a racionalidade, a cultura e o

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A RACIONALIDADE, A CULTURA E O

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  • 123Contribuies da Sociologia Econmica Teoria das Organizaes

    A RACIONALIDADE, A CULTURA E OESPRITO EMPRESARIALPaola Cappellin*Gian Mario Giuliani*

    Resumo: O artigo busca a articulao das noes deracionalidade, interesse, valores e cultura. Na sociologiaweberiana, a racionalidade associada ao capitalismo modernoe ao esprito empresarial. Outros autores (Off, Hirschman,Veblen, Simmel, Elster) tm discutido quo difcil a realizaodo encontro entre o moderno e o racional. Destas anlises, possvel apontar duas questes relevantes para o estudo daproblemtica empresarial. A primeira que o desenvolvimentodo capitalismo tem, de fato, imposto e universalizado aracionalidade econmica, porm no a tornou nem homogneanem independente da influencia da cultura. A segunda dizrespeito influncia dos valores sobre a racionalidadeeconmico-empresarial, formulando normas e regras que dofundamento e orientam as aes e iniciativas para a manutenodo patrimnio e para a realizao do lucro. Pode-se ento falarde cultura de empresa que leva a refletir sobre um conjuntode formas de regulao cultural das empresas, formas que soherdadas de uma longa histria industrial e que devem serponderadas por produzirem efeitos sistemticos. Com isso, oespirito empresarial, como expresso da racionalidadecapitalista, pode ser enriquecido por dimenses que incluemum conjunto de prticas e valores fundados em refernciasadvindas de diferentes ambientes, familiar, territorial, polticoe social. Conclui-se que as empresas no podem ser vistas ex-clusivamente sob a tica organizacional, j que estas soinseridas em uma cultura de uma sociedade, de uma regio, dastradies e organizaes profissionais. Tambm, as empresasconseguem ter influncias sobre diversas dimenses da vidasocial, estabelecendo elos e trocas com as instituies, grupose comunidades.

    Palavras-chave: Sociologia da Empresa, racionalidade.

    * Os autores so professores do Programa de Ps-Graduao em Sociologia e Antropologia(PPGSA) do Instituto de Filosofia e Cincias Sociais (IFCS) da UFRJ.

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    A noo de racionalidade est ligada a diversas visestericas e a uma srie de conceitos que tornam difcil uma definiounvoca. Na Sociologia weberiana, o moderno associado racionalidade nos processos organizativos e produtivos que, baseadosno clculo da rentabilidade capitalista e na impessoalidade, avanamcombatendo e substituindo formas econmico-sociais fundamentadasna tradio, sobretudo no poder personalizado e no patrimonialismo(Weber, 1944). Este processo estaria destinado a abranger todas asesferas da sociedade e a instituir a racionalidade como definitivafonte de orientao das aes de todos os indivduos. At os anos 60,na maioria das anlises brasileiras emergia a preocupao em pr emevidncia a natureza conflitante das dimenses tradicionais com oesprito empresarial, este, sim, racional e moderno, fundamentadona rentabilidade e no trabalho livre.

    As caractersticas mais marcantes de relaes econmicas esociais de tipo tradicional, opostas ao racional e ao moderno, eramidentificadas nas diversas formas das relaes sociais e de trabalhomantidas e no poder social e poltico exercido regional e localmentepelos empresrios. Mais particularmente, o controle personalizadosobre o mercado, sobretudo da mo-de-obra, e a busca da riqueza,no tanto como estmulo para a realizao de lucros, mas comoconjunto de bens razes capazes de aumentar o prestgio e poderdos donos (Faoro, 1989). Porm esta perspectiva da modernidadee de sua incompatibilidade com as tradies, j tem sido objeto desrias revises (Giddens, 1991), e estudos tm mostrado como possvel a convivncia nas prticas empresariais de aspectos damodernidade combinados com dimenses da tradio (Cappellin eGiuliani, 1999).2

    O desenvolvimento de diferentes estilos de ser empresriono Brasil sugerido por autores (Morel et al., 1993) que ressaltam aespecial nfase posta na retrica modernizadora prpria do perodops-Constituinte de 1988, sobretudo pelo que se refere liberalizaoeconmica e ao debate sobre a reformulao das relaes capital-trabalho. Outro autores (Diniz e Boschi, 1993) tm sublinhado asnovidades no plano tanto das relaes entre os empresrios, o Estadoe o mundo do trabalho, como da atuao dos primeiros no processo

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    poltico de renovao. Tais novidades, no entanto, no seriamsuficientes para indicar a existncia de um novo perfil de atuaoempresarial por uma srie de razes. Em primeiro lugar, pela ausnciade um modelo de desenvolvimento de produo industrial e pela faltade diretrizes por parte do governo capazes de estimular um novopatamar de desenvolvimento, tal como foi o caso, por exemplo, daindstria automobilstica nos anos de 1950 ou do setor de bens decapital nos anos de 1970. Tambm porque as novidades apresentam-se isoladas e, portanto, incapazes de apontar para uma possveltendncia de desenvolvimento nesse sentido. Em seguida, porque omodelo de representao do empresariado permanece hbrido,permitindo a coexistncia de um formato corporativo e de um modeloautnomo constitudo pelas associaes baseadas em afinidadeseletivas.3 Finalmente, porque a incapacidade de superar enfoquessetoriais e corporativos torna frgeis e localizados aqueles enfoquesmais abertos prtica da concertao e mais comprometidos com amudana da situao dos trabalhadores. Os autores acabamreconhecendo que os estilos e as prticas de atuao da classeempresarial revelam-se bastante diversificados, mostrando acoexistncia de diferentes posies e posturas ideolgicas.

    No nvel geral, j Offe (1987) havia sugerido que o encontroentre o moderno e o racional que, em teoria, devia acontecernaturalmente, teria na realidade srias dificuldades para se realizar.O autor aponta para a incapacidade de o processo modernizadoralcanar todas as esferas da vida social. Este processo no s temproduzido fortes diferenas entre pases e entre regies do mesmopas, mas tambm tem colocado srios problemas para as prpriassociedades consideradas mais modernas. Nesse sentido, sublinha oautor, as mltiplas dimenses (institucionais, organizativas, culturais)da sociedade tendem a se modernizar tornando-se autnomas demaneira no combinada, e, s vezes, conflitantes entre si. O resultado que as partes acabam se modernizando em prejuzo da modernizaodo todo.

    , portanto, possvel apontar duas questes, a nosso verrelevantes, para o estudo da problemtica empresarial. A primeira que o desenvolvimento do capitalismo tem imposto e universalizadode fato a racionalidade econmica, porm no a tornou nem

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    homognea nem independente da influncia da cultura e dos mbitosem que se organizam e se especificam as relaes sociais (famlia,grupo, territrio, nao), e muito menos a deixou imune de influnciasque ela no pode controlar e que a deformam ou a contrastam. Asegunda, como natural aprofundamento da primeira, diz respeito influncia dos valores sobre a racionalidade econmico-empresarial,formulando regras e normas que do fundamento e orientam as aese iniciativas para a manuteno do patrimnio, a acumulao docapital e a realizao do lucro.

    Para dispor de maiores elementos de reflexo sobre estasquestes, parece interessante revisitar algumas contribuies maisantigas e quase esquecidas, que tratam de temticas importantes paraa discusso da racionalidade econmica e empresarial, tais como: ointeresse econmico, o dinheiro e as atividades produtivas eimprodutivas. A seguir, uma anlise da literatura mais atual epertinente nova modernidade.

    A noo de interesse

    O interesse econmico foi sempre considerado o fundamentode todas as atividades empresariais. As diferentes apreciaes sociaisdesta noo so tratadas por Hirschman, em The passions and theinterest: political arguments for capitalism before its triumph, obraescrita entre 1972 e 1976,4 quando est pensando na Amrica Latina,principalmente preocupado em desfazer a idia corrente de que ocrescimento econmico traria correlatos polticos mais favorveis.Seus escritos criticam tanto as polticas revolucionrias, como aspolticas chatamente reformistas, ambas consideradas ineficazes.(Mendolesi, 1990)

    O autor discorda da perspectiva marxiana que v nodesenvolvimento do capitalismo uma luta contra o sistema de idiasfeudais, e se prope demonstrar que o novo surgiu do velho e que atransio entre as duas formaes sociais foi um processo endgeno.Parte da pergunta de Weber, formulada na consagrada obra A ticaprotestante e o esprito do capitalismo: como pde o comrcio setornar, de uma atividade indigna, em uma atividade digna e

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    civilizadora? Com efeito, na filosofia medieval agostiniana, as paixesconcentradas na nsia pelo dinheiro, desejo de poder e desejo sexualeram consideradas insanas e destruidoras, tanto dos indivduos, comoda convivncia em sociedade. A nica paixo qual era dado umvalor social compensador era o desejo de glria. No entanto,Hirschman se prope seguir um caminho diferente do de Weber. Nobusca as conseqncias no intencionais das aes humanas, comoWeber fez na sua hiptese da combinao de uma tica religiosa como esprito capitalista. Ao contrrio, Hirschman procura descobrir comocertas idias orientam para objetivos que esto claramente definidosnas intenes dos atores.

    Nessa perspectiva, o autor observa que entre a Renascena e oSculo XVII surgiu na cena o homem como ele , obscurecendo ohomem como deveria ser (ver Maquiavel, Hobbes, Galileu eSpinoza) e, para controlar as paixes destruidoras desse homem jno bastavam mais a filosofia moral, a religio e nem o Estado.Comea a tomar forma a idia de que as paixes podiam sercombatidas por outras paixes, distinguindo assim entre paixesdomadoras e paixes a serem dominadas.5

    No Sculo XVIII, as paixes so reabilitadas, passando a serconsideradas revigorantes e at teis, permitindo a afirmao da noode interesse, como a paixo pelo dinheiro, pela riqueza. O interessepode englobar todas as aspiraes humanas, porm revela o clculopara realizar tais aspiraes. Como um novo paradigma, o interessepassa a explicar as aes humanas e torna-se um componente naturaldo homem, uma fora reguladora externa aos indivduos. O interesseapresenta vantagens para a vida social: oferece previsibilidade econstncia. Com efeito, de um lado fornece regras externas ssubjetividades, uniformizando-as; de outro, o interesse torna-se igual razo, j que ningum seria to irracional a ponto de agir contraseus interesses. Assim, a anteriormente condenvel fome de lucrotorna-se uma virtude, porque implica previsibilidade e constncia.Estas dimenses, apontadas por Hirschman, acabam se combinandocom a idia de progresso ao mesmo tempo econmico, social e culturalque o desenvolvimento do sistema de empresas automaticamentelevaria consigo porque ao interesse atribuda uma outra qualidade:a de ser uma paixo inofensiva. Este se tornaria um desejo calmo

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    que age calculada e racionalmente. Ganhar dinheiro seria umaatividade inocente, incua e civilizadora; o comrcio uma atividadedoce, polida, gentil, antinmica violncia.

    Os Sculos XIX e XX, com suas revoltas e revoluesanticapitalistas, anticolonialistas e antiimperialistas, contrastaramduramente este legado, mas no o destruram, j que ainda hoje arenncia maximizao do auto-interesse considerada como umaclara prova de comportamento irracional. Tal percepo tem levadoeconomistas do peso de Sen a dizer que a natureza da economiamoderna foi substancialmente empobrecida pelo distanciamentocrescente entre economia e tica e a lamentar a difuso daquelaextica concepo moral conhecida como egosmo tico(Hirschman, 1999, p. 21).

    O dinheiro na teleologia

    Se interesse pressupe um clculo e acaba eqivalendo racionalidade, o dinheiro torna-se um instrumento fundamental paraa realizao dos interesses. O dinheiro, no entanto, consegue ir muitoalm de um simples instrumento para alcanar as finalidades. Estatemtica tratada por Simmel6 em sua obra mais sistematizada, Afilosofia do dinheiro, publicada em 1900. A obra tem atrado quembusca vieses no marxismo no ligados estritamente relao estrutura-superestrutura. Porm h algo original em Simmel: de um lado, paraanalisar as conseqncias positivas e negativas da economia monetriano se refere diretamente ao processo de industrializao e aodesenvolvimento capitalista-industrial; de outro, concentra suaateno nas relaes de intercmbio e no nas relaes de produo.Considera importante reduzir o processo econmico ao que acontecena cabea de cada sujeito econmico, sendo que em todo intercmbioeconmico ocorre a mesma percepo subjetiva de sacrifcio ou delucro na cabea dos indivduos. O intercmbio no est na basesomente da economia, mas tambm da prpria sociedade humana, jque toda interao humana um intercmbio, como toda conversa,afeto, jogo, ou olhar.

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    No Capitulo III, Simmel refere-se ao que mais nos interessa: 1)s conseqncias das relaes monetrias sobre a ao intencional;2) s relaes meios-fins, chamadas de srie teleolgicas, onde osmeios tornam-se fins. O autor considera que diferentemente do animal,que age movido pelas pulses e visando diretamente satisfao, ohomem considera satisfatria sua ao, que tambm movida pelapulso, somente aps ter avaliado o resultado. Portanto, quando seestabelece uma srie teleolgica porque j se conhece a relaocausal entre os elementos. A conscincia causal anda junto com aconscincia teleolgica. Nas sociedades complexas, as sriesteleolgicas so mais longas e so mais complexos os instrumentospara alcanar os fins.

    Nas sries teleolgicas, o dinheiro desempenha um papel muitosingular. Como o dinheiro aparece neutral, tambm aparece indiferentediante dos fins e das pessoas; mais ainda, em virtude de suauniversalidade e falta de contedo, o dinheiro tem uma relaototalmente ilimitada com os fins. medida que a economia semonetariza, o dinheiro pode se converter em fim absoluto. Devido atal inverso de meio para fim, no incio a economia monetria criafenmenos extremos e contrrios: a pobreza asctica e a prodigalidade.No apogeu da economia monetria cria fenmenos como o cinismo(que nivela os valores mais altos com os mais baixos), a indiferena eo tdio, fruto do desinteresse pela natureza das coisas e pelasqualidades especficas, sentimentos que levam a buscar satisfao navelocidade da troca.

    Se o dinheiro indiferente s qualidades pessoais, o autor sepergunta qual seu papel no desenvolvimento da liberdade individual.Com relao liberdade, o papel do dinheiro multidimensional eat ambguo. Ele cria relaes entre os indivduos, sem perturb-lospessoalmente. D uma maior liberdade a seu possuidor quandocomparado, por exemplo, a quem possui terra ou bens materiais, jque o dinheiro mais fcil de se intercambiar e j que mantmseparada a propriedade da pessoa (separao desconhecida na IdadeMdia). Nas relaes de trabalho, permite contratar somente a forade trabalho e no a pessoa. Torna mais autnomo o indivduo queantes dependia totalmente de seu grupo. Permite a seu possuidorparticipar de uma ampla gama de associaes sem compromisso ou

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    dedicao pessoal. Finalmente, o valor de uma soma de dinheiro valeo valor dos produtos que pode comprar mais o valor da liberdade deescolha. Assim, o dinheiro possui um efeito atomizador, mas tambmunificador; aps ter destrudo todas as relaes entre os indivduos,restabelece relaes entre elementos que jamais teriam tido conexosem ele. A objetivao das interaes humanas encontra seu pontomais alto nos interesses econmicos puramente monetrios e, tambm,na intelectualizao e funcionalizao das relaes. Para Simmel,no entanto, o dinheiro no somente um dos principais instrumentosracionalizadores da vida social moderna, mas tambm acabaproduzindo novas dimenses de irracionalidade. Com efeito, o clculomonetrio, nascido com a Era Moderna leva ao ideal calculatrio,isto , a conhecer o mundo como um imenso problema aritmtico eleva preponderncia da cultura objetiva (os artefatos dos homens)sobre a subjetiva (as percepes individualizadas que os homens tmde tais artefatos e das relaes sociais), provocando o que chama detragdia da cultura ou patologia da cultura, isto , um hiatocrescente entre os desejos e aspiraes e as condies epossibilidades.7

    Atividades produtivas e improdutivas

    A difuso do interesse como paradigma e do clculo comomtodo do agir na sociedade moderna, parece ainda sofrerinterferncias de elementos culturais da tradio, de tal forma que aracionalidade muitas vezes se impe mais como uma racionalizao.Exemplo claro so as formas como so vividas culturalmente asocupaes, o trabalho e o consumo.

    Esta temtica tratada por Veblen em sua obra A teoria daclasse ociosa, publicada em 1899.8 Crtico com relao situaoeconmica e economia clssica, inspirado no evolucionismo, formulauma teoria da ao inter-individual parecida com a de Weber, mesmoque no to rica. Para Veblen, o homem um centro de atividadesimpulsivas e teleolgicas e sempre busca alguma finalidade. Suasaes so impulsionadas pelo instinto da eficincia que se expressapor uma demonstrao de fora, bravura ou competncia alimentada

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    por um natural sentimento de emulao. Nos estgios em que prevalecea cultura pacfica, a emulao leva os indivduos a competir notrabalho e na produo, incentivando seu orgulho em superar sempreos outros e a si mesmos. Com a instituio da propriedade privada, aemulao impulsiona uns a se distinguirem dos outros na base dariqueza dando forma ao que o autor chama de classe ociosa. Estacompete no plano da absteno do trabalho produtivo e caracterizaos estgios brbaros baseados na luta e na explorao e onde prevalecea cultura belicosa. 9

    Nessa obra, o autor quer debater o lugar e o valor da classeociosa luz da sociedade moderna. Para isso, observa que diferentesperodos histricos apresentam diferentes classes ociosas (guerreiros,sacerdotes, nobres), no entanto, estas encontram seu maiordesenvolvimento nos mais altos degraus da civilizao brbara. Todasas classes ociosas tem em comum o fato de no serem produtivas.Podem se dedicar ao governo, guerra, s prticas religiosas, aoesporte, mas no produo e ao trabalho. Com ela nasce adiscriminao das atividades como dignas e no dignas. Sodignas as que levam para a fama e a glria; so indignas as que soquotidianamente necessrias, as que implicam servilismo e submisso.

    Veblen amplia o tema da tenso entre o instinto da eficincia eas conseqncias da emulao pelo dinheiro at compreender oscontrastes entre os aspectos produtivos e os aspectos predadores docapitalismo moderno, mais especificamente, entre a produtividadeda indstria e as atividades do comrcio e da finana, que considerapredatrias. Expresses importantes relativas classe ociosa so aociosidade vistosa e o consumo vistoso. raiz da ociosidadevistosa est a questo da emulao financeira. Para a classe ociosano basta ser rico e poderoso, tem que pr esta condio em evidncia.A diviso arcaica do que uma ocupao vil e o que uma ocupaohonrada, ainda hoje forte. Existem trabalhos que as classes altasno fariam nem foradas, devido a um agudo sentimento deindecncia social. Durante os primeiros perodos da fase industrialps-rapina, a ociosidade a prova conclusiva do poder financeiro e oindicador convencional da respeitabilidade. O trabalho indigno,porque signo de pobreza; deve ser evitado porque indigno parahomens capazes.

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    Para Veblen, as ocupaes tpicas das classes ociosas aindahoje so as mesmas: o governo, as guerras, o esporte, a prtica religiosa.Algum pode dizer que hoje estas so produtivas, mas o fato que osmotivos que levam a exerc-las, no visam aumentar a riqueza atravsde um esforo produtivo. No trabalhar no somente um atomeritrio, mas tambm um requisito de respeitabilidade, a expressode um alto nvel social. Os nobres decados, perdem sua riqueza masno podem trabalhar. Por outro lado, a ociosidade no significaindolncia ou ignvia; significa consumo improdutivo do tempo,devido tanto indignidade do trabalho, como vontade de demonstrara prpria capacidade financeira. Os signos de uma ociosidade passadaassumem a forma de bens imateriais: o conhecimento de lnguasmortas, da literatura, da msica, da pintura, das cincias ocultas, ofalar correto. Todas estas so atividade que demonstram que o tempono foi gasto em trabalhos produtivos. Outras prticas ligadas no aocampo do saber mas habilidade fsica, s boas maneiras, cortesia,s regras formais da etiqueta (que opem o rstico e o grosso ao fino),so mais fortes quando a ociosidade est em voga. A decadncia daetiqueta entre os homens de negcio, para o autor, demonstra que odecoro s prospera em regime de casta. O fundamento econmicomais profundo est no fato de que as boas maneiras esto ligadas aocio, ao consumo improdutivo do tempo, sem o qual estas no podemser aprendidas. A boa educao exige tempo, aplicao, despesas edisponibilidade financeira. O decoro um dever para quem aspira respeitabilidade financeira.

    Tambm, para que a solidez financeira resulte evidente, osociosos precisam mostrar que h gente que trabalha para eles(domsticos, empregados), assim como ostentar a posse de muitosobjetos inteis, como trofus, brases, medalhas. Objetos deconsumo caro so considerados nobres e honorficos e isto constitui abase do consumo vistoso. A classe ociosa aquela que pode distinguirentre o que honrado e o que no . O consumo e a ociosidadeconstituem investimentos em reputao. Na pequena burguesia, ohomem no pode ter pretenses de ociosidade, mas a atividade ociosada mulher tende a demonstrar que esta no precisa produzir. , paraVeblen, a lei econmica do esforo suprfluo. A mulher tem que tergastos vistosos, pela honra da casa e do chefe. O consumo deve ser de

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    coisas suprfluas, deve ser um desperdcio para ser honrado. No hmritos no consumo necessrio. A ociosidade vistosa e o consumovistoso tm em comum o desperdcio: a primeira, de tempo e energias;o segundo, de bens e dinheiro. A escolha de um ou de outro somentequesto de estratgia publicitria, depende das circunstncias e daspessoas que se quer influenciar.

    Poderamos pensar, observa Veblen, que o desenvolvimentoindustrial levaria o consumo vistoso a prevalecer sobre a ociosidadevistosa, at elimin-la. Mas este modelo no estaria totalmente correto.A antiga distino entre classes nobres e no nobres apoiava-se nadistino entre ocupaes honrosas e degradantes e esta distinotornou-se norma. verdade que o declnio da ociosidade, como signode riqueza, pode ter contribudo em parte para a crescente eficciado consumo vistoso. Porm, tal crescimento pode ser atribudo tambmao incremento do instinto da eficincia, isto , ao desprezo por tododesperdcio, tanto de substncia, como de energia. O instinto daeficincia est presente em todos os homens, e os faz naturalmenteamar o trabalho porque d resultados e os leva a detestar o que intil. Tal instinto, para Veblen, deveria ser o grande racionalizador,o demolidor da tradio, a possibilidade de soluo dos problemas.No entanto, na sociedade moderna, o instinto da eficincia podecomear a sofrer desvios. Por exemplo, pode tornar meritrios todosos gastos para o consumo destinado a aumentar a auto-estima, outambm pode transformar os gastos no exerccio de deveres sociais(como a freqncia de clubes e associaes), em si inteis, em gastosprovidos de alguma eficcia econmica, satisfazendo assim ao instintode eficincia atravs de um processo de racionalizao. Esta , paraVeblen, a caraterstica distintiva da classe ociosa moderna: aociosidade sem sentido torna-se detestvel, porm continua vivo opadro de honradez, prestgio e poder ligado s ocupaes noprodutivas.

    A escolha racional

    A racionalidade, fundamento da sociedade moderna, parece,portanto, provida de uma complexidade que a torna frgil e insegura,

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    ainda ligada a uma cultura cheia de desejos e crenas, de tradies eirracionalidade. Esta temtica tratada por Elster10 em diversas obrase, particularmente em uma espcie de trilogia.

    Em 1979, Elster publica Ulysses and the sirens: studies inrationality and irrationality. Nessa obra, fala da racionalidadeimperfeita, dos truques e mecanismos adotados para que aracionalidade dos atores seja, por vrias razes, diferente da escolharacional terica. O maior exemplo, que confere o ttulo ao livro, ocomportamento de Ulisse, pois sabendo que ao ouvir as sereias tornar-se-ia irracional, escolhe um mecanismo que bloqueia a irracionalidadee o obriga a ser racional. Para Elster, os homens, apesar de no seremracionais, querem s-lo, por isso criam suas prprias constries.

    Em 1983, em Sour grapes: studies in the subversion ofrationality, Elster reflete sobre os condicionantes objetivos externose sobre a formao das preferncias, as quais so habitualmentenegligenciadas pelos economistas. Em princpio, a conotao do termoracionalidade vai desde as noes de eficincia e coernciaat as de autonomia e de autodeterminao, dando a impressode que a racionalidade diz ao indivduo o que ele deve fazer e, seassim no o fizer, ser irracional. Mas Elster acha que a racionalidadeno pode fornecer critrio de escolha e s pode excluir algumasalternativas. Considera que os condicionantes so importantes, j quepodem moldar os desejos e at as crenas. Os desejos podem serdistinguidos com base em sua origem (autnomos ou no autnomos)e com base no seu contedo (ticos ou no ticos). No nvel da origem,podemos ter a adaptao das preferncias s condies do possvel (araposa que no consegue comer a uva, acaba dizendo que a deixaporque verde); podemos ter a adaptao das preferncias s dosoutros (conformismo) e, tambm, podemos ter preferncias contra-aditivas, que levam ao anticonformismo e obsesso pela novidade.Nesta obra o autor mostra como a racionalidade pode ser subvertidaquando as crenas so determinadas pelos interesses. Com efeito,podemos no ter a capacidade de tirar concluses lgicas de nossascrenas, seja por falta de conhecimentos completos, seja por pressesafetivas (por exemplo: embora j tenhamos provas da desonestidadede algum amigo, no acreditamos). Podemos tambm ter a iluso de

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    pensar que as coisas so como ns as desejamos (wishful thinking).Elster contesta as idias, difundidas no Sculo XVIII, que associavaminteresse a racionalidade, assim como bem tem mostrado Hirschman.Para esta posio, o autor encontra apoio na teoria do empresriocapitalista de Shumpeter (1954), segundo a qual o capitalismofunciona porque induz a expectativas irreais quanto ao sucesso e,portanto, mobiliza muito mais energias do que seriam empregadaspor espritos sbrios.

    Em 1989, publica Solomonic judjements discutindo os limitesda racionalidade e, portanto, os limites da teoria da ao racional,tanto no plano positivo como no plano normativo. As limitaes vmde dois lados: a) do lado do comportamento efetivamente irracionaldos homens, isto , de sua incapacidade de explorar a teoria; b) dolado da indeterminao da teoria, isto da incapacidade destadeterminar um nico resultado, mas admitir vrios.

    Estas problemticas so recuperadas em Nuts and bolts for desocial sciences, obra publicada em 1989 e na qual caracteriza osmicrofundamentos da sociedade, isto , as engrenagens da sociedade,os desejos e as crenas que geram as interaes e as dinmicascoletivas. Os instrumentos desta busca so a investigao emprica euma srie de instrumentos tericos, entre os quais as teorias dasocializao, a teoria da escolha racional (para o indivduo) e a teoriados jogos (para o coletivo). Para o Elster, o objetivo ltimo compreender, em um fenmeno emprico, a combinao exata dasdimenses antinmicas: racionalidade/irracionalidade, egosmo/altrusmo, intencionalidade/hbito. A teoria da ao racional descobreparadoxos, contradies e incongruncias (assim como para Weber ofaz seu famoso recurso metodolgico, o tipo ideal) e mostra como aintencionalidade no pressupe a racionalidade.

    A escolha racional, para Elster, reuniria trs condies: 1) omelhor modo de realizar os desejos de uma pessoa, dadas suas crenas;2) essas crenas devem ser timas para essa pessoa; 3) deve juntaruma quantidade tima de evidncias, j que pressupe uma avaliaodos meios, das possveis conseqncias e uma escolha entre diferentesalternativas. A racionalidade, portanto, baseia-se na crena maisracional fundada sobre as provas disponveis. Esse tipo de definio

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    no s leva a um aprofundamento da definio weberiana,11 mas revelatoda a fragilidade da noo de racionalidade, j que a cada passo doprocesso de definio da escolha abre uma srie de possibilidadesque tornam o resultado no previsvel. Vejamos tais possibilidades.

    Em primeiro lugar, pelo que se refere relao racionalidade-desejo, o autor observa que os desejos podem se orientar ao presentee sacrificar o futuro, ou podem tambm se orientar ao futurosacrificando o presente, sem que se possa dizer qual orientao seriaracional ou irracional. No mximo podem ser detectadosracionalmente os desejos logicamente incoerentes (por exemplo,desejar comer muito e querer ser magro).

    Em segundo lugar, a escolha racional sempre instrumental. guiada pelos resultados da ao, busca os melhores meios paraalcanar fins dados e, finalmente, avalia e escolhe o que consideraser os melhores meios. Sendo assim, a escolha racional no infalvel,j que as pessoas escolhem os meios que acreditam serem os melhores,enquanto poderiam no s-lo realmente. A escolha racional tambmse baseia em crenas fatuais que so simples probabilidades (plantarpara colher; investir para ganhar, etc.). Finalmente a escolha racionalelege uma alternativa, em geral, a mais conveniente dadas certascondies. Em geral, combina teoricamente custos, benefcios e riscos,sendo que a deciso acontece sob a presso de um destes elementos:algum pode suportar custos maiores, outro est disposto a correr riscosmais altos na busca de benefcios maiores; outros ainda so mais cautose se contentam com menos.

    Em terceiro lugar, a racionalidade pode falhar, no s quandofaltam informaes ou tempo para colet-las, mas tambm quando aescolha racional objetivamente indeterminada. Por exemplo, umempresrio escolhe vender menos com maior margem de lucro ouvender mais com menor margem de lucro? Do ponto de vista daracionalidade indiferente, porm, no o do ponto de vista de suarelao com os empregados ou com os consumidores. Os indivduos,em geral, no reconhecem a indeterminao e buscam uma justificaoqualquer; em geral acabam racionalizando ou se orientando pelo

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    wishful thinking, pela crena de que as coisas esto de fato comoeles gostaria que estivessem.

    Finalmente, da escolha racional podem decorrer conseqnciasno intencionais, as quais, sobretudo, decorrem das caractersticasdo desejo, isto , deste estar orientado ao futuro, ou orientado aopresente. Tais conseqncias podem ser boas ou ms para o conjuntoda sociedade. As ms podem resultar de uma estrita orientao aopresente (a busca do lucro fcil e imediato pode prejudicar oempresrio, seus funcionrios e os consumidores), sendo as piores asque o autor chama de contrafinalidades (desmatar para obter umarea maior para plantar pode levar a perder terra pela eroso e seca;fazer filhos para ter mo-de-obra ou para cuidar da velhice leva superpopulao). Ao contrrio, as boas so aquelas onde os desejosindividuais ajudam a todos, como uma espcie de mo invisvel (aempresa se expande e todos ganham; os moradores cuidam de seusjardins e caladas e o bairro fica lindo). O autor alerta para que asconseqncias no intencionais no sejam usadas como explicaodas aes que as causaram, j que o futuro no pode causar o passado;porm, observa que tais conseqncias podem causar uma repetioda ao.

    Para Elster, a escolha racional depende dos contextos: boapara o indivduo quando age s; mas, na interao com outrosindivduos, tal escolha pode resultar prejudicial para si mesmo e paraos outros. Nas aes coletivas, o indivduo encontra dilemas,problemas sem soluo, porque o resultado de suas aes depende daao dele e dos outros. Na ao coletiva a racionalidade individualpode levar a desastres coletivos (uma empresa pode ter custos muitoreduzidos e altos lucros, mas todas no podem; seria possvel chegarmais rapidamente ao trabalho indo de carro, mas se todos forem decarro, o tempo gasto ser maior). Para mostrar que em um contextocoletivo a indeterminao muito maior, o autor recorre teoria dosjogos.12 Se, por exemplo, aplicarmos tal teoria ao de umempresrio frente escolha de introduzir inovaes para reduzir seuscustos com salrios, podemos ver que a racionalidade da escolhapermanece indefinida. Com efeito, j que seus pares so atores livres,podem ocorrer dois resultados alternativos: a) se ele acreditar que

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    todos inovaro, ele poder no inovar, j que os salrios baixaro dequalquer maneira; b) se acreditar que ningum inovar, ele deverinovar, j que os salrios iro subir. Nesse contexto qual das escolhaspode ser definida racional? Ambas ou nenhuma, j que o racionalfinalmente acaba resultando de uma crena.

    Elster busca superar este impasse restabelecendo a relaoentre escolha racional e a finalidade da ao em um contexto coletivoatravs daquilo que chama de conduta cooperativa e no-cooperativa. As pessoas que fazem aquilo que o melhor se todos ofizerem, para o autor seriam os cooperadores e os outro, os no-cooperadores. A pergunta neste caso : cooperar e agir contra oprprio interesse irracional? O que acontece na realidade so duassituaes extremas: o no-cooperador-unilateral consegue os melhoresbenefcios; o cooperador-unilateral consegue os piores resultados. Oproblema da racionalidade na ao coletiva consiste na dificuldadecom que as pessoas cheguem a cooperar para seu benefcio mtuo.Elster identifica as seguintes condies em que mais fcil atingir acooperao mutuamente benfica: quando h auto-interesse nacooperao, quando os ganhos da cooperao so altos e os da nocooperao baixos, quando a perda da no-cooperao unilateral pequena e, sobretudo, quando o indivduo est convencido de que osoutros so to racionais e bem informados sobre a situao quanto elee, portanto, podem entender que cooperando todos sairo ganhando.

    A racionalidade e a cultura de empresa

    Temos visto como a Sociologia pode alcanar umacompreenso da sociedade contempornea medida que, alm dedescobrir diferentes formas de racionalidade que vo alm, ou aolado, da racionalidade econmica, tambm aponta para dimensesque podem torn-la mais complexa e problemtica. No caso da gestodas empresas, mesmo caracterizada pela racionalidade com finalidadede lucro, diferentes podem ser as formas pelas quais tal finalidade alcanada e de diversa natureza podem ser as dimenses que intervmnos processos de escolhas. Geralmente, so dimenses de tipo cultural

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    (religiosas, locais, tradicionais e simblicas), de natureza afetiva(familiares) ou at ideolgica, sendo que na sociedade contemporneaj no se consideram mais irracionais, moda de Weber, masaparecem como componentes da racionalidade moderna, prpria deindivduos fragmentados, descontnuos e incongruentes. Para Touraine(1984) a empresa ainda um agente da modernidade, definida estacomo racionalizao, no entanto considera que a crise cultural damodernidade redimensiona, reduzindo-o, o triunfo do clculo e daautoridade racional legal e, por isso, duvida que todos os atos queconstituem o essencial da vida das empresas (produzir eficientemente,responder s demandas do mercado, elevar o lucro, diversificar osinvestimentos) respondam integralmente ao ideal calculatriotemido por Simmel, ou que sejam todas expresses da puraracionalidade econmica.

    A Sociologia do Trabalho, nos anos de 1980, em face daglobalizao, acelera o debate sobre a concorrncia, a competividadee a crise do modelo rgido de organizao fechada, revitalizando ointeresse para os estudos da empresa e dando forma Sociologia daEmpresa. Esta, como especializao da Sociologia das Organizaes,considera a empresa como uma organizao cujo papel econmicono esgota sua capacidade de interveno institucional. A novaperspectiva passa a contribuir significativamente para a compreensodos efeitos da crise econmica, das flutuaes das fontes de empregose, sobretudo, da capacidade das empresas serem um centro irradiadore estabilizador das formas de reproduo social (Bernoux, 1995).Este perodo corresponde s fortes manifestaes de esgotamentodefinitivo do modelo taylorista, o qual, enclausurando-se nas paredesda fbrica, tinha feito nascer a hegemonia, e at o mito, da gestocientifica, considerada indispensvel para a otimizao dos recursosda empresa. A crise deste modelo significativa e atinge a prpriadiviso interna das manses que vai sendo abandonada como frutode uma viso simplificada e simplista dos mecanismos de renovaodas qualificaes nas empresas.

    Em 1984, um congresso em Paris13 faz ressaltar o debate emtorno das Culturas de Empresa como fenmeno surgido da

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    necessidade de revigorar o potencial humano das empresas norte-americanas diante da concorrncia japonesa. A cultura de empresa uma problemtica interessante para Sainsaulieu (1987), que buscaresponder a uma srie de interrogativos tericos de no fcil soluo.O autor inicia analisando diversas hipteses, apontando para cadauma os relativos problemas:

    1) dizer que existe uma cultura de empresa poderia significarque as relaes sociais na empresa se desenvolvem na basede representaes mentais e valores articulados e coerentes,interiorizados pelos diversos atores. Esta viso choca-se coma viso do antagonismo de classe na empresa (reivindicaosindical e profissional) e com a prpria histria dodesenvolvimento industrial; nesta viso antagnica, apossibilidade de uma cultura comum vista como impostapelo grupo dominante;

    2) a empresa no seria mais somente um lugar para ondeconfluem diversas culturas especficas herdadas do passado,mas tornar-se-ia um centro de identidade nica, e unificadorcom um projeto mobilizador para o qual cada um podecontribuir ou ao qual pode aderir. Neste caso, o problema saber como passar de representaes culturaiscompartilhadas entre os membros de uma comunidade parao engajamento efetivo em um projeto de realizaesconcretas;

    3) a empresa seria uma instituio social que produzsociabilidade e identidades especficas no seio da sociedade.Teria valores, normas, smbolos prprios, instituindo formasparticulares de se comportar, mecanismos de aprendizagem,de transmisso e de difuso dessa cultura na sociedadeexterna, independentemente de outras instituies, como afamlia, a escola, a Igreja. Neste caso, o problema comoconseguiria conciliar esta vocao institucional com a lgicaeconmica e os objetivos econmicos;

    4) finalmente, falar de cultura significaria dizer que a empresaassegura a seus membros tanto os meios prticos dereconhecimento de uma identidade especfica, como um

  • 141A racionalidade, a cultura e o esprito empresarial

    potencial de criatividade e de integrao para todos. Noentanto, a histria das sociedades industriais to marcadapor conflitos de interesse, desigualdades, explorao,excluso e alienao que estas hipteses devem ser avaliadascom extrema cautela.

    Assim, para o autor, as empresas no so ambientes homogneoscomo, o conceito de cultura na tradio etnolgica pressupe, isto ,no se assemelham a nenhum dos mbitos tradicionais de cultura,no so nem tribos, nem aldeias, nem famlias. Ao mesmo tempo, ahistria das sociedades industriais contm tantos conflitos de interesse,desigualdade de funes, excluso e explorao alienantes queinvalidariam a possibilidade de uma cultura homognea. Portanto,mais do que a cultura de empresa, Sainsaulieu prope considerar asdinmicas culturais das relaes organizadas na empresa (1987, p.210). Nesta perspectiva, ele convida para a reflexo sobre um conjuntode formas de regulao cultural da empresa que so herdadas de umalonga histria industrial e que devem ser ponderadas porque produzemefeitos sistemticos e podem ser importantes em um processo demudana e desenvolvimento (idem, p. 214). Tais formas, que aparecemcomo sendo cultura de empresa, so:

    1) O esprito-casaEncontrado em empresas familiares ou paternalistas, baseia-se

    em foras externas produo: a famlia, a comunidade local, alealdade e a submisso aos valores destas. No interior dessa culturano pode haver oposio duradoura, sob pena de excluso dacomunidade. As decises industriais so tomadas tendo em conta aeconomia, mas tambm a comunidade local e a famlia. So muitofortes, justamente porque conseguem articular o social com oeconmico.

    2) As comunidades profissionaisElas tm contribudo para a regulamentao cultural nas

    empresas, por exemplo as ordens dos engenheiros, advogados,

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    mdicos, pesquisadores, as quais, muitas vezes, impem suas normase valores absoro dos profissionais pelas empresas.

    3) As culturas antagnicasCaracterizam a empresa que tem histria de longos e fortes

    conflitos sociais, que as levaram a instituir uma certa democraciaindustrial e a negociao coletiva. Nesse caso, so as foras sociaisexternas empresa que influenciam o sistema social de produo,porm sem poder converter o sistema social de luta em sistema socialde produo.

    4) As culturas burocrticas e estatutriasEstas culturas no concentram a ateno no ofcio, na famlia

    ou na mobilizao social, mas sobre o complexo conjunto humanodefinido pela estrutura tcnica e pela organizao das funes. Estasculturas suprimem as relaes pessoais, impem relaes formais ehierarquizadas, no so sensveis s representaes coletivas que vmde fora da empresa, reduzem as comunidades profissionais a estratosligados funo e no ao ofcio, definem um sistema fortementecentrado sobre si prprio.

    5) Os fundamentos culturais do taylorismoTais fundamentos desenvolvem uma identidade com o trabalho

    somente entre os quadros e os profissionais, e no entre ostrabalhadores. So dimenses que opem os ofcios aos setorestcnicos e tambm as identidades que dessa oposio resultam. Oimperativo da racionalidade leva a se concentrar sobre os ajustesinternos empresa em detrimento das entidades externas (famlia,comunidade local, nao).

    6) As culturas do atorElas sublinham que o sistema formado pelas pessoas e todas

    elas sentem-se parte de uma ao coletiva. Comportam significativas

  • 143A racionalidade, a cultura e o esprito empresarial

    mudanas nas relaes interpessoais: abrem espao para entrevistasdiretas com os chefes, favorecem a formao de grupos expontneose durveis, criam afinidades interpessoais, transformam os processosdecisrios em processos interativos. Nessa tica, h nas anlisessociolgicas, de um lado, uma impresso geral de justia social, deliberdade e de otimismo e, de outro, uma crtica no sentido de que osoperrios no participam das decises e a manuteno do poder seria,de fato, a verdadeira relao entre estratgias e objetivos. Sainsaulieuconsidera que a cultura do ator pode at ser um comeo de umaverdadeira cultura de empresa (porque permite a coexistncia degrupos culturais diversos, podendo articular as diferenas entre elesem aes estratgicas teis empresa, no somente dentro da mesma,mas tambm fora dela, com clientes, com concorrentes, com bancosou com o Estado), no entanto, apresenta alguns problemas. Um queem face de uma conjuntura de estagnao, as alianas se congelam eos objetivos se restringem defesa do que j adquirido pelos grupos;outro problema que esta cultura no estvel, j que no h lealdadenem adeso durveis nas comunidades profissionais; outro ainda que a identidade com o trabalho forte somente entre os quadrossuperiores, enquanto muito frgil nos estratos sem poder.14

    7) A empresa do mercadoAo contrrio das culturas que privilegiam as estruturas internas

    da empresa e observam como secundrios o mercado, os clientes e osprodutos, esta forma busca fundar uma imagem a partir de elementosque se comunicam com o mercado, tais como a qualidade do produto,uma filosofia da empresa, um estilo comercial. Esta imagem torna-seo fundamento de uma cultura na qual todos os que trabalham estoinseridos e para a qual suas aes tm de contribuir. Produo equalidade do produto se colocam como objetivo que vai mais almdo trabalhador (exemplo japons). O problema que essa preocupaohistoricamente sempre foi do patro ou de certos setores especiaisda empresa e nunca da massa dos trabalhadores.

    8) As culturas de funcionamento coletivoEstas nasceram intelectualmente do utopismo francs e,

    politicamente, da Resistncia, tendo sido revitalizadas pelas

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    experincias de autogesto e das cooperativas operrias aps osmovimentos de 1968. Para Sainsaulieu, os estudos mostram que trsprocessos esto misturados nessas experincias. O primeiro a visode equipe, onde as decises em comum produzem importantes trocase aprendizagem cultural e onde novas identidades se afirmam etrabalhadores antes marginalizados voltam a se sentir parte doconjunto. O segundo a confrontao de diferenas (entre jovens evelhos, entre homens e mulheres, entre profisses) que estimula acomunicao, que obriga a enfrentar as diferenas, abrindo o debatesobre o trabalho e as diferenas culturais. O terceiro dado pelasexperincias efetivas de autogesto e de trabalho coletivo. Estas,porm, so pequenas ilhas no meio do fordismo e do taylorismo eprovocam desconfiana ao seu exterior, nos clientes, fornecedores,tcnicos e fiscais.

    9) A cultura de desenvolvimento social de empresaSeu aspeto mais peculiar concerne articulao da pluralidade

    cultural e da confrontao de identidades especficas. Torna-se umacultura de desenvolvimento social e democrtico, no sentido de queproduz a coexistncia das diferenas, apresentando-se como o lugardo pluralismo. Tal cultura impe empresa a necessidade de se abrirao meio externo do qual depende. Quem trabalha na empresa deverconhecer no somente seus colegas, mas tambm o meio social noqual a mesma est inserida.

    Da anlise cultural da empresa, Sainsaulieu pode tirar algumaslies. A primeira que toda mudana social no pode evitar amodificao das regulaes anteriores, mas tambm no pode ignoraras bases das identidades dos atores. A segunda que a empresa umlugar onde se encontram diversas culturas sadas de grupos einstituies que esto no seu ambiente. Porm no um simplesreceptculo de culturas diversas, nem somente um lugar de conflitose de jogos de poder, mas um lugar de transformao cultural pelotempo e pela intensidade das relaes humanas. Finalmente, falar decultura de empresa significa ir mais alm da cultura da organizao(maneiras de agir, controlar, comunicar e decidir). Nela est englobadatambm a vontade de empreender projetos coletivos de produo e o

  • 145A racionalidade, a cultura e o esprito empresarial

    sentimento de pertencer ao mesmo coletivo humano. O autor concluique, apesar da nossa realidade estar muito longe disso, as anlisesnos mostram quanto as empresas esto ligadas ao seu meio social equo importante no observ-las como meras ilhas sociotcnicas

    guisa de conclusesA noo de racionalidade, referncia inicial desta reflexo,

    permite problematizar as relaes complexas existentes entre asdinmicas econmicas e sociais em um processo de mudana. Nessesentido, os vnculos entre racionalidade, cultura e esprito empresarial,permitem deslocar o enfoque dos estudos em termos de empresa esociedade para uma perspectiva que observa a empresa nasociedade. Assim podemos enfatizar as seguintes proposies.

    A noo de interesse, de fato, mobiliza e organiza os agenteseconmicos porm, se de um lado pode englobar todas asaspiraes humanas, por outro, permanece uma noo ques ganha sentido se for dimensionada historicamente e,conseqentemente, acaba se confrontando com amultiplicidade das relaes entre os valores e a economia.

    O conceito de modernidade no implica necessariamentena uniformidade, nem na ruptura com o passado; poderiaexpressar tambm a adaptao mudana pela capacidadede combinar elementos novos com partes da tradio. Anoo de esprito empresarial tem sido concebida comorepresentando a capacidade de introduzir a novidadeporm, muitas vezes, o novo consiste em conseguir recuperare combinar prticas antigas com as dimenses novas de umcontexto social significativamente modificado. A baseconstitutiva dos empreendimentos capitalistas so os benseconmicos, que constituem a infra-estrutura produtiva, eo capital cultural, que assegura seu funcionamento e suareproduo. A lgica de acumulao destes fatores nemsempre e nem necessariamente segue os princpios tericosda escolha racional, nem simplesmente visa mera expansoda atividade empresarial. De fato, pode-se desenvolver um

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    comportamento no qual o ator seleciona e escolhe, entrediferentes oportunidades, seguindo um clculo estratgicono qual so tomados em conta os lucros e as perdas nosdiferentes nveis, econmico, poltico e simblico.

    O espirito empresarial, como a expresso da racionalidadecapitalista, permaneceu muito tempo restrito s estratgiasprodutivas. Esta noo pode ser enriquecida por uma outra,mais ampla, que inclui as dimenses culturais da empresa,isto um conjunto de prticas e valores fundados emreferncias advindas de diferentes ambiente: familiar,territorial, poltico e social. Tais ambientes atuam tanto naracionalidade organizativa no interior da empresa,estabelecendo hierarquias no necessariamente funcionais(entre trabalho manual e inteletual, entre homens e mulheres,entre raas), como na racionalidade empresarial nas maisamplas relaes sociais estabelecidas pelos empresriosjunto aos fornecedores, consumidores, clientes e ao meioambiente (valores ticos, responsabilidade social,responsabilidade ambiental).

    As empresas no podem ser vistas exclusivamente sob atica organizacional, j que estas so inseridas na culturade uma sociedade, de uma regio, e ligadas a culturasprofissionais que so sensveis sua organizao e quepodem reagir ou intervir em suas mudanas. Isto reafirma aidia de que a empresa, alm de um sistema econmico etcnico, um sistema social e como tal, absorve o que outrasinstncias sociais, como a escola, a famlia e o territrio,lhe oferecem como referncias. Com certeza a empresatambm consegue ter influncias sobre diversas dimensesda vida social, mostrando capacidade de elaboraocultural, isto , capacidade de estabelecer elos e trocas comas instituies, grupos e comunidades. Assim a empresa seapresenta como cenrio expressivo por ser um contextopermevel para absorver, reproduzir, responder emovimentar as representaes simblicas elaboradas pelosatores, os empresrios, os trabalhadores, as trabalhadoras,as organizaes sindicais, os clientes e fornecedores edemais interessados.

  • 147A racionalidade, a cultura e o esprito empresarial

    Notas

    1 Esta reflexo terica parte da pesquisa Os herdeiros: a transmissodos patrimnio econmicos e culturais e a atualizao daprofissionalidade, coordenada por Paola Cappellin, com apoio do CNPq,na qual foram analisadas as transformaes ocorridas nas empresasfamiliares de porte mdio e tradicionais, nos municpios de Petrpolis eTerespolis.

    2 A convivncia de diferentes estilos empresariais, luz das dimenses damudana e/ou da continuidade, podem revelar grande parte de seusaspectos problemticos se observados no mbito da passagem entregeraes. nessa passagem que a transmisso dos patrimnios econmicose culturais e a atualizao das profissionalidades se constituem comocampo privilegiado de interao entre o velho e o novo. Por isso, um dosprincipais objetivos de nosso estudo procurar os elementos de ruptura ede continuidade entre as duas ltimas geraes de empresrios,problematizando as formas de reproduo das organizaes produtivas,elementos esses que tm contribudo para a caracterizao da economiano territrio de atuao da empresa.

    3 Na explicao do surgimento do capitalismo moderno, o autor se referes afinidades eletivas como sendo a combinao de um ethos religiosocom o esprito de um sistema econmico.

    4 Albert Otto Hirschman nasceu em Berlin em 1915; formado em Filosofia,economista de profisso, de convices socialistas, deixou a Alemanhaem 1933. Participou da elaborao do Plano Marshall e foi professor emPrinceton. Entre 1952 e 1956 foi conselheiro econmico do Governo daColmbia, e a principal lio tirada desse perodo a de que as forasno de mercado no so necessariamente menos autnticas do que asforas do mercado. Dedicou dezoito anos ao estudo da Economia doDesenvolvimento e Amrica Latina (ver Mendolesi, 1990).

    5 Mandeville (1670-1733), autor da famosa Fbula das abelhas (1705),d-nos um exemplo claro dessa idia. Conta de uma colmeia que eraprspera, mas viciosa; quando se lhe imps uma moral, acabaram os vciose tambm a prosperidade. O subttulo, Vcios privados e pblicosbenefcios, exprime a idia do autor segundo a qual o fundamento dasociedade no est na sociabilidade, nos sentimentos benevolentes, nasvirtudes da raa e da abnegao; est, ao contrrio, no que chamamos demal, moral ou natural; o natural desejo de riqueza que faz florescer ocomrcio e a indstria. desta viso que tambm deriva a idia de que oluxo faz crescer o consumo e a riqueza.

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    6 Georg Simmel (1858-1918) mais que um socilogo, foi considerado umfilsofo, um psiclogo, um esteta. Todas as suas obras tm um fortecomponente psicolgico. Mesmo que busque fundamentar a Sociologiacomo uma disciplina independente, acabar confessando que ele filsofoe que a Sociologia interessa-lhe enquanto subsdio para a Filosofia.Paradoxalmente, depois de sua morte resta muito do socilogo e bempouco do filsofo. Demostrou sempre ter muitos interesses, conduzidoscom muita personalidade, no podendo ser enquadrado em nenhuma dascorrentes conhecidas.

    7 No ltimo captulo da obra, em que analisa diferentes modos deexperimentar a modernidade, h tambm uma teoria da alienao culturalbastante prprima de Marx.

    8 Thorstein Veblen (1857-1929), filho de agricultores migrantesnoruegueses do Winsconsin, foi professor de Economia em Chicago,Stanford e Missouri. considerado uma das mentes mais criativas daAmrica, mas no se consegue enquadr-la em nenhuma corrente tericae nem mesmo disciplinar; para os socilogos era economista; para oseconimistas era socilogo.

    9 A distino entre cultura pacfica e belicosa, correspondentesrespectivamente aos estgios comunitrios e brbaros, mais umadiferenciao tpico-ideal de que histrica. Para Veblen esta diferena sefunda na atitude pacfica ou de luta que prevalece no senso comum quandojulga os fatos, os eventos e as relaes sociais.

    10 Jon Elster, nascido em Oslo, em 1940, formado em Filosofia, interessa-se logo pela teoria da ao intencional e pelo marxismo. Em meados de1970, vai para os EUA e, em 1979, faz parte, junto com o filsofo Cohen,o economista Roemer e outros, do chamado September Group que, em1986, se autodenomina de marxistas analticos. Discutem de Marx: oconceito de explorao, a crtica tica ao capitalismo, a centralidade daluta de classe na transio histrica. Consideram que o marxismo notem um mtodo prprio de anlise e, por isso, assumem o individualismometodolgico contra o holismo, isto , partem do pressuposto de quetodos os fenmenos sociais so explicveis em termos de indivduos, suaspropriedades, suas crenas. Atualmente, ensina Cincias Polticas eFilosofia na Universidade de Chicago.

    11 Lembramos que, para Weber (1944), a ao racional com relao aos fins a nica realmente racional, sendo que a ao racional com relao aosvalores racional s na escolha dos meios e sempre aparece irracional doponto de vista da primeira. De qualquer maneira, a absoluta racionalidade

  • 149A racionalidade, a cultura e o esprito empresarial

    com relao aos fins um caso limite de carter essencialmente construtivo.Os indivduos reais que agem de maneira mais prxima so, para Weber,os empresrios.

    12 A Teoria dos Jogos foi formulada por Von Neuman e Morgenster (1944).Os autores questionavam a viso econmica que pressupunha uma relaodireta entre os agentes e o mercado, propondo que se observassem asrelaes econmicas como inter-relaes entre agentes, todos elesracionais. Esta teoria viveu 10 anos de sucesso, sendo em seguida postade lado. Reapareceu nos anos de 1970, no estudo das relaesinternacionais, na teoria poltica e, timidamente, na Sociologia.

    13 Organizado pela Fundation Nationale pour lEnseignement de la Gestionde la Entreprise (FNEGE). Sainsaulieu (1987, p. 214) aponta comodecisivas as intervenes publicadas na Revue Franaise de Gestion, n.47-47, Set. 1984.

    14 Outros autores abordam a questo na perspectiva da cultura do trabalho.A empresa pode ser vista tambm como um espao onde se plasma apreparao profissional e uma tica profissional. Neste sentido, aunidade produtiva tornar-se-ia um ambiente importante de integrao ede socializao do saber (Capecchi, 1980; Butera, 1989). A cultura dotrabalho, revela toda sua complexidade e plasticidade na expressivavalorizao dada ao saber tcnico, sobretudo nas fase reorganizao daatividade empresarial. Mas tambm a cultura do trabalho se revela nonormal funcionamento da empresa e, particularmente, na configuraoda diviso do trabalho (Sabel, 1985). Na prpria unidade produtiva, osrecursos investidos nos planos de carreiras, na requalificao e atualizaodos quadros tcnicos, so todos elementos indicativos da preocupaode renovar e/ou preservar a cultura do trabalho. A organizao tcnico-produtivo-administrativa e sua correspondente diviso sexual do trabalhopodem evidenciar os contedos simblicos desta cultura (Pesce, 1990).

    Abstract: The essay deals with the connection among the notionsrationality, interest, values, and culture. In the weberian sociology,rationality is associated to the modern capitalism and to theentrepreneurial spirit. Other authors (Off, Hirschman, Veblen,Simmel, Elster) discussed how difficult is to joint the modern and therational. Their analyses lead to some questions, which are relevant tothe study of firm issues. Firstly, the development of the capitalismreally imposed and universalized the economic rationality, but it didmake this process neither homogeneous, nor independent from the

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    culture influence. Secondly, values affect the economic rationalitycreating norms and rules, those orient actions and initiatives in orderto maintain the patrimony and have profits. It is possible to speak aboutfirm culture that leads to consider the firms cultural regulationsforms. Such regulations are inherited from a long industrial historyand have to be understood because they produce systematic effects.The entrepreneurial spirit, as the capitalistic rationality expression,can be enriched by larger dimensions including values and practicescoming from different cultural environments, such as family, community,political and social organizations. In conclusion, firms cannot be seenon the only organizational optic, because they are part of a regionaland social culture and they are linked to professional cultures andtheir organizations. In addition, firms are able to affect differentdimensions of the social life, setting-up links and exchanges withinstitutions, groups, and communities.

    Key words: Sociology of the Firm, rationality.

    Rsum: L article porte sur le lien entre les notions de rationalit,dintrt, de valeurs et de culture. Dans la sociologie weberienne, larationalit est associe au capitalisme moderne et lespritdentrepreneur. Dautres auteurs (Off, Hirschman, Veblen, Simmel,Elster) traitent de la difficult de runir le moderne et le rationnel.Leurs analyses conduisent certaines questions incontournables pourltude de la firme. Tout dabord, le dveloppement du capitalisme aimpos et universalis la rationalit conomique, mais il na pas renduce processus homogne ni indpendant de linfluence de la culture.Ensuite, les valeurs affectent la rationalit conomique en crant desnormes et des rgles, qui orientent les actions et les initiatives dans lebut de garantir le patrimoine et les profits. Il est possible de parler deculture de la firme, ce qui conduit prendre en considration lesformes de rgulation culturelle de la firme. De telles rgulationsproviennent dune histoire industrielle longue et doivent tre comprisescar elles produisent des effets systmatiques. Lesprit entrepreneurial,comme expression de la rationalit capitaliste, peut tre enrichi par deplus vastes dimensions qui incluent les valeurs et les pratiques provenantde diffrents environnements culturels, comme la famille, lacommunaut, les organisations politiques et sociales. En conclusion,les firmes ne peuvent tre saisies uniquement sous langleorganisationnel, car elles font partie dune culture rgionale et socialeet tissent des liens avec les cultures professionnelles et leurs organisa-

  • 151A racionalidade, a cultura e o esprito empresarial

    tions. En outre, les firmes peuvent affecter diffrentes dimensions dela vie sociale, en tablissant des liens et des changes avec lesinstitutions, les groupes et les communauts.

    Mots-cls: Sociologie de la Firme, rationalit.

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