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cadernos ideias Alejandro Rosillo Martínez ano 12 · nº 215 · vol. 12 · 2014 · ISSN 1679-0316 REPENSAR OS DIREITOS HUMANOS NO HORIZONTE DA LIBERTAÇÃO

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cadernos

ideias

A le jandro R osillo M artínez

ano 12 · nº 215 · vol. 12 · 2014 · ISSN 1679-0316

REPENSAR OS DIREITOS

HUMANOSNO HORIZONTE DA

LIBERTAÇÃO

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Repensar os Direitos Humanos no Horizonte da Libertação

Rethinking Human Rights from the Horizon of Liberation

Alejandro Rosillo MartínezUASLP

Resumo

A fundamentação de direitos humanos se tornou um tema clássico no pensamento jurídico, especialmente na relação com a Filosofia do Direito. Não obstante, na maioria dos casos, as reflexões dominantes desconhecem que os direitos humanos têm sua gênese na luta popular, conduzindo a fundamentação a instâncias não históricas e abstratas. É necessário que se realize na filosofia uma fundamentação “desde abajo”, com simbólicas assimétricas, históricas e concretas, que não desconhe-çam a tarefa que têm as lutas de resistência na construção e compres-são de direitos humanos. Sem fundamentação, “direitos humanos” se-riam uma presa fácil da falácia desenvolvimentista e se transformariam em instrumentos ideologizados de opressão. Daqui se desprende outra razão do porquê de fundamentar direitos humanos: construir uma ins-tância crítica que sirva para verificar na realidade como certos “direitos humanos” contribuem ou não com os processos de libertação das pes-soas e dos povos.

Palavras-chave: Direitos Humanos, Filosofia da Libertação, Pen-samento Latino-Americano.

Abstract

The basis of Human Rights has become a classic theme in legal thought, especially in relation to the Philosophy of Law. Nevertheless, in most cases, the dominant reflections are unaware that human rights has its genesis in the popular struggle, leading to the foundation unhistorical and abstract instances. It is necessary to conduct a foundation in philoso-phy “desde abajo”, with asymmetrical symbolics, concrete and historical, that are aware of the task which has resistance struggles in the cons-truction and compression of human rights. Without a foundation, “human rights” would be an easy prey to the developmentalist fallacy and would be ideologically transformed into instruments of oppression. Here is shed another reason why discuss human rights: building a critical stance that serves to verify the reality of certain “human rights” that contribute or not in processes of liberation of individuals and populations.

Keywords: Human Rights, Philosophy of Liberation, Latin Ameri-can Thought.

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Repensar os Direitos Humanos no Horizonte da Libertação

Alejandro Rosillo MartínezUniversidad Autónoma de San Luís de Potosí, México

Tradução de Lucas Machado Fagundes Universidade Federal de Santa Catarina

ano 12 • nº 215 • vol. 12 • 2014 • ISSN 1679-0316

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Cadernos IHU ideias é uma publicação quinzenal impressa e digital do Instituto Humanitas Unisinos – IHU que apresenta artigos produzidos por palestrantes e convidados(as) dos eventos promovidos pelo Instituto, além de artigos inéditos de pesquisadores em diversas universidades e instituições de pesquisa. A diversidade transdisciplinar dos temas, abrangendo as mais diferentes áreas do conhecimento, é a característica essencial desta publicação.

UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS – UNISINOS

Reitor: Marcelo Fernandes de Aquino, SJ

Vice-reitor: José Ivo Follmann, SJ

Instituto Humanitas Unisinos

Diretor: Inácio Neutzling, SJ

Gerente administrativo: Jacinto Schneider

www.ihu.unisinos.br

Cadernos IHU ideiasAno XII – Nº 215 – V. 12 – 2014ISSN 1679-0316 (impresso)

Editor: Prof. Dr. Inácio Neutzling - Unisinos

Conselho editorial: MS Caio Fernando Flores Coelho; Profa. Dra. Cleusa Maria Andreatta; Prof. MS Gilberto Antônio Faggion; Prof. MS Lucas Henrique da Luz; MS Marcia Rosane Junges; Profa. Dra. Marilene Maia; Profa. Dra. Susana Rocca; Dra. Susana Rocca.

Conselho científico: Prof. Dr. Adriano Neves de Brito, Unisinos, doutor em Filosofia; Profa. Dra. Angelica Massuquetti, Unisinos, doutora em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade; Profa. Dra. Berenice Corsetti, Unisinos, doutora em Educação; Prof. Dr. Celso Cândido de Azambuja, Unisinos, doutor em Psicologia; Prof. Dr. César Sanson, UFRN, doutor em Sociologia; Prof. Dr. Gentil Corazza, UFRGS, doutor em Economia; Profa. Dra. Suzana Kilpp, Unisinos, doutora em Comunicação.

Responsável técnico: MS Caio Fernando Flores Coelho

Revisão: Carla Bigliardi

Editoração eletrônica: Rafael Tarcísio Forneck

Impressão: Impressos Portão

Cadernos IHU ideias / Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Instituto Humanitas Unisinos. – Ano 1, n. 1 (2003)- . – São Leopoldo: Universidade do Vale do Rio dos Sinos, 2003- .

v.

Quinzenal (durante o ano letivo).

Publicado também on-line: <http://www.ihu.unisinos.br/cadernos-ihu-ideias>.

Descrição baseada em: Ano 1, n. 1 (2003); última edição consultada: Ano 11, n. 204 (2013).

ISSN 1679-0316

1. Sociologia. 2. Filosofia. 3. Política. I. Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Instituto Hu-manitas Unisinos.

CDU 316 1

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Bibliotecária responsável: Carla Maria Goulart de Moraes – CRB 10/1252

ISSN 1679-0316 (impresso)

Solicita-se permuta/Exchange desired.As posições expressas nos textos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores.

Toda a correspondência deve ser dirigida à Comissão Editorial dos Cadernos IHU ideias:

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Av. Unisinos, 950, 93022-000, São Leopoldo RS Brasil Tel.: 51.3590 8213 – Fax: 51.3590 8467

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REPENSAR OS DIREITOS HUMANOS NO HORIZONTE DA LIBERTAÇÃO

Alejandro Rosillo MartínezUASLP

PARTE I

Uma fundamentação dos Direitos Humanos

1. Introdução

A fundamentação de direitos humanos se tornou um tema clássico no pensamento jurídico, especialmente na relação com a Filosofia do Direito. Não obstante, na maioria dos casos, as reflexões dominantes desconhecem que os direitos humanos têm sua gênese na luta popular, conduzindo a fundamentação a instâncias não históricas e abstratas. De certa forma, passa algo semelhante com respeito ao Direito Internacional de direitos hu-manos, assim denuncia o jurista índio Balakrishnan Rajagopal, em sua conhecida obra El derecho internacional desde abajo: El desarrollo, los movimientos sociales y la resistencia del Tercer Mundo1. Sobre esta posição no prólogo do dito livro, César Ro-dríguez comenta:

“Na posição contrária à visão do direito internacional ‘des-de arriba’ – narrada desde o ponto de vista das elites polí-ticas e econômicas e centrada no Estado como único ator legítimo nas relações internacionais –, o jurista índio pro-põe uma perspectiva ‘desde abajo’, isto é, uma mirada à construção e transformação do direito desde o ponto de vista dos atores políticos subalternos.

(…)

Isto explica, por exemplo, por que os textos de ensino do direito internacional se ocupam dos novos instrumentos internacionais sobre direitos das comunidades indígenas – desde o Convênio 169 da OIT até o projeto da Decla-ração Internacional dos Direitos Indígenas da ONU – sem mencionar o fato de que ditas normas resultarão de um

1 RAJAGOPAL, Balakrishnan, El derecho internacional desde abajo: El desarrollo, los movimientos sociales y la resistencia del Tercer Mundo, ILSA, Bogotá, 2005.

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processo de pressão e mobilização internacional dos po-vos indígenas que leva já mais de três décadas. O mesmo sucede com outros movimentos sociais que desaparecem da narrativa oficial do direito internacional, desde os movi-mentos locais e globais de mulheres que têm dado lugar às normas internacionais contra a violência doméstica e a discriminação de gênero, até os movimentos sindicais sem cuja pressão não teriam surgido as convenções da OIT”.2

Algo parecido passou com o fundamento dos direitos hu-manos, pois nas filosofias dominantes se realiza uma “narrativa desde abajo”, com simbólicas simétricas, a-históricas e abstra-tas, que invisibilizam as lutas sociais. Assim sendo, é necessário que desde a filosofia se realize uma fundamentação “desde aba-jo”, com simbólicas assimétricas, históricas e concretas, que não desconheçam a tarefa que têm as lutas de resistência na cons-trução e compressão de direitos humanos. É o que se pretende na primeira parte deste escrito, utilizando algumas ideias da Fi-losofia da Libertação (FL).

Com o uso dos conceitos e categorias da FL, podemos es-tabelecer três vertentes gerais de fundamentação dos direitos humanos; nenhuma delas cabe, de forma estrita e precisa, den-tro das correntes juspositivistas, jusnaturalistas ou jusrealistas. Provavelmente pudessem ser classificadas como produto do diálogo entre as jusnaturalistas e as jusrealistas, ou como uma construção entre juspositivismo e jusrealismo; ou, finalmente, como uma síntese das três posturas. Como seja o certo é que intentar classificar estas vias de fundamentação dentro de qual-quer de ditas classes é uma metodologia pouco adequada, pois elas estão estreitamente ligadas às elaborações jusfilosóficas do centro mundial e respondem, de uma ou outra forma, à con-solidação do estado moderno e de sua cidadania desde essa localização geopolítica, enquanto a FL se compreende como um pensamento geopoliticamente localizado desde a periferia. A an-terior postura não significa uma defesa do relativismo, mas a compreensão da inteligência humana onde a verdade não está dada, porém se vai construindo.

Frente aos questionamentos sobre a tarefa de fundamentar os direitos humanos, podemos dizer que, sim, corre-se o risco de inviabilizar suas matrizes históricas, e se perde assim uma instância crítica. Com isto, a não fundamentação teria um efeito semelhante às fundamentações dogmáticas: aos direitos huma-nos já reconhecidos se lhe hipostasiaria, desvinculando-lhes da práxis humana e colocando-lhes em um âmbito a-histórico; mas ainda assim, seguiria tendo uma direta repercussão nos proces-sos políticos concretos dos povos. Impor-se-iam (impõem) con-teúdos normativos e critérios de legitimidade política alheios aos

2 RODRÍGUEZ, César, “Prólogo” en RAJAGOPAL, Balakrishnan, op. cit., pp. 10-11.

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processos históricos de cada povo, e assim os direitos humanos terminariam (terminam) sendo instrumentos de ideologização que justificariam (justificam) a dominação e a opressão de uns países sobre outros, de umas classes sociais sobre outras, ou de uns grupos sobre outros. Sem fundamentação, “direitos hu-manos” seriam uma presa fácil da falácia desenvolvimentista e se transformariam em instrumentos ideologizados de opressão. Daqui se desprende outra razão do porquê de fundamentar di-reitos humanos: construir uma instância crítica que sirva para verificar na realidade como certos “direitos humanos” contri-buem ou não com os processos de libertação das pessoas e dos povos. Apesar de que a fundamentação não pode ser a única instância crítica, pode ser de grande importância, se evita cair nos riscos que comentaremos a seguir.

2. Riscos na fundamentação dos direitos humanos

Antes de entrar ao núcleo de nosso escrito, podemos sus-tentar em geral que o problema de fundamentar direitos huma-nos tem quatro questões que devem ser enfrentadas e evitadas, se é que buscamos uma fundamentação em perspectiva liberta-dora. Estas são: o dogmatismo, o pensamento débil, o reducio-nismo e o etnocentrismo3. São quatro questões que põem em cheque a legitimidade da tarefa filosófica no respeito ao funda-mento de direitos humanos.

Uma fundamentação de direitos humanos é dogmática quando pretende encontrar um fundamento absoluto. Tratar-se-ia de estabelecer um tipo de fundamento que fora uma razão tão evidente que nenhuma pessoa poderia estar escusada em reconhecê-la; uma vez estabelecido não pode posteriormente discutir-se e quem se rebela a ela fica, por conta disso, excluído da comunidade dos sujeitos racionais. Essa postura corre o ris-co de terminar em atitudes intolerantes, pois, ao considerar que se tem um acesso privilegiado ao conhecimento do fundamento de direitos humanos – e do direito em geral –, então aqueles que se opõem hão de ser considerados irracionais e, portanto, criminosos.

Considerando o dogmatismo, topamos com o pensamento único, ou seja, com as posturas que fundamentam os direitos humanos desde pressupostos e pontos próprios do pensamento político e econômico hegemônico; trata-se daquelas posturas (neo)liberais que compreendem que o mercado é o único agente regulador da sociedade e, portanto, é a liberdade (no mercado) o único direito humano a defender; os direitos econômicos, so-ciais e culturais e os direitos coletivos seriam falsos direitos ou

3 Cf. SENENT, Juan Antonio, Problemas fundamentales de los derechos humanos desde el horizonte de la praxis, Tirant lo Blanch, Valencia, 2007, pp. 48-58.

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formas de prejudicar os autênticos direitos, que são os que pro-veem da liberdade (no mercado) do indivíduo. Fora deste mode-lo baseado na liberdade individualista, não há alternativas, e só assim pode-se compreender direitos humanos.

Frente ao rechaço do dogmatismo, topamos com o pensa-mento débil, próprio da pós-modernidade ocidental. Uma de suas propostas é tratar de estabelecer vários fundamentos possíveis. Com ela se corre o risco de um relativismo onde ante uma quan-tidade considerável de fundamentos se perde seu caráter de instância crítica e não se faz referência alguma com a realidade concreta das vítimas dos sistemas. Apesar de que a FL se vale de algumas contribuições da filosofia pós-moderna4, não pode assumir o pensamento débil em relação ao fundamento dos di-reitos humanos. Neste sentido, González Faus analisa como este tipo de pensamento implica tanto o sujeito débil como os direitos débeis; frente à acusação dos pensadores pós-moder-nos de que todo fundamento sugere totalitarismos, este autor assinala que os direitos humanos terminam sendo reduzidos no pensamento débil ao valor de troca do mercado5. A maneira para enfrentar o dogmatismo e o pensamento único por parte da FL não deve ser o relativismo e o pensamento débil, pois através deles pouco favor se faz a quem se lhes negam as condições para produzir e reproduzir sua vida, mas o de outorgar a constru-ção viável de vários fundamentos fortes que reconheçam a dinâ-mica histórica dos direitos humanos, e, portanto, embora fortes, não se considerem uma solução definitiva, e sim só de caráter provisório, pois deve estar em constante revisão ante a situação dos pobres, dos oprimidos e das vítimas.

Quanto ao reducionismo entendemos as teorias que no de-senvolvimento do fundamento focam só uma das dimensões dos direitos humanos. São posturas que limitam a realidade e desconhecem diversas parcelas pelas quais os processos de direitos humanos se veem afetados; só enfocam sua análise já seja no jurídico, no político, no social ou no ético, deixando de lado as outras dimensões. Aqui podemos mencionar certas ver-sões de juspositivismos, jusnaturalismos, historicismos e o monoculturalismo.

O último problema na fundamentação dos direitos huma-nos, e muito relacionam com o anterior reducionismo, é o etno-centrismo. Como assinala Senent, “um dos problemas teóricos com que nos encontramos ao tratar a questão dos direitos hu-manos é que assinala que estes representam uma instituição etnocêntrica, e precisando ainda mais, se denuncia que são

4 DUSSEL, Enrique, Ética de la liberación. En la edad de la globalización y de la exclusión, Trotta, Madrid, 1998, p. 517.

5 GONZÁLEZ FAUS, José Ignacio, “Derechos humanos, deberes míos. I. Pensa-miento débil/consumo fuerte” en Christus, no. 702, México, septiembre-octubre 1997, p. 23.

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uma instituição eurocêntrica”6. Para superar esta situação, a fun-damentação dos direitos humanos deve possibilitar o diálogo intercultural para mostrar que a experiência de luta pela dignida-de humana e o uso das instituições políticas e jurídicas para protegê-la não são postulados exclusivos do Ocidente. Do con-trário, a força crítica do discurso dos direitos humanos se vê di-minuída na realidade periférica, alheia total ou parcialmente à tradição eurocêntrica, e se transformam em ideologizações e instrumentos que justificam a opressão das classes dominantes – que geralmente são funcionais e simpatizam com os interes-ses das potências do Norte – sobre as classes pobres e populares.

3. O fundamento da alteridade

A FL, ainda quando é crítica da Modernidade, não renuncia à subjetividade. Para os processos de libertação é importante que a vítima, o pobre e o oprimido se constituam em sujeitos de sua própria história. No entanto, a FL não fundamenta os direitos humanos no sujeito abstrato da Modernidade, nem o indivíduo egoísta que só busca seu próprio interesse. A autonomia do su-jeito não é sinônimo da subjetividade moderna que inicia os pro-cessos de direitos humanos. Isto porque o sujeito abstrato da Modernidade se constitui como uma Totalidade excludente, não aberta à proximidade, nem a exterioridade do Outro. Ademais, como assinala Franz Hinkelammert, a moderna sociedade oci-dental mais que antropocêntrica é “mercadocêntrica”7; colocou o mercado como uma suposta ordem natural, e a legitimidade e validez das instituições estão em função de que permitam o livre desenvolvimento das leis do mercado. Mas isso, a visão do su-jeito e da subjetividade da Modernidade, iniciada com Descar-tes, terminou ligando-se ao domínio da natureza e da realidade social através do capitalismo. Trata-se de uma concepção ego-centrista do ser humano, que sacraliza ao indivíduo como pro-prietário que fomenta a alienação e mercantilização de todas as facetas da vida humana. Reduzir a dimensão subjetiva do ser humano à subjetividade individualista da Modernidade hegemô-nica significa promover um desperdício da experiência. Desde outras culturas, a subjetividade se construiu de maneira distinta, e em diversas ocasiões de forma comunitária.

Por isso, a subjetividade deve constituir-se no encontro com o outro. Como se sabe, é Enrique Dussel quem, partindo da Filosofia de Emmanuel Lévinas, introduziu a alteridade como um elemento fundamental da FL. Por isso, se fala de uma FL conce-bida como uma metafísica da alteridade ou uma filosofia da alte-

6 SENENT, Juan Antonio, op. cit., p. 56.7 Cf. HINKELARMMERT, Franz, El sujeto y la ley. El retorno del sujeto reprimido,

EUNA, Heredia de Costa Rica, 2005.

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ridade ética.8 A partir daí, se trataria de constituir subjetividades de pessoas e de povos; vale dizer, tanto subjetividades pessoais como subjetividades coletivas.

Do conjunto de categorias que Dussel aporta à FL, algumas delas têm relação com uma fundamentação dos direitos huma-nos desde a alteridade e, ademais, autores juristas próximos aos movimentos de libertação as têm tomado em conta para a construção do seu pensamento jurídico.9 Estas categorias são a proximidade, a totalidade, as mediações, a liberdade situada, a exterioridade e a alienação.

a) Proximidade: Dussel assinala que a experiência grega ou indo-europeia e a moderna privilegiaram a relação com o ser humano–natureza.10 Compreenderam o ser como luz ou como cogito, o que implica definir o âmbito do mundo e o político como visto, o dominado, o controlado. Em troca, se privilegia a relação ser humano-ser humano (a especialidade e o político), se pode dar um discurso filosófico com outra origem. Nesse sentido, tra-ta-se de começar desde a proximidade, distinguindo-a da proxe-mia.11 Práxis é encurtar distâncias; é um obrar até o outro como Outro. É uma ação que não se aproxima às coisas, e sim ao outro enquanto outro; por isso um aproximar-se, e não proxe-mia. Daí que possa falar-se de diversas proximidades (originá-ria, histórica, metafísica).12 Frente a este equívoco da proximida-de histórica, Dussel fala da proximidade inequívoca, que é a que se dá ante o rosto do oprimido, da vítima, do que é exterior a todo sistema. É a proximidade ante o que clama justiça, ao que invoca responsabilidade. A proximidade inequívoca é a que se estabelece com o que necessita serviço, porque é débil, miserá-vel, necessitado. Daí que a proximidade é a raiz da práxis e desde onde parte toda responsabilidade pelo outro, e em con-creto com o outro vítima do sistema.

b) Totalidade: A totalidade é a maneira como as coisas se apresentam ao ser humano. A proximidade, o cara a cara do ser humano com o ser humano deixa irremediavelmente lugar ao distanciamento. Então o ser humano se aproxima aos entes, às coisas, aos objetos; as coisas-sentido, os entes, nos enfrentam em uma multiplicidade quase indefinida. Não obstante, isto se dá em uma totalidade, em um sistema, que os compreende e os

8 Cf. GARCÍA RUIZ, Pedro Enrique, Filosofía de la liberación. Una aproximación al pensamiento de Enrique Dussel, Dríada, México, 2003, pp. 171-202; SALAMAN-

CA, Antonio, Yo soy guardián mundial de mi hermano. Hacia la universalización ética de la opción por el pobre desde el pensamiento de K.O. Apel, E. Dussel y X. Zubiri, IKO, Frankfurt, 2003, pp. 65-70.

9 Cf. DE LA TORRE RANGEL, Jesús Antonio, Apuntes para una introducción filosó-fica al derecho, Porrúa, México, 2007, pp. 139-159.

10 Cf. DUSSEL, Enrique, Filosofía de la liberación, Nueva América, Bogotá, 1996, p. 29.

11 Idem, p. 30.12 Idem., pp. 31-35.

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unifica. Os entes, assinala Dussel, não nos rodeiam de maneira caótica, mas sim formam parte de um mundo, que é uma totali-dade instrumental de sentido. É o horizonte cotidiano no qual vivemos.13

c) Mediações: As mediações não são outra coisa que aqui-lo que empunhamos para alcançar o objetivo final da ação. A proximidade é a imediatez do cara a cara com o outro; a totalida-de é o conjunto dos entes enquanto tal: enquanto sistema. As mediações possibilitam o aproximar-se à imediatez e permane-cer nela, constitui em suas partes funcionais a totalidade.14

d) Liberdade situada: As coisas e entes que constituem seu entorno são mediações, possibilidades. Quando o ser humano obra, o faz por um projeto. Esse projeto determina as possibili-dades, as mediações para sua realização. Vale dizer, a pessoa está assediada por decisões que deve tomar, e caminhos que se abrem e se fecham. Este estar aberto ao dever de continuamen-te determinar-se por esta ou aquela possibilidade; este estar al-gumas vezes desconcertado e não saber qual eleger; este poder eleger o mesmo e não eleger nada; esta capacidade ou poder sobre as mediações se denomina, segundo Dussel, a liberdade. Logo, o ser humano se realiza por determinações eletivas. Ele-ger livremente não consiste em poder determinar absolutamente as mediações desde uma indeterminação absoluta (seria a liber-dade infinita, radical). Tampouco o ser humano está totalmente determinado, condicionado; é livre e ao mesmo tempo historica-mente determinado. A mediação é possibilidade para uma liber-dade. A coisa é ente porque sendo interpretado em seu sentido e estimado em seu valor é por último eleito e postergado em vista do projeto.

e) Exterioridade: Dussel afirma que esta é a categoria mais importante para a FL, e que possibilita realizar um discurso no-vo. Assim, a exterioridade é uma categoria que marca a diferen-ça da FL com as filosofias do centro que usam também as cate-gorias acima descritas. Possibilita um discurso novo porque faz viável fixar-se na realidade dos povos periféricos: “É a novidade dos nossos povos o que se deve refletir como novidade filosófica e não ao contrário”.15 A exterioridade parte do fato de que no conjunto de todos os entes, sobressai um, distinto a todos os demais, o rosto dos outros seres humanos. Aleijados da proximi-dade, consumidos pela proxemia – donde ainda o rosto humano é assumido como uma coisa-sentido, como um ente mais –, a presença deste rosto nos recorda a necessidade daquela. O ser humano como ente é parte da totalidade, dos sistemas, mas a

13 Idem., p. 37.14 Idem., p. 45.15 Idem., p. 55.

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emergência de seu rosto nos remete a enfrentar a proximidade; é quando o outro se revela em toda sua exterioridade.16

f) Alienação: A alienação se dá quando se nega ao outro sua qualidade de outro. A totalidade, o sistema, tende a totali-zar-se, a autocentrar-se, na busca de eternizar sua estrutura presente e a devorar de forma intrasistêmica toda exterioridade possível.17 Então para o sistema o outro aparece como algo dife-rente, que põe em perigo a unidade “do mesmo”. Logo, ao outro no tempo de perigo se lhe transforma, graças à ideologização, em “inimigo”.

As categorias expostas acima, próprias da FL desenvolvi-das por Dussel e, em parte, por Juan Carlos Scannone, nos pos-sibilitam estabelecer um fundamento dos direitos humanos des-de a alteridade, desde o encontro com o outro. À diferença dos fundamentos hegemônicos de direitos humanos embasados em uma subjetividade do indivíduo, que finalmente são partes da totalidade, do sistema dominante, a FL propõe um fundamento na alteridade, desde uma subjetividade aberta ao outro e não fechada no mesmo. Neste contexto, a subjetividade moderna é parte da totalidade que só reconhece direito aos mesmos18, não ao inequivocamente outro, ao que pela totalidade é considerado estranho, alheio e até perigoso ao sistema. A esse outro, ao con-trário, embora exija a satisfação das mesmas necessidades que os mesmos, é catalogado como delinquente; por isso, se crimi-nalizam os protestos e as lutas sociais e as práxis da libertação se reprimem (elas são finalmente os meios em que os outros emergem para romper a alienação a que são submetidos). Des-sa forma, a fundamentação dos direitos humanos efetuada só desde o indivíduo carrega alguns dos reducionismos que co-mentamos; está marcada pelo reducionismo monocultural e his-toricista. Direitos humanos fundamentados desde o sujeito abs-trato facilmente se convertem na ferramenta de alienação, e são parte do que Dussel descreve no seguinte texto: “Vestida de nobres virtudes nietzscheanas, guerreiras, saudáveis, brancas e loiras como arianos, a Europa se lança sobre a periferia, sobre a exterioridade geopolítica; sobre as mulheres de outros varões; sobre seus filhos; sobre seus deuses. Em nome do ser, do mun-do humano, da civilização, aniquila a alteridade dos outros ho-mens, de outras culturas, de outras eróticas, de outras religiões. Incorpora assim aqueles homens ou, de outra maneira, desagre-ga violentamente as fronteiras do seu mundo até incluir a outros povos em seu âmbito controlado.”19

16 Idem., p. 56.17 Idem., p. 70.18 Esses mesmos, esses que reafirmam a mesmidade do sistema, são os que

concretizam ao ser humano abstrato, a esse ser humano que se considera “sujeito universal de direitos”, a dizer, um homem branco, burguês, possuidor de dinheiro, ocidental etc.

19 DUSSEL, Enrique, Filosofía de la liberación, op. cit., p. 69.

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Sem negar a subjetividade como elemento de uma funda-mentação dos direitos humanos, é imprescindível abri-la à plu-riculturalidade e às lutas históricas levadas a cabo pelos diver-sos povos oprimidos do planeta; se trataria de um sujeito intersubjetivo, comunitário, que seja o sujeito de direitos huma-nos como práxis de libertação. É o que propõe a FL a partir de uma metafísica da alteridade, que se concretiza em compreen-der a ética, a responsabilidade pelo outro, como o início de toda filosofia. Esta ética é uma ética da solidariedade que tem suas consequências para a construção de uma juridicidade al-ternativa, gerada desde as lutas sociais.20

A ética da alteridade busca uma abertura do sujeito que seja capaz de compreender o novo da história que se constrói desde a exterioridade. “O ponto de partida é a vítima, o Outro, mas não simplesmente como outra ‘pessoa-igual’ na comunida-de argumentativa, e sim ética e inevitavelmente (apodítico) co-mo Outro em algum aspecto negado-oprimido (principium oppressionis) e afetado-excluído (principium exclusiones).”21 Desde o outro como outro – o pobre, o oprimido, a vítima –, que é liberdade incondicionada por quanto se desprecia sua exterio-ridade considerando-a nada (como incultura, analfabetismo, barbárie, primitivismo, incivilização), é como surge na história o novo. Por ele todo sistema futuro realmente resultante de uma revolução subversiva em seu sentido metafísico é analógica: se-melhante em algo a anterior totalidade, mas realmente distinta.

Todo o anterior se realiza e se faz realidade, quando al-guém diz, por exemplo, “tenho fome, necessito de alimento!”.22 A fome do pobre é consequência de um sistema injusto, e na sua situação de vítima não tem lugar dentro do sistema. Não tem lugar por ser negatividade, por sofrer falta-de, por ser não-ente no mundo. Mas fundamentalmente está fora porque saciar es-truturalmente a fome do pobre é mudar radicalmente o sistema. Sendo assim, direitos humanos fundamentados desde a alteri-dade têm de compreender-se como ferramentas de lutas de quem é vítima do sistema, e por isso, mais que elementos con-servadores do sistema, têm de ser subversivos, transformado-res, revolucionários. O cara a cara do outro inequívoco obriga a repensar constantemente os direitos humanos, pois os direitos do outro não são parte do sistema.23

Este encontro com o outro, o cara a cara, fica complementa-do e levado além, com o pensamento da libertação de Franz Hinkelammert. Este autor fala do retorno do sujeito, mas não do

20 WOLKMER, Antonio Carlos, “Bases éticas para una juridicidad alternativa” en Jesús Antonio de la Torre Rangel (Coord.), Derecho alternativo y crítica jurídi-ca, UAA-ITESO-Porrúa, México, 2002, pp. 179-180.

21 DUSSEL, Enrique, Ética de la liberación, op. cit., p. 417.22 Idem., p. 524.23 DUSSEL, Enrique, Filosofía de la liberación, op. cit., p. 59.

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sujeito metafísico, e sim do sujeito vivo, corporal, enquanto hori-zonte filosófico para uma crítica radical da globalização neoliberal. Como havíamos dito, este autor assinala que a sociedade moder-na ocidental mais que antropocêntrica é mercadocêntrica.

O conceito de sujeito surge na relação sujeito-objeto, na fi-losofia de Descartes. O sujeito é visto como instância que se relaciona com o objeto, ou seja, a res cogitans frente à res ex-tensa. É um sujeito do pensamento que se enfrenta ao mundo dos objetos. Para ele tudo é objeto, tanto a corporalidade do outro como a própria corporalidade. Por isso, Hinkelammert as-sinala que é um sujeito transcendental, que desde um ponto de vista externo a corporalidade do mundo julga sobre este como mundo objetivo, do que não se considera parte, mas somente juiz.24 Sua existência se sustenta somente em sua autorreflexão sobre si mesmo, e por isso não tem corporalidade, nem tampou-co, em consequência, têm sentidos.25

Mas não fica aí a noção deste sujeito epistemológico, pois é um indivíduo possuidor; é o indivíduo que se dirige ao mundo para dominar e possuir; ao pensar o mundo corporal como ob-jeto, na relação sujeito-objeto se entende como possuidor do mundo. O mais grave é que a negação do sujeito transcendental realizado pela pós-modernidade não tem significado uma recu-peração de uma subjetividade libertadora e intercomunitária; ao contrário, tem fortalecido o sujeito atuante como indivíduo pro-prietário; a respeito disso, assinala Hinkelammert: “Mas esta ne-gação do sujeito transcendental não tem afetado o indivíduo possuidor, que é sua contrapartida. De fato tem substituído o sujeito pensante pelo sujeito atuante, que é um indivíduo pro-prietário e calculador dos seus interesses. Segue interpretando todo o mundo corporal como objeto da ação, mas se vê a si mesmo como uma substância calculadora, que se move em um mundo de puros objetos, e calcula sua possibilidade de ascen-der a este mundo consumindo-o e acumular como propriedade partes crescentes dele. Para este sujeito calculista, o próprio corpo segue sendo um objeto igual como é o mundo exterior. Não tem corpo, para calcular sua ação sobre corpos, que é seu objeto. Este sujeito calculista é o indivíduo, que não se vê inco-modado pela negativa ao sujeito transcendental”.26

Uma fundamentação de direitos humanos desde o sujeito transcendental, ou desde sua negação pós-moderna, termina sendo funcional para os interesses do sujeito calculista. Os direi-tos humanos se reduzem aos “direitos” necessários para ascen-der “ao mundo consumindo-o” e acumular propriedade. Parado-xalmente, o sujeito atuante verá, nos outros, objetos, pois a sociedade do mercado o conduz a “transformar tudo em objeto,

24 HINKELAMMERT, Franz, El sujeto y la ley, op. cit., p. 485.25 DUSSEL, Enrique, Ética de la liberación, op. cit., p. 515.26 HINKELAMMERT, Franz, El sujeto y la ley, op. cit., pp. 486-487.

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inclusive a si mesmo, [e isto] é apresentado agora como liberda-de e salvação”.27 Então os bens protegidos pelos direitos huma-nos não são satisfatórios para a produção e reprodução da vida, mas meros objetos para serem consumidos. Em troca, a FL pro-põe recuperar o ser humano como se faz presente na realidade, como ser corporal, como sujeito vivo frente aos outros que tam-bém se fazem presentes como seres corporais e sujeitos vivos; é uma relação de corpo a corpo, de cara a cara. A pergunta-cha-ve deste sujeito não é “se existo”, mas “se posso seguir existin-do”. Trata-se de responder pelas condições de possibilidade de viver como ser corporal, como ser vivente.

A demanda da recuperação do sujeito, da vida humana concreta, da vida para todos, nas instituições sociais e nas cons-truções culturais, é a demanda mais urgente do mundo de hoje, segundo F. Hinkelammert. Para isto, direitos humanos são, sem dúvida, uma ferramenta importante, mas fundamentada em um sujeito intersubjetivo. E isto tem que ver com a volta, nas pala-vras no nosso autor, ao sujeito reprimido e ao bem comum.

4. O fundamento sócio-histórico (práxis de libertação)

A FL não se compreende só como uma ética da alteridade, mas também pode entender-se como uma filosofia da práxis. Diver-sos autores – por exemplo, Ignacio Ellacuría, E. Dussel e F. Hinke-lammert – abordam em sua reflexão as diversas formas de práxis. De uma ou outra forma, buscam encontrar suas características pa-ra poder considerá-la como uma práxis de libertação. Apesar de que partem da análise da práxis humana em geral, coincidem em assinalar que não toda práxis é libertadora, mas que existem umas opressoras, homicidas e alienantes. Neste sentido, direitos huma-nos como realidade histórica estão afetados por esta ambivalência da práxis; direitos humanos bem podem ser instrumentos de ideo-logização funcionais a práticas opressoras ou ferramentas para a libertação. Fundamentar direitos humanos desde a práxis significa encontrar um fundamento sociopolítico; trata-se de entendê-los co-mo ferramentas das práxis de libertação.

Ellacuría aborda a práxis desde a análise dos elementos e dinamismos que integram a realidade histórica, que vão desde a materialidade até a dimensão pessoal, e desde o indivíduo até o corpo social. Como assinala Antonio González, a práxis humana “enquanto apropriação e transmissão tradente28 de possibilida-des é a categoria mais apropriada para compreender a originali-

27 Idem., p. 487.28 Tradente é um neologismo de Xavier Zubiri que se refere à forma em que uma

generação a outra se dá a entrega de capacidades e possibilidades; ou seja, a vida humana começa sempre montada sobre um modo de estar na realidade que foi entregue a cada ser humano. E isto é formalmente a história: ter um modo de estar na realidade entregue pelo progenitor.

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dade do histórico”.29 Em diversos escritos, tanto nos de caráter político, filosófico como teológico, Ellacuría utiliza o conceito práxis, e em variadas ocasiões o faz de maneira adjetivada; as-sim, se encontram conceitos como práxis histórica, práxis social, práxis política, etc. É um conceito utilizado por este autor como parte de seu diálogo com o marxismo, embora com uma impor-tante fundamentação no pensamento de Xavier Zubiri.

Para Ellacuría, pelo seu caráter transformador, a práxis é o âmbito onde com maior claridade se expressa a interação entre o ser humano e o mundo, pois nela as relações não são sempre unidirecionais, mas respectivamente codeterminantes. Através da práxis se mostra o poder criativo do ser humano. Este poder “está na estreita relação com o grau de liberdade que vai alcançando [o ser humano] dentro do processo histórico”.30 Ainda considerando que todo tipo de atividade humana transformadora está incluso na reflexão filosófica da práxis humana, pois ela inclui todas as for-mas do fazer humano, tanto especulativas, educativas, técnicas, religiosas, etc., Ellacuría põe ênfase nas práxis históricas de liber-tação, vale dizer, naquelas que atuam como produtoras de estru-turas novas mais humanizantes. Em sentido semelhante, Dussel assinala que a práxis de libertação “é a ação possível que trans-forma a realidade (subjetiva e social) tendo como última referên-cia sempre algumas vítimas ou comunidade de vítimas”.31

O processo práxico de libertação, já no âmbito ético e polí-tico, é principalmente dialético – embora não exclusivamente – enquanto busca negar a negação dos seres humanos, e se avance afirmando o positivo. Um processo que se dá dentro do dinamismo histórico da possibilitação e capacitação, pelo qual não existe nenhuma garantia de triunfo. Já se disse que a reali-dade histórica pode ser princípio de humanização e de persona-lização, mas também pode ser de opressão e alienação. Isto porque “a práxis histórica não se é reduzível nem às leis do mun-do natural nem aos saltos dialéticos de algum possível espíri-to”.32 À diferença do que pode suceder com posturas idealistas ou mecanicistas da história, o mal e a injustiça na história não podem ser legitimados nem justificados como necessidades ló-gicas no desenvolvimento de uma teleologia ou como partes de um devir forçoso da história. Antes, o mal histórico é um limite real que se apresenta como um desafio à práxis de libertação.

A libertação é, então, um processo através do qual o ser humano vai exercendo sua liberdade, e vai fazendo-se cada vez mais livre graças a sua estrutura de essência aberta. “A liberta-

29 GONZÁLEZ, Antonio, “Prólogo” en Ignacio Ellacuría, Filosofía de la realidad his-tórica, UCA Editores, San Salvador, 1999, p. 11.

30 SAMOUR, Héctor, “Filosofía y libertad” en Rodolfo Cardenal y Jon Sobrino (Coord.), “Ignacio Ellacuría. Aquella libertad esclarecida”, Sal Terrae, Santan-der, 1999, p. 110.

31 DUSSEL, Enrique, Ética de la liberación, op. cit., p. 553.32 GONZÁLEZ, Antonio, “Prólogo”, op. cit., p. 11.

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ção é, de imediato, um processo. Um processo que, no pessoal, é, fundamentalmente, um processo de conversão e que, no his-tórico, é um processo de transformação, quando não de revolução”.33

A concepção de práxis até agora analisada tem importantes consequências para a fundamentação dos direitos humanos, se isto se assume como momentos da práxis histórica da liberta-ção. Neste contexto não seria viável, e careceria de sentido, um fundamento absoluto e dogmático, desde o que se proponha um tipo de “falácia desenvolvimentista”. Na realidade, deveria se compreender os direitos humanos desde sua complexidade co-mo momentos pertencentes às distintas forças históricas; ou se-ja, contemplá-los como momentos tanto jurídicos como ideológi-cos, sociais e políticos. Isto significaria assumir uma concepção complexa de direitos humanos.

O compreender os direitos humanos como momentos da práxis histórica de libertação se constitui em um fundamento só-cio-histórico. Logo, trata-se de entender a práxis da libertação dos novos sujeitos sócio-históricos como fundamento dos direi-tos humanos. De certa forma, a análise crítica que realiza Helio Gallardo tem relação com nosso tema. Este autor assinala que o fundamento dos direitos humanos não é filosófico, mas socioló-gico; este deve entender-se como matriz e, portanto se constitui pela formação social moderna que contém tensões, conflitos e deslocamentos. Ora, o fundamento se encontra na sociedade civil, em sua dinâmica emergente libertadora, em seus movi-mentos e mobilizações sociais contestatórias.34

O fundamento dos direitos humanos teria então como mo-tor a luta social em matrizes sócio-históricas; assim, Gallardo afirma que “desde o ponto de vista da sua prática, o fundamento dos direitos humanos se encontra, ostensivamente, em socieda-des civis emergentes, vale dizer, em movimentos e mobilizações sociais que alcançam incidência política e cultural (configuram ou renovam um ethos ou sensibilidade) e, por isso, podem insti-tucionalizar juridicamente e com eficácia suas reclamações”.35 Esta fundamentação sócio-histórica é assumida pelo pensa-mento da libertação não só desde o aspecto sociológico, mas também desde o horizonte filosófico.

Agora, a FL não só desenvolve a compreensão do sentido da práxis, mas também do sujeito dela. De entrada, toda a pes-soa pode constituir-se em sujeito da práxis de libertação, seja em sua qualidade de vítima ou por ser solidário com o oprimido, enquanto realiza ações, organiza instituições ou transforma sis-

33 ELLACURÍA, Ignacio, “En torno al concepto y a la idea de liberación”, en Escritos Teológicos, Tomo I, UCA Editores, San Salvador, 2000, p. 640.

34 Cf. GALLARDO, Helio, Teoría crítica: Matriz y posibilidad de derechos humanos, DSR, Murcia, 2008, p. 31.

35 Idem., p. 44.

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temas para que as vítimas, os pobres e os oprimidos desfrutem e exerçam efetivamente direitos humanos.36 Mas o analogado principal do sujeito da práxis de libertação é a vítima que, adqui-rindo consciência de sua situação, e em diálogo com outras víti-mas, empreende ações para deixar para trás, para superar a situação que lhe nega as possibilidades de produzir e reproduzir sua vida. Nesse sentido, Dussel afirma: “O sujeito da práxis de libertação é o sujeito vivo, necessitado, natural, e por isso cultu-ral, em último término a vítima, a comunidade das vítimas e dos a ela corresponsavelmente articulados. O ‘lugar’ último, então, do discurso, do enunciado crítico, são as vítimas empíricas, cujas vidas estão em risco, descobertas no ‘diagrama’ do Poder pela razão estratégica”.37

O sujeito da práxis de libertação supõe não uma mera sub-jetividade individual, mas a já mencionada intersubjetividade. A intersubjetividade não significa a criação de um sujeito coletivo natural, pois isto implica finalmente uma substancialização inde-vida; os sujeitos sócio-históricos são fluidos e fragmentários, aparecem e desaparecem em conjunturas bem determinadas, segundo as tramas sociais. Antes significa o reconhecimento da subjetividade de cada sujeito humano concreto, e de seu encon-tro com o outro, que também é sujeito, e que por suas qualida-des de vítima ou solidário com elas, se conformam em uma co-munidade de vida.38 Como assinala Dussel, a intersubjetividade “se constitui a partir de uma certa comunidade de vida, desde uma comunidade linguística (como mundo da vida comunicá-vel), desde uma certa memória coletiva de gestas de libertação, desde necessidades e modos de consumo semelhantes, desde uma cultura com alguma tradição, desde projetos históricos con-cretos aos que se aspira em esperança solidária”.39

Por sua parte, Hinkelammert ressalta o caráter processual do fazer-se sujeito que, para a FL, significa a volta – a recupera-ção – do sujeito reprimido: “[…] o ser humano como sujeito não é uma instância individual. A intersubjetividade é uma condição para que o ser humano chegue a ser sujeito. Se sabe em uma rede, que inclui a mesma natureza externa ao ser humano: que viva o outro, é uma condição da própria vida”.40 O ser humano, para viver, requer fazer-se sujeito; a vida é um chamado a cons-tituir-se como sujeito. Então, o ser sujeito não é um antes, um a priori do processo, e sim o que resulta do mesmo processo.41 Sendo assim, o “sujeito” não contém um valor ou uma substân-cia a priori, mas que depende do sentido negativo do sistema

36 DUSSEL, Enrique, Ética de la liberación, op. cit., p. 513.37 Idem., p. 525.38 GALLARDO, Helio, Teoría crítica, op. cit., p. 60.39 DUSSEL, Enrique, Ética de la liberación, op. cit., p. 525.40 HINKELAMMERT, Franz, El sujeto y la ley, op. cit., p. 495.41 Idem., p. 496.

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que o faz vítima; o que poderia dizer-se é que esse sujeito bus-cará reverter sua situação de vítima através da geração de um novo sistema. Logo, para chegar a ser sujeito da práxis da liber-tação, é necessário efetuar uma crítica autoconsciente do siste-ma que causa a vitimização. As vítimas têm de dar-se conta de que não haviam participado no acordo originário do sistema – por utilizar expressões da ética do discurso – e, sobretudo, que devido ao dito sistema não podem produzir, reproduzir e desen-volver sua vida.42

Havíamos assinalado, parágrafos acima, que o processo práxico de libertação é principalmente dialético, embora não ex-clusivamente. Enquanto direitos humanos, a práxis de libertação se constitui, em diversas ocasiões, pelo enfrentamento de um mo-vimento social organizado das vítimas e um sistema formal domi-nante. Gera-se um conflito ético, com consequências sociais e jurídicas, onde a comunidade de vítimas busca modificar as tra-mas sociais para lograr uma transferência de poder com o fim de satisfazer suas necessidades de vida.43 Se a práxis de libertação se realiza por um sujeito intersubjetivo, o princípio normativo “crí-tico democrático” é parte dela. A intersubjetividade nas lutas de libertação se embasa no consenso crítico das vítimas. Um movi-mento social embasado, por exemplo, nas decisões de “líderes” e que não se guia pela vontade consensual das vítimas, terminará reproduzindo o mesmo sistema que exclui as vítimas, e esses “lí-deres” terminarão utilizando o poder de maneira fetichizada. Por isso, a intersubjetividade tem que ver com dito princípio, que Dussel define da seguinte maneira: “O princípio normativo crítico democrático aponta a promover o consenso crítico das vítimas, por sua participação real e em condições simétricas”.44 Em efeito, ao fundamentar direitos humanos na práxis de libertação, se com-preende a importância do consenso das vítimas para que a luta por “novos direitos” signifique a criação de um novo sistema, que inclui a participação dos que haviam sido excluídos.

Do anterior podemos concluir que o estado não é funda-mento de direitos humanos; no máximo pode ser um instru-mento, um conjunto de instituições para fazê-los efetivos. A práxis de libertação dos povos é um ato mais radical que a existência e o funcionamento do estado.45 Se fundamentam-se direitos humanos na práxis histórica de libertação, se potencia-liza, seguindo as categorias de Boaventura de Sousa Santos, o pilar emancipatório da Modernidade. Em troca, se se funda-menta não esta, se potencializará eventualmente um dos pila-

42 Idem., pp. 495-496.43 GALLARDO, Helio, Teoría crítica, op. cit., p. 44. DUSSEL, Enrique, Ética de la

liberación, op. cit., p. 541.44 DUSSEL, Enrique, Veinte tesis de política, Siglo XXI, México, 2006, p. 105.45 Cf. SALAMANCA, Antonio, Filosofía de la revolución. Filosofía para el socialismo

en el siglo XXI, UASLP-CEDH, San Luis Potosí, 2008, pp. 28-34.

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res de controle.46 Portanto, recuperando o melhor da Moderni-dade, a FL tem de insistir que direitos humanos devem se conservar como parte do pilar emancipatório fundamentando-lhes nas práxis de libertação.

Os direitos humanos têm como um de seus fundamentos a práxis histórica de libertação, enquanto se realiza por uma co-munidade de vítimas – que se constitui em um sujeito intersub-jetivo – que busca, ao exercer o direito a gerar direitos, subverter o sistema que lhe nega a satisfação das necessidades para a produção e reprodução da vida e dar passo a um novo sistema. Isto implica o colocar a práxis como o fato mais radical, que an-tecede o estado ou a natureza humana, enquanto a busca de fundamentos dos direitos humanos. É um fundamento não dog-mático, nem etnocêntrico, nem historicista; defende a necessi-dade do sujeito, mas não do sujeito individual da Modernidade hegemônica, e sim o sujeito intersubjetivo que se constitui atra-vés da vontade de libertação das vítimas reunidas e organizadas em comunidade.

5. O fundamento da produção da vida

A FL tem como um tema central da sua reflexão o “sujeito vivo”, e em conexão com ele a satisfação das necessidades para a vida. A recuperação do sujeito não só é referida a um sujeito intersubjetivo e a um sujeito da práxis de libertação, mas também ao sujeito como sujeito vivo, como um ser corpo-ral, pelo que a satisfação das necessidades se constitui como um fato radical. Isto não quer dizer que o sujeito intersubjetivo e o sujeito da práxis fiquem relegados a um segundo sítio, ou-torgando-lhes a primazia ao sujeito vivo. Não se trata de hierar-quizar os “sujeitos”. Vale dizer, para que o sujeito de direitos humanos realmente seja tal, deve ser alternadamente um su-jeito vivo, intersubjetivo e práxico.47 A ausência de qualquer deles, ou a ausência total do sujeito, significaria que a funda-mentação dos direitos humanos cairia em algum dos riscos analisados no início desta seção.

Em virtude ao sujeito vivo, a fundamentação dos direitos hu-manos se constitui como um referente crítico do sujeito da práxis, encaminhado a responder a interpretação que as vítimas realizam através do sujeito intersubjetivo. Vale dizer, se o sujeito da práxis dirige seu atuar para lograr uma libertação integral, através da organização e o consenso da comunidade de vítimas que trans-forma o sistema através de “novos direitos”, a satisfação de ne-cessidades para a vida é o marco material dessa práxis, dessa organização e desse consenso entre as vítimas: “O juízo de fato

46 Cf. SANTOS, Boaventura de Sousa, Sociología jurídica crítica, op. cit., p. 31.47 Cf. HINKELAMMERT, Franz, Crítica de la razón utópica, Desclée de Brouwer,

Bilbao, 2002.

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crítico (desde o marco material da ética) se enuncia como a pos-sibilidade da produção, reprodução e desenvolvimento da vida dos sujeitos reais do sistema, e como ‘medida’ ou critério dos fins do mesmo: se a vida não é possível, a razão instrumental que se exerce em fazê-la impossível é eticamente perversa”.48

O sujeito vivo evita que o sujeito da práxis fique tão só em um sujeito pragmatista que aplica a razão instrumental em fun-ção do cálculo de utilidade. Esta é uma forma de exercer a razão que faz impossível a reprodução da vida, pois eventualmente significa o suicídio.

Hinkelammert assinala que entre os séculos XIV e XVI, nos inícios da Modernidade, racionalidade meio-fim, que é a raciona-lidade concebida a partir do indivíduo e se caracteriza por ser a racionalidade econômica hegemônica, se impõe – ou se preten-de impor – à sociedade inteira.49

É uma racionalidade que atenta contra a vida e nega direi-tos humanos, e por isso é “a irracionalidade do racionalizado, que é, por sua parte, a ineficiência da eficiência”.50

A eficiência e a racionalidade econômica se lhes conside-ram os aportes da competitividade, e ambas são transformadas nos valores supremos. Esta competitividade exclui da consciên-cia o sentido da realidade, pois provoca que se perceba como “realidade virtual”. O milho ou o trigo são produzidos se forem competitivos, não porque alimentam; uma peça de roupa não se fabrica, embora aqueça e dê abrigo, se sua produção não é competitiva.

Com esta realidade virtual, segundo o qual tudo tem seu critério na competitividade, desaparece o valor de uso das coi-sas. Não obstante, isto se estende a todas as facetas da vida, incluindo aquelas relacionadas com o jurídico e os direitos humanos.

Uma cultura humana que não produz competitividade tem que desaparecer, e sua desaparição poderá ser interpretada co-mo um devir natural dos acontecimentos e pelo “exercício da li-berdade” de seus membros que optaram por deixar de utilizar, por exemplo, sua língua (é mais competitivo falar inglês que ñañú, por exemplo); ou, igualmente desde este critério, se tem de considerar que as transformações sociais que não aumentem a competitividade não devem realizar-se. O domínio da compe-titividade não admite ações frente aos efeitos destrutores que ela produz; e mais, impede sequer de vê-los.

Significa a afirmação da Totalidade e a negação do Outro; o encobrimento do rosto da vítima, quem o é por sua própria responsabilidade, por não ser “competitivo”. Por isso um sujeito prático ou atuante não é suficiente.

48 DUSSEL, Enrique, Ética de la liberación, op. cit., p. 523.49 Cf. HINKELAMMERT, Franz, El sujeto y la ley, op. cit., pp. 19-23.50 Idem., p. 23.

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Contrário à racionalidade meio-fim, Hinkelammert assinala que a vida do ator não pode ser um fim, dado que não pode ser tratada como um fim em competência com outros. Quem elege a morte, elege a dissolução de todos os fins possíveis. A vida é a possibilidade de ter fins e, no entanto, não é um fim. Por isso, se abordamos o ator como um ser vivo que se enfrenta em suas relações a suas relações meio-fim, então o miramos como sujei-to. O ator, antes de ser ator, é sujeito humano; só se transforma em ator quando decidiu sobre o fim e calcula os meios, incluindo nestes sua própria atividade. A racionalidade reprodutiva é a própria do sujeito vivo.

Para poder enfocar nesta racionalidade, devemos assumir o ator além das suas relações meio-fim; percebê-lo como sujeito e, portanto, não como um fim, mas como condição de possibilidade dos fins. O ser humano como sujeito vivo concebe fins e se refere ao conjunto de seus fins possíveis. Mas não pode realizar todos os fins que sob um cálculo meio-fim parecem possíveis; pelo menos deve excluir aqueles fins cuja realização atenta contra sua possibi-lidade de viver. Apesar de o sujeito determinar seus fins, não pode desconhecer a materialidade histórica, como assinala Ellacuría.51 Daí que o sujeito esteja “atado” ao circuito natural da vida humana que é condição de possibilidade de sua própria vida.

O critério da vida ou morte se converte no critério em última instância. A racionalidade meio-fim perde legitimidade em cada caso no qual ele entre em contradição performativa com a racio-nalidade reprodutiva; aquela racionalidade é uma racionalidade subordinada à vida. A irracionalidade do racionalizado não é ou-tra coisa que a evidência desta contradição performativa. Como assinala Hinkelammert, “[A] racionalidade meio-fim reduz a vida humana (e da natureza), o que evidencia seu caráter potencial-mente irracional”.52

À racionalidade do sujeito vivo se enfrenta a pretensão de mostrar como racionais as ações que produzem morte. Hinke-lammert denuncia a desorientação do mercado e do pensamen-to sobre ele em relação com a racionalidade reprodutiva. Frente ao critério do mercado todas as ações meio-fim são igualmente racionais, embora desde a racionalidade reprodutiva sejam des-trutivas. Portanto, as atividades devastadoras da vida são pro-movidas pelo mercado assim como as atividades compatíveis: “Cortar o galhos de uma árvore sob a qual o ator se encontra sentado é tão racional como cortar qualquer outro”. Gera-se en-tão uma tendência inevitável do mercado para a destruição em termos da racionalidade reprodutiva: trata-se da morte tanto dos seres humanos como da natureza: “Esta tendência destrutiva é a irracionalidade do racionalizado”.53

51 Cf. ELLACURÍA, Ignacio, Filosofía de la realidad histórica, op. cit., pp. 55 y ss.52 HINKELAMMERT, Franz, El sujeto y la ley, op. cit., p. 49.53 Idem., p. 53.

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Agora, esta tendência à destruição não é necessariamente a finalidade de nada, e sim que resulta da própria racionalidade meio-fim e por constituir-se em uma totalidade. O sistema coor-denador da divisão social do trabalho – o mercado – a faz surgir. Poderá tratar-se de efeitos externos para a racionalidade meio-fim, mas são indiscutivelmente internos para a vida e para a ra-cionalidade reprodutiva.

Não obstante, quando a racionalidade meio-fim pretende totalizar-se, a racionalidade reprodutiva não deixa de existir e segue fazendo-se presente. Esta racionalidade não é uma pos-tura idealista, mas responde a uma exigência material, ao en-frentamento do ser humano com a materialidade da realidade histórica; portanto, se lhe assume para preservar a vida ou se lhe evita pra produzir a morte.

Quando mais se nega esta racionalidade, aumentam as si-tuações que impossibilitam a satisfação das necessidades, tais como o desemprego, a violência, o subdesenvolvimento, a pau-perização, etc. Então, como assinala Hinkelammert, estas insa-tisfações se fazem sentir como exigências e protestos, mas ade-mais “donde não há protesto possível, como no caso da natureza destruída, a ausência da racionalidade reprodutiva se faz pre-sente pela crise ambiental. (…) E donde o protesto social não é possível, a ausência da racionalidade se faz sentir nas crises da convivência, as migrações, a decomposição social, o crime e a corrupção”.54

Do anterior se desprende a relação sujeito vivo com o sujei-to da práxis de libertação. A práxis que busca a libertação inte-gral tem como momento material e objetivo a satisfação das necessidades das vítimas; a transformação do sistema e a gera-ção de uma nova institucionalidade devem ter como objetivo possibilitar a vida e evitar a morte.55

A tomada de consciência da vítima para gerar uma comuni-dade e constituir-se em uma subjetividade emergente que gera “novos direitos” tem como momento inicial o enfrentamento ante a morte. Se o aprendizado da razão meio-fim é descrito como uma aprendizagem de prova e erro, em troca a aprendizagem da racionalidade produtiva é diferente. Assinala Hinkelammert que é uma aprendizagem que se enfrenta a morte para evitá-la; busca evitar a derrubada de todos os fins com a morte. Perse-gue-se afirmar a vida e então o esforço de evitar aquilo que ameaça; trata-se de uma aprendizagem negativa. A práxis da libertação surge, neste contexto, como consequência da experi-ência, por parte das vítimas, das distorções que o mercado pro-duz na vida e na natureza. Ademais, a afirmação da vida não é um fim, mas um projeto: o de conservar-se como sujeito que pode ter fins. É assim como se gera uma consciência geradora

54 Idem., p. 57.55 HINKELAMMERT, Franz, Crítica de la razón utópica, op. cit., p. 338.

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de práxis de libertação: “Trata-se de conservar a vida do ator, e não de realizar algum fim positivo mediante uma gama de alter-nativas da ação por provar. Esta aprendizagem na lógica da ra-cionalidade reprodutiva se refere a um futuro desconhecido com a possibilidade do fracasso. Daí que os valores implícitos desta aprendizagem são diferentes: de solidariedade; de respeito à vida própria e a de outros, incluindo a própria natureza; de cui-dado e sabedoria. São valores que relativizam a racionalidade meio-fim e a transformam em racionalidade secundária. Sua re-lativização é, assim mesmo, questão de vida e morte”.56

Apesar de a comunidade de vítimas tomar consciência e se organizar, gerando um consenso para guiar sua práxis (prin-cípio formal), este deve ter como projeto – e por sua vez como limite – o desenvolvimento da vida (princípio material). O sujei-to tem um horizonte objetivo que é de vida e morte.57 Se não contasse com esse horizonte não seria um sujeito vivo; poderia em troca pretender ser um ator da racionalidade meio-fim que não tem como limite a vida e chega a gerar, como temos visto, o suicídio.

Ficar unicamente com o critério da produção da vida, do sujeito vivo, como fundamento de direitos humanos correria o risco, entre outros, de terminar defendendo um individualismo justificador de um egoísmo que afirmasse um imperativo “sal-ve-se quem puder” ou “viva quem pode viver”. Por isso é neces-sário completar este fundamento com o fundamento da alterida-de e da práxis de libertação. Nesse sentido, Hinkelammert assinala que “[o] querer-se salvar não é suficiente, se bem é condição necessária. A partir desta situação, toda relação huma-na tem que ser reenfocada. Não há saída, exceto por um reco-nhecimento mútuo entre sujeitos que, a partir deste reconheci-mento, submetem todo o circuito meio-fim à satisfação de suas necessidades. Caso parte-se deste reconhecimento, é necessá-ria uma solidariedade que só é possível se este a sustenta”.58 O sujeito se faz sujeito pela afirmação da sua vida, mas esta sub-jetividade se complementa com a afirmação da vida do outro.

O outro aparece com claridade nas crises dos sistemas que causam morte: “Surge assim no e ante os sistemas, nos diagra-mas do Poder, nos lugares standard de enunciação, de imedia-to, por ditas situações críticas, o Outro que o sistema, o rosto do oprimido ou excluído, a vítima não intencional como efeito da lógica performativa do todo formal racionalizado, mostrando sua irracionalidade desde a vida negada da vítima”.59

56 HINKELAMMERT, Franz, El sujeto y la ley, op. cit., p. 66-67.57 Cf. Idem., p. 70.58 Idem, pp. 68-69.59 DUSSEL, Enrique, Ética de la liberación, op. cit., p. 523.

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PARTE II

Compreensão complexa dos Direitos Humanos

1. Introdução

A fundamentação dos direitos humanos tem estreita rela-ção com a práxis que se gera. Na realidade, se dá um tipo de círculo hermenêutico donde a fundamentação explica à práxis e, a sua vez, lhe guia e inspira. Em outras palavras, se a FL deseja assumir uma tarefa clássica da filosofia dos direitos humanos como é a construção de uma definição, esta não deve desenvol-ver-se desde um logos a-histórico e abstrato, mas desde um logos histórico. Isto comporta diversas implicações, entre elas a compreensão complexa dos direitos humanos.

Na segunda parte deste texto, buscaremos traçar uma compreensão complexa dos Direitos Humanos, diferenciando-lhe das compreensões simplificadoras que normalmente carac-terizam as correntes hegemônicas do pensamento jurídico. Com efeito, não pretendemos abordar este tema desde o clássico debate entre jusnaturalismo e juspositivismo, mas desde o de-bate entre um paradigma de simplificação e um paradigma de complexidade. Cremos que esta segunda opção é mais radical, pois afinal de contas grande parte das escolas jurídicas domi-nantes se inscrevem no paradigma da simplicidade, e sua ma-neira de compreender direitos humanos terminam cerceando a realidade e a práxis histórica de libertação; por isso, ambas são construções idealistas de direitos humanos apesar de entre elas existirem diversos pontos de oposição.

Direitos humanos devem compreender-se desde uma pers-pectiva que permita serem ferramentas de libertação dos povos e sujeito que se encontram nas periferias. Neste sentido, uma tarefa importante da FL se refere ao âmbito do conhecimento, pois, como assinala Santos, “construir uma concepção de direi-tos humanos pós-imperial intercultural é primeiramente e antes de tudo uma tarefa epistemológica”.60 Neste contexto é que abordaremos a questão da compreensão complexa dos direitos humanos.

2. Pensamento simplificador vs. pensamento complexo

Desde a FL, a compreensão dos direitos humanos não resi-de primariamente no debate entre o jusnaturalismo e o juspositi-vismo, e sim é mais radical. Logo, tem a ver com assumir uma compreensão complexa em oposição a uma compreensão sim-plificadora. Isto significa não só a construção de uma definição,

60 SANTOS, Boaventura de Sousa, Sociología jurídica crítica, op. cit., p. 533.

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mas a adoção de uma forma de conhecimento. Em outros espa-ços, temos comentado alguns pressupostos epistemológicos da FL que se referem ao logos histórico.61 Um logos que tem como lugar epistemológico a perspectiva do vitimizado, oprimido e ex-plorado, e que realiza uma síntese entre a necessidade de com-preensão e de transformação da realidade histórica.

Dito logos histórico em relação com a compreensão de di-reitos humanos nos leva a assumir sua complexidade em função das implicações que tem na realidade histórica e na práxis de libertação. Se a ideia de uma compreensão complexa em oposi-ção a uma compreensão simplificadora a tomamos de Edgar Morin, cremos que no geral coincide com as implicações e con-sequências de assumir os fundamentos da FL no conhecimento de direitos humanos.62

A partir do sujeito vivo, do sujeito da práxis e do sujeito in-tersubjetivo não se pode compreender direitos humanos, nem defini-los ou conceituá-los, desde uma epistemologia que con-duza à simplificação. Não obstante, as filosofias dominantes do direito se inscrevem na epistemologia hegemônica do Ocidente, que busca ideias claras e distintas, como bem descreve Morin:

“Vivemos sob o império dos princípios de disjunção, re-dução e abstração, cujo conjunto constitui o que chamo de ‘paradigma da simplificação’. Descartes formulou esse paradigma mestre do Ocidente, desarticulando ao sujeito pensante (ego cogitans) e a coisa extensa (res extensa), ou seja, filosofia e ciência, e postulando como princípio de verdade as ideias ‘claras e distintas’, vale dizer, ao pensa-mento disjuntor mesmo.”63

Neste contexto, para Morin, “é complexo aquilo que não pode resumir-se em uma palavra mestre, aquilo que não pode reverter-se em uma lei, aquilo que não pode reduzir-se a uma ideia simples”.64 Daí que se fale de uma oposição entre um pen-samento simplificador e um pensamento complexo. Por um la-do, o pensamento simplificador busca isolar o que o separa e oculta tudo o que religa e interatua. Mediante processos de abstração e idealização, se reduz a complexidade à realidade, simplificando-lhe para poder abarcá-la e compreendê-la. Des-de este paradigma se ordena, hierarquiza e conceitua como meios para chegar, supostamente, à realidade. São processos

61 Cf. ROSILLO MARTÍNEZ, Alejandro, Praxis de liberación y derechos humanos, UASLP-CEDH, San Luis Potosí, 2008.

62 Por exemplo, tanto Morin como Ellacuría criticam as posturas idealistas do conhecimento que desconhecem a materialidade da história. Cf. ELLACURÍA, Ignacio, Filosofía de la realidad histórica, op. cit.; MORIN, Edgar, El paradigma perdido. Ensayo de bioantropología, Trad. Domènec Bergadè, Kairós, Barcelo-na, 2005.

63 MORIN, Edgar, Introducción al pensamiento complejo, Trad. Marcelo Pakman, Gedisa, Barcelona, 2005, p.

64 Idem., p. 21.

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úteis para desenvolver o conhecimento, mas se desconhece o que se elimina, e o que se acrescenta, se absolutiza.

Ao isolar os objetos de seus ambientes, o pensamento sim-plificante é mutilador. Na realidade, é um pensamento que não corresponde com a práxis histórica de libertação dos povos, pois um pensamento que mutila conduz irremediavelmente a ações mutiladoras, a uma práxis débil e incompleta. Mas também pode gerar práxis de morte que se veem justificadas por esse mesmo pensamento simplificante, pois o uso das ideias como oculta-mento da realidade é uma de suas consequências: “A patologia da ideia está no idealismo, onde a ideia oculta a realidade que tem por missão traduzir, e se toma como única realidade”.65

O pensamento simplificante não é capaz de conceber o uno e o múltiplo; suas opções se reduzem a unificar abstrata-mente anulando a diversidade ou, pelo contrário, justapondo a diversidade sem conceber a unidade. Por isso, assinala Morin, “haveria que substituir ao paradigma da disjunção/redução/uni-dimensinalização por um paradigma de distinção/conjunção que permita distinguir sem desarticular, associa sem identificar ou reduzir”.66 Por sua parte, o pensamento complexo busca prestar contas das articulações entre domínios disciplinários quebrados pelo pensamento desagregador, que é um dos principais aspec-tos do pensamento simplificador; intenta, pois, gerar um conhe-cimento multidimensional.

3. Pensamento simplificador de direitos humanos

O pensamento jurídico hegemônico, como temos insistido, se inscreve no paradigma da simplificação. Durante a Moderni-dade, o pensamento simplificador, ao ser um dos pilares da regulação, negou a diversidade da juridicidade, na busca de se-gurança e ordem que pretende outorgar à dogmática e à lógica-formal cartesiana. Esta simplificação da vida jurídica tem impor-tantes consequências no pensamento relativo aos direitos humanos (etnocentrismo, idealismo, negação da histórica, etc.), mas falando especificamente de sua compreensão, o intento do pensamento jurídico de gerar um conceito ou uma definição ex-pressada em uma “ideia distinta”, mais que uma melhor prote-ção à dignidade do ser humano, traz como consequência uma mutilação da realidade e desconhece a materialidade da práxis histórica. Encerra estes direitos em um idealismo que desco-nhece diversas parcelas da realidade e, portanto, impõe a ideia por cima dos fatos. Fariñas expressa da seguinte maneira a sim-plificação que realiza o pensamento jurídico moderno:

65 Idem., p. 34.66 Idem., p. 34.

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A racionalidade jurídica moderna, sobre a qual se assenta a construção teórica dos direitos humanos, está presidida pelo paradigma da ‘simplicidade’, na qual contribuiu, me-diante o pressuposto epistemológico da reductio ad unum, para o ocultamento e a ‘hipersimplificação’ da pluralidade, a diversidade e a complexidade ontológicas das socieda-des e dos processos sociais concretos. Segundo aquele, a única fonte dos direitos e obrigações se encontra na pró-pria razão do indivíduo, o qual determina o valor universal do sistema jurídico moderno embasado na primazia do in-divíduo, cuja consequência é a simplificação do Direito.67

Por outro lado, Sánchez Rubio assinala distintos planos on-de se observam as consequências simplificadoras e desagrega-doras do pensamento moderno68 no âmbito jurídico, a saber:

a) Reduz-se o direito ao direito estatal, assumindo o monis-mo jurídico e ignorando outras expressões jurídicas não estatais (pluralismo jurídico). Neste sentido, como herança do positivis-mo do século XIX, se acredita que o direito é norma ou institui-ção, e se termina absolutizando a lei do Estado. Ademais, se reduz o saber jurídico à pura lógico-analítica, ignorando as cone-xões entre o jurídico, o ético e o político.

b) Separa-se sem capacidade autocrítica o âmbito do públi-co e do privado; o âmbito do jurídico e do político, das relações de poder e do ético; a prática e a teoria na matéria de direitos humanos; a dimensão pré-violatória da pós-violatória de direitos humanos.

c) Abstrai-se o mundo jurídico do contexto sociocultural em que se encontra e pelo que está condicionado. Esvazia-se e se desloca o humano, o corporal, o físico, e se substitui o ser huma-no real por seres sem atributos e atributos descontextualizados.

Nestas consequências do pensamento simplificador se mostram, é claro, enquanto a compreensão dos direitos humanos. Vejamos alguns casos.

Um exemplo da imposição do paradigma da simplificação é a problematização que se leva a cabo em respeito ao uso do termo “direitos humanos”. Sem dúvida, este termo não é fácil de definir, nem tampouco é simples e claro, pois seu uso tem a ver com diversas parcelas da realidade humana. A pretensão do pensamento simples é assumir esta dificuldade como um aspecto negativo a eliminar, acusando os “direitos humanos” de ser um conceito ambíguo e manipulável. Por exemplo, Ma-nuel Atienza assinala que “direitos humanos” é um termo: A)

67 FARIÑAS DULCE, José María, Los derechos humanos: desde la perspectiva so-ciológico-jurídica a la “actitud postmoderna”, Instituto Bartolomé de las Casas/Dikinson, Madrid, 2006, p. 27.

68 Cf. SÁNCHEZ RUBIO, David, “Desafíos contemporáneos del derecho: diversi-dad, complejidad y derechos humanos” en Revista del Instituto de Investiga-ciones Jurídicas, No. 17, UASLP, San Luis Potosí, 2010, pp. 15 y ss.

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Ambíguo por apresentar-se entre o direito e a moral. B) Vago intencionalmente porque não é possível encontrar uma série de notas que definam todas as situações em que se fala de “direitos humanos”; e extensionalmente, porque não existe um acordo sobre a extensão do catálogo de direitos. C) Afetado “de uma carga emotiva tão poderosa que em muitas ocasiões (...) não tem significado descritivo algum. Utilizar a linguagem dos direitos humanos é, como todos sabemos e alguns põem em prática, um recurso tentado para tratar de justificar qual-quer tipo de situação”.69

Ou seja, se assume a complexidade como algo negativo que se deve buscar eliminar a favor da claridade e da distinção, apesar de que isso signifique a mutilação da realidade; aqui se aplica a crítica que realiza Morin ao pensamento simplificador: “A complexidade não seria algo definível de maneira simples pa-ra tomar o lugar da simplicidade. A complexidade é uma palavra problema e não uma palavra solução”.70 Assumir a complexida-de dos direitos humanos não significa uma solução ou uma pa-lavra final sobre quais são os direitos humanos e definir seu exa-to conteúdo, pois sua compreensão tem que ser aberta à novidade da práxis histórica de libertação.

Não se trata de crítica a qualquer ideia clara e distinta, mas somente àquelas que mutilam a realidade e desconhecem os processos reais da práxis histórica; e neste caso cremos que se encontram “direitos humanos”. A complexidade não conduz a eliminação da simplicidade, mas aparece quando o pensamento simplificado falha. O pensamento complexo deve integrar em si mesmo tudo aquilo que põe ordem, claridade, precisão e distin-ção no conhecimento. Na realidade, “há que estar sempre alerta e ser consciente de que se elimina e se acrescenta a realidade, sem anular sua riqueza, sem fragmentá-la nem perder a pers-pectiva contingente de sua totalidade e a localização que nela temos os seres”.71 A respeito, Morin explica:

“Enquanto o pensamento simplificador desintegra a com-plexidade do real, o pensamento complexo integra o mais possível os modos simplificadores de pensar, mas recha-çam as consequências mutilantes, reducionistas, unidi-mensionalizantes e finalmente cegadas de uma simplifica-ção que se toma por reflexo daquilo que teve de real na realidade.”72

Os possíveis problemas gerados pela vagueza do conceito “direitos humanos”, por sua ambiguidade, ou por sua alta carga

69 Cf. ATIENZA, Manuel, Introducción al derecho, Barcanova, Barcelona, 1989, p. 171.

70 MORIN, Edgar, Introducción al pensamiento complejo, op. cit., p. 22.71 SÁNCHEZ RUBIO, David, Contra una cultura anestesiada de derechos humanos,

UASLP-CEDH, San Luis Potosí, 2007, p. 43.72 MORIN, Edgar, Introducción al pensamiento complejo, op. cit., p. 22.

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emotiva não se solucionam através da mutilação da realidade e de desconhecer as práxis históricas de libertação dos povos. Devemos assumir a complexidade dos direitos humanos e aprender a conhecê-la; como disse Morin, não é questão de as-sumir a ambição do pensamento simples de controlar e dominar o real, mas de exercitar-se em um pensamento capaz de tratar, de dialogar, de negociar, com o real.73

Por exemplo, a ideologização dos direitos humanos não se deve exclusivamente à manipulação de sua alta “carga emoti-va”, nem à sua “ambiguidade”, pois também uma ideia clara e distinta pode ter a mesma finalidade74; por isso, o pensamento complexo deve propor métodos capazes de revelar tais usos ideológicos.

Em uma preocupação semelhante à de Atienza, podemos localizar a opinião de Francisco Laporta. Este autor assinala que detecta dois fenômenos com respeito ao conceito de direitos humanos.

Por um lado, dá conta de um crescimento enquanto seu conteúdo, ao grau de que se fale de novas gerações; observa que daqueles direitos do cidadão se tem expandido o uso dos “direitos humanos” até incluir direitos com conteúdo econômico, relacionado com as novas tecnologias ou em função do cuidado do meio ambiente. Por outro lado, assinala a existência de um poderoso uso dos direitos humanos como últimos escalões nos sistemas jurídicos e morais que se conformam como exigências jurídicas, políticas e morais fundamentais, cujo conteúdo se tor-na inegociável. Frente a esta situação, afirma que “ambas as coisas tendem a ser incompatíveis. Parece-me razoável supor que quanto mais se multiplique a nômina dos direitos humanos menos força terá como exigência, e quanto mais força moral ou jurídica se lhes suponha, mais limitada há de ser a lista de direi-tos que a justifiquem adequadamente”.75

O autor busca superar este suposto paradoxo ao realizar “uma indagação conceitual suficientemente rigorosa”, a que rea-liza através da análise dos caracteres que considera se predi-cam usualmente aos direitos humanos: universais, absolutos e inalienáveis.

A postura de Laporta é um exemplo de que certos jusnatu-ralismos se localizam no pensamento simplificador. Podemos assinalar que seu artigo em comentário contém importantes tra-

73 Ibidem.74 Como apontado por Joaquín Herrera, o pensamento abstrato de direitos hu-

manos faz com que “o conhecimento seja relegado a uma casta que sabe o que é universal ou que define os limites do particular”. (HERRERA FLORES, Joaquín, “Hacia una visión compleja de los derechos humanos” en Joaquín Herrera (Ed.), El vuelo de Anteo. Derechos humanos y crítica de la razón libe-ral, Desclée de Brouwer, Bilbao, 2000 p. 70).

75 LAPORTA, Francisco, “Sobre el concepto de derechos humanos” en Doxa, no. 4, 1987, p. 23.

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ços desta corrente, como o seguinte: “[...] se admitimos o traço de universalidade então temos que sacar os direitos humanos fora do âmbito do sistema jurídico positivo. Porque, na realidade, não falamos de direitos que uns têm e outros não têm em função do sistema jurídico em que vivam”.76 Na realidade, apesar de o autor não realizar a simplificação dos direitos humanos própria do positivismo – ou seja, através do monismo jurídico –, sua contradição mais radical deriva de que reconhece a complexida-de dos direitos humanos, mas a assume como um problema que intenta resolver através da simplificação. Ou seja, reconhece a complexidade histórica e práxica dos direitos humanos, por exem-plo, quando afirma que é uma categoria linguística complexa77, mas anula esta complexidade ao mutilar a realidade e reduzir di-reitos humanos ao cânone liberal e eurocêntrico, e predicá-los como universais, absolutos e inalienáveis desde essa compre-ensão. Neste sentido, concebe a universalidade desde uma pos-tura clássica do pensamento simplificador, que a constrói em referência ao sujeito abstrato, alheio a seu contexto, de sua prá-xis, de sua intersubjetividade e das suas condições concretas de acesso aos bens para produzir e reproduzir sua vida.

Se Laporta vê como incompatíveis o aumento do conteúdo dos direitos humanos com sua força moral e política é porque, ao intentar simplificá-los, os nega como produtos da práxis his-tórica da libertação. Quando fala da inalienabilidade dos direitos humanos desconhece a intersubjetividade, reduzindo o sujeito ao indivíduo abstrato, e por isso contorna a práxis e as lutas dos povos por lograr que os direitos sejam meio para a satisfação das suas necessidades de vida. As afirmações deste autor fa-zem pensar que os direitos humanos são entidades alheias à história, construídas abstratamente por uma razão privilegiada e que pouco ou nada tem a ver com a práxis de libertação. Nesse sentido, afirma:

“Os direitos humanos, como (…) são ‘inalienáveis’, se lhes adscreve ao indivíduo à margem de seu consentimento, ou contra ele, e se imuniza moralmente inclusive frente à sua própria vontade. Isso quer dizer que esses ‘bens’ cuja importância é tal que subministram razões suficientes para uma proteção normativa tão relevante que lhe são atribuí-dos a cada um ineludivelmente. E isso abona minha sus-peita de que ampliar mais e mais os catálogos de direitos humanos é incompatível com a maioria dos traços que se predicam deles.”78

76 Idem., p. 32.77 Cf. Idem., p. 32.78 Idem., p. 44.

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A preocupação da ampliação do catálogo de direitos huma-nos é própria do pensamento simplificante, pois ignora que essa “ampliação” é consequência da complexidade do real.

Estabelecer um catálogo restritivo dos direitos humanos é, por geral, produto de um pensamento idealista e simplifican-te, que desconhece os “novos direitos” que produz constante-mente o sujeito vivo, práxico e intersubjetivo79; de um pensa-mento hegemônico que tem temor à novidade histórica; de um pensamento que, em busca de segurança e ordem, opta por cercear a realidade e desconhecer os diversos reclamos e prá-xis que geram os povos a quem se lhes negam o acesso aos bens para a produção e reprodução de sua vida. Este acesso não está em função da amplitude do catálogo de direitos, mas sim de que esses direitos respondam efetivamente às suas lu-tas de libertação.80

Poderíamos dar mais exemplos de posturas simplificantes na visão dos direitos humanos, mas cremos que as anteriores bastam. As visões simples de direitos humanos funcionam final-mente como padrão de medida e de exclusão; sempre haverá algo ou alguém que ficará marginalizado da análise e da prática por não responder a esse padrão. Tanto as posturas jusnatura-listas como as juspositivistas são excludentes e simplistas, seja porque colocam os direitos humanos em um plano de abstração alheio à história e às práxis concretas de libertação, ou porque reduzem o direito às normas criadas pelo estado, negando a capacidade criadora de juridicidade das pessoas e dos povos. Na realidade, a compreensão complexa evita tanto a naturaliza-ção como a estatização, como bem assinala Herrera Flores:

79 De fato, em resposta a seus críticos, Laporta disse: “O que eu não tenho tanta certeza assim é se é necessário ‘novos’ direitos humanos para lidar com essas realidades”. (LAPORTA, Francisco, “Respuesta a Pérez Luño, Atienza y Ruiz Manero” en Doxa, no. 4, 1987, p. 74).

80 Nós poderíamos classificar de idealista a postura de Laporta quando ele diz: “Supondo que os direitos humanos são direitos morais e não podem ser outra coisa, meu argumento é hipotético: Se você mantém que os direitos humanos são direitos universais, direitos moralmente fortes e direitos inalienável, então não podemos pensar que a sua folha de pagamento está constantemente a aumentar com o ritmo dos tempos, e, em particular, não podemos nos dar ao luxo de assumir que se reproduzem em ‘gerações’ com certa rapidez sem por gravemente em questão que são direitos fortes e para todos sem exceção. Pelo menos, não consigo pensar em um mundo pobre e superpovoado como o nosso. Os direitos humanos, nesse caso, devem ser poucos para muitos e não muitos para poucos e a teoria da “gerações” desemboca com certeza nessa segunda possibilidade” (LAPORTA, Francisco, “Respuesta a Pérez Luño, Atienza y Ruiz Manero”, op. cit., p. 74). O acesso limitado a bens para a pro-dução de acesso a vida não está no âmbito do catálogo de direitos, mas em grande parte das estruturas neocoloniais que apoiam a atual fase do capita-lismo global. Neste contexto, os direitos humanos devem basear-se, como já enfatizado, nos processos de libertação do povo dessas estruturas opressivas. Além disso, você corre o risco de que esses poucos direitos que está falando Laporta sejam os direitos individuais do liberalismo eurocêntrico.

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Esta perspectiva deve sempre estar atenta contra os pe-rigos de uma interpretação que naturalize o fenômeno a estudar separando-lhe de sua história, o que lhe estatize eliminando as dimensões políticas ou ideológicas do mes-mo, as quais deverão ser implícita o explicitamente recu-sadas, mas nunca abolidas. O discurso teórico estatizado e naturalizado configurará uma imagem extra-histórica do fenômeno, situando-lhe aparentemente na margem dos conflitos e das diferentes posições de poder.81

Por outro lado, não basta assinalar que os direitos huma-nos têm uma dimensão axiológica, pois se corre o risco de se-guir simplificando. O problema dos valores não é uma questão meramente teórica, mas que tem que localizar-se, ademais, no campo da luta ideológica e dos sistemas políticos.

O sujeito de direitos humanos também é submetido à sim-plificação. A “subjetividade” do pensamento jurídico hegemônico tem sido a do sujeito abstrato, que não assume cabalmente o sujeito intersubjetivo, o sujeito vivo nem o sujeito da práxis, que temos referido ao analisar o fundamento de direitos humanos. Em diversas doutrinas jusfilosóficas tão alheias em outras coi-sas82, o “subjetivo” não é em referência o sujeito como ser corpo-ral – que requer bens para produzir e reproduzir sua vida, que se constrói junto com outros, e que com sua práxis responde ao poder do real –, mas que se “predica dos devaneios, preferên-cias, desejos, enfim, do âmbito de uma fantasia que se assume como irrealidade”.83

Por isso, ao final do caminho, emerge nestas teorias um sujeito abstrato que faz eleições irreais, embora as mesmas teorias construam estes sujeitos abstratos partindo do suposto de que os sujeitos corporais não podem realizá-las através de um juízo racional.

Desde o paradigma da simplicidade, a práxis do sujeito cor-poral, real e concreto para produzir e reproduzir a sua vida é declarada irracional, e se nega sua supremacia crítica a partir da qual se deveriam verificar direitos humanos e o direito geral. Re-duz-se a pessoa a um centro de imputação de direito e deveres;

81 HERRERA FLORES, Joaquín, “Hacia una visión compleja de los derechos huma-nos”, op. cit., p. 48.

82 São os casos paradigmáticos de Hans Kelsen e John Rawls. Por exemplo, o primeiro se pergunta em que consiste a situação objetiva que a teoria tradicio-nal caracteriza dizendo que a ordem jurídica confere ao homem, ou a alguns homens, a personalidade jurídica, ou seja, a qualidade da pessoa. (KELSEN, Hans, Teoría pura del derecho, Trad. Eduardo García Máynez, Editora Nacio-nal, México, 1965, pp. 182-183). Entretanto, sabe-se a hipótese de trabalho de John Rawls, que remove o contexto ea identidade da pessoa como sujeito de justiça e direitos (RAWLS, John, Teoría de la justicia, Trad. María Dolores González, FCE, México, 2002, p. 25).

83 SOLÓRZANO, Norman, Marcos categoriales del pensamiento jurídico moderno” en Jesús Antonio de la Torre Rangel (Coord.), Derecho alternativo y crítica jurídica, UAA-ITESO-Porrúa, México, 2002, p. 118.

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então os direitos não postulam referências a algum sujeito vivo, nem de sua práxis na realidade histórica, mas se cai em um so-lipsismo normativo, onde a norma é só aquela definida pela mesma norma. O sujeito corporal desaparece porque sua práxis é complexa, e a abstração requer simplificá-lo, seja através de uma norma ou de uma hipótese baseada em um “véu de igno-rância”. O pensamento abstrato mutila a pessoa, ao deixá-la só referida a norma e definida pela norma mesma. Como faz notar Solórzano, o pensamento jurídico deste tipo termina comportan-do-se de maneira semelhante à teoria econômica neoliberal na análise que dela faz Hinkelammert.84

Esta abstração do sujeito de direito leva as posturas positi-vistas a cair, como assinalamos, em um solipsismo normativo. Tudo se pensa desde as normas, desde dentro do sistema, e o sujeito é só um elemento mais criado por alguma norma: a dispo-sição que o faz centro de imputação de direitos e obrigações.

Neste sentido, estas teorias jurídicas vinculadas ao solip-sismo normativo não logram explicar, pois não têm espaço para isso, fenômenos constitutivos da complexidade de direitos hu-manos: a luta social, a resistência à lei para aceder a bens que a sua vez cumprem com a satisfação do que se predica como direitos humanos, a emergência dos novos sujeitos sociais, as tramas sociais e a distribuição de poder, etc.

Assim, por exemplo, as práxis de libertação dos povos opri-midos costumam colocar um especial interesse nos chamados direitos sociais, econômicos e culturais; pois bem, como faz nota Joaquín Herrera, esses tipos de direitos costumam ser relega-dos pelo pensamento simplificador, pelo fato de não serem “pu-ros”.85 Daí que as práticas populares para fazer-se dos bens re-lacionados com este tipo de direitos evitados pelo pensamento jurídico hegemônico, por considerar-lhes fora do jurídico, e mais bem realidades políticas ou econômicas. Assim, estas posturas negam a complexidade do real onde atua o verdadeiro sujeito, o sujeito corporal.86

Mas não só o pensamento jurídico expressado no jusnatu-ralismo ou juspositivismo comporta simplificar os direitos huma-nos. Por outro lado, Joaquín Herrera assinala que no mundo contemporâneo a polêmica dos direitos humanos se centrou em duas visões, duas racionalidades e duas práticas: a visão abs-trata e a visão localista. Apesar de que esta classificação é limi-tada – pois a discussão sobre os direitos humanos pode ser mo-tivo de outras classificações –, serve este autor para defender a necessidade de uma compreensão complexa de direitos huma-

84 Cf. HINKELAMMERT, Franz, Yo soy, si tú eres. El sujeto de los derechos huma-nos, Centro de Estudios Ecuménicos-Dríada, México, 2010.

85 Cf. HERRERA FLORES, Joaquín, “Hacia una visión compleja de los derechos humanos”, op. cit., p. 30.

86 FARIÑAS DULCE, José María, Los derechos humanos, op. cit., p. 32.

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nos. Assinala que a primeira visão se encontra vazia de conteú-dos e referências às circunstâncias reais das pessoas e centra-da em torno da concepção ocidental do direito e do valor da identidade, enquanto na segunda predomina o próprio por cima dos demais, centrando-se em uma ideia particular de cultura e valorizando a diferença; o problema surge quando cada uma destas visões se defende por seu lado e tende a considerar infe-rior ou a desdenhar o que a outra propõe.87 Finalmente, ambas as posturas desconhecem parcelas da realidade que devem considerar nas lutas de libertação dos povos.

Uma visão complexa pretende assumir a racionalidade do sujeito vivo, que ao ser vítima de um sistema, exerce uma prática de libertação. Por isso, como assinala Herrera, com esta visão se pretende “superar a polêmica entre o pretendido universalismo dos direitos e a aparente particularidade das culturas”.88

E isto porque ambas as posturas terminam ontologizando e dogmatizando seus pontos de vista e não relacionam seus postulados e propostas com os contextos reais. Afinal, condu-zem a posturas idealistas, que negam de uma ou outra forma a materialidade da história. Seja excluindo da história aos direitos humanos, ou inserindo-os em uma concepção idealista ou está-tica desta.

Frente à hegemonia de um pensamento simplificante de direitos humanos, seja em sua perspectiva jusnaturalista ou jus-positivista, universalista ou culturalista, a FL deve optar por cons-truir uma compreensão complexa de direitos humanos. Porém não só como um mero exercício intelectual, mas por responder efetivamente a perspectiva das vítimas e para que direitos hu-manos signifique uma ferramenta de libertação.

4. Recuperação da complexidade dos direitos humanos

Diversos autores relacionados com os processos emanci-patórios de povos ou sujeitos oprimidos pelas atuais estruturas da globalização capitalista, vinculados expressamente ou não ao pensamento da libertação, destacaram a importância de transcender de uma visão simplificadora dos direitos humanos para uma complexa.89

A práxis de libertação que tem efetuado diversos sujeitos nos últimos tempos mostra que o pensamento simplificante do direito não dá conta cabalmente da realidade. Por isso se viu obrigado a abrir-se à complexidade, a recuperar sua conexão

87 HERRERA FLORES, Joaquín, “Hacia una visión compleja de los derechos huma-nos”, op. cit., p. 68.

88 Ibidem.89 SENENT, Juan Antonio, Problemas fundamentales de los derechos huma-

nos…, op. cit., p. 29; SÁNCHEZ RUBIO, David, “Desafíos contemporáneos del derecho…”, op. cit., p. 19.

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com a realidade, e daí que Boaventura de Sousa Santos assina-le que atualmente “o direito, que reduziu sua complexidade da vida jurídica à segurança da dogmática, redescobre o mundo fi-losófico e sociológico em busca da prudência perdida”.90 Como temos dito, a FL opta por uma concepção ampla e não fragmen-tada da práxis, o que aplicado aos direitos humanos leva a recu-perar essa complexidade perdida a que se refere o professor da Universidade de Coimbra.

Uma visão complexa dos direitos humanos busca não mu-tilar o humano; parte do sujeito vivo e o mantém como seu ponto crítico. Não cai no solipsismo normativo, nem no formalismo, mas aborda direitos humanos desde as diversas parcelas da re-alidade histórica onde incidem. Isto porque são momentos da práxis de libertação dos seres humanos que se constituem como sujeito no encontro com outros sujeitos e com o mundo, em bus-ca de produzir, reproduzir e desenvolver suas vidas.

A compreensão complexa dos direitos humanos está em função de uma teoria crítica destes. Se entendemos por teoria crítica, entre outras coisas, “toda teoria que não reduz a ‘realida-de’ ao que existe”91, então as visões simplificadoras dos direitos humanos não podem ter este caráter. Sua pretensão de eliminar com precisão e com claridade os direitos humanos implica pen-sar a realidade somente ao que existe. Ou seja, uma visão com-plexa está em função de abrir o pensamento para valorizar as alternativas ao dado empiricamente. Direitos humanos deve ser motivo, mais que de conformidade com um “sistema constitucio-nal de direitos”, de incomodidade, de inconformismo e de indig-nação frente às realidades que devem ser transformadas e superadas.

Optar por uma compreensão complexa de direitos huma-nos tem algumas implicações, se deseja servir para um pensa-mento crítico e de libertação.92 A seguir reflexionaremos breve-mente sobre isso.

4.1. Construir a pluralidade cultural dos direitos humanos

Uma compreensão complexa deve possibilitar superar o monoculturalismo e assumir o pluralismo cultural. Desde os cri-térios da práxis, a intersubjetividade e a vida, a FL pode construir esta pluriversalidade de direitos humanos; a visão complexa de-ve permitir o encontro com o outro, e construir seu conceito des-de essa abertura. Por isso, deve ser uma visão capaz de com-preender os diversos processos de cada cultura que vão

90 SANTOS, Boaventura de Sousa, Una epistemología del sur, Siglo XXI-Clacso, México, 2009, p. 48.

91 SANTOS, Boaventura de, Crítica de la razón indolente. Contra el desperdicio de la experiencia, Desclée de Brouwer, Bilbao, 2000, p. 23.

92 Parte destas implicações foram tomadas da considerações que Boaventura de Sousa Santos realiza sobre a teoria crítica (SANTOS, Boaventura de, Crítica de la razón indolente, op. cit., pp. 31 y ss.).

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encaminhados a potencializar a práxis humana com o fim de estabelecer as condições para produção e reprodução da vida.

O problema da pluriculturalidade e dos direitos humanos tem sido analisado desde diversas correntes do pensamento crí-tico. Santos estabelece certas premissas necessárias para um diálogo intercultural; são premissas que devem assumir uma concepção complexa93:

a) Transcender o debate sobre o universalismo e o relativis-mo cultural: é um debate falso que prejudica o uso libertador dos direitos humanos. O universalismo deve ser superado por diálo-gos transculturais sobre preocupações isomórficas, e o relativis-mo deve ser superado desenvolvendo critérios procedimentais transculturais para distinguir a política progressista da conserva-dora, o apoderamento do desapoderamento, a emancipação da regulação.

b) Todas as culturas possuem ideias sobre a dignidade hu-mana, mas nem todas concebem como equivalente aos direitos humanos.

c) Todas as culturas são incompletas e problemáticas em suas concepções da dignidade humana.

d) Nenhuma cultura é monolítica e, portanto, dentro delas mesmas existem diversas versões da dignidade humana.

Uma ideia que pode ser retomada pela FL para reflexão sobre a pluriculturalidade de direitos humanos é critério de ri-queza humana expressada por Joaquín Herrera Flores. Este critério se refere à possibilidade de reação que toda pessoa possui frente ao entorno de relações em que se encontra, na busca de ter acesso aos bens propícios para uma vida digna. Para que direitos humanos sejam instrumentos através dos que se possa levar a cabo este critério, não se deve universalizar uma concepção deles ou manter que todas as visões e práticas são igualmente válidas. Ou seja, nem o universalismo nem o relativismo são próprios de um pensamento complexo; ambas as posturas simplificam a realidade histórica em que se desen-volvem direitos humanos.

Em primeiro lugar, se devem considerar os direitos huma-nos como produtos culturais, e que não são, portanto, algo pré-vio à práxis histórica. Ambos, tanto direitos humanos como prá-xis, vão de mão na construção das condições sociais, culturais, econômicas e políticas que propiciam o desenvolvimento das capacidades humanas e o acesso aos bens adequados para eles. Por isso, se deve rechaçar qualquer universalismo que im-ponha a priori o conteúdo dos direitos, como se eles pretendes-sem ser o padrão de medida para uma humanidade perfeita. Em troca, devem ser vistos como produtos das lutas culturais, so-

93 Cf. SANTOS, Boaventura de Sousa, Sociología jurídica crítica, op. cit., pp. 517-518.

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ciais, econômicas e políticas que buscam a transformação das relações de poder para gerar um acesso igualitário aos bens para produção da vida.

É necessário que a visão complexa dos direitos humanos esteja aberta à criatividade pluricultural; que possibilite que ou-tros grupos humanos, outros coletivos e outras comunidades sejam capazes de criar seus próprios procedimentos e institui-ções sociojurídicas encaminhados à emancipação; que podem recriar direitos humanos para satisfazer suas necessidades de vida desde suas próprias circunstâncias e tramas sociais. Ou seja, que podem criar “outro conjunto de ficções e supostos, favoráveis agora, não só a uma classe social, a que triunfa com as revoluções burguesas, mas aos coletivos tradicionalmente marginalizados da ficção hegemônica: indígenas, imigrantes, mulheres...”.94

Mas a complexidade dos direitos humanos não significa fo-mentar o relativismo cultural ou culturalismo. Estas posturas cor-rem os mesmo riscos que o universalismo, ao absolutizar uma perspectiva e simplificar a realidade a uma só visão. Esquecem-se de que dentro da complexidade da realidade histórica, as cul-turas são incompletas, ademais que todas estão afetadas por condições materiais. Ou seja, o culturalismo conduz a um novo idealismo simplificador quando crê que tudo é cultura, passando por alto as relações que estão estritamente marcadas pela ma-terialidade da história.95

Para que a visão complexa dos direitos humanos realmente assuma a pluralidade cultural do mundo, é necessário compre-ender que os processos culturais não fundam a realidade, mas que se encontram e são parte dela. O que a cultura outorga ao sujeito é um instrumental simbólico que permite à riqueza huma-na reagir frente determinada configuração e tramas sociais. Neste sentido, uma primeira aproximação a uma compreensão complexa os veria como “processos de abertura e consolidação da luta por diversas formas de entender a dignidade huma-na”.96 Assim, não se compreenderiam como “dados básicos do real” alheios aos processos históricos, mas que se colocaria ên-fase em seu caráter processual. Rechaça-se então um conceito universal de dignidade humana, mas não em função de defen-der um relativismo ético. Antes se opta pela construção de uma “pluriversalidade”, como já se disse, onde desde a cultura ou desde cada encontro intercultural se geram processos de luta por instaurar condições materiais que tornem possível a produ-ção e reprodução da vida.

94 HERRERA FLORES, Joaquín, Los derechos humanos como productos cultu-rales. Crítica del humanismo abstracto, Catarata, Madrid, 2005, p. 208.

95 Idem., p. 128.96 SÁNCHEZ RUBIO, David, “Desafíos contemporáneos del derecho…”, op. cit.,

p. 20.

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Apesar do critério de riqueza humana nos possibilitar com-preender a capacidade do ser humano para constituir-se em su-jeito da práxis, na luta por criar as condições que permitam a todo ser humano viver com dignidade, fica a dúvida do que en-tender por dignidade humana em um contexto de pluralismo cul-tural. A respeito Boaventura de Sousa Santos se faz a pergunta de por que há tantos princípios diferentes em torno da dignidade humana – todos com pretensão de serem únicos – e por que às vezes são contraditórios entre si. Chega à conclusão, como já mencionamos, de que “as culturas possuem ideias sobre a dig-nidade humana, mas não todas concebem a dignidade humana como equivalente aos direitos humanos. É, portanto, importante buscar preocupações isomórficas entre diferentes culturas”.97 Propõe então uma concepção mestiça de direitos humanos, que, em vez de recorrer a falsos universalismos, se organiza a si mesma como uma constelação de significados locais e mutua-mente inteligíveis.

Dita concepção mestiça de direitos humanos – que é parte de uma compreensão complexa destes – se gera pelo intercâm-bio entre universos de significados diferentes. Os topoi são “lu-gares comuns retóricos amplamente estendidos de uma deter-minada cultura, autoevidentes, e que, portanto, não são objetos de debate. Funcionam como premissas para a argumentação, possibilitando desta maneira a reprodução e intercâmbio de ar-gumento”.98 Para compreender os topoi forte de uma cultura à outra, Santos propõe uma hermenêutica diatópica. Esta se em-basa na ideia de que os topoi de uma cultura são tão incomple-tos como a cultura mesma, sem importar o forte que sejam. Den-tro da mesma cultura não é visível a incompletude dos topoi, pelo que o objetivo da hermenêutica diatópica é conscientizar da incompletude e iniciar o diálogo com outras culturas.99

Santos mostra como desenvolver a hermenêutica diatópica ao relacionar o conceito ocidental de direitos humanos com o dharma da cultura hindu, e a umma da cultura islâmica. Faz no-tar que os três topoi são incompletos e o diálogo entre si os en-riquece. Os direitos humanos se mostram incompletos desde o dharma porque não logram estabelecer um vínculo entre a parte (o indivíduo) e o todo (a realidade); desde o umma, os direitos humanos estão infestados de uma simetria muito simplista e me-cânica entre direitos e deveres, e por isso não é capaz de con-ceber direitos para as gerações futuras, para a natureza ou para os animais, pois eles não têm deveres. Em troca, desde os direi-tos humanos, o dharma é incompleto porque tende a olvidar que o sofrimento humano contém uma dimensão individual irredutí-vel: as sociedades não sofrem, mas os indivíduos sim.

97 SANTOS, Boaventura de Sousa, Sociología jurídica crítica, op. cit., p. 517.98 Idem., p. 518.99 Cf. Idem., p. 518-525.

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Semelhante à proposta de Santos, encontramos a aplica-ção a este problema da hermenêutica analógica proposta por Mauricio Beuchot. A hermenêutica analógica é um intento de su-perar a distinção que se produz entre hermenêuticas de corte univocistas e equivocistas.100 As hermenêuticas univocistas são aquelas que sustentam que há uma só interpretação válida de um texto.101 As hermenêuticas equivocistas, ao contrário, sus-tentam que praticamente todas as interpretações são válidas. À diferença de ambas, uma hermenêutica analógica aceita mais de uma interpretação como válida, mas não todas; há um grupo delas, mas ordenadas segundo uma hierarquia, de modo que haja algumas interpretações melhores que outras, seguindo uma graduação nela que chega num ponto em que já não são adequadas ao texto em questão.

Uma hermenêutica analógica tem como um dos seus efei-tos evitar os inconvenientes de uma interpretação unívoca e de uma equívoca, para tirar proveitos de suas vantagens. Neste sentido, podemos afirmar que a hermenêutica analógica é um desenvolvimento do pensamento complexo. Da hermenêutica unívoca assume que não todas as interpretações podem ser verdadeiras; da hermenêutica equívoca toma a lição de que não só uma pode ser verdadeira. Tem que ser mais uma, mas não todas.102 Para colocar um limite à interpretação se utilizam critérios analógicos. Há um limite analógico para frear a extra-ção de significado de um texto, para que não se volte à explo-ração descontrolada. Há limites sintáticos, semânticos e prag-máticos: o conhecimento do idioma, sua correlação com os significados e o estudo do contexto cultural do autor do texto. É necessário usar o diálogo com os outros membros da comuni-dade de intérpretes que nos rodeiam. A analogia exige o diálo-go, pois se analogiza melhor de maneira comunitária. Em todo caso, o contexto do texto põe limites para a interpretação e evitar, assim, o equivocismo.

Se a hermenêutica analógica trata de evitar o fechamento da univocidade, para permitir e reconhecer a pluralidade, tam-

100 Cf. BEUCHOT, Mauricio, Tratado de hermenéutica analógica. Hacia un nuevo modelo de la interpretación, UNAM-Ítaca, México, 2009, pp. 35 ss.

101 Considerando que, é claro, o texto na sua compreensão mais ampla. A noção de texto evoluiu dentro do campo de hermenêutica. Primeiro foi considerado como o texto escrito, e isso é importante, porque a maioria dos documentos são interpretados. Mas Gadamer expande a noção de texto à fala, conversa ou diálogo, já que se dá a escrita um texto fechado, a conversa é o texto mais aberto, não sabemos bem ao certo onde parar. Ricoeur acrescenta como tex-to a ação significativa, aí está o que pode ser interpretado por antropólogos, psicólogos, sociólogos, historiadores, advogados, etc. Assim, temos uma grande variedade de textos, que são objecto de interpretação e, portanto, da hermenêutica. (Cf. GRONDIN, Jean, Introducción a la hermenéutica, Trad. Ángela Ackermann, Herder, Barcelona, 1999).

102 Cf. BEUCHOT, Mauricio, Compendio de hermenéutica analógica, Torres Aso-ciados, México, 2007, pp. 11-50.

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bém se trata de superar a postura equivocista, que termina facil-mente no relativismo. Assinala Beuchot que a polissemia ou multivocidade pode ser equívoca ou analógica. A equívoca não tem redução nem limites; a analógica é uma pluralidade encurta-da e limitada. É a que se deseja para a hermenêutica analógica. Na realidade, esta hermenêutica aplicada ao tema que nos ocu-pa nos conduz ao pluralismo cultural analógico, o qual privilegia a diferença e trata de proteger o mais possível a identidade das culturas. Mas isto não quer dizer que este pluralismo considere que as culturas são perfeitas; ao contrário, para evitar a equivo-cidade, estabelece limites analógicos, e, portanto, fomenta o diálogo e a convivência de culturas: “De cada cultura haverá ele-mentos que alguma, algumas das demais ou todas as outras aceitam, outros elementos que toleram e outros que recha-çam”.103 Daqui se pode gerar um tipo de “universalidade” desde abaixo, que não seja a priori mas a posteriori, como produto de um diálogo e intercâmbio entre as culturas, em busca de superar suas “incompletudes”.104

A visão complexa dos direitos humanos deve ser capaz de assumir uma teoria da tradução, seja como hermenêutica diató-pica ou como hermenêutica analógica, que parte do pressuposto que uma necessidade ou uma prática em uma cultura poder vol-tar-se compreensível e inteligível por outra cultura. Vale dizer, a FL deve dar suporte à epistemologia para que direitos humanos possam enriquecer-se com as práxis de libertação que se de-senvolvem em cada cultura. Práxis que são, por serem históri-cas, finitas e completas, mas que formam parte da realidade histórica como totalidade.

A FL assume que não existe cultura pura nem completa; toda cultura está constituída por muitas culturas e racionalida-des. O que se busca através de uma compreensão complexa dos direitos humanos seria, então, não a imposição de um mo-delo monocultural de valores e da compreensão da dignidade humana, mas a geração de processos de luta que transformem as relações e as instituições sociais, culturais, políticas e econô-micas buscando que cada ser humano consiga os bens neces-sários para a produção e reprodução da sua vida. Estes proces-sos de mudança se veem enriquecidos pelo diálogo entre culturas. Como temos assinalado, nisto a FL assume a proposta de Sánchez Rubio de construir pluriversidade de controvérsia:

“A pluriversidade de controvérsia se resolve buscando cri-térios de emancipação que nos permitam, em um processo contínuo aberto, itinerante e em trânsito, desde a experiên-cia e os contextos da gente (particularismos tensionados de universalidade), principalmente daqueles que estão em

103 BEUCHOT, Mauricio, Multiculturalidad y derechos humanos, Siglo XXI-UNAM, México, 2005, p. 62.

104 Idem., pp. 65-66.

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condições subalternas, vulneráveis e vitimados, distinguir e diferenciar, por um lado, aquelas políticas de aberturas de humanização e, por outro lado, políticas de fechamento (tendo em conta as dinâmicas de inclusão desde a dife-rença e dinâmicas de exclusão e desumanização). Uma interculturalidade que não ignora as relações de poder e as pretensões de hegemonia de umas culturas ou grupos so-bre outras/os em todos os níveis (epistemológicos, axioló-gicos, ideológicos). Em definitivo, espaços de capacitação aos seres humanos como que sujeitos plurais, mas sem cair em uma funcionalidade que consolida imaginários he-gemônicos predefinidos e preestabelecidos (como podem ser os estabelecidos pelo Estado-nação, a lógica de capital e a cultura patriarcal)”.105

Seguindo o sentido destas reflexões, é até certo ponto fá-cil precatar-se que o pluralismo cultural assumido por uma compreensão complexa, que evita cair em um universalismo abstrato ou em um relativismo absolutista, se complementa com uma das principais características do logos histórico: a perspectiva da vítima. Ou seja, que os processos que podemos qualificar de direitos humanos devem potencializar as relações humanas emancipadoras-libertadoras e superar as relações reguladoras-opressoras.

4.2. Incluir a perspectiva da vítima

A perspectiva da vítima é um dos temas fundamentais pa-ra o pensamento da libertação; neste momento queremos des-tacar que uma compreensão complexa deve assumir esta perspectiva, como bem assinala Herrera: “[A] visão complexa dos direitos aposta por situar-nos na periferia. Centro só há um. O que não coincide com ele é tachado pejorativamente de periferia. Periferias têm muitas. Na realidade tudo é periferia se aceitamos que não existe nada puro e que tudo está relaciona-do”.106 Ademais, esta perspectiva tem que assumir-se no atual contexto de globalização. Colocar os direitos humanos como elementos de direito internacional que se vai impondo aos di-versos estados do mundo é uma visão simplista, que nem sem-pre corresponde à visão das vítimas. É necessário pensar di-reitos humanos na globalidade desde as lutas dos povos, desde a construção de alternativas sociopolíticas e econômi-cas desde abajo. Ou seja, parte da complexidade de direitos humanos é sua localização como elementos interculturais em um contexto de globalização ou mundialização.

105 SÁNCHEZ RUBIO, David, “Desafíos contemporáneos del derecho…”, op. cit., p. 21.

106 HERRERA FLORES, Joaquín, “Hacia una visión compleja de los derechos hu-manos”, op. cit., p. 69.

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Para Santos, o que chamamos de globalização consiste em séries de relações, coisas, e segundo mudam estas o faz tam-bém aquela. Globalização seria, então, “o processo pelo qual uma condição ou entidade local dada logra estender seu alcan-ce por todo o globo e, ao fazê-lo, desenvolve a capacidade de designar como local alguma entidade ou condição social rival”.107 Desde esta perspectiva, o que se chama globalização no atual sistema-mundo é a globalização exitosa de um localismo. As globalizações podem distinguir-se em quatro modos, segundo sua produção: localismos globalizados, globalismos localizados, cosmopolitismo e herança comum da humanidade.108 Os primei-ros modos abarcam a globalização hegemônica, pois surgem das forças do capitalismo global, e levam a cabo a integração global, seja por exclusão ou por inclusão. As outras duas formas são as globalizações contra-hegemônicas.

O localismo globalizado consiste no processo pelo qual um fenômeno local é globalizado com êxito; pode ser a operação mundial das empresas transnacionais, a imposição do inglês co-mo língua franca, a globalização da comida rápida ou das leis de propriedade industrial dos Estados Unidos. O globalismo locali-zado consiste no impacto específico das práticas e imperativos transnacionais nas condições locais; estas são desestruturadas e reestruturadas com o fim de responder àqueles. Como exem-plo podemos citar os enclaves de livre comércio; a devastação florestal e os deterioramentos dos recursos naturais de países que estão submetidos ao pagamento de dívidas externas; o uso turístico dos tesouros históricos e lugares religiosos, das artes, os artesanatos e a vida selvagem; a transformação de uma agri-cultura para subsistência para uma orientada à exportação; etc. Neste contexto, assinala Boaventura, “a divisão internacional do globalismo assume o seguinte padrão: os países centrais se es-pecializam nos localismos globalizados, enquanto aos países periféricos se impõem as alternativas dos globalismos localiza-dos. O sistema mundial e, mais especificamente, o que nele é designado como globalização, é uma rede de globalismos loca-lizados e localismos globalizados”.109

Por outro lado, no cosmopolitismo se compreendem as re-lações de poder e de interdependência de forma complexa, e se considera que as formas de dominação prevalentes não ex-cluem a possibilidade de que os sujeitos subordinados – sejam estados, grupos sociais, etc. – se organizem transnacionalmen-te na defesa dos interesses percebidos como comuns e usem no seu proveito as possibilidades de interação transnacional cria-

107 SANTOS, Boaventura de Sousa, Una epistemología del sur, op. cit., p. 230.108 Cf. Idem., pp. 231-232.109 SANTOS, Boaventura de Sousa, La globalización del derecho. Los nuevos ca-

minos de la regulación y la emancipación, Universidad Nacional de Colombia- ILSA, Bogotá, 2002, p. 57.

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das pelo sistema mundial. “O cosmopolitismo não é nada mais que o estabelecimento de uma rede de lutas locais progressis-tas, com o fim de maximizar seu potencial emancipador in locu através de conexões translocais/locais”.110 Enquanto o patrimô-nio comum da humanidade – no uso livre da expressão tomada do direito internacional – se refere ao surgimento dos problemas que, por sua natureza, são tão globais como o globo mesmo, tais como aqueles relacionados com a possibilidade da perma-nência da vida humana na Terra (questões ambientais como a camada de ozônio, o aquecimento global, etc.).

Santos observa que direitos humanos podem conceber-se como uma modalidade de localismo globalizado ou como uma modalidade de cosmopolitismo subalterno e insurgente. Aquela modalidade seria uma globalização desde arriba, enquanto esta seria desde abajo. Defendem-se que os direitos humanos como “universais” – desde um paradigma da simplicidade – tenderiam a funcionar como localismo globalizado, como uma forma de globalização desde arriba. Ao contrário, se deseja que funcio-nem como uma forma de globalização cosmopolita, contra-he-gemônica, então deveria ser repensada desde a perspectiva das vítimas e da pluralidade cultural.

Se a globalização dos direitos humanos se estuda como a expansão de uma única razão, desde as práticas jurídicas hege-mônicas111, como são as instâncias internacionais promovidas pelos países do centro geopolítico, então se simplifica sua com-preensão. Estudar o conteúdo dos instrumentos internacionais dos direitos humanos e os procedimentos regulamentados para as instâncias respectivas, sem dar conta de se seu uso e prática respondem a uma globalização hegemônica ou a uma globaliza-ção contra-hegemônica, é uma visão idealista e simplista. Ao revés, uma perspectiva complexa deve atender a maneira em que a “comunidade de vítimas” – por usar um termo de Dussel – utiliza os instrumentos e instâncias internacionais, e em geral o discurso de “direitos humanos”. Ou seja, a complexidade de direitos humanos deve evidenciar se a práxis histórica é de opressão ou de libertação, se funcionam como localismos globa-lizados ou como globalização cosmopolita, se são ferramentas para construir uma globalização desde arriba ou uma globaliza-ção desde abajo.

Por isso, a compreensão complexa deve ser coerente com o incluir as práticas jurídicas populares, que buscam ampliar – e

110 Idem., p. 60.111 De fato, como Santos percebe, o estudo do direito neste contexto domina a

perspectiva da globalização “de cima” (SANTOS, Boaventura de Sousa y RO-

DRÍGUEZ, Cesar A., “El derecho, la política y lo subalterno en la globalización contrahegemónica” en SANTOS, Boaventura de Sousa y RODRÍGUEZ, Cesar A. (Ed.), El derecho y la globalización desde abajo. Hacia una legalidad cosmo-polita, Trad. Carlos F. Morales, Anthropos-Universidad Autónoma Metropolita-na, Barcelona-México, 2007, p. 8).

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porque não também corrigir – o cânone hegemônico dos direitos humanos. É o que Santos assinala como legalidade cosmopolita subalterna, que é “uma forma de teoria e prática sociojurídica ade-quada para compreender e aprofundar a ação e o pensamento político encarnados pela globalização contra-hegemônica”.112

4.3. Contextualizar direitos humanos nos processos históricos

Desde uma compreensão complexa, devemos contextuali-zar direitos humanos nos processos históricos; então não esta-riam compreendidos politicamente como entidades naturais ou direitos infinitos, mas como reações antagonistas frente a um determinado conjunto de relações sociais nascidas em uma pre-cisa realidade histórica.113

Direitos humanos podem ser elementos de práxis de liber-tação ou práxis de opressão, ou seja, como produtos culturais surgem nos contextos concretos, donde se dão relações não neutrais. Em nossa realidade histórica, os processos de direitos humanos há que entendê-los “como processos levados à prática no marco das relações sociais impostas pelo capital – não os direitos humanos ‘em si mesmos considerados’ como dispersão humanista de uma natureza eterna e abstraída de suas condi-ções sociais de existência. Por isso, sua história não pode ser entendida se unicamente vemos os diferentes textos nos que se têm intentado positivar”.114 Portanto, podem tender à regulação/opressão ou à emancipação; no primeiro caso, mantém o status quo desde perspectivas de obstrução à mudança e à transfor-mação social, enquanto no segundo caso geram uma interação dinâmica com o entorno e propiciam aberturas de mudanças e transformações.

Como produtos culturais reguladores/opressores, direitos humanos tendem ao fechamento dos circuitos de “reação cultu-ral”, ou seja, se voltam processos ideologizantes que impedem aos atores sociais a criação de produções culturais, bloqueando a possibilidade de intervir nos entornos das relações em que estão situados. Convertem-se também nos processos coloniais que impedem a interação com outros processos culturais num plano de igualdade econômica e negam a igual capacidade para fazer valer suas próprias convicções. E, ademais, se voltam pro-cessos totalitários ou processos democráticos débeis (mera-mente formais) em que os atores sociais não podem construir alternativas de ação social aos dominantes, nem modificar as estruturas políticas e econômicas hegemônicas. Por outro lado, como produtos culturais emancipadores, direitos humanos se

112 SANTOS, Boaventura de Sousa y RODRÍGUEZ, Cesar A., “El derecho, la política y lo subalterno en la globalización contrahegemónica”, op. cit., p. 10.

113 Cf. HERRERA FLORES, Joaquín, Los derechos humanos como productos cultu-rales, op. cit., pp. 120 y ss.

114 Idem., pp. 143-144.

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constituem em processos em que todos os atores sociais podem reagir, criando produções culturais em função das tramas so-ciais em que estão situados. No lugar dos processos colonialis-tas, direitos humanos devem ser processos abertos à interação com outros processos culturais, criando espaços de diálogo ba-seados na igualdade de acesso a bens e na igual capacidade de fazer valer suas convicções. Por último, se geram como proces-sos de “democracia substantiva e radical” em que os atores so-ciais podem construir alternativas de ação social e modificar as estruturas políticas e econômicas.

Direitos humanos não são categorias ideais, mas que se vão criando e recriando segundo vai-se dando a construção so-cial. Ao conhecê-los, desde uma visão complexa, é importante ter presente os contextos, as tramas sociais e os processos que lhes dão sustento. Ter em conta os atos, os sujeitos implicados e suas condições materiais de produção e reprodução da vida. Devem ser concebidos desde um pensamento que desvele os conflitos de interesses que se encontram por trás das ideologi-zações, e se tem de inserir nos contextos sociais, culturais e político em que se geram. O pensamento complexo é capaz de dialogar com uma realidade que nos mostra que frente a fatos novos, a novas formas de opressão, tem de se gerar novas for-mas de resistência. Supor que essas novas formas de resistên-cia são alheias aos direitos humanos por temor a uma “amplia-ção indevida, vaga ou com grande carga sentimental”, significa favorecer uma maneira de encerrar o diálogo com a realidade, de favorecer processos de fechamento e deixar-se dominar pelo pensamento simplificador. Os processos geradores de “novos direitos” ficam excluídos dos direitos humanos se a estes os compreendemos como “identidades imaginárias e passivas”. Devem-se superar as abstrações que reduzem o ser humano a abstrações, despojadas de corpo, de necessidades e de carên-cias. Tem que estar focadas no sujeito vivo, o de carne e osso.

4.4. Assumir a dimensão utópica dos direitos humanos

Temos dito que um pensamento crítico não pode reduzir a realidade ao que existe, mas que deve refletir sobre as alternati-vas que podem abrir-se ao futuro. Se os direitos humanos assu-mem esta característica, então será mais fácil que se constituam nos processos de emancipação e não de regulação. Em conse-quência, a compreensão complexa compreende uma dimensão utópica: “Os direitos humanos figuram sempre como a utopia, como o horizonte utópico realizável, embora cometido a obstá-culos que impedem constantemente sua plena satisfação”.115

Esta dimensão tem um caráter dialético, pois a denúncia das situações de violação de direitos humanos e a utopia se

115 HERRERA FLORES, Joaquín, “Hacia una visión compleja de los derechos hu-manos”, op. cit., p. 52.

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potenciam mutuamente. É necessário um horizonte utópico para que se dê a tomada de consciência de que algo pode ser supe-rado; mas também se requer uma constatação de origem estru-tural da negação dos direitos humanos (de sua privação e viola-ção), para que dita tomada de consciência adquira a forma de um autêntico dinamismo da luta e da exigência real de bens. Por isso, “a denúncia sem utopia é, até certo ponto, cega, mas a utopia sem denúncia é praticamente inoperante, mais ainda, evi-ta o compromisso real”.116

Por utópico entendemos o que pode ser pensado ou imagi-nado, sempre desejado, mas nunca realizado, que atravessa transversalmente as realizações ou concreções históricas espe-cíficas. Trata-se, como assinala Hinkelammert, do princípio de impossibilidade da ação humana que lhe descobre suas possibi-lidades.117 Daí que Ellacuría fale de uma permanente humaniza-ção, pois se trata de um horizonte que estabelece “o melhor dos possíveis”, mas como uma relação transversal entre a utopia e a realidade histórica.

Não devemos falar de momentos cada vez mais próximos, de progressivas aproximações, a realização absoluta ou perfeita da utopia. Esta sempre deverá ser o motor que impulsiona a permanente humanização, pois do contrário é fácil cair em uma ilusão que oculte o que na realidade se faz: estabelecer uma ordem que uma vez instituída buscará sua perpetuação, e é quando os direitos humanos se convertem em um discurso de legitimação e já não de utopia. Daí que as concepções dos direi-tos humanos que dão prioridade ao formalismo institucional e sistemático, por cima da realidade histórica e das necessidades dos seres humanos, sejam estáticas e fechem a porta a qual-quer dimensão utópico-transformadora que podem ter.

A dimensão utópica está estreitamente relacionada com o sujeito vivo, da práxis e intersubjetivo que temos afirmado como fundamento dos direitos humanos. Podemos chamá-la, de certa forma, seguindo Santos, uma “subjetividade latino-americana” no seguinte sentido:

“A subjetividade e a sociabilidade de Nuestra América são incômodas para o pensamento institucionalizado e legalis-ta, mas são afins com o pensamento utopista. Por utopia entendo aquela exploração imaginativa de novos modos e estilos de capacidade e vontade de direitos humanos, e a confrontação imaginativa da necessidade de tudo o que existe – só porque existe – em prol de algo radicalmente

116 ELLACURÍA, Ignacio, “Historización de los derechos humanos desde los pue-blos oprimidos y las mayorías populares”, op. cit., p. 438-439.

117 Cf. HINKELAMMERT, Franz, Crítica de la razón utópica, op. cit. Para aplicar este princípio ao horizonte utópico dos direitos humanos: Cf. SOLÓRZANO, Norman José, Crítica de la imaginación jurídica. Una mirada desde la episte-mología y la historia al derecho moderno y su ciencia, Universidad Autónoma de San Luis Potosí, San Luis Potosí, 2007.

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melhor, pelo qual vale a pena lutar, algo que a humanidade merece plenamente.”118

Situar os direitos humanos em um horizonte utópico, no sentido mencionado, nos conduz a rechaçar toda classe de utopismo. Tanto aquele utopismo que facilmente conduz ao tota-litarismo, seja estatal ou de mercado, cujas posturas podem re-fletir-se na afirmação estamos construindo o único mundo possí-vel, ou em posturas antiutópicas (ou utopismo irreflexivo), que acusam as “utopias” ou os “grandes relatos” de querer construir paraísos na terra, mas na realidade constroem infernos. De for-ma semelhante, direitos humanos como ideais utópicos se cons-tituem em princípios da práxis que queiram combater os discur-sos cínicos, os quais não constituem uma ideologização, mas que pretendem impor seus princípios como os únicos válidos; caso que se dá, por exemplo, na simplificação dos direitos so-ciais quando se afirma que estes são postulados do estado do direito que não os pode realizar, pois dependem da economia, a qual é o autêntico campo de batalha e, como em qualquer bata-lha, há perdedores, bem faria o estado em deixá-los fora de suas obrigações.

Reivindicar o princípio da vida ou da solidariedade por cima do princípio da eficiência empresarial ou do mercado capitalista, dentro de um horizonte utópico, é uma maneira que os direitos humanos podem mostrar-se como momento intelectivo da prá-xis da libertação.

Compreender os direitos humanos como ideais utópicos – como assinala Ellacuría – possibilita, então, que não se conver-tam no discurso hegemônico que impeça e anule o processo de libertação, mas ao contrário: que sejam momentos ideológicos que facilitem a construção das práticas sociais e históricas, de processos culturais abertos, que permitam ao ser humano viver com o máximo de dignidade.

Conclusão

A partir dos conceitos e categorias da FL é possível cons-truir um fundamento de direitos humanos baseado em três pila-res: a alteridade, a práxis de libertação e a produção da vida. Esta fundamentação busca superar os riscos que corre o intento de fundamentação, tais como o dogmatismo, o pensamento dé-bil, o reducionismo e o etnocentrismo. Sem negar a subjetivida-

118 SANTOS, Boaventura de Sousa, Una epistemología del sur, op. cit., p. 242. Isso não significa que a fundamentação que propusemos tem que ser restrita aos direitos humanos na América Latina, porque assim reduz Boaventura, “Nossa América deve desterritorializar e se tornar a metáfora para a luta que empreendem vítimas da globalização hegemônica em todos os lugares, seja Norte, Sul, Leste ou Oeste” (Idem., p. 255).

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de como elemento essencial dos direitos humanos, a FL abre a pluralidade cultural e as lutas históricas levadas a cabo pelos diversos povos oprimidos do planeta; por isso, se trata de um sujeito intersubjetivo, que desenvolve uma práxis de libertação para juridificar as necessidades e acessar os bens para a produ-ção, reprodução e desenvolvimento da vida. Para a FL, direitos humanos devem ter o critério da vida ou morte como de última instância. A racionalidade meio-fim perde legitimidade em cada caso em que ela entra em contradição performativa com a racio-nalidade reprodutiva; aquela racionalidade é uma racionalidade subordinada à vida.

A fundamentação proposta significa um retorno do sujeito; não do sujeito metafísico, mas do sujeito vivente, corporal, inter-subjetivo e práxico, como um horizonte filosófico para uma críti-ca da globalização neoliberal. Logo, a práxis se realiza por uma comunidade de vítimas – que se constitui em um sujeito inter-subjetivo – que busca, exercendo o direito para gerar direitos, subverter o sistema que lhe nega a satisfação de necessidades para a produção e reprodução da vida, e dar passo a um novo sistema. Por isso a práxis é um fato mais radical que o estado ou a “natureza humana” enquanto a busca de fundamentos de di-reitos humanos. Rechaça o dogmatismo, o etnocentrismo e o historicismo, mas defende a necessidade do sujeito; não do su-jeito individual e abstrato da Modernidade hegemônica, mas o sujeito intersubjetivo que se constitui através da vontade de li-bertação das vítimas reunidas e organizadas em comunidade.

Uma visão complexa de direitos humanos deve assumir o critério da vida.119 Isto nos possibilita abordar os direitos huma-nos desde distintas tradições culturais sem cair em um relativis-mo ético, pois, afinal de contas, os processos de libertação vão concretizando as aspirações naturais que a realidade possibilita em um momento dado. Ora, as necessidades não são equívo-cas (o que sim seriam as reivindicações, fundadas em um volun-tarismo ou idealismo jurídico arbitrário), mas tampouco se consi-deram as necessidades como uma questão unívoca no ser humano (o que seria um materialismo vulgar ou uma metafísica não dinâmica), mas que as necessidades do povo são funda-mentadas bioeticamente, e a estrutura dinâmica do ser humano permite certa pluralidade histórica delas e de seus meios de sa-tisfação. Nesse sentido contrário, perder este critério conduz a uma visão simplificante que nos encadeia a uma só tradição cul-tural (a ocidental): “Quando se luta unicamente por direitos – e não pelo acesso aos bens necessários para uma vida digna –, já estamos lutando encerrados na jaula de ferro do liberalismo in-dividualista dominante na concepção jurídica ocidental”.120

119 HERRERA FLORES, Joaquín, Los derechos humanos como productos cultu-rales, op. cit., p. 250.

120 Idem., p. 251.

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Intentamos aproximar-nos, desde a fundamentação pro-posta e a complexidade, a uma conceptualização dos direitos humanos. Por suposto que não pretendemos dar uma definição acabada, o que seria incoerente com o que temos dito, mas bus-camos esboçar uma aproximação aberta que a partir dele se pode construir a visão que defendemos.

Joaquín Herrera dá em um primeiro momento uma defini-ção abreviada: os direitos humanos “suporiam a instituição ou posta em marcha de processo de luta pela dignidade”121. Em seguida, define direitos humanos desde um plano político como “os resultados dos processos de luta antagonista que se tem dado contra a expansão material e a generalização ideológica do sistema de relações imposto pelos processos de acumulação de capital”122. E, por último, o faz no sentido social, como “o re-sultado de lutas sociais e coletivas que tendem à construção de espaços sociais, econômicos, políticos e jurídicos que permita o empoderamento de todos e todas para poder lutar plural e dife-renciadamente por uma vida digna de ser vivida”123. Em outra de suas obras, os define “como sistemas de objetos (valores, nor-mas, instituições) e sistema de ações (práticas sociais) que pos-sibilitam a abertura e a consolidação de espaços de luta pela dignidade humana”.124 Por sua parte, Sánchez Rubio os compre-ende como “práticas e meios discursivos, expressivos e norma-tivos que propugnam por reinserir os seres humanos no circuito de reprodução e mantimento da vida, permitindo abrir espaços de interpelação, de luta e de reivindicação”,125 ademais de “rea-lidades normativas e institucionais que se vão construindo so-cialmente através da coimplicação da práxis social, a constante produção de necessidades e o processo de valorização coletiva sobre os bens”.126 Por último, Antonio Salamanca os define co-mo “a formulação jurídica da obrigação que tem a comunidade de satisfazer as necessidades materiais do povo para produzir e reproduzir sua vida”.127

Estas três aproximações podem servir de base para uma visão complexa. Entender os direitos humanos como um conjun-to de práticas sociais, simbólicas, culturais, jurídicas, econômi-cas e institucionais da “comunidade de vítimas”, que lhes permi-te constituir-se em sujeito e reagir contra os excessos de

121 Idem., p. 246.122 Ibidem.123 Idem., p. 247.124 HERRERA FLORES, Joaquín, “Hacia una visión compleja de los derechos hu-

manos”, op. cit., p. 52.125 SÁNCHEZ RUBIO, David, Contra una cultura anestesiada de derechos huma-

nos, op. cit., p. 34.126 SÁNCHEZ RUBIO, David, Filosofía, derecho y liberación en América Latina,

Desclée de Brouwer, Bilbao, 1999, p. 181.127 SALAMANCA, Antonio, El derecho a la revolución. Iusmaterialismo para una

política crítica, UASLP-CEDH, San Luis Potosí, 2006, p. 26.

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qualquer tipo de poder, modificando as tramas sociais para lo-grar acessar os bens para a satisfação das necessidades de produção e reprodução da vida, é um ponto de partida adequado para uma compreensão complexa de direitos humanos. É uma formulação geral e ampla, mas não equívoca e sim análoga, que permite dar conta da necessidade das vítimas de tomar consci-ência de sua situação e gerar práticas para fazer valer seus di-reitos humanos. Ademais, obriga a abandonar visões abstratas do jurídico que magnificam o papel solitário do sistema jurídico positivo na proteção das pessoas, das comunidades e dos po-vos, e em troca conduz a atender um sistema amplo de garan-tias de diversa natureza – econômica, cultural, jurídica, política, educativa, etc. – que sejam parte das lutas sociais pelo acesso aos bens necessários para a produção da vida.

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CADERNOS IHU IDEIAS

N. 01 A teoria da justiça de John Rawls – José NedelN. 02 O feminismo ou os feminismos: Uma leitura das produções teóricas – Edla Eggert O Serviço Social junto ao Fórum de Mulheres em São Leopoldo – Clair Ribeiro Ziebell e Acadê-

micas Anemarie Kirsch Deutrich e Magali Beatriz StraussN. 03 O programa Linha Direta: a sociedade segundo a TV Globo – Sonia MontañoN. 04 Ernani M. Fiori – Uma Filosofia da Educação Popular – Luiz Gilberto KronbauerN. 05 O ruído de guerra e o silêncio de Deus – Manfred ZeuchN. 06 BRASIL: Entre a Identidade Vazia e a Construção do Novo – Renato Janine RibeiroN. 07 Mundos televisivos e sentidos identiários na TV – Suzana KilppN. 08 Simões Lopes Neto e a Invenção do Gaúcho – Márcia Lopes DuarteN. 09 Oligopólios midiáticos: a televisão contemporânea e as barreiras à entrada – Valério Cruz BrittosN. 10 Futebol, mídia e sociedade no Brasil: reflexões a partir de um jogo – Édison Luis GastaldoN. 11 Os 100 anos de Theodor Adorno e a Filosofia depois de Auschwitz – Márcia TiburiN. 12 A domesticação do exótico – Paula CaleffiN. 13 Pomeranas parceiras no caminho da roça: um jeito de fazer Igreja, Teologia e Educação Popular

– Edla EggertN. 14 Júlio de Castilhos e Borges de Medeiros: a prática política no RS – Gunter AxtN. 15 Medicina social: um instrumento para denúncia – Stela Nazareth MeneghelN. 16 Mudanças de significado da tatuagem contemporânea – Débora Krischke LeitãoN. 17 As sete mulheres e as negras sem rosto: ficção, história e trivialidade – Mário MaestriN. 18 Um itinenário do pensamento de Edgar Morin – Maria da Conceição de AlmeidaN. 19 Os donos do Poder, de Raymundo Faoro – Helga Iracema Ladgraf PiccoloN. 20 Sobre técnica e humanismo – Oswaldo Giacóia JuniorN. 21 Construindo novos caminhos para a intervenção societária – Lucilda SelliN. 22 Física Quântica: da sua pré-história à discussão sobre o seu conteúdo essencial – Paulo Henri-

que DionísioN. 23 Atualidade da filosofia moral de Kant, desde a perspectiva de sua crítica a um solipsismo prático

– Valério RohdenN. 24 Imagens da exclusão no cinema nacional – Miriam RossiniN. 25 A estética discursiva da tevê e a (des)configuração da informação – Nísia Martins do RosárioN. 26 O discurso sobre o voluntariado na Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS – Rosa

Maria Serra BavarescoN. 27 O modo de objetivação jornalística – Beatriz Alcaraz MaroccoN. 28 A cidade afetada pela cultura digital – Paulo Edison Belo ReyesN. 29 Prevalência de violência de gênero perpetrada por companheiro: Estudo em um serviço de aten-

ção primária à saúde – Porto Alegre, RS – José Fernando Dresch KronbauerN. 30 Getúlio, romance ou biografia? – Juremir Machado da SilvaN. 31 A crise e o êxodo da sociedade salarial – André GorzN. 32 À meia luz: a emergência de uma Teologia Gay – Seus dilemas e possibilidades – André Sidnei

MusskopfN. 33 O vampirismo no mundo contemporâneo: algumas considerações – Marcelo Pizarro NoronhaN. 34 O mundo do trabalho em mutação: As reconfigurações e seus impactos – Marco Aurélio SantanaN. 35 Adam Smith: filósofo e economista – Ana Maria Bianchi e Antonio Tiago Loureiro Araújo dos

SantosN. 36 Igreja Universal do Reino de Deus no contexto do emergente mercado religioso brasileiro: uma

análise antropológica – Airton Luiz JungblutN. 37 As concepções teórico-analíticas e as proposições de política econômica de Keynes – Fernando

Ferrari FilhoN. 38 Rosa Egipcíaca: Uma Santa Africana no Brasil Colonial – Luiz MottN. 39 Malthus e Ricardo: duas visões de economia política e de capitalismo – Gentil CorazzaN. 40 Corpo e Agenda na Revista Feminina – Adriana BragaN. 41 A (anti)filosofia de Karl Marx – Leda Maria PaulaniN. 42 Veblen e o Comportamento Humano: uma avaliação após um século de “A Teoria da Classe

Ociosa” – Leonardo Monteiro MonasterioN. 43 Futebol, Mídia e Sociabilidade. Uma experiência etnográfica – Édison Luis Gastaldo, Rodrigo

Marques Leistner, Ronei Teodoro da Silva e Samuel McGinityN. 44 Genealogia da religião. Ensaio de leitura sistêmica de Marcel Gauchet. Aplicação à situação atual

do mundo – Gérard DonnadieuN. 45 A realidade quântica como base da visão de Teilhard de Chardin e uma nova concepção da

evolução biológica – Lothar SchäferN. 46 “Esta terra tem dono”. Disputas de representação sobre o passado missioneiro no Rio Grande do

Sul: a figura de Sepé Tiaraju – Ceres Karam BrumN. 47 O desenvolvimento econômico na visão de Joseph Schumpeter – Achyles Barcelos da CostaN. 48 Religião e elo social. O caso do cristianismo – Gérard DonnadieuN. 49 Copérnico e Kepler: como a terra saiu do centro do universo – Geraldo Monteiro SigaudN. 50 Modernidade e pós-modernidade – luzes e sombras – Evilázio TeixeiraN. 51 Violências: O olhar da saúde coletiva – Élida Azevedo Hennington e Stela Nazareth MeneghelN. 52 Ética e emoções morais – Thomas KesselringJuízos ou emoções: de quem é a primazia na

moral? – Adriano Naves de BritoN. 53 Computação Quântica. Desafios para o Século XXI – Fernando HaasN. 54 Atividade da sociedade civil relativa ao desarmamento na Europa e no Brasil – An Vranckx

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22 • Cadernos IHU ideias

N. 55 Terra habitável: o grande desafio para a humanidade – Gilberto DupasN. 56 O decrescimento como condição de uma sociedade convivial – Serge LatoucheN. 57 A natureza da natureza: auto-organização e caos – Günter KüppersN. 58 Sociedade sustentável e desenvolvimento sustentável: limites e possibilidades – Hazel

HendersonN. 59 Globalização – mas como? – Karen GloyN. 60 A emergência da nova subjetividade operária: a sociabilidade invertida – Cesar SansonN. 61 Incidente em Antares e a Trajetória de Ficção de Erico Veríssimo – Regina ZilbermanN. 62 Três episódios de descoberta científica: da caricatura empirista a uma outra história – Fernando

Lang da Silveira e Luiz O. Q. PeduzziN. 63 Negações e Silenciamentos no discurso acerca da Juventude – Cátia Andressa da SilvaN. 64 Getúlio e a Gira: a Umbanda em tempos de Estado Novo – Artur Cesar IsaiaN. 65 Darcy Ribeiro e o O povo brasileiro: uma alegoria humanista tropical – Léa Freitas PerezN. 66 Adoecer: Morrer ou Viver? Reflexões sobre a cura e a não cura nas reduções jesuítico-guaranis

(1609-1675) – Eliane Cristina Deckmann FleckN. 67 Em busca da terceira margem: O olhar de Nelson Pereira dos Santos na obra de Guimarães

Rosa – João Guilherme BaroneN. 68 Contingência nas ciências físicas – Fernando HaasN. 69 A cosmologia de Newton – Ney LemkeN. 70 Física Moderna e o paradoxo de Zenon – Fernando HaasN. 71 O passado e o presente em Os Inconfidentes, de Joaquim Pedro de Andrade – Miriam de Souza

RossiniN. 72 Da religião e de juventude: modulações e articulações – Léa Freitas PerezN. 73 Tradição e ruptura na obra de Guimarães Rosa – Eduardo F. CoutinhoN. 74 Raça, nação e classe na historiografia de Moysés Vellinho – Mário MaestriN. 75 A Geologia Arqueológica na Unisinos – Carlos Henrique NowatzkiN. 76 Campesinato negro no período pós-abolição: repensando Coronelismo, enxada e voto – Ana

Maria Lugão RiosN. 77 Progresso: como mito ou ideologia – Gilberto DupasN. 78 Michael Aglietta: da Teoria da Regulação à Violência da Moeda – Octavio A. C. ConceiçãoN. 79 Dante de Laytano e o negro no Rio Grande Do Sul – Moacyr FloresN. 80 Do pré-urbano ao urbano: A cidade missioneira colonial e seu território – Arno Alvarez KernN. 81 Entre Canções e versos: alguns caminhos para a leitura e a produção de poemas na sala de

aula – Gláucia de SouzaN. 82 Trabalhadores e política nos anos 1950: a ideia de “sindicalismo populista” em questão – Marco

Aurélio SantanaN. 83 Dimensões normativas da Bioética – Alfredo Culleton e Vicente de Paulo BarrettoN. 84 A Ciência como instrumento de leitura para explicar as transformações da natureza – Attico

ChassotN. 85 Demanda por empresas responsáveis e Ética Concorrencial: desafios e uma proposta para a

gestão da ação organizada do varejo – Patrícia Almeida AshleyN. 86 Autonomia na pós-modernidade: um delírio? – Mario FleigN. 87 Gauchismo, tradição e Tradicionalismo – Maria Eunice MacielN. 88 A ética e a crise da modernidade: uma leitura a partir da obra de Henrique C. de Lima Vaz – Mar-

celo PerineN. 89 Limites, possibilidades e contradições da formação humana na Universidade – Laurício NeumannN. 90 Os índios e a História Colonial: lendo Cristina Pompa e Regina Almeida – Maria Cristina Bohn

MartinsN. 91 Subjetividade moderna: possibilidades e limites para o cristianismo – Franklin Leopoldo e SilvaN. 92 Saberes populares produzidos numa escola de comunidade de catadores: um estudo na pers-

pectiva da Etnomatemática – Daiane Martins BocasantaN. 93 A religião na sociedade dos indivíduos: transformações no campo religioso brasileiro – Carlos

Alberto SteilN. 94 Movimento sindical: desafios e perspectivas para os próximos anos – Cesar SansonN. 95 De volta para o futuro: os precursores da nanotecnociência – Peter A. SchulzN. 96 Vianna Moog como intérprete do Brasil – Enildo de Moura CarvalhoN. 97 A paixão de Jacobina: uma leitura cinematográfica – Marinês Andrea KunzN. 98 Resiliência: um novo paradigma que desafia as religiões – Susana María Rocca LarrosaN. 99 Sociabilidades contemporâneas: os jovens na lan house – Vanessa Andrade PereiraN. 100 Autonomia do sujeito moral em Kant – Valerio RohdenN. 101 As principais contribuições de Milton Friedman à Teoria Monetária: parte 1 – Roberto Camps

MoraesN. 102 Uma leitura das inovações bio(nano)tecnológicas a partir da sociologia da ciência – Adriano

PremebidaN. 103 ECODI – A criação de espaços de convivência digital virtual no contexto dos processos de ensino

e aprendizagem em metaverso – Eliane SchlemmerN. 104 As principais contribuições de Milton Friedman à Teoria Monetária: parte 2 – Roberto Camps

MoraesN. 105 Futebol e identidade feminina: um estudo etnográfico sobre o núcleo de mulheres gremistas –

Marcelo Pizarro NoronhaN. 106 Justificação e prescrição produzidas pelas Ciências Humanas: Igualdade e Liberdade nos discur-

sos educacionais contemporâneos – Paula Corrêa HenningN. 107 Da civilização do segredo à civilização da exibição: a família na vitrine – Maria Isabel Barros

BelliniN. 108 Trabalho associado e ecologia: vislumbrando um ethos solidário, terno e democrático? – Telmo

AdamsN. 109 Transumanismo e nanotecnologia molecular – Celso Candido de AzambujaN. 110 Formação e trabalho em narrativas – Leandro R. Pinheiro

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Cadernos IHU ideias • 23

N. 111 Autonomia e submissão: o sentido histórico da administração – Yeda Crusius no Rio Grande do Sul – Mário Maestri

N. 112 A comunicação paulina e as práticas publicitárias: São Paulo e o contexto da publicidade e pro-paganda – Denis Gerson Simões

N. 113 Isto não é uma janela: Flusser, Surrealismo e o jogo contra – Esp. Yentl DelanhesiN. 114 SBT: jogo, televisão e imaginário de azar brasileiro – Sonia MontañoN. 115 Educação cooperativa solidária: perspectivas e limites – Carlos Daniel BaiotoN. 116 Humanizar o humano – Roberto Carlos FáveroN. 117 Quando o mito se torna verdade e a ciência, religião – Róber Freitas BachinskiN. 118 Colonizando e descolonizando mentes – Marcelo DascalN. 119 A espiritualidade como fator de proteção na adolescência – Luciana F. Marques e Débora D.

Dell’AglioN. 120 A dimensão coletiva da liderança – Patrícia Martins Fagundes Cabral e Nedio SeminottiN. 121 Nanotecnologia: alguns aspectos éticos e teológicos – Eduardo R. CruzN. 122 Direito das minorias e Direito à diferenciação – José Rogério LopesN. 123 Os direitos humanos e as nanotecnologias: em busca de marcos regulatórios – Wilson EngelmannN. 124 Desejo e violência – Rosane de Abreu e SilvaN. 125 As nanotecnologias no ensino – Solange Binotto FaganN. 126 Câmara Cascudo: um historiador católico – Bruna Rafaela de LimaN. 127 O que o câncer faz com as pessoas? Reflexos na literatura universal: Leo Tolstoi – Thomas Mann

– Alexander Soljenítsin – Philip Roth – Karl-Josef KuschelN. 128 Dignidade da pessoa humana e o direito fundamental à identidade genética – Ingo Wolfgang

Sarlet e Selma Rodrigues PetterleN. 129 Aplicações de caos e complexidade em ciências da vida – Ivan Amaral GuerriniN. 130 Nanotecnologia e meio ambiente para uma sociedade sustentável – Paulo Roberto MartinsN. 131 A philía como critério de inteligibilidade da mediação comunitária – Rosa Maria Zaia Borges AbrãoN. 132 Linguagem, singularidade e atividade de trabalho – Marlene Teixeira e Éderson de Oliveira CabralN. 133 A busca pela segurança jurídica na jurisdição e no processo sob a ótica da teoria dos sistemas

sociais de Nicklass Luhmann – Leonardo GrisonN. 134 Motores Biomoleculares – Ney Lemke e Luciano HennemannN. 135 As redes e a construção de espaços sociais na digitalização – Ana Maria Oliveira RosaN. 136 De Marx a Durkheim: Algumas apropriações teóricas para o estudo das religiões afro-brasileiras

– Rodrigo Marques LeistnerN. 137 Redes sociais e enfrentamento do sofrimento psíquico: sobre como as pessoas reconstroem

suas vidas – Breno Augusto Souto Maior FontesN. 138 As sociedades indígenas e a economia do dom: O caso dos guaranis – Maria Cristina Bohn

MartinsN. 139 Nanotecnologia e a criação de novos espaços e novas identidades – Marise Borba da SilvaN. 140 Platão e os Guarani – Beatriz Helena DominguesN. 141 Direitos humanos na mídia brasileira – Diego Airoso da MottaN. 142 Jornalismo Infantil: Apropriações e Aprendizagens de Crianças na Recepção da Revista Recreio

– Greyce VargasN. 143 Derrida e o pensamento da desconstrução: o redimensionamento do sujeito – Paulo Cesar

Duque-EstradaN. 144 Inclusão e Biopolítica – Maura Corcini Lopes, Kamila Lockmann, Morgana Domênica Hattge e

Viviane KlausN. 145 Os povos indígenas e a política de saúde mental no Brasil: composição simétrica de saberes para

a construção do presente – Bianca Sordi StockN. 146 Reflexões estruturais sobre o mecanismo de REDD – Camila MorenoN. 147 O animal como próximo: por uma antropologia dos movimentos de defesa dos direitos animais –

Caetano SordiN. 148 Avaliação econômica de impactos ambientais: o caso do aterro sanitário em Canoas-RS – Fer-

nanda SchutzN. 149 Cidadania, autonomia e renda básica – Josué Pereira da SilvaN. 150 Imagética e formações religiosas contemporâneas: entre a performance e a ética – José Rogério

LopesN. 151 As reformas político-econômicas pombalinas para a Amazônia: e a expulsão dos jesuítas do

Grão-Pará e Maranhão – Luiz Fernando Medeiros RodriguesN. 152 Entre a Revolução Mexicana e o Movimento de Chiapas: a tese da hegemonia burguesa no

México ou “por que voltar ao México 100 anos depois” – Claudia WassermanN. 153 Globalização e o pensamento econômico franciscano: Orientação do pensamento econômico

franciscano e Caritas in Veritate – Stefano ZamagniN. 154 Ponto de cultura teko arandu: uma experiência de inclusão digital indígena na aldeia kaiowá e

guarani Te’ýikue no município de Caarapó-MS – Neimar Machado de Sousa, Antonio Brand e José Francisco Sarmento

N. 155 Civilizar a economia: o amor e o lucro após a crise econômica – Stefano ZamagniN. 156 Intermitências no cotidiano: a clínica como resistência inventiva – Mário Francis Petry Londero e

Simone Mainieri PaulonN. 157 Democracia, liberdade positiva, desenvolvimento – Stefano ZamagniN. 158 “Passemos para a outra margem”: da homofobia ao respeito à diversidade – Omar Lucas Perrout

Fortes de SalesN. 159 A ética católica e o espírito do capitalismo – Stefano ZamagniN. 160 O Slow Food e novos princípios para o mercado – Eriberto Nascente SilveiraN. 161 O pensamento ético de Henri Bergson: sobre As duas fontes da moral e da religião – André

Brayner de FariasN. 162 O modus operandi das políticas econômicas keynesianas – Fernando Ferrari Filho e Fábio Hen-

rique Bittes TerraN. 163 Cultura popular tradicional: novas mediações e legitimações culturais de mestres populares pau-

listas – André Luiz da Silva

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24 • Cadernos IHU ideias

N. 164 Será o decrescimento a boa nova de Ivan Illich? – Serge LatoucheN. 165 Agostos! A “Crise da Legalidade”: vista da janela do Consulado dos Estados Unidos em Porto

Alegre – Carla Simone RodegheroN. 166 Convivialidade e decrescimento – Serge LatoucheN. 167 O impacto da plantação extensiva de eucalipto nas culturas tradicionais: Estudo de caso de São

Luis do Paraitinga – Marcelo Henrique Santos ToledoN. 168 O decrescimento e o sagrado – Serge LatoucheN. 169 A busca de um ethos planetário – Leonardo BoffN. 170 O salto mortal de Louk Hulsman e a desinstitucionalização do ser: um convite ao abolicionismo –

Marco Antonio de Abreu ScapiniN. 171 Sub specie aeternitatis – O uso do conceito de tempo como estratégia pedagógica de religação

dos saberes – Gerson Egas SeveroN. 172 Theodor Adorno e a frieza burguesa em tempos de tecnologias digitais – Bruno PucciN. 173 Técnicas de si nos textos de Michel Foucault: A influência do poder pastoral – João Roberto Barros IIN. 174 Da mônada ao social: A intersubjetividade segundo Levinas – Marcelo FabriN. 175 Um caminho de educação para a paz segundo Hobbes – Lucas Mateus Dalsotto e Everaldo CesconN. 176 Da magnitude e ambivalência à necessária humanização da tecnociência segundo Hans Jonas –

Jelson Roberto de OliveiraN. 177 Um caminho de educação para a paz segundo Locke – Odair Camati e Paulo César NodariN. 178 Crime e sociedade estamental no Brasil: De como la ley es como la serpiente; solo pica a los

descalzos – Lenio Luiz StreckN. 179 Um caminho de educação para a paz segundo Rousseau – Mateus Boldori e Paulo César NodariN. 180 Limites e desafios para os direitos humanos no Brasil: entre o reconhecimento e a concretização

– Afonso Maria das ChagasN. 181 Apátridas e refugiados: direitos humanos a partir da ética da alteridade – Gustavo Oliveira de

Lima PereiraN. 182 Censo 2010 e religiões:reflexões a partir do novo mapa religioso brasileiro – José Rogério LopesN. 183 A Europa e a ideia de uma economia civil – Stefano ZamagniN. 184 Para um discurso jurídico-penal libertário: a pena como dispositivo político (ou o direito penal

como “discurso-limite”) – Augusto Jobim do AmaralN. 185 A identidade e a missão de uma universidade católica na atualidade – Stefano ZamagniN. 186 A hospitalidade frente ao processo de reassentamento solidário aos refugiados – Joseane Mariéle

Schuck PintoN. 187 Os arranjos colaborativos e complementares de ensino, pesquisa e extensão na educação supe-

rior brasileira e sua contribuição para um projeto de sociedade sustentável no Brasil – Marcelo F. de Aquino

N. 188 Os riscos e as loucuras dos discursos da razão no campo da prevenção – Luis David CastielN. 189 Produções tecnológicas e biomédicas e seus efeitos produtivos e prescritivos nas práticas sociais

e de gênero – Marlene TamaniniN. 190 Ciência e justiça: Considerações em torno da apropriação da tecnologia de DNA pelo direito –

Claudia FonsecaN. 191 #VEMpraRUA: Outono brasileiro? Leituras – Bruno Lima Rocha, Carlos Gadea, Giovanni Alves,

Giuseppe Cocco, Luiz Werneck Vianna e Rudá RicciN. 192 A ciência em ação de Bruno Latour – Leticia de Luna FreireN. 193 Laboratórios e Extrações: quando um problema técnico se torna uma 0questão sociotécnica –

Rodrigo Ciconet DornellesN. 194 A pessoa na era da biopolítica: autonomia, corpo e subjetividade – Heloisa Helena BarbozaN. 195 Felicidade e Economia: uma retrospectiva histórica – Pedro Henrique de Morais Campetti e Tiago

Wickstrom AlvesN. 196 A colaboração de Jesuítas, Leigos e Leigas nas Universidades confiadas à Companhia de Jesus:

o diálogo entre humanismo evangélico e humanismo tecnocientífico – Adolfo NicolásN. 197 Brasil: verso e reverso constitucional – Fábio Konder ComparatoN. 198 Sem-religião no Brasil: Dois estranhos sob o guarda-chuva – Jorge Claudio RibeiroN. 199 Uma ideia de educação segundo Kant: uma possível contribuição para o século XXI – Felipe

Bragagnolo e Paulo César NodariN. 200 Aspectos do direito de resistir e a luta socialpor moradia urbana: a experiência da ocupação

Raízes da Praia – Natalia Martinuzzi CastilhoN. 201 Desafios éticos, filosóficos e políticos da biologia sintética – Jordi MaisoN. 202 Fim da Política, do Estado e da cidadania? – Roberto RomanoN. 203 Constituição Federal e Direitos Sociais: avanços e recuos da cidadania – Maria da Glória GohnN. 204 As origens históricas do racionalismo, segundo Feyerabend – Miguel Ângelo FlachN. 205 Compreensão histórica do regime empresarial-militar brasileiro – Fábio Konder ComparatoN. 206 Sociedade tecnológica e a defesa do sujeito: Technological society and the defense of the individual

– Karla SaraivaN. 207 Territórios da Paz: Territórios Produtivos? – Giuseppe CoccoN. 208 Justiça de Transição como Reconhecimento: limites e possibilidades do processo brasileiro –

Roberta Camineiro BaggioN. 209 As possibilidades da Revolução em Ellul – Jorge Barrientos-ParraN. 210 A grande política em Nietzsche e a política que vem em Agamben – Márcia Rosane JungesN. 211 Foucault e a Universidade: Entre o governo dos outros e o governo de si mesmo – Sandra CaponiN. 212 Verdade e História: arqueologia de uma relação – José D’Assunção BarrosN. 213 A Relevante Herança Social do Pe. Amstad SJ – José Odelso SchneiderN. 214 Sobre o dispositivo. Foucault, Agamben, Deleuze – Sandro Chignola

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Alejandro Rosillo Martinez é doutor e mestre em Estudos Avançados em Direitos Humanos pela Uni-versidade Carlos III de Madrid e formado em Direito pela Universidad Autónoma de San Luís de Potosí – UASLP. É professor da Faculdade de Direito nesta mesma universidade, além de coordenador acadê-mico do Programa de Pós-Graduação em Direito e Direitos Humanos. Seu trabalho se desenvolve es-pecialmente envolvendo Direitos Humanos, Pensa-mento Latino-Americano e Filosofia da Libertação.

Algumas obras do autorMARTINEZ, Alejandro Rosillo. La doble dimensión de la vida en los dere-chos humanos: como fundamento y como derecho. In: Meritum, revista de Direito da Universidade FUMEC, Belo Horizonte, V. 9, 2014 (no prelo).

______. Los Acuerdos de San Andrés: hacia una descolonización del derecho. In: Otros logos. Revista de estudios críticos, Centro de Estu-dios y Actualización en Pensamiento Político, Decolonialidad e Intercul-turalidad – CEAPEDI – de la Universidad Nacional del Comahue, no. 4, diciembre 2013, pp. 81-101.

______. Crítica de la ideologización de derechos humanos desde la Fi-losofía de la liberación. In: Revista de Investigaciones Jurídicas, No. 37, Escuela Libre de Derecho, México, 2013, pp. 525-558.