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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” FACULDADE INTEGRADA AVM DESAPROPRIAÇÃO COMO FORMA DE INTERVENÇÃO NA PROPRIEDADE PRIVADA E O ESTATUTO DA CIDADE Por: Everton Oliveira de Souza Orientador Prof. Anselmo Souza Rio de Janeiro 2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

DESAPROPRIAÇÃO COMO FORMA DE INTERVENÇÃO NA PROPRIEDADE PRIVADA E O ESTATUTO DA CIDADE

Por: Everton Oliveira de Souza

Orientador

Prof. Anselmo Souza

Rio de Janeiro

2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

DESAPROPRIAÇÃO COMO FORMA DE INTERVENÇÃO NA PROPRIEDADE PRIVADA E O ESTATUTO DA CIDADE

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Direito Público

e Tributário.

Por: Everton Oliveira de Souza

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos professores, amigos, irmã e

namorada, que me auxiliaram nesse estudo,

com idéias, orientações, informações e

compreensão.

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DEDICATÓRIA

Dedico esse trabalho a minha família

especialmente aos meus pais, pelo voto

de confiança que sempre depositaram na

minha pessoa, pelo exemplo de

dedicação e perseverança que sempre

me passaram durante todos estes anos.

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo demonstrar que apesar de o direito a

propriedade ser garantido na Constituição Federal como sendo um direito

individual e como todo direito individual uma cláusula pétrea poderá o ente

público intervir na propriedade privada, obedecendo aos limites constitucionais

que amparam o interesse público e garantam os direitos individuais, onde o

interesse coletivo deverá prevalecer sobre o interesse individual, haja vista a

maioria das cidades terem seus planejamentos urbanos ligados à regularidade

e uso social da propriedade. Pretende confirmar a supremacia do interesso

coletivo sobre o interesse individual no âmbito do direito a propriedade,

elucidando o direito a propriedade como garantia constitucional do indivíduo,

demonstrando o instituto da desapropriação como forma de intervenção na

propriedade privada e explicar o processo da desapropriação na esfera

municipal com o advento do estatuto da cidade.

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METODOLOGIA

Para tal propósito, empregou-se como método de abordagem o dedutivo

e método de coleta de dados bibliográficos por meio dos quais, com a pesquisa

dos conceitos gerais constante nos diplomas e doutrinas constitucionais,

civilistas e administrativos, bem como da legislação específica tornou-se

possível obter os correspondentes resultados.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

1 . PROPRIEDADE 9

1.1. ASPECTOS HISTÓRICOS 9

1.2 RETROSPECTO DAS LEGISLAÇÕES BRASILEIRAS 12

1.3 CONCEITO 13

1.4 PODERES DO PROPRIETÁRIO 14

1.5 CARACTERÍSTICAS DA PROPRIEDADE 15

1.6 CLASSIFICAÇÃO DA PROPRIEDADE 15

1.7 MODOS DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE 17

1.8 PERDA DA PROPRIEDADE 18

2 . DESAPROPRIAÇÃO 22

2.1 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA 22

2.2 FUNÇÃO SOCIAL 25

2.3 PRESSUPOSTOS CONSTITUCIONAIS E LEGISLAÇÃO APLICAVEL 26

2.4 COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR E DESAPROPRIAR 29

2.5 PROCEDIMENTO EXPROPRIETARÓRIO 30

2.5.1 FASE DECLARATÓRIA 31

2.5.2 FASE EXECUTÓRIA 33

3 . ESTATUTO DA CIDADE 37

3.1 DIRETRIZES GERAIS 39

3.2 INSTRUMENTOS DE POLÍTICA URBANA 40

3.3 PLANO DIRETOR 47

3.4 GESTÃO DEMOCRATICA 51

CONCLUSÃO 53

BIBLIOGRAFIA 55

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INTRODUÇÃO

O tema, objeto desta, consubstancia-se no exame da desapropriação

como forma de intervenção na propriedade privada e o estatuto da cidade.

No ordenamento jurídico, o direito à propriedade apresenta-se como

garantia fundamental e inviolável. Todavia, com o respaldo no Princípio da

Supremacia do Interesse Coletivo sobre o Individual, permite-se a sua

expropriação, quando presente qualquer vício na sua destinação ou

superveniente uma necessidade, utilidade pública ou interesse social.

Tendo em conta essas circunstâncias, analisaremos também neste

trabalho os instrumentos de políticas urbanas previstos no estatuto da

cidade, os quais se mostram capazes de limitar as liberdades privadas em

prol do interesse público, a fim de que seja garantida a função social da

cidade. A importância do tema em questão encontra-se na atual

preocupação mundial no desenvolvimento sustentável, ou seja, crescimento

econômico e populacional, aliados ao bem estar social das presentes e

futuras gerações.

Assim sendo o presente trabalho encontra-se estruturado em três

capítulos.

O primeiro capítulo explicará acerca do direito de propriedade, seu

histórico, o retrospecto das legislações brasileiras, a definição, os poderes

atribuídos ao seu titular, as características, as classificações, as formas de

aquisição e perda do domínio.

O segundo capítulo, por sua vez explicará o instituto da desapropriação

partindo dos aspectos gerais, conceitos e natureza jurídica, função social,

fundamentos e legislações aplicáveis, bem como, os procedimentos que

são: a fase declaratória e a fase executória.

O terceiro capítulo dedicou-se a analise do estatuto da cidade, o qual

representa um dos mais importantes diplomas de direito urbanístico no

Brasil, serão abordadas as diretrizes gerais de desenvolvimento das

cidades, os principais instrumentos de política urbana, o plano diretor,

gestão democrática e as considerações finais previstas no estatuto.

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CAPÍTULO I

1 - PROPRIEDADE

Neste capítulo, o direito à propriedade, apesar de comportar uma vasta

extensão teórica, será abordado de forma breve, apontando apenas os traços

essenciais, haja vista que com este trabalho acadêmico não se almeja esgotá-

lo, mas sim, através de uma análise superficial, identificar os conceitos que são

fundamentais para a compreensão do tema proposto.

1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS

Para um melhor estudo do direito de propriedade, faz-se imprescindível

identificar o seu curso histórico. Nesse intento, ressalte-se que, tanto seu

conceito, como suas características, restrições e modos de aquisição,

apresentaram transformações ao longo dos tempos, as quais se encontram

diretamente atreladas à cultura e ao cenário político e econômico.

Na era primitiva, em face da organização social, da fartura de recursos

naturais e do sistema nômade, a propriedade restringia-se aos instrumentos de

uso pessoal, em especial, as peças de vestuário e os utensílios de caça e

pesca. O solo, por sua vez, pertencia ao domínio comum, cuja utilização era

permitida a todos os integrantes da tribo ou família.

Todavia, na medida em que o homem passa a se fixar na terra para

desenvolver a cultura agrícola, confere-se a ele a titularidade definitiva da

propriedade, o que, inicialmente, se dá de forma coletiva, particularizando-se, a

posteriori.

Nessa senda, cumpre sublinhar que o primeiro indício de vínculo de

natureza individual entre o homem e a terra deu-se no seio da antiga Roma.

Consoante lição de Venosa (2008):

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Nesse primeiro período do Direito Romano, o individuo recebia

uma porção de terra que devia cultivar, mas, uma vez terminada

a colheita, a terra voltava a ser coletiva. Paulatinamente, fixa-se

o costume de conceder sempre a mesma porção de terra às

mesmas pessoas ano após ano. Ali, o pater famílias instala-se,

constrói sua moradia e vive com sua família e escravos. Nesse

sentido, arraiga-se no espírito romano a propriedade individual e

perpétua. (VENOSA, 2008, v. 5, p. 150).

Não se pode olvidar, ainda, que o caráter exclusivo e absoluto da

propriedade romana encontrou alicerce na religião, visto ter-se no lar o local

apropriado à destinação do altar e do culto aos deuses.

Já na era medieval, com o surgimento do feudalismo, o aspecto unitário,

que vigorava até então, perde sua força e dá lugar à propriedade Duarte (2003)

“escalonada ou mediatizada, onde o domínio direto pertencia ao senhor feudal,

e o domínio útil, ao vassalo”.

Neste sistema, o soberano delimitava na área dominial a fração que

caberia exclusivamente ao seu domicílio e também a que se submeteria à

exploração econômica por parte dos vassalos, condicionada esta ao

cumprimento de obrigações pecuniárias e militares destes em relação àqueles,

o que denota a estreita ligação da propriedade ao poder político.

O regime feudal, no entanto, é extinto pela Revolução Francesa, que

retoma a idéia romanista da propriedade, marcada pela feição individualista,

sagrada e absoluta.

Partilhando desta linha, Coelho (2006) observa que:

O primeiro marco é a Revolução Francesa (1789). Nele, o direito

de propriedade é proclamado como natural, ilimitado e

individualista. Para a declaração dos direitos do homem e do

cidadão, a propriedade é um direito “inviolável e sagrado”.

Define-o, por outro lado, o Código Napoleão – expressão da

mesma ideologia burguesa impulsionadora da Revolução

Francesa – como “o direito de gozar e dispor das coisas da

maneira mais absoluta”. (COELHO, 2006, v. 4, p. 57).

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Anote-se que o espírito românico da propriedade repercutiu às demais

nações, as quais, por longo período, guiaram os seus passos sob este

enfoque.

Contudo, tais pressupostos acabaram sendo relativizados a partir da

Revolução Industrial e das correntes socialistas. Acerca desse momento

histórico, Coelho esclarece:

O segundo marco é a flexibilização a que se obrigou o Estado

capitalista ao longo do século XX para sobreviver ao avanço do

socialismo. Ela reclamou uma profunda alteração no direito de

propriedade, cujo exercício passou a se subordinar ao

atendimento da função social. Deixou de ser firmado como um

direito egoísta para se compatibilizar com a realização do

interesse público (Savatier, 1950). O altruísmo do proprietário,

que a nova formulação procurou estimular, contribuía assim para

a redução dos conflitos de classe. (COELHO, op. cit., p. 57).

Como se vê, é incontroverso que o direito de propriedade no decorrer de

seu percurso adaptou-se gradualmente às condições políticas e econômicas de

cada momento, ora se apresentando como um direito exclusivo, sólido e

incontestável, ora se exteriorizando de forma antagônica a imagem privatista,

com o intuito de atender os anseios sociais.

Posta assim a questão, destaca-se que o predomínio do interesse

público sobre o particular revelou-se como o fator primordial, quiçá o mais

decisivo, na transformação que se processa no instituto da propriedade e

conseqüentemente em todo o direito das coisas.

Impende observar que, na atualidade, época em que o capitalismo é o

regime predominante, o domínio mostra-se como um instrumento instigador do

progresso individual, mas que, por outro lado, deve servir como meio

conciliador dos interesses particulares e coletivos.

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1.2 RETROSPECTO DAS LEGISLAÇÕES BRASILEIRAS

No Brasil, o direito à propriedade ganhou amparo legal desde que se

outorgou a primeira Magna Carta, datada de 25 de março de 1824, a qual

atribuiu ao instituto a sua plenitude e inviolabilidade, exceto quando o Ente

Público ordenasse seu uso, o que se faria mediante prévia indenização.

De forma similar, norteou-se também a Constituição da República dos

Estados Unidos do Brasil, de 24 de fevereiro de 1891, que acrescentou no

artigo 17, parágrafo 17, como circunstância limitadora, a expressão

desapropriação por necessidade ou utilidade pública.

Em 1° de janeiro de 1916, com o advento do Código Civil Brasileiro

assegurou-se “ao proprietário o direito de usar, gozar, e dispor de seus bens, e

de reavê-los do poder de quem quer que injustamente os possua” e, inclusive,

adicionou-se nele outros dispositivos específicos a respeito do assunto.

A função social do domínio é reconhecida na Norma Maior, em 16 de

julho de 1934, ao passo que o mesmo Diploma Jurídico, agora editado em 10

de novembro de 1937, imputou à legislação específica o dever de regulamentar

a propriedade em seu conteúdo e em seus limites. Em decorrência disso,

expede-se, no dia 21 de junho de 1941, o Decreto-lei 3.365, acerca dos

procedimentos expropriatórios.

Com a Constituição de 1946, condiciona-se o uso da propriedade ao

bem estar - social e recepciona-se a idéia de sua justa distribuição. A Carta

Política subseqüente, contemporânea ao ano de 1967, seguiu o mesmo

compasso das anteriores, sem trazer maiores inovações que envolvessem a

matéria.

A atual redação constitucional, datada de 05 de outubro de 1988,

colocou a propriedade no rol dos direitos fundamentais (artigo 5º, inciso XXII).

Entretanto, o legislador constituinte percebeu que seria inadequado prever este

direito e esquecer que ele deve, simultaneamente, resguardar o interesse

coletivo. Assim, materializou tal preocupação na regra da obrigatoriedade do

atendimento da função social do domínio, que restou capitulada na mesma

categoria de direitos (art. 5º, inciso XXIII).

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Vale lembrar que se manteve como delimitação do instituto a

“desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social,

mediante justa e prévia indenização em dinheiro”, que, caso venha concretizar-

se, deverá ser precedida do devido processo legal, consoante o previsto no art.

5º, inciso LIV.

1.3 CONCEITO

Nas doutrinas civilistas verifica-se uma sintonia entre os juristas quanto à

definição de propriedade, visto que elas apóiam o seu conceito no que

estabelece o artigo 1.228, do Código Civil.

Na concepção de Diniz (2007):

Poder-se-á definir, analiticamente, a propriedade, como sendo o

direito que a pessoa física ou jurídica tem, dentro dos limites

normativos, de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo ou

incorpóreo, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o

detenha. Esses seus elementos constitutivos correspondem ao

jus utendi, fruendi e abutendi e à rei vindicatio dos romanos. A

propriedade não é a soma desses atributos, ela é o direito que

compreende o poder de agir diversamente em relação ao bem,

usando, gozando ou dispondo dele. (DINIZ, 2007, p. 113-114).

Depreende-se da teoria supracitada que há, neste direito subjetivo, um

vínculo entre o proprietário e o bem, o qual propaga seus reflexos a todos os

demais cidadãos, na medida em que estes se comprometem a respeitar o

exercício proveniente de tal liame jurídico.

A par disso, o próprio Estado, além de reconhecer a existência desta

relação jurídica, assume e possibilita meios para que o senhor possa proteger

o seu direito à propriedade.

Por outra forma, vislumbra-se a submissão da coisa à pretensão de seu

titular, o que torna a propriedade o mais abrangente de todos os direitos reais,

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já que reúne como prerrogativas do senhor, uma gama de faculdades, as quais

compreendem: o direito de usar, gozar, dispor do bem e reavê-lo do poder de

quem injustamente o possua.

1.4 PODERES DO PROPRIETÁRIO

Como dito, os poderes de senhoria, que formam o conteúdo positivo do

instituto da propriedade, elevam-no a posição do mais completo dos direitos

reais, elencados no artigo 1.225 do Código Civil. Isto porque, reúne, nas mãos

de seu titular, direitos que continuam a existir mesmo com a presença de um

outro direito real sobre a coisa. (MONTEIRO, 2003, p. 84).

A faculdade de usar significa segundo Coelho (2006) “desfrutar dos

proveitos diretamente proporcionados pelo bem”, sem alterar-lhe a essência.

Convém ponderar que a utilização dar-se-á ao proprietário, que poderá tão

somente mantê-lo em condições de servir, ou até mesmo a favor de terceiro.

A possibilidade de gozar expressa a colheita dos frutos oriundos do bem,

sejam eles naturais ou civis; refere-se à exploração econômica propriamente

dita. Ressalva-se que, em regra, os benefícios procedentes da coisa pertencem

ao proprietário desta, mesmo que dela apartados. Admite-se, porém, norma

jurídica especial que determine o contrário, como no caso dos possuidores de

boa-fé, bem como dos usufrutuários.

O poder de dispor da coisa é exclusivo do senhor, a quem se possibilita

aliená-la, consumi-la, gravá-la de ônus e submetê-la ao serviço de outrem.

Reivindicar de quem quer que injustamente o possua ou detenha, é o

quarto e último privilégio conferido à pessoa do proprietário, cuja reclamação é

conhecida como o direito de seqüela; manifesta-se quando se priva o titular do

bem, momento em que a propositura de ação judicial torna-se o instrumento

adequado para recuperá-lo.

Em que pese à amplitude das garantias outorgadas ao proprietário, é

oportuno repisar que elas devem se consolidar de acordo com as restrições e

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com os limites impostos à coisa, que, como se verá adiante, também encontra

respaldo nos diplomas jurídicos e na Constituição Federal.

1.5 CARACTERÍSTICAS DA PROPRIEDADE

Vê-se que a propriedade, além de ser um direito subjetivo e pertencer à

classe dos direitos reais, é dotada de outros caracteres que a distingue e a

destaca dos demais.

Qualifica-se a propriedade como um direito absoluto, pois em virtude da

oponibilidade erga omnes, permite-se ao titular reagir contra todos aqueles que

violarem este preceito. Ademais, desde que praticada de forma regular e

observadas as limitações ligadas ao interesse coletivo, poderá o senhor

desfrutá-la e dispô-la como bem entender. (DINIZ, 2007, p. 115-116).

Neste sentido, o Código Civil Brasileiro, no artigo 1.231, prevê: “A

propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário”.

Portanto, extrai-se como outro atributo a exclusividade, já que o

exercício do poder dominial pelo titular exclui o direito simultâneo de terceiro

sobre o bem.

O caráter perpétuo também faz parte dos predicados da propriedade,

pois ela continua a prevalecer independentemente de exercício, salvo a

hipótese de caracterizar-se o desvio de finalidade, por vontade do senhor ou

por incidência de causa legal extintiva.

Gomes (2007), representando uma ala da doutrina nacional, apresenta,

ainda, a elasticidade, como a quinta particularidade do instituto dominial,

porque ele é capaz de estender-se ou contrair-se, ao adicionar ou reduzir suas

faculdades para compor outros direitos reais, sem que para isso tenha que

perder a sua essência. (GOMES apud DINIZ, 2007, p. 117).

1.6 CLASSIFICAÇÃO DA PROPRIEDADE

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Correlaciona-se a propriedade a diferentes tipos de objetos, ao modo de

concentração de poderes pelo senhor, a diversidade de seus titulares e a sua

duração, estas formas variadas de externar-se implicam em distintos critérios

de classificação.

Quanto ao objeto, poderá a propriedade ser corpórea ou incorpórea. A

primeira, também denominada de domínio; dá-se quando os bens são “dotados

de existência física, providos de materialidade, de corpo e que, por isso,

ocupam espaço”. A segunda trata-se de “alguns direitos que existem apenas

enquanto conceitos jurídicos”. (COELHO, 2006, p. 59).

Para melhor explanar, exemplifica-se como bem corpóreo o terreno ou o

televisor, e como bem incorpóreo a marca registrada ou as ações emitidas por

uma sociedade anônima.

É importante atentar-se que a ordem jurídica disciplina de forma

autônoma os dois tipos intrínsecos a esta modalidade de classificação: a

propriedade corpórea acompanha o capitulado nos artigos 1.228 e seguintes

do Código Civil, e a propriedade incorpórea o contido em normas esparsas.

Ainda no tocante à natureza do objeto, cumpre mencionar que a

propriedade corpórea subdivide-se em imobiliária, o que ao solo se incorpora

de maneira natural ou artificial, como a casa ou a plantação; e mobiliária,

aqueles bens que se transportam por força própria ou alheia, sem modificar a

sua substância, como os animais, os veículos e os livros.

Na extensão de poderes tem-se a propriedade plena, quando se reúnem

no comando do titular todas as faculdades associadas ao direito de

propriedade, sem que haja qualquer entrave decorrente de declaração negocial

de vontade; e a propriedade restrita ou limitada, quando uma ou mais das ditas

faculdades não se encontram a disposição do senhor, tendo em vista a

imposição de limites provenientes da celebração de negócio jurídico. O

titular do direito de propriedade pode ser único, uma pessoa física ou uma

pessoa jurídica, o que denota uma propriedade singular, ou ainda pode o

objeto dividir-se em dois ou mais sujeitos, o que evidencia uma co-propriedade.

Por derradeiro, tem-se a propriedade perpétua, cujo tempo de duração

depende única e exclusivamente da vontade do senhor; e a propriedade

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resolúvel ou revogável, que possui no seu título uma condição, que uma vez

concretizada implicará no seu término.

1.7 AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE

A aquisição da propriedade, tanto móvel quanto imóvel, recebeu do

Código Civil tratamento diverso, o qual reservou capítulos distintos para cada

uma das espécies.

Assim, ao considerar a existência de pontos não coincidentes para

ambas as modalidades de propriedade, examinar-se-á, de forma breve e

isolada, os modos aquisitivos do direito à propriedade mobiliária e imobiliária.

Obtém-se a propriedade do bem imóvel de duas formas: a originária e a

derivada. Naquela não há qualquer conexão jurídica entre a titularidade dos

antecessores e a do sucessor. Têm-se como hipóteses a usucapião e a

acessão natural. Conquanto que, na derivada, ocorre à efetiva transmissão do

domínio, entre o sujeito anterior e o posterior, com todas as suas

peculiaridades, sejam estas positivas ou negativas, encaixando-se nesta seção

a aquisição pelo registro público e a sucessão causa mortis.

Em outras palavras, ensina Rodrigues (2003):

São originários os modos de aquisição da propriedade em que

não há qualquer relação jurídica de causalidade entre o domínio

atual e o estado jurídico anterior, como ocorre na hipótese da

acessão ou da usucapião. São derivados os modos de aquisição

quando, entre o domínio do adquirente e do alienante, existe

uma relação de causalidade, representada por um fato jurídico,

tal o contrato seguido de tradição, ou o direito hereditário.

(RODRIGUES, 2003, p. 93).

Colhem-se, como meios aquisitivos da propriedade móvel: a usucapião;

a ocupação; o achado do tesouro; a tradição; a especificação; e a confusão, a

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comissão e a adjunção. Diniz (2007) ramifica também em originária e derivada

estas vias, pelas quais se adquire o bem mobiliário:

São considerados modos originários de aquisição e perda de

propriedade móvel: a ocupação e a usucapião, porque nelas não

há qualquer ato volitivo de transmissibilidade, ao passo que a

especificação, a confusão, a comistão, a adjunção, a tradição e a

sucessão hereditária são tidas como derivadas porque só se

perfazem com a manifestação do ato acima mencionado. (DINIZ,

2007, p. 304-305).

Dito isso, é acertada a conclusão de que para um indivíduo adquirir para

si o domínio, outro provavelmente terá que perdê-lo. Assim, tratar-se-á no

próximo subitem das causas de sua extinção.

1.8 PERDA DA PROPRIEDADE

Para bem analisar as circunstâncias que colocam fim ao poder dominial,

é conveniente trazer à baila o regulamento constante no Código Civil:

Art. 1275. Além das causas consideradas neste Código, perde-

se a propriedade:

I – por alienação;

II – pela renúncia;

III – por abandono;

IV – por perecimento da coisa;

V – por desapropriação.

Parágrafo único. Nos casos dos incisos I e II, os efeitos da perda

da propriedade imóvel serão subordinados ao registro do título

transmissivo ou ato renunciativo no Registro de Imóveis.

No inciso I encontra-se como modo terminativo a alienação. Nela, o

titular do domínio, mediante o regular registro no cartório imobiliário

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competente, transfere a outrem o seu direito, de maneira livre ou compulsória,

gratuita ou onerosa. Em sua obra, Monteiro (2003) leciona:

Alienação é ato pelo qual o titular transfere a outra pessoa sua

propriedade. Ela pode consumar-se a título gratuito, como a

doação, e a título oneroso, como a compra e venda. Pode ainda

ser voluntária, como a dação em pagamento, e compulsória,

como a arrematação e a desapropriação. Pode resultar,

outrossim, do implemento de condição resolutiva e da ocorrência

da exceção rei venditae et traditae. Momento culminante da

alienação é o registro, pelo qual o imóvel sai definitivamente do

patrimônio do alienante para incorporar-se ao do adquirente

(art.1.275, parágrafo único). Por força desse dispositivo, o efeito

da perda do domínio, no caso de alienação, subordina-se ao

registro do título transmissivo no cartório de registro de imóveis.

(MONTEIRO, 2003, p. 169).

Da acepção do autor acima referido, constata-se que ele inclui a

desapropriação como um exemplo de alienação compulsória, o que contrasta

com a codificação dada pelo legislador nacional, a qual coloca o ato

expropriatório num inciso especial.

Em seguida, contempla-se a renúncia, que é a abdicação expressa dos

direitos sobre o bem pelo proprietário. Neste caso, o assento no cartório de

registro de imóveis também se faz medida obrigatória, conforme o parágrafo

único, do artigo 1.275, do Código Civil.

Para Venosa (2008):

Renunciar implica abdicar, abrir mão de direitos. Em sentido

estrito, renúncia é ato pelo qual alguém abandona um direito,

sem transferi-lo a outrem. É ato unilateral. Independe, portanto,

de aceitação. Além de unilateral, é irrevogável e não se

presume, dado seu caráter, devendo ser expresso. A renúncia

em favor de outrem refoge ao sentido do instituto porque traduz

alienação. (VENOSA, 2008, p. 245).

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20

A disparidade entre a renúncia e o abandono, disposto no inciso III, do

artigo acima ilustrado, está na formalidade de declarar a intenção extintiva do

domínio. Neste último, inexiste manifestação expressa, tampouco transcrição

do ato no registro imobiliário.

Por esta forma, para concluir-se o abandono, perceber-se-á o

comportamento do proprietário perante o bem, pois além de impresumível, não

é o simples fato de não usá-lo ou a ausência de cuidados que acarretará o

término do domínio.

Não há que se falar em direito quando ausente o seu respectivo objeto.

É sob este prisma que se traduz o perecimento da coisa, condição

exterminadora da propriedade, arrolada no inciso IV, do artigo 1.275, do Código

Civil. Nesta modalidade, por força natural ou atividade humana, acontece o

desaparecimento do domínio.

Se por um lado, incêndios, terremotos, enchentes, a invasão de terra

pelas águas, ilustram a dissipação natural e involuntária, por outro, a destruição

representa a voluntariedade do próprio senhor, que de igual modo, aniquila o

vínculo jurídico até então existente entre o titular e o bem.

Para a desapropriação, último pressuposto do artigo 1.275 do Código

Civil, dedicar-se-á um capítulo exclusivo, com o intuito de expor os pormenores

de seu conteúdo, os quais se revelam instrumentos imperiosos para a presente

investigação.

Extrai-se do caput, do artigo 1.275, do Código Civil, um rol não taxativo,

que admite outras formas de perda da propriedade. Para Monteiro (2003) pode-

se acrescer nele a usucapião; a acessão; a dissolução da sociedade conjugal,

sob regime de comunhão universal de bens; e a sentença com trânsito em

julgado, que implica na transferência do imóvel de um para outro litigante.

Diniz (2007) adiciona, ainda, o implemento de condição resolutiva no

caso de propriedade resolúvel, bem como o confisco, este último permitido pelo

ordenamento apenas na hipótese do artigo 243 da Constituição Federal.

A generalidade do teor do artigo 1.275 do Código Civil exprime que as

condições que impõe o fim da propriedade imobiliária são idênticas as

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consagradas à mobiliária, as ínfimas divergências restringem-se à necessidade

de adaptações conforme as características intrínsecas à espécie.

Por exemplo, no caso da alienação e da renúncia, insculpidas nos

incisos I e II, ao invés do registro no cartório imobiliário competente, há apenas

um documento ou declaração que reflete a disposição de vontade, na qual se

pautou o negócio jurídico.

Em regra, concomitantemente à aquisição da coisa, tanto a móvel como

a imóvel, tem-se a sua perda. Neste raciocínio, todos os expedientes utilizados

para adquiri-la são também considerados vias extintivas. Em suma, os modos

de obtenção da propriedade imobiliária e mobiliária são, ao mesmo tempo,

maneiras de perdê-la.

Posto isto, é de bom tom frisar que as circunstâncias terminativas aqui

explanadas são exceções deste direito real, pois, na verdade, o que prevalece

é a regra de sua perpetuidade.

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22

CAPÍTULO II

2 – DESAPROPRIAÇÃO

Este capítulo trata das noções introdutórias ao direito de desapropriação,

abordando principalmente o conceito de desapropriação e sua natureza

jurídica, bem como, sua função social, a qual demonstra que diante de uma

motivação superior o interesse privado deve subordinar-se ao interesse

público. Por fim, faz-se um estudo do seu amparo e seu procedimento

expropriatório.

2.1 - CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

Etimologicamente, desapropriação equivale ao ato de privar alguém da

propriedade, tirar ou fazer perder a propriedade. (VELLOSO, 2000, p.02).

Contudo, no âmbito do direito administrativo, a desapropriação é a forma

mais drástica de intervenção do Estado na propriedade, através da qual o

poder público adquire originalmente um bem, antes sob o domínio de outrem.

(MEIRELLES, 2002, p.502).

A Lei das Desapropriações n.° 3.365/41, enumera em seu artigo 29, o

entendimento de que a desapropriação trata da perda da propriedade privada,

que só se aperfeiçoam com a transcrição da sentença de mérito ou

homologatória do acordo, no registro de imóveis.

Assim afirma Miranda (1971) à expropriação é “A privação de elementos

da propriedade”. Por essa definição explicam-se todas as espécies de

desapropriação.

Para Di Pietro (2002), define desapropriação como:

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O procedimento administrativo pelo qual o Poder Público ou

seus delegados, mediante prévia declaração de necessidade

pública, utilidade pública ou interesse social, impõe ao

proprietário a perda de um bem, substituindo-o em seu

patrimônio por justa indenização. (DI PIETRO, 2002, p.134).

Conceitua Whitaker (1927) na mesma linha de entendimento:

Desapropriação é o ato pelo qual a autoridade competente, em

casos expressos em lei e mediante indenização determina que a

propriedade individual seja transferida a quem dela se utiliza em

interesse da coletividade. (WHIATER 1927, p.03).

No mesmo sentido, o conceito dado por Mello (2001) preceitua que:

A luz do Direito Positivo brasileiro, desapropriação se define com

o procedimento através do qual o Poder Público, fundado em

necessidade pública ou interesse social, compulsoriamente

despeja alguém de um bem certo, normalmente adquirindo-o

para si, em caráter originário, mediante indenização prévia, justa

e pagável em dinheiro [...]. (MELLO, 2007, p.711)

Assim, pode-se asseverar que desapropriação é desapossar, tirar a

coisa do domínio privado, passando-o ao púbico, utilizando o procedimento

administrativo, preparatório do judicial, por meio do qual o Poder Público ou

seus delegados, compulsoriamente, pretendem despejar alguém do seu direito

de propriedades a fim de o adquirir, mediante indenização prévia, justa, em

geral em dinheiro ou excepcionalmente, em títulos da dívida pública.

O ato de expropriar propriedade alheia encontra aparo na Carta Magna

de 1988, que em seu artigo 5°, XXIV, determina a competência de lei ordinária

para estabelecer o procedimento para desapropriar por necessidade ou

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utilidade pública, ou por interesse social, ou seja, é a perda da propriedade

pelo particular, para fins de interesse público, mediante prévia e justa

indenização em dinheiro.

Quanto à natureza jurídica, a desapropriação é a forma originária da

aquisição da propriedade, segundo Mello (2007):

Diz-se originária a forma de aquisição da propriedade quando a

causa que atribuí a propriedade a alguém não se vincula a

nenhum título anterior, isto é, não procede, não deriva de título

precedente, portanto, não é dependente de outro. É causa

autônoma, bastante por si mesma, para gerar, por força própria,

o título constitutivo da propriedade. (MELLO, 2007, p.827)

Franco Sobrinho (RDA 112/25, apud DI PIETRO, 2000, p.146),

caracteriza desapropriação:

1. por independer da vontade do particular;

2. por não ser compra venda;

3. por não ser confisco;

4. por exigir compensação;

5. pela fixação do interesse público;

6. por estar isenta de evicção ou demanda por vício redibitório;

7. pela força de extinguir os ônus reais que pesarem sobre a coisa;

8. pela extinção da inalienabilidade.

Deste modo, a desapropriação pode ser entendida como um

procedimento administrativo declaratório, pelo qual o expropriante adquire a

propriedade expropriada, originariamente, mediante prévia declaração de

necessidade ou utilidade pública e interesse social, sem vínculos com o

proprietário anterior, por independer da vontade do particular é de extrema

importância a sua função social, mediante a intervenção do Estado na

propriedade.

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2.2 FUNÇÃO SOCIAL

Se não for observada a função social da propriedade, complete ao

direito concedido ao Estado de expropriar propriedade alheia, sem que seu ato

seja considerado esbulho, e sim largamente amparado na legislação brasileira,

que prevê as hipóteses cabíveis de desapropriação e o processo a ser

devidamente seguido.

Observando o art. 15 § 1°, do Decreto-Lei n.° 3.365/41, a imissão

provisória da posse, poderá ser feita independentemente da citação o réu,

mediante o depósito, tal norma não contraria a Constituição, como demonstra a

Súmula do Supremo Tribunal Federal n.° 652, e assim dispõe: “[...] não

contraria a Constituição o artigo 15, parágrafo 1°, do Decreto-Lei 3.365/41 (Lei

da Desapropriação por Utilidade Pública)”.

Sobre isso Meirelles (2002) afirma que:

Para propiciar esse bem-estar social o Pode Público pode

intervir na propriedade privada e nas atividades econômicas das

empresas, nos limites da competência constitucional atribuída a

cada uma das entidades estatais, através de normas legais e

atos administrativos adequados aos objetivos de intervenção.

(MEIRELLES, 2002, p.498)

A Constituição Federal de 1988 garante o direito de propriedade, mas

estabelece como um dos direitos fundamentais que a propriedade deverá

atender a sua função social. Assim, entende Meirelles (2002) que:

Desapropriação é a forma conciliadora entre a garantia da

propriedade individual e a função social dessa mesma

propriedade, que exige usos compatíveis como o bem-estar da

coletividade. (MEIRELLES, 2002, p.501)

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A previsão legal de um processo de desapropriação demonstra que,

apesar de não observância da função social da propriedade ensejar a

possibilidade de sua perda, outros direitos do proprietário devem ser

resguardados, como o direito a um pagamento justo pelas benfeitorias

realizadas e a uma indenização pelas perdas e danos e lucros cessantes em

face da desapropriação, o que faz se necessário para que a sociedade evolua,

mas continue a viver em harmonia. (FARIA, 2004, p.376).

Conclui-se que por ser tratar de interesse coletivo, o qual sobrepõe o

direito individual, justiça e a ação do Estado sobre a propriedade particular,

transferindo-a que regulamentem o procedimento de expropriação, de modo

que respeite o direito de propriedade garantido constitucionalmente.

2.3 FUNDAMENTOS E LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

A legislação pátria, quanto ao ato de expropriar propriedade de outrem,

encontra amparo na Constituição de 1988, que preleciona em seu artigo 5°,

XXIV, a permissão para desapropriar por necessidade ou utilidade pública e

interesse social, o mesmo vem mencionado no artigo 1.288, parágrafo 3°, do

Código Civil, ipsis literis:

Art. 5°, CF.

[...]

XXIV- da Constituição Federal: a lei estabelecerá o

procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade

pública, ou interesse social, mediante justa prévia indenização

em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;

[...]

Art. 1.288, C

[...]

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§ 3° O proprietário deve ser privado da coisa, nos casos de

desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou

interesse social, bem como no de requisição, em caos de perigo

público iminente. (www.planalto.com.br).

Como mencionado no artigo 5°, XXIV, da constituição da República,

essa expropriação dever ser feita mediante justa e prévia indenização em

dinheiro, salvo algumas exceções previstas na própria Carta Constitucional, em

que a desapropriação não é paga em dinheiro, e sim, por exemplo, em títulos

da dívida pública. Dispõe sobre o pagamento em títulos da dívida púbica a

chamada desapropriação-sanção, que no artigo 182, parágrafo 4°, inciso III,

também da CF, define-a como penalidade para aquele proprietário de solo

urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, facultando ao Poder

Público a indenização em títulos da dívida pública. (MEDAUAR, 2006, P.349).

Especificamente sobre a desapropriação para fins de reforma agrária,

considerada constitucionalmente como interesse social, a Magna Carta dispõe

no artigo 184, a competência da União, e assim prescreve:

Art.184. Compete a União desapropriar por interesse social, para

fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprido

sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos

da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real,

resgatáveis no prazo de até 20 anos, a parir do segundo ano de

emissão, e cuja utilização será definida em lei.

A distinção entre necessidade ou utilidade pública e interesse social, foi

formulada por Fagundes (1984):

A necessidade pública aparece quando a Administração se

encontra diante de um problema inadiável e premente, isto é,

que não pode ser removido nem procrastinado e para cuja

solução é indispensável incorporar no domínio do Estado o bem

particular. A utilidade pública aparece quando a utilização da

propriedade é conveniente e vantajosa ao interesse coletivo,

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mas não constitui imperativo irremovível. Haverá um motivo de

interesse social quando a expropriação se destine a solucionar

os chamados problemas sociais, isto é, aqueles diretamente

atinentes às classes mais pobres, aos trabalhadores, à massa

do povo em geral pela melhoria nas condições de vida, pela

mais eqüitativa distribuição da riqueza, em fim, pela atenuação

das desigualdades sociais. (FAGUNDES, 1984, p.187)

O texto legal mais significativo a respeito da desapropriação é o Decreto-

Lei n.° 3.365, de 21 de junho de 1941, também conhecido como Lei Geral das

Desapropriações. O referido Decreto-Lei supriu a expressão necessidade

pública e regula a desapropriação por utilidade pública, mantendo essa

expressão. Deve ser utilizado sempre que o Poder Público necessitar para

suas funções estatais, exigindo a aquisição de domínio de bens alheios.

(GASPARINI, 1995, p. 437).

O Decreto-Lei n.° 3.365/41 aceita apenas os casos de desapropriação

por utilidade pública, por exemplo: para abertura de ruas, execução de planos

urbanísticos, realização de casas de saúde e etc. Sendo assim:

Omite a indicação explícita de casos de necessidades pública. A

doutrina vem afirmando quanto aos quatro casos mencionados

no art.5° do Decreto-lei número 3.365/41, ou seja, segurança

nacional, defesa do estado, socorro público em caso de

calamidade, salubridade pública, são de necessidade pública.

(MEDAUAR, 2006, P.352).

Com relação à desapropriação por interesse social, o texto que a regula

é a Lei n.° 4.132/62, definindo seu artigo 2°, os casos de desapropriação por

interesse social.

Sobre o tema descreve Di Pietro (2002):

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Há de se observar que a definição de quais sejam os casos de

necessidade pública, utilidade pública ou interesse social mão

fica a critério da Administração Pública, uma vez que as

hipóteses vêm taxativamente indicadas, em Lei; não basta, no

ato expropriatório, mencionar genericamente um dos três

fundamentos; é necessário indicar o dispositivo legal em que se

enquadra a hipótese concreta. (DI PIETRO, 2002, p.139).

Porém, essas não são as únicas disposições normativas a respeito da

desapropriação. O Decreto-Lei n.° 1.075/7, por exemplo, traz disposições de

caráter processual, como o instituto da imissão na posse de imóveis

residenciais urbanos. Além disso, a Lei n.° 6.602/78 também dispõe sobre a

desapropriação, bem como, os Códigos de Mineração e de Águas e o Estatuto

da Terra, entre outros.

2.4 COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR E DESAPROPRIAR

A capacidade para expropriar é decorrente da soberania estatal. De

acordo com a organização, só nas hipóteses de poder originário ou delegação,

torna-se permissível legalmente o uso da competência expropriatória.

(FRANCO SOBRINHO, 1989, p.41).

A competência, tendo em vista a organização política ou os regimes

administrativos, vêm sempre jurisdicionalizada, dividida, circunscrita às áreas

de atuação, vinculada a interesses qualificados pela natureza dos serviços

públicos. (FRANCO SOBRINHO, 1989, p.41).

Compete exclusivamente à União legislar sobre a desapropriação, como

mostra o art.22, II, da Carta Constitucional, sendo assim, afasta todos os

demais entes federados de formularem qualquer lei, sobre a matéria

expropriatória.

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Dispõe a Constituição Federal, no artigo 22, inciso II: “Compete

privativamente à União legislar sobre [...]; II - desapropriação; [...]”.

Desta forma, cabe à União disciplinar o procedimento administrativo e o

processo judicial, necessários para que possa ocorrer o expropriamento.

É competente para declarar, ou seja, submeter um bem ao regime

expropriatório, por necessidade ou utilidade pública, ou interesse social, as

pessoas políticas dentro de suas respectivas jurisdições, tato a União, os

Estados e o Distrito Federal podem emitir declaração expropriatória (art. 2°,

Decreto-Lei n°3.365/41). (GASPARINI, 1995, P.437).

Além das autoridades citadas, é competente para editar o ato

declaratório a Autarquia DNIT, tal competência está inserida legalmente no art.

14, do Decreto-Lei Federal n.° 512/69, também podem editar declarações

expropriatórias a empresa ANEEL, nas hipóteses previstas na Lei n.° 9.427/96,

sendo esses atos declaratórios em forma de portaria.

Por fim, a competência para executar ou promover a desapropriação é

das entidades da Administração indireta, mediante autorização, constante em

lei ou contrato (art. 3°, Decreto-Lei n.° 3.365/41), devendo ser emitido

previamente ao ato declaratório pelo Chefe do Executivo (Presidente da

República, Governador do Distrito Federal, Governador do Estado ou Prefeito

Municipal), dependendo da competência de cada uma dessas pessoas

políticas.

2.5 PROCEDIMENTO EXPROPRIATÓRIO

Como já foi visto, a desapropriação se dá por procedimento

administrativo, isto é, uma sucessão de atos que culminam para um único fim,

qual seja, a aquisição originária pelo Poder Público de propriedade alheia,

realizada em 2 (duas) fases: A Primeira de natureza declaratória,

consubstanciada na indicação da utilidade pública; a segunda de caráter

executório, compreendendo a estimativa da justa indenização e a transferência

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do bem expropriado para o domínio do expropriante. (GASPARINI, 1995,

P.437).

Conceitua Meirelles (1997):

É um procedimento administrativo e não um ato, porque se

efetiva através de uma sucessão ordenada de atos

intermediários (declaração de utilidade, avaliação, indenização),

visando à obtenção de um ato final que é a adjunção do bem ao

Poder Púbico ou ao seu delegado beneficiário da expropriação.

(MEIRELLES, 1997, p.514):

É de grande alvitre diferenciar essas duas fases, uma declaratória que é

a fase administrativa e a executória que pode ser administrativa ou judicial.

2.5.1 Fase Declaratória

A fase declaratória é feita de forma administrativa, materializada em ato

declaratório emanada pelo Poder Executivo ou por intermédio de lei; se

expedida pelo Poder Legislativo, será através de uma declaração por utilidade

pública ou interesse social. (FARIA, 2004, p.396).

Como a desapropriação é uma das modalidades de intervenção do

Estado na propriedade e têm caráter concreto, incidente sobre um bem

determinado e individualizado, o ato declaratório deve conter o sujeito ativo da

desapropriação, a descrição do bem, a declaração de necessidade pública,

utilidade pública ou interesse social, a qualificação ou identificação do bem

explorado, a destinação específica a ser dada ao bem, o fundamento legal e

indicação da fonte jurídica embasadora da medida. (FARIA, 2004, P.397-398).

A partir do ato declaratório de desapropriação, verificam-se os efeitos do

decreto expropriatório, são eles: submete-se o bem a força do Estado; fixa as

condições que o bem se encontra; o Poder Público passa a ter direito de posse

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sobre o bem; começa a contagem do prazo de caducidade do ato declaratório

por necessidade ou utilidade pública (05 anos – artigo 10, do Decreto-Lei n.°

3.365/41). Não podendo o bem ser modificado. (GASPARINI, 1995, p.450).

Como expõe o parágrafo anterior, o início do prazo de caducidade

resulta na proibição quanto às modificações feitas nos bens, pois este é o

objetivo de avaliação para o cálculo da justa indenização. As benfeitorias

realizadas antes do ato declaratório, de quaisquer modalidades, serão

computadas no cálculo da indenização, as benfeitorias voluptuárias, entretanto,

jamais serão indenizadas, se realizadas após a declaração de desapropriação.

(GASPARINI, 1995, p.451).

Calha o ensinamento de Mello (1999, p.379):

Como a simples declaração de utilidade pública não tem o

condão de transferir a propriedade do futuro expropriado ao

Estado, o proprietário do bem pode usar gozar e dispor dele. Em

razão disto, a Administração não pode negar alvará de licença

para edificação no imóvel, desde que o postulante preencha os

pressupostos legais de sua expedição. Entretanto, a

Administração não será obrigada a indenizar o valor da

edificação realizada no imóvel depois da declaração de utilidade

pública. (MELLO, 1999, p.379).

É o que dispõe a Súmula 23 do STF, vazada nos seguintes

termos: verificados os pressupostos legais para o licenciamento

da obra, não o impede a declaração de utilidade pública para

desapropriação do imóvel, mas o valor da obra não se incluirá na

indenização, quando a desapropriação dor efetivada.

Deste modo, o ato declaratório de utilidade pública ou de interesse social

gera efeitos, já que o Pode Público desapropria o bem identificado, como, tem

o direito de penetrar no imóvel declarado para medição, inspeção e outras

averiguações.

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2.5.2 FASE EXECUTÓRIA

A fase executória se dá após ser editado o ato declaratório de utilidade

pública, pode ser administrativa ou judicial. A fase executória tem por finalidade

a adoção das medias necessárias para a desapropriação.

Complementa Di Pietro (2002) que:

Compreende os atos pelos qual o poder público promove a

desapropriação, ou seja, adora as medias necessárias à

efetivação da desapropriação, pela integração do bem no

patrimônio público. (DI PIETRO, 2002, p.137)

Esse procedimento pode ocorrer de duas formas; por via extrajudicial ou

por via judicial.

Por via extrajudicial, sucede quando o expropriante e o expropriado

chegam a um acordo sobre o valor indenizatório da desapropriação, basta que

esse acordo seja reduzido a termo para que efetive a transferência do bem

expropriado; se for imóvel exige-se a escritura no registro imobiliário

competente. Aperfeiçoa-se então, a desapropriação amigavelmente.

(MEDAUAR, 2006, p.357).

Há casos em que essa fase inexistente acontece quando o Pode Público

desconhece que é o proprietário, hipótese em que deverá propor Ação de

Desapropriação, o que independe de saber quem é o proprietário do imóvel a

ser expropriado. (DI PIETRO, 2002, p.137)

Não havendo acordo, ou seja, quando o particular opuser-se às

conclusões pelo ente expropriante, a desapropriação seque o rito judicial

previsto no Decreto-Lei n.° 3.365/41, sobre desapropriação, o qual admite, no

que dor omisso, a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, sendo

iniciada pelo Poder Público. (MEDAUAR, 2006, p.357).

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Conforme propugnado por Medauar (2006):

Se o proprietário recusar o preço ou se for inevitável o acordo

administrativo, o expropriante ingressa com a ação

expropriatória. Poderá ocorrer acordo em juízo, se o proprietário,

na contestação ou quem outra fase, aceitar o preço ofertado na

inicial, caso em que o juiz procederá à homologação por

sentença. (Decreto-lei nº. 3.365 /41, art. 22). (MEDAUAR,

2006, p.357)

A competência para julgar e processar a Ação de Desapropriação,

quando o sujeito passivo for a União, é da Justiça Federal, devendo ser

proposta no foro da jurisdição cujo imóvel esteja situado, em virtude de sua

situação. Quando iniciada por outra pessoa, a competência será da justiça

comum, devendo ser proposta no foro da situação do bem. (FARIA, 2004,

p.399).

Iniciada a Ação de Desapropriação, a petição inicial deve ser composta

pelos requisitos do art. 282, do Código de Processo Civil e do Decreto-Lei n.°

3.365/41, este elenca os seguintes: a oferta do preço; um exemplar (original ou

fotocópia autenticada) do contrato ou jornal onde foi publicado o decreto de

desapropriação, e; a planta, a descrição dos bens e suas confrontações. Tais

documentos são alcançados por esse dispositivo legal à categoria de

indispensáveis à propositura da ação. Deve constar ainda na petição inicial, a

alegação de urgência e o pedido de imissão provisória na posse do bem objeto

da desapropriação. (RODRIGUES, 1987, p.178).

Para a imissão provisória na posse deve-se alegar urgência, a qual

poderá estar contemplada no decreto de desapropriação ou não, sendo assim,

mesmo que já tenha iniciado o processo judicial expropriatório, o poder

expropriante poderá decretar sua urgência em expropriar, nestes termos, o

depósito do valor indenizatório deverá ser feito em juízo, para que o juiz possa

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conceder provisoriamente a posse do bem objeto da desapropriação seguindo

os requisitos do artigo 5º, do Decreto-Lei 3.365/41. (FARIA, 2004, p.399).

Meirelles (2002) destaca que:

A fixação da importância do depósito a ser feito em juízo, para

obter-se a imissão provisória na posse, não fica ao alvedrio o

expropriante, nem do juiz, nem do expropriado. Obedece a

ordem estabelecida pelo § 1° do art. 15 da Lei Geral das

Desapropriações. Que é impositiva para todos. (MEIRELLES,

2002, p 516).

Uma vez realizado o depósito provisório, o expropriado poderá levantar

80% (oitenta por cento) do depósito feito para a desapropriação, mediante

prova da propriedade e quitação das dividias fiscais que recaiam sobre o bem

expropriado, observando-se os requisitos do artigo 34, do Decreto-Lei n°.

3.365/41, (DI PIETRO, 2002, p.149). O qual prescreve que:

Art.34. O levantamento do preço será deferido mediante prova

de propriedade, de quitação de divididas fiscais que recaiam

sobre o bem expropriado, e publicação de editais, como prazo

de 10 dias, para conhecimento de terceiros.

Parágrafo único. Se o juiz verificar que há dúvida fundada sobre

o domínio, o preço ficará em depósito, ressalvada aos

interessados a ação própria para disputá-lo.

Haja vista que a transferência do domínio só ocorre com o pagamento

do valor total fixado, esse depósito realizado previamente, apenas permite ao

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expropriante o ingresso no imóvel. Uma vez declarada à imissão provisória da

posse, transfere-se o pagamento do tributo predial e territorial ao ente que

efetivamente exerça a posse sobre o bem. (VELLOSO, 2000, p.31).

Comunga desta opinião Meirelles (2002, p.517):

A imissão definitiva na posse, em qualquer hipótese, só de dará

após o integral pagamento do preço, conforme o fixado no

acordo ou na decisão judicial final, que adjudicará o bem ao

expropriante, transferindo-lhe o domínio como todos os seus

consectários. Mas é de observa-se, que desde a imissão

provisória na posse o expropriante aufere todas as vantagens do

bem, e cessar também todos os encargos correspondentes,

notadamente os tributos reais. (MEIRELLES, 2002, p.517).

Deste modo é assegurado o contraditório ao expropriado para o fim de

impugnação do valor do depósito. Se o valor não estiver atualizado, compete

ao juiz da causa fixá-lo independente da avaliação, levando em consideração o

tempo transcorrido da ultima atualização e a variação monetária no período.

Dentro do que foi enunciado até então, pode-se afirmar que o legislador no

desempenho de suas funções, sempre se preocupou em fixar limites às

condutas individuais, com direcionamento à proteção societária.

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CAPÍTULO III

3 - O ESTATUTO DA CIDADE

A Lei 10.257/2001, também conhecido como Estatuto da Cidade,

tramitou pelo Congresso Nacional por 11 anos, e após diversas modificações,

foi finalmente aprovada em 2001. Em que pese o aspecto negativo da demora

na sua tramitação, o Estatuto foi extremamente enriquecido com os debates

ocorridos no processo legislativo. Para Osório (2002) os movimentos populares

radicados com o objetivo de alcançar a reforma urbana e os trabalhos técnicos

criados com o fim de embasar o conteúdo do Estatuto foram essenciais para a

formação do que temos hoje em matéria urbanístico.

Já Pinto (2005), destaca que o Estatuto da Cidade é a primeira lei

federal destinada a regulamentar o Capítulo da Política Urbana previsto nos

artigos 182 e 183 da Constituição Federal e seu principal objetivo é delinear as

diretrizes gerais para o crescimento e ordenamento urbano, estabelecendo um

paralelo entre desenvolvimento urbano e o equilíbrio ambiental, tudo isso em

consonância com as previsões dos planos diretores de cada Município. Para

tanto, trouxe diversas inovações, precipuamente, no que diz respeito a

mecanismos de controle do meio urbano com vistas ao atendimento da função

social da cidade. No artigo 2ª do Estatuto percebe-se com muita clareza a

importância fundamental que o legislador deu à questão do desenvolvimento

da função social da cidade.

A função social da cidade será exercida quando as ações e medidas

estabelecidas no Plano Diretor forem destinadas a garantir o exercício do

direito às cidades sustentáveis previsto no inciso I do artigo 2º do Estatuto.

Dentro desse contexto, o atendimento aos direitos à moradia, ao saneamento

básico, ao meio-ambiente ecologicamente equilibrado, ao transporte, aos

serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações,

expressa o significado da função social da cidade. (SAULE JÚNIOR, 2007, p.

81).

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Ainda, segundo Saule Junior, (2007), a política de desenvolvimento

urbano se não tiver como prioridade atender às necessidades básicas das

populações marginalizadas e excluídas das cidades, ela estará em conflito com

as normas constitucionais norteadoras da política urbana. Portanto, dar

cumprimento à função social da cidade é mediar à intensa litigiosidade dos

conflitos urbanos, por exemplo, tem-se que conciliar a necessidade premente

de utilização da água, com a preservação de bacias e mananciais, ou ainda, a

necessidade de implantação de usinas, com o estudo de impacto ambiental.

Para Mukai, (2004), os pontos mais importantes do Estatuto da Cidade,

referem-se à efetiva concretização do Plano Diretor nos Municípios com mais

de 20 mil habitantes, afixação de diretrizes gerais para que o Município execute

sua política de desenvolvimento urbano; a fixação de sanções para os Prefeitos

e Agentes Públicos que não tomarem as providências de sua competência; a

instituição da gestão democrática da cidade; a regulamentação dos institutos

do parcelamento e edificações compulsórios, IPTU progressivo no tempo e

desapropriação com pagamento em títulos e, por fim, as alterações na Lei de

Ação Civil Pública, possibilitando ao Judiciário tornar concretas as obrigações

de ordem urbanísticas determinadas no Estatuto, inclusive no tocante à

elaboração e aprovação do Plano Diretor.

Ressalte-se que não há qualquer vedação expressa para o

desenvolvimento dos Municípios em razão da função social da cidade, somente

tenta-se alcançar alternativas de crescimento urbano que não degradem o

meio-ambiente e nem sejam nocivas ao bem-estar social. O Estatuto da Cidade

conduz a uma série de reflexões sobre temas em áreas diversas (ambiental,

social, econômica e política), interligando-os entre si, buscando, dessa forma

um novo modelo de desenvolvimento econômico e social que seja

verdadeiramente sustentável.

O Estatuto da Cidade é formado por cinco capítulos, os quais estão

dispostos nessa ordem: I – Diretrizes Gerais; II – Dos instrumentos de Política

Urbana, com as Seções I a XII; III - Do Plano Diretor; IV – Da Gestão

Democrática da Cidade e V - Disposições Gerais.

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3.1 - Diretrizes gerais

De acordo com Gasparini (2002), as diretrizes gerais de política urbana

estabelecem o direito à cidade sustentável; à cooperação entre os diversos

entes governamentais, na esfera federal, estadual e municipal; à oferta de

transportes e serviços públicos adequados aos interesses da população local; à

ordenação e controle do uso do solo; à justa distribuição dos benefícios e ônus

decorrente do processo de urbanização, à participação popular e de

associações representativas dos vários segmentos da comunidade na

formulação de planejamentos públicos, dentre outros.

Para Mukai (2004), essas diretrizes têm o objetivo de propiciar um meio-

ambiente equilibrado nas cidades, observando o bem-estar social das

presentes e futuras gerações, a saúde, a democracia, dentre outros direitos e

interesses da comunidade envolvida, tendo como foco a ordenação do

crescimento urbano.

As diretrizes gerais necessárias à realização da política urbana de

desenvolvimento da função social da cidade e da propriedade, estão arroladas

no artigo 2º do Estatuto da Cidade, conforme se vê a seguir:

Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno

desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade

urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: (...) VI –

ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar: a) a

utilização inadequada dos imóveis urbanos; b) a proximidade de

usos incompatíveis ou inconvenientes; c) o parcelamento do

solo, a edificação ou o uso excessivo ou inadequado em relação

à infra-estrutura urbana; d) a instalação de empreendimentos ou

atividades que possam funcionar como pólos geradores de

tráfego, sem a previsão da infra-estrutura correspondente; e) a

retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua

subutilização ou não utilização; f) a deterioração das áreas

urbanizadas; g) a poluição e a degradação ambiental;

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Macruz (2002) destaca que a fixação de diretrizes isoladamente não

basta para o estabelecimento de uma política urbana. É necessário que tais

delineamentos gerais estejam presentes na elaboração dos Planos Diretores

dos Municípios, a fim de que seja garantida a implementação dessa política, a

qual tem como maior objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções

sociais da cidade e da propriedade urbana. Atendidas tais diretrizes na

elaboração do Plano Diretor dos Municípios, certamente a função social da

propriedade e da cidade será alcançada.

Um ponto das diretrizes gerais que é alvo de elogios da mais abalizada

doutrina diz respeito à preocupação com a preservação ambiental nos centros

urbanos, vez que o Estatuto, em que pese não tenha reservado capítulo próprio

para o Estudo de Impacto Ambiental, tal qual fez com o Estudo de Impacto de

Vizinhança, dele se encarregou esparsamente ao longo de seu texto, conforme

se observa logo em seus primeiros artigos. Ademais, o Estatuto apresenta

normas gerais em matéria ambiental de observância obrigatória para os

Estados e Municípios, constituindo importante instrumento de proteção

ambiental. (MUKAI, 2004, p.186).

3.2 - Instrumentos de política urbana

Os instrumentos de política urbana estão previstos no artigo 4º do

Estatuto da Cidade. É possível observar abaixo que eles estão apontados

apenas de forma exemplificativa, sendo admitida à criação de outros

instrumentos com vistas à administração do meio urbano.

Art. 4o Para os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros

instrumentos: I – planos nacionais, regionais e estaduais de

ordenação do território e de desenvolvimento econômico e

social; II – planejamento das regiões metropolitanas,

aglomerações urbanas e microrregiões; – planejamento

municipal, em especial: a) plano diretor; b) disciplina do

parcelamento, do uso e da ocupação do solo; c) zoneamento

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ambiental; d) plano plurianual; e) diretrizes orçamentárias e

orçamento anual; f) gestão orçamentária participativa; g) planos,

programas e projetos setoriais; h) planos de desenvolvimento

econômico e social; IV – institutos tributários e financeiros: a)

imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU;

b) contribuição de melhoria; c) incentivos e benefícios fiscais e

financeiros; V – institutos jurídicos e políticos: a) desapropriação;

b) servidão administrativa; c) limitações administrativas; d)

tombamento de imóveis ou de mobiliário urbano; e) instituição de

unidades de conservação; f) instituição de zonas especiais de

interesse social; g) concessão de direito real de uso; h)

concessão de uso especial para fins de moradia; i)

parcelamento, edificação ou utilização compulsórios; j)

usucapião especial de imóvel urbano; l) direito de superfície; m)

direito de preempção; n) outorga onerosa do direito de construir

e de alteração de uso; o) transferência do direito de construir; p)

operações urbanas consorciadas; q) regularização fundiária; r)

assistência técnica e jurídica gratuita para as comunidades e

grupos sociais menos favorecidos; s) referendo popular e

plebiscito; VI – estudo prévio de impacto ambiental (EIA) e

estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV). § 1o Os

instrumentos mencionados neste artigo regem-se pela legislação

que lhes é própria, observado o disposto nesta Lei. § 2o Nos

casos de programas e projetos habitacionais de interesse social,

desenvolvidos por órgãos ou entidades da Administração Pública

com atuação específica nessa área, a concessão de direito real

de uso de imóveis públicos poderá ser contratada coletivamente.

§ 3o Os instrumentos previstos neste artigo que demandam

dispêndio de recursos por parte do Poder Público municipal

devem ser objeto de controle social, garantida a participação de

comunidades, movimentos e entidades da sociedade civil.

Os instrumentos previstos nos incisos I e II do artigo 4º são de maior

amplitude, abrangendo planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação

do território e de desenvolvimento econômico. No inciso III é explicitado o

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planejamento municipal, destacando-se como importantes mecanismos o plano

diretor, o zoneamento ambiental, as leis orçamentárias, dentre outros. Os

institutos tributários vêm arrolados no inciso IV e no inciso V estão indicados os

institutos jurídicos e políticos utilizados para adequar a propriedade urbana à

sua função social. Finalmente, no inciso VI estão destacados os instrumentos

de proteção ambiental e de vizinhança.

Nas palavras de Gasparini (2002, p. 16), os instrumentos previstos no

Estatuto da Cidade são “todos os meios capazes, conjuntas ou

individualmente, de propiciar a execução da política urbana”.

Para Garcia (2005), os instrumentos denominados parcelamento,

edificação ou utilização compulsória, IPTU progressivo no tempo e

desapropriação com pagamento em títulos, deverão ser utilizados

sucessivamente, sempre que uma propriedade privada estiver desatendendo à

sua função social, nos termos do Estatuto.

Ainda, segundo o autor, o mecanismo parcelamento, edificação ou

utilização compulsória, com respaldo no Plano Diretor, dará ao Município a

tarefa de fiscalizar se os proprietários estão observando as regras

estabelecidas no Plano, bem como se atendem à função social da cidade e da

propriedade. Desse modo, a partir do momento em que o cidadão é notificado

acerca do descumprimento de alguma regra urbanística, ele terá um prazo, que

será prescrito no Plano, para cumprir a obrigação urbanística (edificar, parcelar

ou utilizar), sob as penas da lei.

Deve-se ressaltar que todos os atos relativos ao procedimento ora

apontados devem ser levados a registro e independem, até mesmo, da

mudança do proprietário. Isto significa dizer que a função social da cidade e da

propriedade está acima de qualquer outra questão. Sette e Nogueira (2006)

destacam que:

A finalidade do Poder Público municipal na utilização do IPTU

progressivo no tempo não é a arrecadação fiscal, mas sim a de

induzir o proprietário do imóvel urbano a cumprir com a

obrigação estabelecida no plano urbanístico local, de parcelar ou

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edificar, ou seja, de utilizar a propriedade urbana de forma a

atender sua função social – mudar o comportamento. . Neste

caso, a parte da progressividade visa a melhorar a destinação da

propriedade de forma a proporcionar bem-estar e incentivar o

atendimento aos direitos metaindividuais. (SETTE e NOGUEIRA,

2006, p. 19).

O instrumento ora em comento objetiva levar os indivíduos a um

comportamento social adequado ao Plano Diretor da cidade, bem como aos

princípios inseridos em nossa Carta Magna. Segundo o art. 7º do Estatuto, o

Município procederá à aplicação do IPTU mediante a majoração da alíquota

pelo prazo de cinco anos consecutivos. Ao final desse prazo, o Município

poderá utilizar-se da desapropriação urbanística sancionatória.

Com as colocações acima, tem-se que o IPTU progressivo no tempo,

tem como objetivo principal o cumprimento da função social da cidade,

atentando-se que a sistemática legal nacional aponta de forma expressiva a

necessidade de atender aos interesses sociais comuns.

Para Sette e Nogueira (2006), tal instrumento traz em seu bojo algumas

vantagens, é flexível e tem mais permanência do que a regulamentação e

fiscalização, além do que, se receber o tratamento recomendado aos tributos

ambientais em geral, que é a vinculação das receitas, terá a garantia de mais

confiabilidade, transparência e legitimidade, além de poder realizar mais

melhorias, efetivando outros instrumentos que o próprio Estatuto dispõe, como,

por exemplo, o exercício do direito de preempção.

O terceiro instrumento de política urbana a ser estudado é a

desapropriação urbanística sancionatória, que nada mais é do que um

mecanismo que o Poder Público possui para sancionar o proprietário do imóvel

que não atende à destinação da função social da propriedade.

Observa-se, que uma vez procedida à desapropriação, o Município terá

um prazo de cinco anos, após a incorporação da propriedade ao seu

patrimônio, para adequar o aproveitamento do imóvel à função social prevista

no Plano Diretor.

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Outro instrumento é o usucapião especial, o qual se constitui em mais

um mecanismo de política urbana previsto no Estatuto e na Constituição

Federal. Trata-se de usucapião prómoradia, prevista no art. 183 da CF, que é

auto-aplicável por estarem enumerados todos os requisitos necessários à

aquisição do domínio, quais sejam: a) ser possuidor de uma área urbana de até

250m, durante cinco anos, ininterruptamente e sem oposição; b) o possuidor

deverá utilizá-la para a sua moradia ou de sua família; c) o possuidor não

poderá ser proprietário de outro imóvel, urbano ou rural. (HARADA, 2005, p.

60).

Depreende-se deste conceito a idéia de que a função social da cidade é

o ponto primordial a ser observado pela sociedade e pelo governo. O prazo

curto de 5 anos para usucapir é sobremaneira indicador da importância do

interesse público em que se baseia a função social. Desse modo, é notável que

todos os instrumentos previstos no Estatuto são voltados para um objetivo

comum, qual seja, o alcance de um meio ambiente equilibrado e saudável. Por

fim, enquanto a via da desapropriação é de titularidade do ente estatal, a via do

usucapião é do particular, nos termos da lei.

Um polêmico instrumento previsto no Estatuto da Cidade é o usucapião

especial coletivo de imóveis urbanos, o qual prevê a ocupação de múltiplas

moradias informais que configurem uma comunidade aglomerada numa área

urbana superior a duzentos e cinqüenta metros quadrados. Na opinião de

alguns autores, tal instrumento pode servir para legalizar áreas invadidas,

fomentando a indústria das invasões, vez que o ritual de entrada em terras

alheias (muitas vezes públicas) é prática comum em grandes cidades e se

constitui no primeiro passo para a favelização nos grandes centros urbanos.

(TAVARES, 2006, p. 1524)

A concessão de uso especial, próximo instrumento a ser analisado, teve

os seus artigos vetados na Lei n 10.257/2001, razão pela qual a matéria

passou a ser regulada pela Medida Provisória n 2.220 de 04.09.2001. Tal

mecanismo consiste na concessão pela Administração de direito real de uso

gratuito para fins de moradia de imóvel, atendidos os critérios estabelecidos em

lei. Deverá ser efetuado o registro público e é um ato precário, que pode ser

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revogado a qualquer tempo pela Administração, não gerando para o

proprietário direito à indenização. Aqui no Distrito Federal o uso deste

instrumento é muito comum.

O direito de superfície é o instrumento que tem por objetivo facilitar a

utilização do terreno não edificado, subutilizado ou não utilizado. Não prejudica

o proprietário, que poderá retomar a coisa com os acréscimos, sem

necessidade de ressarcimento, quando extinto o direito de superfície.

Segundo Garcia (2005), outro instrumento importante previsto no

Estatuto da Cidade é o direito de preempção, o qual representa a preferência

do Município na aquisição de bem de interesse público, sendo necessária a

sua previsão no Plano Diretor Municipal, bem como que neste esteja previsto o

elenco da área com a possibilidade de preempção. Será exercido sempre que

o Município necessitar de áreas urbanas para:

a) regularização fundiária;

b) execução de programas e projetos habitacionais de interesse social;

c) constituição de reserva fundiária;

d) ordenamento e direcionamento da expansão urbana;

e) implantação de equipamentos urbanos e comunitários;

f) criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes;

g) criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas de

interesse ambiental;

h) proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico.

No entanto, os seguintes requisitos devem ser cumpridos:

a) existir plano diretor que institua e discipline substancialmente a

prelação;

b) lei municipal baseada no plano diretor delimitando a área de

incidência da preempção e indicando as finalidades arroladas no art. 26;

c) incidir sobre propriedade imobiliária urbana; d) ser propriedade urbana

objeto de alienação onerosa entre particulares.

O solo criado ou outorga onerosa do direito de construir é um novo

instrumento da política urbana instituído pelo Estatuto da Cidade (art. 4º, V,

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“n”). As normas que regulam o instituto geram uma espécie de solo criado, ou

seja, um espaço edificável acima do coeficiente de aproveitamento.

A norma fixará um coeficiente único de aproveitamento para construir,

entretanto, o Município pode vender ao proprietário um acréscimo neste

coeficiente para construção. Além da fixação desse coeficiente único, o Plano

Diretor deverá prever a área ou zona onde será permitida a construção acima

deste índice. É interessante ressaltar que os recursos auferidos serão

empregados nos termos das finalidades previstas no artigo 26 do Estatuto.

Igualmente, o mecanismo denominado operações urbanas consorciadas

deve estar previsto no Plano Diretor e será regido por lei municipal que

observará os termos daquele. Segundo a lição de Harada (2005, p. 77), este

instituto é: “o conjunto de intervenções urbanas com a participação de

proprietários, moradores, usuários e investidores privados, sob coordenação do

Poder Público municipal, para transformações urbanísticas estruturais, que

possam trazer melhorias sociais e valorização ambiental”.

Mais uma vez evidencia-se a necessidade do compromisso de todos os

setores da sociedade para o alcance do bem-estar social. O mecanismo das

operações consorciadas demonstra que o Estado deve promover o máximo de

ações voltadas para a melhoria do meio urbano. Assim, deve a Administração

contar com a participação dos interessados que serão beneficiados

diretamente, bem como de todos que tenham algum interesse, até mesmo

privado, que se coadune com o interesse público. Este instrumento deixa clara

a responsabilidade de toda a sociedade na consecução do objetivo de alcançar

o bem comum.

O instrumento da transferência do direito de construir também deve estar

previsto no Plano Diretor e necessita ser autorizado por lei municipal. Com este

mecanismo, o proprietário de um imóvel poder transferir a outrem o seu direito

de construir em um imóvel para outro imóvel que seja localizado em local

diverso, conforme a previsão do Plano, diferindo, assim, do direito de

superfície. Este instituto se perfaz com a escritura pública.

Por fim, apresenta-se o instrumento denominado estudo de impacto de

vizinhança, o qual determina a edição de lei municipal específica para definir os

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empreendimentos e atividades privadas ou públicas, em zona urbana,

dependentes de estudo prévio de impacto de vizinhança – EIV, como condição

para expedição de licenças de construção, ampliação e funcionamento. Isso se

deve ao fato de que determinados empreendimentos ou atividades causam

impacto na ordenação da cidade, perturbando excessivamente o sossego dos

circunvizinhos, por meio de ruídos, congestionamento de trânsito etc.,

comprometendo a qualidade de vida, como decorrência da degradação do

meio ambiente, cuja preservação constitui um dos objetivos da política urbana.

(HARADA, 2005. p. 83)

Segundo Bonizzato (2005), o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV)

tem sido alvo de críticas de diversos setores sociais, podendo ser citado como

exemplo o Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Rio de

Janeiro, que por manifestação de seu presidente Roberto Kauffmann à Gazeta

Mercantil assim deixou consignado: [...] Este tópico representa um avanço. Mas

é preciso cuidar para que o estudo seja isento no sentido de avaliar os efeitos

sobre o tráfego, ruído, abastecimento de água e não se restrinja à simples

consulta se o vizinho aprova ou não o empreendimento.

3.3 - Plano Diretor

Um mecanismo essencial para a condução da política urbana previsto

no Estatuto da Cidade é o Plano Diretor, o qual possibilita que os Municípios

assumam a responsabilidade direta de atender às necessidades de seus

habitantes, visando o bem-estar social, conforme as prescrições previstas nos

artigos 39 a 42 do Estatuto da Cidade.

Esta determinação legal de responsabilidade do Município se dá porque

é nele que se estabelecem todas as relações sociais. Isto significa que a má

prestação de serviços essenciais, tais como coleta de lixo, o fornecimento de

água potável e o saneamento básico, acompanhados de um crescimento

desordenado das grandes cidades, acabam por desencadear vários distúrbios

para a comunidade. Surgindo estas dificuldades no Município, ele mesmo

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deverá adotar as medidas necessárias para restabelecer o objetivo traçado no

Plano Diretor, qual seja, o bem-estar social.

Conforme o artigo 40 da Lei 10.257/2001, o Plano Diretor será criado por

lei Municipal, sendo obrigatório para as cidades com população superior a

20.000 habitantes, muito embora algumas Constituições Estaduais, como a

paulista, tenham estendido tal obrigatoriedade a todos os Municípios.

É importante frisar que também haverá a obrigatoriedade do Plano

Diretor para as cidades pertencentes a regiões metropolitanas e aglomerações

urbanas; localizadas em áreas de especial interesse turístico; e também para

as situadas em área de influência de empreendimentos ou atividades com

significativo impacto ambiental, nos termos do artigo 41 da Lei 10.257/ 2001.

O Plano Diretor estabelecerá o controle do uso, ocupação, parcelamento

e expansão do solo urbano do Município, podendo, ainda, abranger temas e

diretrizes sobre habitação, saneamento, sistema viário e transportes urbanos.

Nos termos do artigo 42 da Lei 10.257/ 2001, o Plano Diretor deverá

conter, no mínimo, os seguintes elementos:

a) Delimitação das áreas urbanas onde poderão ser aplicados o

parcelamento, a edificação ou a utilização compulsória, previstos no Artigo 183

da Constituição Federal, considerando, no entanto, a existência de infra-

estrutura e de demanda para a utilização.

b) A delimitação das áreas urbanas passíveis de incidência do Direito de

Preempção (direito que confere ao Poder Público municipal a preferência para

aquisição de imóveis urbanos);

c) O estabelecimento das diretrizes para a delimitação das áreas

urbanas nas quais a Outorga Onerosa do Direito de Construir poderá ser

implementada;

d) O estabelecimento das diretrizes para a delimitação das áreas

urbanas passíveis da aplicação de operações urbanas consorciadas;

e) Definição das diretrizes para a autorização da transferência do direito

e construir por proprietários de imóveis urbanos.

f) Sistema de acompanhamento e controle da execução do plano.

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No tocante ao procedimento para sua elaboração, o Estatuto da Cidade

determina que o Plano Diretor deverá englobar o território municipal como um

todo, ou seja, considerar zonas urbana e rural, bem como ser revisto, pelo

menos, a cada dez anos; e ainda contar com a participação da sociedade na

sua elaboração e implementação, por intermédio de audiências públicas,

debates, publicidade e acesso aos documentos produzidos.

Dúvidas surgem acerca da elaboração do Plano Diretor do Distrito

Federal, vez que a realidade desta unidade federativa é completamente distinta

da de qualquer outra da Federação Brasileira, sendo que, conforme o

pensamento de alguns autores, o Distrito Federal não se enquadra nem no

perfil de Estado, nem no perfil de Município. (ARAÚJO e JÚNIOR, 1998, p.

201).

Em que pese à divergência doutrinária acerca da abrangência da

competência legislativa do Distrito Federal em matéria urbanística, o artigo 32,

Parágrafo 1º, da Constituição Federal, é claro ao determinar que este ente

detem competências legislativas reservadas aos Estados e Municípios, ou seja,

possui competência cumulativa, vez que as funções legislativas e

administrativas reservadas para os Estados e Municípios são exercidas

cumulativamente pelo Distrito Federal.

Além disso, é oportuno lembrar que o artigo 24, inciso I, da Constituição

Federal, conferiu competência concorrente à União, aos Estados e ao Distrito

Federal para legislar sobre direito urbanístico. Por outro lado, ao Município

também foram atribuídas competências em matéria urbanística, especialmente

em questões de interesse local, conforme se verifica nos artigos 30, incisos IV,

VIII e IX e 182 da Constituição Federal. (FILHO, 2006, p. 331).

Para espancar qualquer dúvida acerca da competência legislativa do

Distrito Federal em matéria urbanística, basta atentar para o artigo 51 do

Estatuto da Cidade, o qual determina que aplicam-se ao Distrito Federal e ao

Governador do Distrito Federal as disposições relativas, respectivamente, a

Município e a Prefeito. Verifica-se, assim, que o Estatuto equiparou o Distrito

Federal ao Município. Desta maneira, os poderes, deveres, ônus e obrigações

enunciados nesta Lei não incidem somente sobre os Municípios e seus

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Prefeitos, mas também sobre o Distrito Federal e seu Governador. Não

obstante, tal equiparação não provoca qualquer efeito no que diz respeito à

competência suplementar do Distrito Federal, para legislar sobre direito

urbanístico, nos termos do artigo 24, Parágrafo 2º, da Constituição Federal.

Apesar de o Estatuto da Cidade exigir a aprovação de um Plano Diretor

para os Municípios que possuem mais de 20.000 habitantes, é possível

identificar que nem todos os Municípios brasileiros possuem esse mecanismo.

De acordo com dados disponibilizados na página eletrônica do Ministério das

Cidades (2007), dos 1.682 municípios que precisam implantar planos diretores,

apenas 478 já aprovaram os seus, sendo que os Municípios localizados nas

regiões menos favorecidas econômica e socialmente estão tendo maior

dificuldade na elaboração de seus planos diretores.

Além disso, o Ministério das Cidades (2007) detectou que alguns

Municípios simplesmente copiam algumas partes dos planos diretores de

outros Municípios. Nesses casos, os Municípios têm recebido ações para

anularem seus planos diretores e gradativamente o Ministério Público tem

visitado cada cidade para cobrar a implementação das diretrizes previstas no

Estatuto da Cidade.

Em que pese à reconhecida importância do Plano Diretor no

desenvolvimento dos Municípios, algumas críticas são dirigidas a este

instrumento. Na opinião de Flávio Vilhaça (2005), há um abismo que separa o

discurso do Plano Diretor e dos Planos Regionais da prática da administração

municipal e da desigualdade que caracteriza nossa realidade política e

econômica. Para o autor, o que chama a atenção no Plano Diretor é o fato dele

conseguir, com incrível facilidade, a adesão de significativas lideranças sociais

que representam interesses de uma pequena minoria da população e a uma

minúscula parcela da cidade. O autor sugere uma revisão do planejamento

urbano no Brasil, a fim de que o conteúdo e métodos do Plano Diretor sejam

redefinidos tendo por fundamento o interesse da maioria.

De acordo com Bonizzato (2005), o Plano Diretor confere aos prefeitos

uma série de possibilidades de intervir na propriedade privada, o que, em certa

medida, pode configurar um convite à corrupção. O autor recomenda uma

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revisão do Plano Diretor, para que sejam limitados os poderes de ingerência na

propriedade privada concedidos aos prefeitos.

3.4 - Gestão Democrática

A gestão democrática da cidade é um instrumento amplamente

defendido pela Declaração Universal dos Diretos do Homem, a qual considera

a participação política um direito fundamental de todas as pessoas, bem como

pela Conferência das Nações Unidas, que previu o processo de

institucionalização da participação social na gestão como fator fundamental na

construção da democracia e do desenvolvimento sustentável. (MATTOS, 2002,

p. 295).

Para Bonizzato (2005), a gestão democrática da cidade nasce da

verificação de que a representação política parlamentar, embora legítima e

indispensável nas democracias modernas, não é capaz de exprimir com

completa fidelidade a vontade popular na multiplicidade de suas manifestações.

Tal assertiva é comprovada tanto pela crescente insatisfação popular

diante da eficácia da representação tradicional quanto pela consolidação de

vários institutos de democracia semidireta, em sociedades contemporâneas, os

quais funcionam como corretivos à democracia representativa.

Portanto, tal mecanismo de participação popular permite que a

população interessada participe efetiva e ativamente nas decisões que digam

respeito ao emprego do dinheiro público. É inegável que a participação popular

acarreta um maior controle dos gastos públicos, bem como um melhor

direcionamento aos recursos que serão investidos em política urbana. Além

disto, a transparência na gestão da coisa pública fica latente, vez que o

acompanhamento da dinâmica governamental se dá de maneira direta pela

comunidade.

Não são raros os elogios a todas as novidades inseridas no Estatuto,

especialmente no que toca à faculdade conferida ao cidadão de participar de

forma eficaz e eficiente da formação e composição do espaço em que vive.

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Uma cidadania participativa é fator essencial para o avanço das relações

democráticas no país, além de ser peça fundamental para um melhor

desenvolvimento urbano. Há vários dispositivos prevendo a participação direta

da sociedade na resolução de questões relativas ao ordenamento urbano,

especialmente os artigos 43 a 45 do Estatuto. (BONIZZATO, 2005, p. 157-166)

A opinião assumida por Raquel Rolnik (2002, p. 02) é no sentido de que

os Planos Diretores devem contar com a participação da população não

apenas durante o processo de elaboração e votação, mas também na

implementação e gestão do Plano, vez que este se constitui um espaço de

debates e negociações entre o governo e o povo acerca de estratégias de

intervenção no território do Município. O Desafio lançado pelo Estatuto é a

participação efetiva da população interessada nos processos decisórios sobre

a intervenção sobre o território.

Entretanto, Mattos (2002,) enfatiza que na prática, é que não tem havido

uma intensa participação popular no processo de construção da democracia

brasileira. Exemplos disso são a falta de autonomia municipal antes da

Constituição de 1988 e outros fatores conjunturais que caracterizam a tradição

republicana brasileira, passando pela maneira peculiar pela qual foi instalada a

República no Brasil até uma análise de exemplos mais recentes, como os

quase trinta anos de regime ditatorial pelo qual passou o país. Sobre o papel

do Estatuto da Cidade nesse contexto histórico, segue transcrição abaixo.

O Estatuto da Cidade aceita este desafio, acreditando na

democratização das cidades e convida a todos para construírem juntos, uma

nova ordem urbana, mais justa e sustentável, que seja expressão do desejo

dos que fazem das cidades o tear em que se tece o fio de suas vidas.

(MATTOS, 2002, p. 303).

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CONCLUSÃO

Apresentou-se, como intuito primordial desta pesquisa acadêmica,

analisar a desapropriação como forma de intervenção na propriedade privada e

o estatuto da cidade.

No decorrer do estudo, evidenciou-se a propriedade como uma

garantia constitucional, absoluta, exclusiva, perpétua, que em face da sua

plenitude, confere ao titular do domínio uma gama de faculdades.

Todavia, o manto da inviolabilidade que a envolve pode ser rompido,

quando inapropriada a sua destinação ou, ainda, nas circunstâncias de

necessidade, utilidade pública e interesse social, visto que na ordem jurídica

atual ela deve servir como meio conciliador dos interesses particulares e

coletivos.

Neste passo, a Administração Pública, alicerçada no princípio da

supremacia do interesse público sobre o individual, detém a prerrogativa de,

mediante um procedimento administrativo e judicial, apropriar-se de patrimônio

privado, para atender o bem comum.

Para materializar e legitimar o ato expropriatório, o Ente Público deverá

aliar a preponderância do interesse coletivo sobre o privado aos outros

preceitos que guiam à atividade administrativa. E, é claro, respeitar o limite de

vinculação e discricionariedade de seu poder.

Quanto ao estatuto da cidade, o estudo levou em conta, o atual estágio

de urbanização brasileiro, que vem sendo objeto de estudo de diversas áreas

do conhecimento. Há uma crescente preocupação dos Entes Federados e da

sociedade no sentido de produzir mecanismos capazes de conferir ao meio

urbano um crescimento ordenado de seu território, propiciando, assim

melhores condições de vida nas cidades. Esse é também o principal desafio da

política urbana nacional e mundial. Dentro desse contexto, a legislação

brasileira tem dispensado tratamento privilegiado aos centros urbanos. Com o

advento da Constituição Federal de 1988, Poder Público passou a exigir que a

propriedade privada atendesse à função social, propiciando, assim, a

construção de cidades realmente sustentáveis, onde o Estatuto da Cidade foi

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editado com o objetivo de regulamentar o capítulo de política urbana previsto

na Constituição Federal.

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