patrimonio geologico e geomineiro de monforte da beira

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 PATRIMÓNIO GEOLÓGICO E GEOMINEIRO DE MONFORTE DA BEIRA (CASTELO BRANCO): CARACTERIZAÇÃO DO PERCURSO PEDESTRE “CAMINHOS DO FERRO DE MONFORTE” Geological and Geomining heritage from Monforte da Beira: Description base for the tourist trail “Monforte Iron Paths” Carlos Neto de Carvalho, Joana Rodrigues e Sara Canilho Vila Velha de Ródão, 2011

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    PATRIMNIO GEOLGICO E GEOMINEIRODE MONFORTE DA BEIRA (CASTELO

    BRANCO): CARACTERIZAO DO PERCURSO

    PEDESTRE CAMINHOS DO FERRODE MONFORTE

    Geological and Geomining heritagefrom Monforte da Beira: Description basefor the tourist trail Monforte Iron Paths

    Carlos Neto de Carvalho, Joana Rodrigues e Sara Canilho

    Vila Velha de Rdo, 2011

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    PATRIMNIO GEOLGICO E GEOMINEIRO DE MONFORTE DA BEIRA (CASTELO BRANCO): CARACTERIZAO DO PERCURSO PEDESTRECAMINHOS DO FERRO DE MONFORTE

    Carlos Neto de Carvalho, Joana Rodrigues e Sara Canilho

    AAFA On Line, n 4 (2011) Associao de Estudos do Alto Tejo www.altotejo.org

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    PATRIMNIO GEOLGICO E GEOMINEIRODE MONFORTE DA BEIRA (CASTELO BRANCO):CARACTERIZAO DO PERCURSO PEDESTRE

    CAMINHOS DO FERRO DE MONFORTE1

    Geological and Geomining heritagefrom Monforte da Beira: Description basefor the tourist trail Monforte Iron Paths

    Carlos Neto de Carvalho23, Joana Rodrigues2e Sara Canilho2

    Palavras-chave: patrimnio geolgico, patrimnio geomineiro, percursopedestre geoturstico, Monforte da Beira, Geopark Naturtejo

    Keywords: geological heritage, geomining heritage, geotouristpedestrian trail, Monforte da Beira, Naturtejo Geopark

    1Na capa uma perspectiva da Mina do P vista de NE. 2Geopark Naturtejo da Meseta Meridional Geoparque Europeu e Global sob os auspcios daUNESCO.3Associao de Estudos do Alto Tejo.

    Resumo

    O Patrimnio Geolgico da Serra de Monforte (ou Serra do Povo)

    descrito pela primeira vez. Deste, destacam-se os vestgios delaborao mineira de jazigos supergnicos de ferro cujas tipologias se

    reportam Idade do Ferro e que tero existido, pelo menos, at ao

    Perodo Romano. Num espao ecolgico privilegiado proposta a

    constituio de um percurso pedestre interpretado no esprito dos

    Percursos Geotursticos do Geopark Naturtejo, uma pequena rota

    circular designada de Caminhos do Ferro de Monforte, com partida echegada em Monforte da Beira. Com a caracterizao das diversas

    valncias patrimoniais existentes ao longo do percurso pretende-se criar

    ferramentas de interpretao com apoio da comunidade e valorizar,

    numa ptica de sustentabilidade ambiental e turstica, recursos que, at

    ao presente, so considerados potenciais para o desenvolvimento local.

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    pedestre marcado, havendo a referncia existncia de Percursos

    Pedestres do Parque Natural do Tejo Internacional na freguesia de

    Malpica do Tejo, ainda que no devidamente homologados, nas

    imediaes de Monforte da Beira, que permitem usufruir da sua

    paisagem (Monteiro, 1999). propsito deste trabalho o

    reconhecimento do valor patrimonial da Serra de Monforte com oobjectivo de apresentar a proposta de um percurso pedestre de

    pequena rota, que explore e apresente os aspectos da geodiversidade,

    biodiversidade, histria e cultura locais. A proposta dos Caminhos do

    Ferro de Monforte permite ainda a valorizao do Complexo Mineiro de

    Monforte da Beira (Neto de Carvalho & Martins, 2006), geomonumento

    de grande interesse regional mas carente de um estudo

    geoarqueolgico em que o presente trabalho , ainda, preliminar. A

    compilao da informao que se apresentar aqui poder servir de

    apoio elaborao dos painis temticos propostos, a juntar

    Sinaltica de proximidade do Geopark Naturtejo, j existente em

    Monforte da Beira, assim como criao de abordagens tecnolgicasde apoio ao percurso pedestre, que actualmente esto a ser

    desenvolvidas em colaborao com a Escola Superior de Tecnologia do

    Instituto Politcnico de Castelo Branco.

    Figura 1.Localizao da freguesia de Monforte da Beira no Geopark Naturtejo, e doGeopark Naturtejo no territrio portugus.

    2. Enquadramento geolgico e geomorfolgico

    Monforte da Beira localiza-se na Peneplancie de Alto Alentejo-Cceres,

    no bloco rebaixado da falha do Ponsul, que separa a primeira da

    Superfcie de Castelo Branco. Desta vasta planura, suavemente

    ondulada por uma rede de drenagem no geral pouco encaixada,

    destaca-se a crista quartztica da Serra de Monforte (ou Serra do Povo),

    de direco NNW-SSE, que atinge os 457 m de altitude no v.g. do

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    Castelo, elevando-se cerca de 100 a 150 m da Peneplancie (Fig. 2). A

    serra estende-se por 9 km, atingindo uma largura mxima de 2 km.

    Figura 2. Mapa hipsomtrico da freguesia de Monforte da Beira, com adistribuio das altitudes entre o Rio Tejo (cotas mais baixas) e a serra deMonforte (cotas mais elevadas). Adaptado a partir do Atlas do Ambiente Digitaldisponibilizado pelo Instituto do Ambiente.

    A freguesia limitada a Norte pela Ribeira do Aravil e a Sul pelo Rio

    Tejo, estas com vales bastantes encaixados, chegando a atingir no Tejo

    um desnvel de 180 m. O limite NW sofre da influncia do Rio Ponsul.

    A geologia da freguesia de Monforte da Beira apresenta grande parte

    das formaes de origem sedimentar aflorantes no Geopark Naturtejo(Fig. 3). As formaes mais antigas correspondem ao Grupo das Beiras,

    datadas do Neoproterozico a Cmbrico Inferior (aproximadamente 600

    a 520 milhes de anos de idade) e afloram como resultado do encaixe

    profundo do Rio Tejo e resultante eroso. Nesta regio esto

    representadas a Formao Malpica do Tejo (Campos et al.,1991) e a

    Formao Cabeo das Popas (Sequeira, 2011), compostas pormetagrauvaques com algumas intercalaes de metapelitos laminados e

    por metapelitos intercalados por metaconglomerados e

    metagrauvaques, respectivamente. Estas formaes tm

    correspondncia no sector Centro-Ocidental da Extremadura, pelo

    menos, a parte inferior do Alogrupo de Ibor (Junta da Extremadura,

    2002), atingindo mais de 2000 m de espessura (por exemplo, Martn

    Herrero, 1982). Estas rochas encontram-se dobradas e so

    intersectadas obliquamente pela xistosidade primria Varisca,

    demonstrando uma fase de deformao anterior a esta Orogenia, que

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    poca de estiagem; uma das mais produtivas a Fonte do Peso (0,154

    l/s; Sampaio, 2010).

    Figura 3.Mapa geolgico da freguesia de Monforte da Beira.Adaptadoa partir do Atlas do Ambiente Digital disponibilizado pelo Instituto doAmbiente.

    As rochas quartzticas tm especial interesse hidrogeolgico. A

    permeabilidade destas rochas fissural, originando as nascentes mais

    importantes, a NW de Monforte da Beira associadas a acidentes

    tectnicos paralelos Falha de Monforte, com caudais de 1,71 l/s na

    exsurgncia do Carregal, que permite abastecer a aldeia (Sampaio,

    2010). So guas cloretadas-sdicas, hipossalinas, pobres em clcio ecidas (pH = 4,7-6,1; Sampaio, 2010).

    Figura 4. Fsseis marinhos encontrados nas formaes geolgicas de Monforte daBeira. Poro posterior de trilobite (pigdio) a) Daedalus desglandi dos quartzitos deSancada b).

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    3. Patrimnio Geolgico e Geomineiro

    A Geodiversidade da freguesia de Monforte da Beira reflecte-se

    essencialmente num rico patrimnio geomineiro (Tabela 1), dada a

    abundncia de recursos minerais explorados na antiguidade na serra de

    Monforte, como o ferro, no contexto da crista quartztica e a quantidadede vestgios antigos de metalurgia encontrados (veja-se Henriques et al.

    1995). Segundo Leito (2010) A Praa de Cima, junto da igreja, cujo

    pavimento, antes do actual calcetamento, era constitudo por terreno

    que inclua abundantes escrias metlicas, demonstra a magnitude dos

    processos metalrgicos antigos na regio.

    Tabela 1. Listagem de patrimnio geolgico e geomineiro inventariado

    DesignaoLocalizao

    (UTM)Tipologia

    Principal(ais)interesse(s)

    Casa Subterrnea 0645321 4399619PatrimnioGeomineiro

    Arqueologiamineira

    Lapa de Baixo do Cho 0645366 4399565

    Patrimnio

    Geomineiro

    Arqueologia

    mineira, cultural

    Mina do P 0646251 4398770PatrimnioGeomineiro

    Arqueologiamineira, geocultural

    Mina da Tinta 0646181 4398983PatrimnioGeomineiro

    Arqueologiamineira, geocultural

    Mina das VacasPreadas

    0646462 4398867PatrimnioGeomineiro

    Arqueologiamineira, cultural

    Miradouro do Castelo 0646728 4398959Patrimnio

    Geomorfolgico

    Tectnica,geomorfologia,paleontologia,arqueologia

    mineira

    As minas situam-se em zonas de falha, e o ferro explorado tem origemno preenchimento de estruturas brechificadas nas rochas quartzticas.

    3.1. Patrimnio Geolgico

    Miradouro do Castelo

    Do miradouro do Castelo, localizado no ponto mais elevado da Serra de

    Monforte, assiste-se a uma das paisagens mais diversificadas, do ponto

    de vista geomorfolgico, do Geopark Naturtejo (Fig. 5): em primeiro

    plano, para norte, o flanco NE do antiforma do Castelo, cujo ncleo

    mostra aflorante o Grupo das Beiras; para alm deste estende-se a

    campina de Idanha de solos avermelhados de idade paleognica, de

    onde sobressai o inselberg grantico de Monsanto e o relevo residual da

    Murracha, com o sinclinal quartztico de Penha Garcia por trs a

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    estender-se para Espanha; para NW, a extensa escarpa da Falha do

    Ponsul, que provoca o rejeito entre a Serra de Monforte e S. Martinho,

    onde se abeiram Castelo Branco, Mata e Idanha-a-Nova; no horizonte, e

    na mesma direco, os relevos proeminentes da Gardunha e da Serra

    de Alvelos, com a Serra da Estrela por detrs, compondo os demi-horsts

    da Cordilheira Central, e a Cova da Beira a adivinhar-se; olhando paraOeste, as quartzticas Serra das Talhadas e a Serra de guas Quentes;

    a Sul, os alinhamentos quartzticos da Serra de S. Mamede e os planos

    do Tejo; por fim, para leste, o domnio dos xistos que condiciona uma

    rede de drenagem dendrtica neste sector da bacia do Tejo e a

    terminao do sinclinal da Sierra de San Pedro, em Espanha.

    Os afloramentos quartzticos envolventes mostram icnofsseis do tipo

    Skolithos annulatus que atingem vrios decmetros de comprimento.

    Estes complementavam os tramos amuralhados, actuando como

    defesas naturais, com mais de 15 m de altura, com amplo domnio

    visual (Fig. 5c e d). Do lado esquerdo das escadas de acesso existe

    estreita galeria de que no se conhece o fim dadas as exguasdimenses, com cerca de 3 m de comprimento visvel, com relao com

    a actividade mineira possvel, mas incerta.

    Figura 5. Miradouro do Castelo. Pormenor do espao do antigo povoado a) Uma dasperspectivas, com Monforte da Beira aninhada em zona de falha que rejeita a Serra deMonforte e, mais longe, os blocos erguidos de Castelo Branco (escarpa de falha doPonsul) e da Cordilheira Central (Serra da Gardunha e Serra da Estrela) b) Pormenordas penedias quartzticas, intensamente fracturadas, que defendiam o povoado doCastelo a Norte c) Outra perspectiva do escarpado quartztico d).

    3.2. Patrimnio Geomineiro

    O Patrimnio Geomineiro de Monforte da Beira constitudo por minas

    proto-histricas includas no Inventrio de Patrimnio Geolgico e

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    hidrxidos de ferro (Fig. 6a). Na sua terminao mais interior existem

    vestgios de abertura de uma pequena galeria de prospeco, hoje

    totalmente entulhada. Em tempos recentes h evidncias do

    aproveitamento desta pequena mina como abrigo pastoril.

    A Casa Subterrnea no possui ainda qualquer interpretao no local eseria desejvel que fosse colocada sinaltica de localizao.

    Lapa de Baixo do Cho

    A Lapa de Baixo do Cho, conhecida localmente tambm por MinaPequena, apresenta uma pequena entrada parcialmente entulhada,

    abrindo-se numa cavidade que se adivinha mais ampla, pouco mais de

    1 m abaixo do nvel da entrada (fig.6c,d) em cujas paredes se observam

    mineralizaes de ferro (sobretudo goetite/limonite). O acesso faz-se na

    base do pequeno escarpado, em caixa de falha claramente evidenciada

    pela intensa brechificao.

    Actualmente esta mina no tem condies de visitao, devido ao

    acesso; porm seria desejvel que fosse desobstruda a entrada para

    facilitar o seu estudo e que fosse colocada sinaltica de

    localizao/interpretao.

    Figura 6.Casa Subterrnea: detalhe da parede rica em hidrxidos de ferro a) Boca damina b). Lapa de Baixo do Cho: pequena galeria parcialmente entulhada de acessoao interior, mais amplo c) Entrada, em zona de cisalhamento (falha) que corta a rochaquartztica d).

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    Mina do P

    Esta mina tem a designao local de Aljube do P uma vez que l se

    extraiu uma areia muito fina usada para arear os utenslios de lato

    (Henriques et al., 1995; Leito, 2010, p. 20). A designao local de

    aljubes para este tipo de minas interessante dada a sua derivao dotermo rabe al-jubb ou gubb, com significado de cisterna ou poo e

    parece ter relao com o topnimo da vizinha Sierra de Aljibe, que faz

    parte da Sierra de San Pedro e onde se situa o importante povoado

    proto-histrico de Aliseda (Diaz & Soldevila, 1999).

    A Mina do P (Fig. 7) dispe-se segundo uma orientao semelhante das minas anteriores e das seguintes, isto , acompanhando falhas

    com uma orientao NE-SW. Actualmente existem dois acessos: dada a

    sua pequena profundidade, parte da abbada quartztica que formava o

    tecto da mina, com cerca de 5 m de altura mxima, abateu. Mas o

    acesso original fazia-se pelo sul, ao nvel da primeira cmara, atravs

    de arco sustentado por muro no seu lado direito, que se abre em zonaampliada do ressalto litolgico (Fig. 10a). Logo na entrada so

    abundantes as escrias que testemunham a fundio do ferro boca da

    mina (Fig. 7d). O espao amplo da mina divide-se em dois patamares,

    sendo o mais interior sobrelevado em cerca de 2 m. Nos dois patamares

    separados pelo afloramento existem pequenas galerias de prospeco,

    de pequeno dimetro (Fig. 7b). A galeria de prospeco do patamar

    mais exterior no lhe conhecido o fim dado o seu dimetro ser inferior

    a 1 m, estendendo-se por mais de 5 m segundo uma orientao

    descendente.

    Figura 7. Mina do P. Abbada principal a) Galeria secundria de prospeco b)Detalhe da parede com brecha ferruginosa c) Escorial encontrado boca da mina d).

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    acompanhamento em tempo real do dia-a-dia e interaco social na

    colnia de morcegos, atravs da instalao de uma webcam de infra-

    vermelhos. A mina da Tinta possui sinaltica do Geopark Naturtejo e

    respectiva interpretao.

    Figura 8. Mina da Tinta. Acesso vertical a) Passagem estreita da galeria principal paraoutra sala em abbada b) Colnia de morcegos na cmara mais interior c)Vandalizao de frente de explorao d).

    Figura 9. Mina da Tinta. Galeria ascendente totalmente entulhada a) Concavidadeproduzida por aquecimento da rocha quartztica seguido de arrefecimento brusco;Marcas de ferramentas metlicas no minrio de ferro, de idade incerta c).

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    Figura 10. Esboo em planta dos espaos mineiros. Mina da Tinta ( esquerda); Minado P ( direita).

    Mina das Vacas Preadas

    A Mina das Vacas Preadas composta por um poo vertical alongado

    segundo a direco das camadas quartzticas, ou seja NNW-SSE, com

    3,5 m por 2 m e cerca de 10 m de profundidade (Fig. 11a, b), assim

    como por uma profunda cavidade existente do lado esquerdo do acessoao Castelo, em forma de fosso ou trincheira com mais de 20 m de

    comprido e 10 m de profundidade, alongada segundo a direco SSE-

    NNW (Fig. 11c). Este fosso est afastado do poo cerca de 20 m. A

    existncia de uma galeria horizontal no fundo do poo, que se dirige

    para NNW, ainda no conhecida, leva a crer numa possvel ligao

    entre este e o fosso, hoje parcialmente entulhado. O nome da minaadvm de uma tradio local antiga, ainda hoje evidente pelas ossadas

    existentes, de utilizar o poo como vazadouro de animais doentes

    (Henriques et al., 1995). Actualmente o poo encontra-se vedado, por

    razes de segurana. Quanto ao fosso observa-se uma enorme

    acumulao de lixos (Fig. 11d). Actualmente estas minas no tm

    condies de visitao, porm seria desejvel que fossem limpas e quefosse colocada sinaltica de localizao e advertncia para o poo

    vertical.

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    Figura 11. Poo das Vacas Preadas. Localizao do poo a) Poo de secoquadrangular a dar acesso a galeria horizontal b) Trincheira c) Detalhe do lixo quepreenche o fundo da explorao mineira d).

    Apesar de seu mbito regional, o Complexo Mineiro de Monforte daBeira reconhecido como um dos dezasseis geomonumentos do

    Geopark Naturtejo, um dos locais-chave seleccionado por melhor

    testemunhar a histria geolgica-mineira da regio e por permitir ao

    pblico uma melhor compreenso destes episdios (Fig. 12).

    No que diz respeito minerao antiga, a indstria do ferro remonta a

    1700 a.C., desenvolvida pelos Hititas, e chega Pennsula Ibrica no

    sc. V a.C. (Lores, 2004), tendo Moncayo (Catalayud) e Turiasson

    (Tarazona) como referncias principais, com fama entre os romanos

    (Lores, op. cit.).

    At ao sc. XVIII, a reduo directa do minrio era feita por combusto

    do carvo de lenha, para obteno do ferro metlico. Dado o elevado

    ponto de fuso do ferro, preciso martelar o minrio incandescncia,

    eliminando assim a escria e outras impurezas.

    Na regio, so relativamente comuns os indcios de mineralizaes

    filonianas de ferro na Formao do Quartzito Armoricano, tal como

    acontece em Monforte da Beira, algumas vezes co-ocorrendo minas e

    vestgios de metalurgia. o caso de Pea del Castillo em Cabaas del

    Castillo, mina datada da Idade do Ferro (Junta de Extremadura, 2007).

    Indcios similares a este so abundantes no Geopark Villuercas-Ibores-

    Jara. Ao longo da Serra de Hospital del Obispo, na vertente do Vale deIbor, restos de antigas exploraes de ferro, de pequeno tamanho,

    encontram-se com frequncia junto das runas de antigas fundies,

    provavelmente de origem medieval, como a Mina Alfonsina e Los

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    Regajos del Aguila (Navalvillar de Ibor) (Gumiel et al., 1993). A

    explorao de ferro nos jazigos da Formao do Quartzito Armoricano

    na regio deu-se, pelo menos, at h cerca de 40 anos, com

    testemunhos ainda vivos da actividade mineira informal, e muito

    primitiva, nas minas da Cacheira, em Penha Garcia (Fig. 13), a qual

    dever ter fornecido as forjas da aldeia e do concelho.

    Apesar dos minerais de ferro serem bastante evidentes no interior das

    minas de Monforte da Beira, outros minerais metlicos podero ter sido

    aqui explorados desde o Bronze Final Idade do Ferro e ao perodo

    Romano.

    A mineralizao de ouro ocorre na regio associada a cavalgamentos e

    falhas inversas com reactivaes tardias, com orientaes NE-SW a N-

    S e NW-SE. O ouro nativo ocorre em veios irregulares ou associados a

    processos de enriquecimento supergnico que produziram a

    transformao da pirite em xidos de ferro. Na vizinha Extremadura,

    minas deste tipo tm teores em ferro em torno dos 10%, com teoresbaixos de ouro e prata (Gumiel et al., 1993). A fundio do ferro pode ter

    sido aproveitada para a fuso fraccionada, e consequente separao,

    do ouro e do ferro, pois o ouro funde a 1063 e o ferro a 1530. Em

    captulo prprio salientaremos os achados, em zona prxima de

    Monforte da Beira, de tesouros de diferentes idades, de ouro e prata,

    que testemunham, pelo menos, a circulao destes metais preciosos

    nas imediaes do povoado do Castelo. S estudos geoqumicos

    complementares podero determinar com preciso os teores de ferro,

    ouro e prata eventualmente extrados das minas de Monforte da Beira,atravs da anlise das mineralizaes e das escrias produzidas.

    Figura 12. Reconstituio de tcnicas de explorao subterrnea proto-histricas eprocessos metalrgicos a) Fundio de ferro para moldagem de ferramentas b).

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    Figura 13. Explorao de ferro em perodo contemporneo (dcada de 60 do sc. XX).Minas da Cacheira (Penha Garcia) a) Pormenor das mineralizaes de hematite emveios de quartzo b).

    4. Outros pontos de interesse

    - Biodiversidade

    A Serra de Monforte encontra-se nas imediaes do Parque Natural do

    Tejo Internacional, pelo que apresenta uma Biodiversidade de referncia

    (ICNB, 2007). Referia Siborro (1758) sobre a Serra de Monforte: H

    abundncia de gado mido de cabelo, javalis, coros, veados, coelhos,

    perdizes e muito lobo.

    A paisagem pode ser facilmente confundida com os horizontes

    alentejanos, com uma extensa planura cortada apenas pelo relevo da

    serra quartztica de Monforte, com extensos montados de sobro e de

    azinho, assim como vastas manchas de matagal.

    A biodiversidade desta serra assenta essencialmente em solos xistentose quartzticos, pobres em matria orgnica, explorados pelo Homem

    (Fig. 14), apenas em pequenas hortas ou pomares e em olivais, alguns

    de grande extenso, embora muitos deles estejam j abandonados.

    Quanto ao clima destaca-se o contraste das elevadas temperaturas

    durante os meses de Vero, que por vezes ultrapassam 40 C, com um

    Inverno suave mas com amplitudes trmicas significativas. Esta regioapresenta uma das precipitaes mdias anuais mais baixas do pas.

    Podem ser vistas a sobrevoar a rea espcies protegidas como o grifo,

    abutre-negro, cegonha-branca, abelharuco, poupa ou chasco-preto,

    entre muitas outras aves, de que se destacam as rapinas. Algumas aves

    mais pequenas como o rouxinol ou o melro no so fceis de observarmas possvel ouvi-las. Mamferos como a raposa, o coelho, o veado

    ou o javali, tambm no so fceis de encontrar, apenas algumas

    pegadas ou excrementos. Existem ainda morcegos escondidos em

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    cavidades abrigadas e sossegadas, como as minas abandonadas ou

    outros refgios.

    Figura 14.Elementos da flora local, fortemente modificada. Sobreiro a) Cogumelos b)Medronheiro c) Oliveira d).

    Os bosques conservam ainda algumas reminiscncias da floresta antigasubtropical hmida de h 10 milhes de anos, com plantas como o

    loureiro (Lauraceae) ou o medronheiro (Arbutus unedo). A cobertura

    arbrea constituda por sobreiros (Quercus suber) e azinheiras

    (Quercus ilex), assim como carvalhos (carvalho-negral, Quercus

    pyrenaica) que nesta rea apresentam manchas muito bem

    conservadas. H reas extensas com eucaliptais e pinheiro-bravo que

    impedem o desenvolvimento da floresta autctone e empobrecem os

    solos.

    A cobertura arbustiva das zonas com menos perturbao humana

    caracteriza-se por estevas (Cistus ladanifer), rosmaninho (Lavandula

    stoechas), alecrim (Rosmarinus officinalis), roselha-grande (Cistus

    albidus), tomilho (Thymus vulgaris), carqueja (Genista tridentata), urze

    (Erica spp.), entre outras espcies.

    Na Primavera so frequentesas joaninhas (Adalia sp.) e as borboletas.

    Os fungos so tambm elemento caracterstico, em determinadas

    alturas do ano e em condies especficas de humidade e temperatura,

    desenvolvendo-se fundamentalmente em solos com manta morta ou em

    pequenos galhos mortos, destacando-se o Amanita muscaria pela sua

    abundncia e beleza (Fig. 14b), bem como o Macrolepiota procera.

    comum observarem-se lquenes nos troncos e galhos das rvores,

    essencialmente sobreiros e oliveiras, alguns muito bem desenvolvidos.

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    semelhante a outras que se encontram nas frentes de explorao do

    interior dos aljubes. Tal como na Sierra de Aljibe (Diaz & Soldevila,

    1999) este poder ter sido um povoado relacionado com a vigilncia e

    explorao de jazigos minerais, pelo menos, desde o Bronze Final.

    Capela de Santo Antnio

    A capela de Santo Antnio, localizada num amplo terreiro rodeado por

    olivais, j perto da aldeia, tem uma arquitectura simples, com o vo da

    porta principal revestida de cantaria encimada por um fronto quebrado

    e com ameias (Fig. 15a).

    Igreja Matriz

    A Igreja Matriz data do sculo XVIII (1721) e dedicada a Nossa

    Senhora da Ajuda, padroeira da freguesia. A sua imagem destaca-se da

    fachada principal, num nicho, representada por uma esttua em granito

    (Fig. 15b). O seu interior guarda uma imagem de Cristo crucificado do

    sc. XIV. constituda por uma s nave, sete altares e dois plpitos de

    talha dourada de elaborada beleza.

    Do restante patrimnio arquitectnico de Monforte da Beira (Fig. 16)

    vale a pena salientar a casa senhorial de D. Carlota Ferraz, a qual

    domina a envolvente da Igreja Matriz. No centro da aldeia existe umportal quinhentista, estrutura em granito, bem conservada, que preserva

    a herana da arquitectura manuelina, no n.7 da Rua Nova. A Torre do

    Relgio, de planta quadrangular, encimada por um coruchu em forma

    de pirmide, com pinculos e grgulas nos ngulos. Por fim, as poucas

    casas de arquitectura tradicional em quartzito, de elevado sentido

    esttico e smbolo de uma regio.

    Figura 15.Capela de Santo Antnio a) Igreja Matriz b).

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    Figura 16. Portal quinhentista, em cantaria a) Casa de D. Carlota Ferraz b) Otradicional Madeiro junto Igreja Matriz c) Arquitectura tradicional em quartzito d).

    - Cultura

    Monforte da Beira salienta-se pelas festas de S. Joo, em especial, e

    pela de Esprito Santo e de Nossa Senhora da Ajuda. Do ponto de vista

    gastronmico, destaca-se a sopa de gro, o ensopado de cabrito ou

    assado, e, em particular os doces de festa: broas de mel e o bolo dos

    santos (boleima), filhs, cavacas, fascias ou xurrilhos. Os queijos da

    Beira Baixa DOP, com produo biolgica, o azeite e as bicas, so

    produtos locais reconhecidos que levaram a Aldeia em Movimento

    Associao Cultural, Desportiva e Recreativa de Monforte da Beira aorganizar, com o apoio do Municpio de Castelo Branco, a Feira dos

    Sabores dedicado bica de azeite, que se tornou uma das referncias

    culturais deste concelho.

    O S. Joo de Monforte da Beira, a festa por excelncia dos

    Monforteiros, ainda preserva muito da originalidade que foi descrita porJaime Lopes Dias, h sessenta anos (Dias, 1952; fig. 17): Alguns dias

    antes do S. Joo, todas as famlias de Monforte trazem do campo:

    rosmaninho, alecrim e outras plantas que, no comeo da noite de 23

    para 24 de Junho, amontoam s portas de suas casas e no cruzamento

    das ruas, e a que deitam fogo logo que os sinos da Torre do Relgio e

    os foguetes do o sinal convencionado. () Tambm boca noite, navspera do dia de S. Joo, todos os que na povoao tm montada,

    burro, muar, gua ou cavalo, vo concentrar-se porta do alferes

    (festeiro). Os alferes e seus dois padrinhos vm juntar-se-lhes montados

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    em cavalos ou guas, cujos arreios so ornamentados com flores e

    fitas, e as selas cobertas com colchas brancas. A esposa do alferes

    entrega ao marido, pela janela ou varanda de sua casa, antes que se

    inicie a marcha, o S. Joo (a bandeira de S. Joo). Os padrinhos

    empunham, cada um, uma vela acesa envolvida num ramo de flores e

    fitas. Assim preparada a volta, os sinos da Torre do Relgio rompem, ordem do alferes, em toque desordenado, ao mesmo tempo que

    deflagram foguetes. o sinal convencionado para o acender das

    fogueiras. A cavalhada inicia a marcha, a volta, passando sobre as

    chamas olorosas a cantar em coro o S. Joo (). A volta termina

    porta do alferes, onde a esposa deste recebe a bandeira, que ali fica

    exposta. Ainda a cavalo, o alferes oferece vinho a todos os presentes. Ovinho no todo bebido. Deixam sempre uma pinga que despejam

    sobre a cabea das montadas para que estas no tenham aguamento.

    () s nove horas realiza-se a primeira das quatro voltas ou cavalhadas

    do dia. Pelas janelas de algumas casas, h pessoas munidas de fitas de

    seda com a medida da sua altura, prometidas a S. Joo, em hora de

    doena ou aflio. O alferes aproxima-se e os devotos atam as fitas na

    bandeira. () Na Devesa realizam-se as corridas para a disputa de

    galos oferecidos pelo povo. Posto um galo na meta e os cavaleiros, dois

    a dois, a certa distncia, dado o sinal de partida, correm o mais que

    podem. Ganha o galo, o que chegar primeiro. Os galos so oferecidos

    pelos solteiros, s noivas; pelos casados, s esposas.

    Figura 17.O tradicional S. Joo de Monforte da Beira, em 2007. As Cavalhadas a)Detalhe do ritual b)

    5. Descrio do percurso pedestre Caminhos do Ferrode Monforte

    A proposta do percurso pedestre geoturstico Caminhos do Ferro de

    Monforte, de pequena rota, circular e tem como ponto de partida e dechegada a aldeia, com zona de parqueamento. As caractersticas do

    percurso (Tabela 2) permitem a sua utilizao por qualquer tipo de

    visitante e em qualquer altura do ano, percorrendo os principais pontos

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    de interesse, que devero estar sinalizados e interpretados (Fig. 18),

    assim como toda a aldeia, podendo contribuir para a dinmica

    econmica do seu pequeno comrcio. Neste sentido, fundamental a

    referncia ao alojamento, restaurao e comrcio local, assim como aos

    locais de venda de produtos locais, que existem em Monforte da Beira e

    suas imediaes, em todas as plataformas de divulgao do percursopedestre, e mesmo no painel de incio de percurso, favorecendo assim a

    permanncia do turista atravs de uma experincia mais completa e

    enriquecedora do territrio.

    Tabela 2. Caractersticas do percurso

    Partida e chegada: Largo da Misericrdia, Monforte da BeiraU.T.M. 06445681 4400056mbito: ambiental, cultural, paisagstico e desportivoTipo de percurso: circularExtenso: 9,5 km, de pequena rota (PR).Nvel de dificuldade: baixoDesnveis: pouco acentuados

    Altitude mxima: 457 mAltitude mnima: 290 mTipo de caminho: caminhos rurais e florestaispoca aconselhada: todo o anoNotas: aconselha-se calado confortvel e gua; sugere-se a utilizaode binculos. Este percurso tambm pode ser feito em BTT.

    Figura 18. Mapa do percurso sobre imagem do GoogleEarth@. A amarelo a posiodos pontos de interesse.

    O percurso inicia-se junto do nicho da Rainha Santa Isabel, no Largo da

    Misericrdia. Virando esquerda, segue-se pela Rua Quelha de

    Malpica, com arquitectura tradicional em quartzito at sada da rea

    urbana. Ao fim de 200 m, sobe-se esquerda atravessando olival; asvistas alargam-se sobre a aldeia. Numa curva direita, j na cumeada,

    encontrar-se-o esquerda as variantes que permitem visitar a Casa

    Subterrnea e a Lapa de Baixo do Cho.

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    Implementao

    Para a implementao do percurso pedestre, alm da marcao no

    terreno com sinaltica direccional de acordo com as normas da

    federao Portuguesa de Campismo e Montanhismo, ser necessrio a

    colocao de um painel de introduo/enquadramento a colocar no

    ponto de partida/chegada, no Largo da Misericrdia. Ao longo do

    percurso sugere-se a colocao de cinco painis temticos de

    interpretao, de acordo com a informao anteriormente apresentada:

    Etnografia, Geodiversidade, Biodiversidade, Paisagem e Histria.

    A sinaltica do Geopark Naturtejo contempla j as minas mais

    importantes, facilitando desta forma a visitao. A Mina do P e a Mina

    da Tinta possuem sinaltica direccional, sinaltica de localizao e um

    painel de interpretao, que s reforaro o percurso Caminhos do

    Ferro de Monforte (Fig. 19), assim como a sua fundamental ligao ao

    territrio do Geopark Naturtejo.

    de inegvel importncia o potencial turstico da Serra de Monforte no

    contexto da regio de Castelo Branco. No entanto, os seus patrimnios

    permanecem longe dos roteiros tursticos, acabando por se degradar,

    em vez de contriburem para o desenvolvimento sustentvel local.

    Figura 19. Sinaltica do Geopark Naturtejo j existente no local. Direccional a)Localizao b) Interpretao c).

    Olhando para as boas prticas que se desenvolvem ali bem perto, na

    vizinha Extremadura, vale a pena conhecer o que se tem vindo a fazer

    nos ltimos anos para a valorizao de patrimnio mineiro com

    caractersticas semelhantes ao de Monforte da Beira. Na Sierra de San

    Pedro, em Santiago de Alcntara, a algumas dezenas de km de

    Monforte da Beira, em linha recta, vamos encontrar a Ruta Cueva del

    Buraco e a Ruta Cueva de la Grajera. No incio dos percursos pedestres

    existe um interessante Centro de Interpretao do Megalitismo, que faz

    a reconstituio de um monumento funerrio megaltico. A este seassocia um complexo turstico com restaurante, parque ldico, etc. A

    Cueva del Buraco uma mina de ferro, com um enquadramento

    geolgico em tudo semelhante ao de Monforte da Beira, e uma das mais

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    emblemticas estaes com arte rupestre da Extremadura. Segundo

    Bueno et al. (2006) e Carrera et al. (2007), encontram-se representadas

    cenas sociais por conjuntos humanos, datveis do Calcoltico-Idade do

    Ferro, infelizmente praticamente invisveis no local, no fora os estudos

    arqueolgicos que agora a reconstituem (Fig. 20).

    Figura 20. Um exemplo do aproveitamento turstico de minas de ferro proto-histricas.El Buraco em Santiago de Alcntara, Sierra de San Pedro a) Painel interpretativo daarte rupestre b) Incio do percurso pedestre Ruta Cueva el Buraco c) Centro deInterpretao do megalitismo, arquitectura inspirada nas construes dolmnicaspossivelmente contemporneas de El Buraco d).

    Outro exemplo de valorizao do patrimnio arqueolgico e mineiro, em

    contextos geolgicos similares a Monforte da Beira, o trabalho que

    tem sido desenvolvido em Aliseda. Tal como em Monforte da Beira, a

    criao de percursos pedestres e centros de interpretao nestes

    pequenos municpios extremenhos contribuem para o reconhecimento

    dos patrimnios e para a dinmica econmica local.

    Educao

    O percurso pedestre Caminhos do Ferro de Monforte adequa-se aos

    contedos curriculares do Ensino Bsico e Secundrio das disciplinasdas Cincias Naturais (Biologia e Geologia) e Histria, podendo ser feito

    com guia especializado e ajustado aos diversos anos de escolaridade.

    Trata-se de um percurso pedestre privilegiado de Educao Ambiental

    (Fig. 21), j experimentado por diversas vezes pela Naturtejo em visitas

    com universidades e com alguns grupos tursticos, onde possvel

    explorar e articular a geodiversidade e a biodiversidade, com a

    explorao dos recursos minerais e a sua importncia na sociedade,

    numa perspectiva histrica e numa abordagem de desenvolvimento

    sustentvel.

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    Caminhos do Ferro de Monforte, a partir do qual podero e devero

    surgir novas abordagens de usufruto da paisagem.

    Agradecimentos

    Os autores agradecem o entusiasmo do Professor Pedro Silva, da

    Escola Superior de Tecnologia de Castelo Branco, assim como ao seu

    aluno finalista Joo Galvo, natural de Monforte da Beira. Aos membros

    da Associao Aldeia em Movimento, em particular a Nelson Marques,

    pelo apoio aos trabalhos de reconhecimento do patrimnio geomineiro

    de Monforte e a actividades desenvolvidas em parceria com o GeoparkNaturtejo.

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