e sotodos isomorfos a 2.

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    4.1. ORTOGONALIDADE 45

    4.1 Ortogonalidade

    Daqui para frente, assumiremos sempre que H um espao de Hilbert.

    Definio 4.1.1 (Vetores Ortogonais e Ortonormais) Dois vetores e de Hso ortogonais se | = 0. Eles so ortonormais se, alm de ortogonais, sounitrios.

    Exemplo 4.1.1 O espao Rn munido do produto interno can nonico um espaode Hilbert (exerccio). Os vetores da base cannica (veja pgina 35) soortonormais relativamente a esse produto interno. Situao anloga ocorre como Cn.

    Uma base para Hformada por vetores ortonormais uma base ortonormal deH.

    Exemplo 4.1.2 (Sries de Fourier) Considere o espao de Hilbert das funesseccionalmente contnuas no intervalo [, ] da reta real munido do produtointerno

    f|g = 1

    f(x)g(x)dx.

    Uma funo seccionalmente contnua nesse intervalo uma funo que cont-

    nua nesse intervalo ou que tem no mximo um nmero finito de descontinuidadesde primeira espcie (se ela descontnua em um ponto a do intervalo, isso se deveao fato de que seus limites laterais so distintos no ponto, mas existem, contrari-amente a funes que so descontnuas de segunda espcie, como f(x) tan(x),que no tem limite no ponto a = 2 ).

    Verifica-se que as funes 1, sin x, cos2x, sin2x, cos2 x, etc. so vetoresortonormais relativamente ao produto interno acima. Se f uma funo seccio-nalmente contnua no intervalo dado, ela integrvel no intervalo e limite dasrie seguinte, que pode ser vista como sua expresso como combino linear dasfunes ortonormais dadas, a saber,

    f(x) = a0.1 + a1 sin x + b1. cos x + a2. sin2x + b2. cos2x + . . . . (4.10)

    O que necessitamos aprender a calcular os coeficientes, os coeficientes de Fou-rier), o que faremos abaixo no caso geral de um Hqualquer. A expresso (4.10) dita ser o desenvolvimento de f(x) em srie de Fourier.

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    46 CAPTULO 4. PRODUTOS INTERNOS

    Denomina-se de Processo de Ortogonalizao de Gram-Schmidt o seguinteprocedimento para, dada uma base ordenada

    A=

    {

    1, . . . ,

    n}para um espao

    H,

    encontrarmos uma base ordenada ortogonal B = {1, . . . , n} para H, do seguintemodo:

    (1) 1 = 1

    (2) m+1 = m m11=1

    1|m||i||2 i.

    Constata-se sem dificuladade que os j so ortogonais entre si. Para exempli-ficar, mostraremos que 2 ortogonal a 1. Com efeito, lembrando que 1 = 1,temos que

    1|2 = 1|2 1|2||1||2 1 = 1|2 1|2||1||2 1|1 = 0.

    Uma vez obtida a base ortogonal B, uma base ortonormal obtida simples-mente dividindo-se cada vetor de B pela sua norma, ou seja, obtendo

    N= { 1||1|| , . . . ,n

    ||n||}.

    Espaos de Hilbert so fundamentais na formulao usual da fsica quntica.Vetores unitrios de um espao de Hilbert Hrepresentaro os estados dos siste-mas fsicos, e certos opradores (que veremos na seo seguinte) representaro os

    observveis fsicos.

    4.1.1 Coeficientes de Fourier

    O caso geral ao qual nos referimos acima no caso do exemplo das sries de Fou-rier, trata de encontrarmos as coordenadas de um vetor em uma base ortonormal.Tais coeficentes so denominados de coefiencientes de Fourier.

    Seja A = {1, . . . , n} uma base ortonormal ordenada para um espao de Hil-bert H(na verdade, o que faremos pode ser desenvolvido para um espao vetorialcom produto interno quaquer, no necessariamente de Hilbert). Se um vetor

    qualquer desse espao, existem escalares xi (i=

    1, . . . , n), tais que = x11 + . . . + xnn. (4.11)

    Ora, sabemos quei|j = i j, (4.12)

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    4.1. ORTOGONALIDADE 47

    logo

    i| = i|x11 + . . . + xnn = x1i|1 + . . . + xii|i + . . . + xni|n.

    Tendo em vista (4.12), resulta que

    i| = xi. (4.13)

    Portanto, em (4.11), temos

    = 1|.1 + . . . + n|.n =n

    i=ii|.i. (4.14)

    Os coeficientes da combinao linear acima so denominados de coeficientesde Fourier. Se os vetores da base A no fossem ortonormais, mas ortogonaissimplesmente, deveramos dividir cada vetor da base por sua norma, de modo atorn-los unitrios; assim,

    =

    ni=i

    i|||i|| .i. (4.15)

    De maneira geral, os coeficientes de Fourier so portanto

    xi =i|||i||

    , (4.16)

    e so exatamente esses que devem ser buscados na expresso (4.10), levando emconta o produto interno e as funes envolvidas.

    Exerccio 4.1.1 Calcule os coeficientes da expresso (4.10).

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    48 CAPTULO 4. PRODUTOS INTERNOS

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    Captulo 5

    Operadores Lineares

    Definio 5.0.2 (Transformao linear) Uma transformao linear, ou homo-morfismo de um espao vetorial V em um espao vetorial W, ambos sobre ummesmo corpo K, uma aplicao T : V W tal que, para todos , V ea K, se tenha que

    1. T( +) = T() + T()

    2. T(a) = a.T().

    As condies 1 e 2 so chamadas de condies de linearidade. Podemos subs-tituir 1 e 2 por uma s condio, a seguinte, para b

    K:

    T(a + b) = aT() + bT().

    Definio 5.0.3 (Operador linear) Um operador linear sobre um espco veto-rial V uma transformao linerar de V em V.

    Exemplo 5.0.3 A aplicacao T : R2 R2 definida por T(x,y) = (x +y, x + 2y) um operador linear sobre o R2, como facilmente se verifica.

    Exemplo 5.0.4 Considere o espao vetorial das funes diferenciveis em umintervalo [a, b]

    R. A aplicao D definida por

    D(f(x)) =d f(x)

    dx

    um operador linear sobre o espao referido.

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    50 CAPTULO 5. OPERADORES LINEARES

    Notao Em fsica quntica, certos operadores lineares sobre espaos relevantes(espaos de Hilbert) representaro os observveis fsicos, como momento, posi-o, etc. Os fsicos distinguem entre os observveis e os operadores que os re-presentam mudando um pouco a notao: se T um observvel fsico, como aposio de uma partcula, ento T o operador que o representa. No momento,no faremos essa distino.

    5.1 Representao matricial

    Nesta seo, utlizaremos a notao de Dirac, para que o leitor v se acostumandoa ela. Seja V espao de dimenso finita n sobre K, e seja A = {|i} uma base

    ordenada para V. Se T um operador linear sobre V e V, podemos escrever como combinao linear dos vetores da base, ou seja, h escalares x1, . . . , xn taisque

    | = x1|1 + + xn|n. (5.1)A transformada de | pelo operador T, sendo vetor de V, pode tambm ser

    escrito como combinao linear dos vetores da base, ou seja,

    T(|) = y1|1 + +yn|n =n

    j=1

    yj|j. (5.2)

    Conheceremos T se soubermos como encontrar, dados os xi (as coordenadasde | na base), os escalares yi (as coordenadas de T(|).

    A partir a combinao linear (5.1), obtemos

    T(|) = T(x1|1 + + xn|n),

    ou seja, pela linearidade de T,

    T(|) = x1T(|1) + + xnT(|n).

    em notao mais cmoda,

    T(|) =n

    i=1

    xi.T(|i). (5.3)

    Por sua vez, as transformadas T(|i) dos vetores da base podem ser escritoscomo combinaes lineares dos vetores da prpria base, ou seja,

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