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Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração Pública MARE Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado Cadernos MARE da Reforma do Estado Luiz Carlos Bresser Pereira

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Page 1: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

Exposição no Senadosobre a Reforma da

Administração Pública

MARE Ministério da AdministraçãoFederal e Reforma do Estado

Cadernos MAREda Reforma do Estado

Luiz Carlos Bresser Pereira

Page 2: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

MARE Ministério da AdministraçãoFederal e Reforma do Estado

MinistroLuiz Carlos Bresser Pereira

Chefe de GabineteJosé Walter Vazquez Filho

Secretária-ExecutivaCláudia Costin

Secretária da Reforma do EstadoAngela Santana

Secretário de Recursos LogísticosRainer Weiprecht

Secretário de Recursos HumanosLuiz Carlos de Almeida Capella

Secretário de Articulação InstitucionalCarlos Cesar Pimenta

Presidente da ENAPEscola Nacional de Administração PúblicaRegina Silvia Viotto Monteiro Pacheco

Responsável Técnico:

Ciro Campos Christo Fernandes (Revisão de Texto)

Page 3: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

Brasília - DF / 1997

MARE Ministério da AdministraçãoFederal e Reforma do Estado

Cadernos MAREda Reforma do Estado

Luiz Carlos Bresser Pereira

Caderno 3

Exposição no Senado sobre aReforma da Administração

Pública

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Pereira, Luiz Carlos Bresser, 1934 -Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração

Pública / Luiz Carlos Bresser Pereira. Brasília: Ministério daAdministração Federal e Reforma do Estado, 1997.

42 p. (Cadernos MARE da reforma do estado; v. 3)

1.Reforma administrativa - Brasil - História 2.Salários - Servidorpúblico - Evolução (1987 - 95) 3. Previdência pública -Aposentadoria. I.Brasil. Ministério da Administração Federal eReforma do Estado. II. Série. III. Título

CDD - 351.0073

Conselho EditorialCiro Campos Christo Fernandes - presidenteCláudio Seiji SatoFrederico Raphael C. Durão BritoSheila Maria Reis RibeiroSelene Marinho MachadoLetícia SchwarzMarianne Nassuno

Projeto e Editoração GráficaJoão Carlos Machado Ribeiro

Cláudio Seiji SatoJosé Murilo C. Carvalho JúniorSelene Marinho MachadoRoberta Figueiredo Abreu CruzJoão Carlos Machado RibeiroAntônia da Silva Farago

Thaisis Barboza Souza (estagiária)

Copyright © outubro,1997 . MARE.

1ª Edição, 6 outubro de 1997

Sala 740, Fones: (061) 313-1009Esplanada dos Ministérios, bloco C.Brasília - DFCEP 70046-900

Impresso no Brasil

MARE Ministério da AdministraçãoFederal e Reforma do Estado

Page 5: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

Sumário

Introdução ............................................................................... 7

Crise e Reforma ...................................................................... 9

Da Administração Burocrática à Gerencial ..................... 11

As Duas Reformas Administrativas ................................... 13

A Volta aos Anos 50 e aos Anos 30 .................................. 15

Os Salários e a Folha ............................................................ 17

Os Dois Objetivos e os Setores do Estado...................... 23

Propriedade Estatal e Privatização ................................... 26

Propriedade Pública Não-Estatal ...................................... 28

A Reforma Constitucional ................................................... 31

Previdência Pública ............................................................. 34

Três Projetos Fundamentais .............................................. 37

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Page 7: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

7Depoimento no Senado sobre a Reforma da Administração Pública

Exposição no Senadosobre a Reforma daAdministração Pública

Texto preparado para exposição no Plenário do Senado Federal,em 26 de julho de 1996

A reforma do Estado, que se tornou tema central nos anos 90em todo o mundo, é uma resposta ao processo deglobalização em curso, que reduziu a autonomia dos Estadosde formular e implementar políticas e principalmente à crise

do Estado, que começa a se delinear em quase todo o mundo nosanos 70, mas que só assume plena definição nos anos 80. No Brasil, areforma do Estado começou nesse momento, em meio a uma grandecrise econômica, que chega ao auge em 1990 com um episódiohiperinflacionário. A partir de então ela se torna imperiosa. O ajustefiscal, a privatização e a abertura comercial, que vinham sendoensaiados nos anos anteriores são então atacados de frente. A reformaadministrativa, entretanto, só se tornou umtema central no Brasil em 1995, após aeleição e a posse de Fernando HenriqueCardoso. Nesse ano ficou claro para asociedade brasileira que essa reformatornara-se condição, de um lado, daconsolidação do ajuste fiscal do Estadobrasileiro e, de outro, da existência no paísde um serviço público moderno, profissionale eficiente, voltado para o atendimento dasnecessidades dos cidadãos.

A crise do Estado impôs a necessidadede reconstruí-lo; a globalização, o imperativode redefinir suas funções. Antes daintegração mundial dos mercados e dos sistemas produtivos, os Estadospodiam ter como um de seus objetivos fundamentais proteger asrespectivas economias da competição internacional. Depois daglobalização, as possibilidades do Estado de continuar a exercer esse

Em 1995 ficou claro para asociedade brasileira que essa

reforma tornara-se condição, deum lado, da consolidação do ajuste

fiscal do Estado brasileiro, e, deoutro, da existência no país de um

serviço público moderno,profissional e eficiente, voltado

para o atendimento dasnecessidades dos cidadãos.

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papel diminuíram muito. Seu novo papel é o de facilitar para que aeconomia nacional se torne internacionalmente competitiva. Aregulação e a intervenção continuam necessárias, na educação, nasaúde, na cultura, no desenvolvimento tecnológico, nos investimentosem infra-estrutura - uma intervenção que não apenas compense osdesequilíbrios distributivos provocados pelo mercado globalizado, masprincipalmente que capacite os agentes econômicos a competir a nívelmundial. A diferença entre uma proposta de reforma neoliberal e umasocial democrática está no fato de que o objetivo da primeira é retiraro Estado da economia, enquanto que o da segunda é aumentar agovernança do Estado, é dar ao Estado meios financeiros eadministrativos para que ele possa intervir efetivamente sempre que omercado não tiver condições de coordenar adequadamente aeconomia.

Depoimento no Senado sobre a Reforma da Administração Pública

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9Crise e Reforma

1Crise e Reforma

No Brasil, a percepção da natureza da crise e, em seguida, danecessidade imperiosa de reformar o Estado, ocorreu deforma acidentada e contraditória, em meio ao desenrolarda própria crise. Entre 1979 e 1994, o Brasil viveu um período

de estagnação da renda per capita e de alta inflação, sem precedentes.Em 1994, finalmente, estabilizaram-se ospreços através do Plano Real, criando-se ascondições para a retomada do crescimento.A causa fundamental dessa crise econômicafoi a crise do Estado - uma crise que aindanão está plenamente superada, apesar detodas as reformas já realizadas. Crise quese desencadeou em 1979, com o segundochoque do petróleo. Crise que se caracterizapela perda de capacidade do Estado decoordenar o sistema econômico de formacomplementar ao mercado. Crise que sedefine como uma crise fiscal, como uma crisedo modo de intervenção do Estado, comouma crise da forma burocrática pela qual oEstado é administrado.

A crise fiscal ou financeiracaracterizou-se pela perda do crédito públicoe por poupança pública negativa. A crise domodo de intervenção, acelerada peloprocesso de globalização da economiamundial, caracterizou-se pelo esgotamentodo modelo protecionista de substituição de importações, que foi bemsucedido em promover a industrialização nos anos de 30 a 50, masque deixou de sê-lo a partir dos anos 60. Transpareceu na falta decompetitividade de uma parte ponderável das empresas brasileiras e

A crise fiscal ou financeiracaracterizou-se pela perda do crédito

público e por poupança públicanegativa. A crise do modo de

intervenção, acelerada pelo processode globalização da economiamundial, caracterizou-se pelo

esgotamento do modelo protecionistade substituição de importações. Porfim, a crise da forma burocrática deadministrar o Estado emergiu comtoda a força depois de 1988, antes

mesmo que a própria administraçãopública burocrática pudesse serplenamente instaurada no país.

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expressou-se no fracasso em se criar no Brasil um Estado do Bem-Estarque se aproximasse dos moldes social-democratas europeus. Por fim,a crise da forma burocrática de administrar o Estado emergiu com todaa força depois de 1988, antes mesmo que a própria administraçãopública burocrática pudesse ser plenamente instaurada no país.

A crise da administração pública burocrática começou ainda noregime militar, não apenas porque não foi capaz de extirpar opatrimonialismo que sempre a vitimou, mas também porque esseregime, ao invés de consolidar uma burocracia profissional no país,através da redefinição das carreiras e de um processo sistemático deabertura de concursos públicos para a alta administração, preferiu ocaminho mais curto do recrutamento de administradores através dasempresas estatais. Esta estratégia oportunista do regime militar, queresolveu adotar o caminho mais fácil da contratação de altosadministradores através das empresas, inviabilizou a construção no paísde uma burocracia civil forte, nos moldes que a reforma de 1936propunha. A crise agravou-se, entretanto, a partir da Constituição de1988, quando se salta para o extremo oposto e a administração públicabrasileira passa a sofrer do mal oposto: o enrijecimento burocráticoextremo. As conseqüências da sobrevivência do patrimonialismo e doenrijecimento burocrático, muitas vezes perversamente misturados,serão o alto custo e a baixa qualidade da administração públicabrasileira.

Crise e Reforma

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2Da AdministraçãoBurocrática à Gerencial

A administração burocrática clássica, baseada nos princípiosde administração do exército prussiano, foi implantada nosprincipais países europeus no final do século passado; nosEstados Unidos, no começo deste século e no Brasil, em

1936, com a reforma administrativa promovida por Maurício Nabuco eLuís Simões Lopes. É a burocracia que Max Weber descreveu, baseadano princípio do mérito profissional.

Entretanto, embora tenham sido valorizados instrumentosimportantes à época, tais como o instituto do concurso público e dotreinamento sistemático, não se chegou a adotar consistentemente umapolítica de recursos humanos que respondesse às necessidades doEstado. O patrimonialismo (contra o qual a administração públicaburocrática se instalara), embora em processo de transformação,mantinha ainda sua própria força no quadro político brasileiro. Aexpressão local do patrimonialismo - o coronelismo - dava lugar aoclientelismo e ao fisiologismo e continuava a permear a administraçãodo Estado brasileiro.

A administração pública burocrática foi adotada para substituira administração patrimonialista, que caracterizou as monarquiasabsolutas, na qual o patrimônio público e o privado eram confundidos.O nepotismo e o empreguismo, senão a corrupção, eram a norma.Tornou-se assim necessário desenvolver um tipo de administração quepartisse não apenas da clara distinção entre o público e o privado, mastambém da separação entre o político e o administrador público. Surgeassim a administração burocrática moderna, racional-legal. Surge aorganização burocrática capitalista, baseada na centralização dasdecisões, na hierarquia traduzida no princípio da unidade de comando,

Os Dois Objetivos e o Setores do Estado

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na estrutura piramidal do poder, nas rotinas rígidas, no controle passoa passo dos processos administrativos. Surge a burocracia estatalformada por administradores profissionais especialmente recrutados etreinados, que respondem de forma neutra aos políticos.

Como a administração pública burocrática vinha combater opatrimonialismo e foi implantada no século XIX, no momento em quea democracia dava seus primeiros passos, era natural que desconfiassede tudo e de todos - dos políticos, dos funcionários, dos cidadãos. Já aadministração pública gerencial parte do pressuposto de que jáchegamos a um nível cultural e político em que o patrimonialismo estácondenado e a democracia é um regime político consolidado.

Aos poucos foram-se delineando oscontornos da nova administração pública:(1) descentralização, do ponto de vistapolítico, transferindo recursos e atribuiçõespara os níveis políticos regionais e locais; (2)descentralização administrativa, através dadelegação de autoridade para osadministradores públicos transformados emgerentes crescentemente autônomos; (3)organizações com poucos níveis hierárquicosao invés de estruturas piramidais; (4)organizações flexíveis ao invés de unitárias

e monolíticas, nas quais as idéias de multiplicidade, de competiçãoadministrada e de conflito tenham lugar; (5) pressuposto da confiançalimitada e não da desconfiança total; (6) controle por resultados, aposteriori, ao invés do controle rígido, passo a passo, dos processosadministrativos e (7) administração voltada para o atendimento docidadão, ao invés de auto-referida.

Mais amplamente, a administração pública gerencial estábaseada em uma concepção de Estado e de sociedade democrática eplural, enquanto que a administração pública burocrática tem um vezocentralizador e autoritário. Enquanto esta acredita em umaracionalidade absoluta, que a burocracia está encarregada de garantir,aquela pensa na sociedade como um campo de conflito e incerteza,no qual cidadãos defendem seus interesses, afirmam suas posiçõesideológicas, que afinal se expressam na administração pública. Nestestermos, o problema não é o de alcançar a racionalidade perfeita, masdefinir instituições e práticas administrativas suficientemente abertas etransparentes para que o interesse coletivo na produção de benspúblicos pelo Estado seja razoavelmente atendido.

Mais amplamente, a administraçãopública gerencial está baseada em

uma concepção de Estado e desociedade democrática e plural,enquanto que a administração

pública burocrática tem um vezocentralizador e autoritário.

Os Dois Objetivos e o Setores do Estado

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3As Duas ReformasAdministrativas

No Brasil, a idéia de uma administração pública gerencial éantiga. Começou a ser delineada ainda na primeira reformaadministrativa, nos anos 30, com a criação das autarquias eestava na origem da segunda reforma, ocorrida em 1967.

Os princípios da administração burocrática clássica foram introduzidosno país através da criação, em 1936, do DASP - DepartamentoAdministrativo do Serviço Público. A criação do DASP representou nãoapenas a primeira reforma administrativa do país, com a implantaçãoda administração pública burocrática, mas também a afirmação dosprincípios centralizadores e hierárquicos da burocracia clássica.

A primeira tentativa de reforma gerencial da administraçãopública brasileira, entretanto, irá acontecer no final dos anos 60, atravésdo Decreto-Lei nº 200, de 1967, sob o comando de Amaral Peixoto e ainspiração de Hélio Beltrão, que foi o pioneiro das novas idéias noBrasil. Beltrão participou da reforma administrativa de 1967 e depois,como Ministro da Desburocratização, entre 1979 e 1983, transformou-se em um arauto da administração voltada para o cidadão.

A reforma iniciada pelo Decreto-Lei nº 200 foi uma tentativa desuperação da rigidez burocrática, podendo ser considerada como umprimeiro momento da administração gerencial no Brasil. Toda a ênfasefoi dada à descentralização mediante a autonomia da administraçãoindireta, a partir do pressuposto da rigidez da administração direta e damaior eficiência da administração descentralizada. Instituíram-se, comoprincípios de racionalidade administrativa, o planejamento e oorçamento, a descentralização e o controle dos resultados. Nas unidadesdescentralizadas foram utilizados empregados celetistas, submetidosao regime privado de contratação de trabalho. O momento era de

As Duas Reformas Administrativas

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grande expansão das empresas estatais e das fundações. Através daflexibilização de sua administração, buscava-se uma maior eficiência

nas atividades econômicas do Estado.

O Decreto-Lei nº 200 teve, entretanto,duas conseqüência inesperadas eindesejáveis. De um lado, ao permitir acontratação de empregados sem concursopúblico, facilitou a sobrevivência de práticaspatrimonialistas e fisiológicas. De outro lado,ao não se preocupar com mudanças noâmbito da administração direta ou central,que foi vista pejorativamente como�burocrática� ou rígida, deixou de realizarconcursos e de desenvolver carreiras de altosadministradores. O núcleo estratégico doEstado foi, na verdade, enfraquecidoindevidamente através de uma estratégiaoportunista do regime militar que, ao invésde se preocupar com a formação deadministradores públicos de alto níve,l

selecionados através de concursos públicos, preferiu contratar osescalões superiores da administração através das empresas estatais.

Desta maneira, a reforma administrativa embutida no Decreto-Lei nº 200 ficou pela metade e fracassou. A crise política do regimemilitar, que se inicia já em meados dos anos 70, agrava ainda mais asituação da administração pública, na medida que a burocracia estatalé identificada com o sistema autoritário em pleno processo dedegeneração.

O núcleo estratégico do Estado foi,na verdade, enfraquecido

indevidamente através de umaestratégia oportunista do regime

militar que, ao invés de se preocuparcom a formação de administradorespúblicos de alto nível, selecionados

através de concursos públicos,preferiu contratar os escalões

superiores da administração atravésdas empresas estatais.

As Duas Reformas Administrativas

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1 5A Volta aos Anos 50 e aos Anos 30

4A Volta aos Anos 50e aos Anos 30

A transição democrática ocorrida com a eleição de TancredoNeves e posse de José Sarney, em março de 1985, não iráentretanto apresentar perspectivas de reforma do aparelhodo Estado. Pelo contrário, significará no plano

administrativo uma volta aos ideais burocráticos dos anos 30 e no planopolítico, uma tentativa de volta ao populismo dos anos 50. Os doispartidos que comandam a transição eram partidos democráticos, maspopulistas. Não tinham, como a sociedade brasileira também não tinha,a noção da gravidade da crise que o país estava atravessando. Havia,ainda, uma espécie de euforia democrático-populista. Uma idéia deque seria possível voltar aos anos dourados da democracia e dodesenvolvimento brasileiro, que foram os anos 50.

O capítulo da administração pública da Constituição de 1988será o resultado de todas essas forças contraditórias. De um lado, ele éuma reação ao populismo e ao fisiologismo que recrudescem com oadvento da democracia. Por isso a Constituição irá sacramentar osprincípios de uma administração pública arcaica, burocrática aoextremo. Uma administração pública altamente centralizada,hierárquica e rígida, em que toda a prioridade será dada à administraçãodireta ao invés da indireta. A Constituição de 1988 ignoroucompletamente as novas orientações da administração pública. Osconstituintes e, mais amplamente a sociedade brasileira, revelaramnesse momento uma incrível falta de capacidade de ver o novo.Perceberam apenas que a administração burocrática clássica, quecomeçara a ser implantada no país nos anos 30, não havia sidoplenamente instaurada. Viram que o Estado havia adotado estratégiasdescentralizadoras - as autarquias e as fundações públicas - que nãose enquadravam no modelo burocrático-profissional clássico. Notaram

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que essa descentralização havia aberto espaço para o clientelismo,principalmente ao nível dos estados e municípios - clientelismo esseque se acentuara após a redemocratização. Não perceberam que asformas mais descentralizadas e flexíveis de administração, que oDecreto-Lei nº 200 havia consagrado, eram uma resposta à necessidadedo Estado administrar com eficiência as empresas e os serviços sociais.E decidiram completar a revolução burocrática antes de pensar nosprincípios da moderna administração pública.

A partir dessa perspectiva, decidiram, através da instauração deum �regime jurídico único� para todos os servidores públicos civis daadministração pública direta e das autarquias e fundações, tratar deforma igual faxineiros e professores, agentes de limpeza e médicos,agentes de portaria e administradores da cultura, policiais e assistentessociais; através de uma estabilidade rígida, ignorando que este institutofoi criado para defender o Estado, não os seus funcionários; através deum sistema de concursos públicos ainda mais rígido, inviabilizar queuma parte das novas vagas fossem abertas para funcionários jáexistentes; através da extensão a toda a administração pública das novasregras, eliminar toda a autonomia das autarquias e fundações públicas.

O retrocesso burocrático ocorrido em 1988 não pode seratribuído a um suposto fracasso da descentralização e da flexibilizaçãoda administração pública que o Decreto-Lei nº 200 teria promovido.Embora alguns abusos tenham sido cometidos em seu nome, seja emtermos de excessiva autonomia para as empresas estatais, seja emtermos do uso patrimonialista das autarquias e fundações (onde nãohavia a exigência de processo seletivo público para a admissão depessoal), não é correto afirmar que tais distorções possam ser imputadascomo causas desse retrocesso. Na verdade, ele foi o resultado, emprimeiro lugar, de uma visão equivocada das forças democráticas quederrubaram o regime militar sobre a natureza da administração públicaentão vigente. Na medida que, no Brasil, a transição democráticaocorreu em meio à crise do Estado, esta última foi equivocadamenteidentificada, pelas forças democráticas, como resultado, entre outros,do processo de descentralização que o regime militar procuraraimplantar. Em segundo lugar, foi a conseqüência da aliança políticaque essas forças foram levadas a celebrar com o velho patrimonialismo,sempre pronto a se renovar para não mudar. Em terceiro lugar, resultoudo ressentimento da velha burocracia contra a forma pela qual aadministração central fora tratada no regime militar: estava na hora derestabelecer a força do centro e a pureza do sistema burocrático.Finalmente, um quarto fator relaciona-se com a campanha peladesestatização que acompanhou toda a transição democrática: este fatolevou os constituintes a aumentar os controles burocráticos sobre asempresas estatais, que haviam ganhado grande autonomia graças aoDecreto-Lei nº 200.

A Volta aos Anos 50 e aos Anos 30

Page 17: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

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5Os Salários e a Folha

A inexistência de uma política remuneratória para os servidorespúblicos federais, durante o período autoritário, não foicorrigida no retorno à democracia. As distorções salariais, quejá eram grandes, apenas se aprofundaram, enquanto o total

de gastos, que aumentou durante o governo Sarney, foi violentamentereduzido pelo governo Collor, através de uma grande redução dossalários médios reais. No governo Itamar, o nível de salários érecuperado, ao mesmotempo que o total degastos com pessoal crescede forma explosiva.

C o n f o r m edemonstra a Tabela 1, ossalários, que haviam sidoreduzidos para a metadeentre 1989 e 1992, voltampara um nível superior aopico anterior (1990) em1995. O governo procurouentão, através de umprograma de �isonomiasalarial�, corrigir asprofundas distorções naremuneração dosservidores que seacumularam a partir dasegunda metade dos anos80. O resultado, entretanto,foi apenas um forteaumento nos gastos com pessoal, que alcançaram um pico históricoem 1995, sem que as distorções fossem eliminadas.

Índice PCC - nível

superiorÍndice ponderado *

1989 100.0 100.0

1990 105.8 114.7

1991 70.1 75.7

1992 61.7 67.3

1993 82.1 81.6

1994 98.9 97.0

1995 116.7 124.7

Tabela 1: Índice de Remuneração Média Real dos Servidores Civis do Executivo

Observação: O Índice Ponderado foi construído a partir do índice das principais carreiras ponderado pelo número deocupantes de cada carreira. Foi destacado o índice do Nível Superior do PCC - Plano de Classificação de Cargos, porqueessa é a carreira mais representativa do serviço público brasileiro.

Fonte: MARE - Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado, com base em dados do Diário Oficial daUnião.

Os Salários e a Folha

Page 18: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

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O aumento das remunerações ocorrido no governo Itamarsomado a alguns aumentos adicionais realizados nos três primeiros

meses do governoFernando Henrique,provocaram um violentoaumento dos saláriosmédios reais e umaexplosão correspondentedos gastos totais compessoal, no governofederal. A Tabela 2apresenta os principaisdados a respeito dadespesa global. Em 1995,o gasto com pessoalalcançou, em reaisdeflacionados, um picoabsoluto: 39,6 bilhões dereais, importando emaumento de 30 por centoreal, de 1994 para 1995,porcentagem semelhanteao aumento do saláriomédio real nesse períodode um ano, que foi de 28por cento. Em termos de

participação da folha no PIB, porém, o pico continuou a ser 1990, emconseqüência do aumento dos salários que o governo que então seencerrava concedeu aos servidores federais.

Os aumentos salariais realizados no governo Itamar nãolograram reduzir as distorções salariais existente no serviço público

federal. Estas distorções podem ser avaliadassob dois ângulos. De um lado temos osdesequilíbrios em relação ao mercado detrabalho privado. De outro, os desequilíbriosinternos, com alguns setores ganhando muitobem e outros muito mal.

Existe no país uma crençageneralizada de que a remuneração dos

servidores públicos é baixa. A verdade não é essa. Elas são baixas paraalguns setores, altas para outros. A Tabela 3 baseia-se em umacomparação entre os salários do setor público e do setor privado, naqual foram confrontadas as remunerações de cargos com atribuiçõessemelhantes nos dois mercados. Os resultados mostram que, enquantoos executivos e profissionais de nível superior recebem salários mais

em R$ bilhõesÍndice

(1989=100)em % do PIB

1987 16.8 66.0 3.46

1988 20.6 80.9 4.26

1989 25.4 100.0 6.68

1990 29.3 115.3 6.47

1991 24.0 94.5 4.85

1992 19.6 77.0 4.58

1993 26.5 104.0 4.91

1994 30.5 120.0 5.14

1995 39.6 155.9 6.15

Tabela 2: Gastos com Pessoal Federal Civil e Militar

Observação: O valor de 1995 está sujeito a pequenas alterações, pois o gasto referente a dez/95 são estimativas. Os valoresestão atualizados pela inflação até dez/95. O percentual do PIB foi calculado em relação aos valores correntes (não corrigidospela inflação), o que implica alguma diferença em relação à evolução do índice.

Existe no país uma crençageneralizada de que a remuneração

dos servidores públicos é baixa.

Os Salários e a Folha

Page 19: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

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elevados no setor privado, os funcionários menos qualificados do setorpúblico (como os que trabalham em atividades auxiliares daadministração, digitação, estoques, manutenção, instalação, vigilância,portaria, limpeza e copa, entre outros) têm remuneraçãosubstancialmente maior do que nosetor privado. Dessa forma, o setorpúblico corrige o fortedesnivelamento existente entre osaltos ordenados e os baixos saláriosdo setor privado, que explica boaparte da alta concentração de rendaexistente no país, mas o faz criandouma outra distorção: aincomunicabilidade entre osmercados público e privado detrabalho.

Por outro lado,internamente ao serviço público federal, as distorções são tambémprofundas. Estas distorções internas têm origem no regime militar,quando o serviço público foi relegado a segundo plano e a burocraciado Estado passou a ser recrutada através das empresas estatais. Aconseqüência foi uma forte redução dos salários dos servidoresestatutários, que até hoje se reflete na baixa remuneração dosparticipantes no Plano de Classificação de Cargos, que então pretendiaser o sistema universal de carreira e remuneração dos servidores federais.

Para fugir a essa situação, dois tipos de estratégias foramadotadas: o Poder Judiciário, o Ministério Público e o Poder Legislativo,tornados fortemente autônomos do ponto de vista administrativo a partirde 1988, trataram de aumentar por conta própria, independentementedo Poder Executivo, sua remuneração. Por outro lado, no PoderExecutivo, as categorias tradicionalmente mais poderosas - osprocuradores, os delegados de polícia, os diplomatas, os auditores fiscais- e as novas carreiras de administradores-economistas criadas depoisda abertura democrática - os analistas do tesouro e do orçamento e osgestores governamentais - conseguiram �gratificações deprodutividade�, que, na verdade, não eram outra coisa senão umaestratégia para corrigir seus salários sem que fosse necessário aumentara remuneração de todo o funcionalismo público de nível superior.

Dado seu caráter ad hoc, estas duas estratégias, perfeitamentecompreensíveis e até certo ponto necessárias para que o Estado pudessevoltar a recrutar pessoal de bom nível nos setores estratégicos daadministração, tiveram como resultado o aprofundamento dasdistorções no sistema remuneratório dos servidores.

Tabela 3: Salários Médios: Setor Público e Privado (reais de maio de 1995)

Fonte: MARE (1995): SIAPE (Sistema Integrado de Administração de Pessoal) e Coopers & Lybrand.

Os Salários e a Folha

Salário Médio

Setor Privado

Salário Médio

Setor Público

Diferença

Público/Privado

Cargos Executivos 7.080 5.736 -19%

Cargos de Nível

Superior1.899 1.814 -5%

Cargos de Nível

Técnico/Médio926 899 -3%

Cargos

Operacionais437 635 45%

Page 20: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

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Finalmente, temos uma terceira origem das distorções do sistemaremuneratório federal: a possibilidade de �incorporações de vantagens�,como �quintos�, somada à possibilidade de acumulação de cargos eseus respectivos proventos por servidores ativos e inativos. Estasincorporações e acumulações, habilmente manipuladas, permitiram

que um número crescentede servidores passassema ganhar altos salários,surgindo então aexpressão �marajás� paraidentificar essesfuncionários. AConstituição de 1988procurou enfrentar oproblema através de um�teto de salários�,correspondente à maiorremuneração em cadaum dos poderes(Ministros de Estado,

deputados federais e senadores e Ministros do Supremo TribunalFederal), mas interpretações judiciais permitiram que esse teto fossecontornado.

Os aumentos de saláriosconcedidos durante o governo Itamarprovocaram um enorme crescimentona folha de pagamento do governofederal, como já vimos pela Tabela 2e podemos vê-lo novamente naTabela 4. A folha quase dobrou o seuvalor em termos reais: de uma médiade 23,2 bilhões de reais em 1991/93,subiu para 39,9 bilhões em 1995 e parauma estimativa em torno de 39 bilhõesem 1996, mesmo sem a concessão dereajuste em janeiro desse ano.

Esse crescimento da folha nãose deveu ao aumento do número defuncionários. Dada a necessidade deajuste fiscal, que ficou patente a partirde 1987 e dado o custo elevado quepassou a representar a contratação de

novos servidores públicos, os concursos públicos foram quasetotalmente suspensos a partir de 1988, de forma que o número total defuncionários diminuiu. Na verdade, conforme pode ser observado pela

MÉDIA 91/93 1994 1995*

Rs$ % Rs$ % Rs$ %

ATIVOS 14,8 63,8 16,5 54,0 20,3 50,8

INATIVOS/PENS. 7,0 30,2 12,5 41,0 17,3 43,2

BEN. GLOBAIS E AJUSTES 0,0 0,0 -0,4 1,3 0,0 0,0

TRANSFER NCIAS 1,4 6,0 1,9 6,3 2,4 6,0

TOTAL 23,2 100,0 30,5 100,0 39,9 100,0

Tabela 4: Despesa com Pessoal da União (bilhões de reais de dezembro/95)

(*) Estimativa

Fonte: SIAFI

C IV IS

E S T A T U T Á R IO S *U N IÃ O **

1 98 8 7 05 .5 4 8 1 .44 2 .6 57

1 98 9 7 12 .7 4 0 1 .48 8 .6 08

1 99 0 6 28 .3 0 5 1 .33 8 .1 55

1 99 1 5 98 .3 7 5 1 .26 6 .4 95

1 99 2 6 20 .8 7 0 1 .28 4 .4 74

1 99 3 5 92 .8 9 8 1 .25 8 .1 81

1 99 4 5 83 .0 2 0 1 .19 7 .4 60

1 99 5 *** 5 67 .6 8 9

Tabela 5: Evolução do Número de Servidores da União

(*) Civis da Adm. Direta (Poder Executivo), Autarquias e Fundações

(**) Inclui, além dos civis estatutários, os funcionários das empresas estatais.

(***) Posição de dezembro

Fonte: Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado (1995).

Os Salários e a Folha

Page 21: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

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Tabela 5, o número de funcionários ativos, que chegou a alcançar 713mil em 1989, baixou para 567 mil em 1995. Se considerados tambémos funcionários das empresas estatais, a queda foi ainda maior, dado ofato adicional das privatizações.

A explicação para o aumento da folha tem que ser encontradano aumento dos salários a partir de 1993 e no custo crescente dosservidores inativos. O elevado valor das aposentadorias, mais altas doque o último salário da atividade em quase 20 por cento, quando emoutros países os proventos da aposentadoria variam em torno de 70por cento do último salário e o fato de os servidores poderem seaposentar muito cedo, levou a uma explosão no custo dos inativos.Conforme vemos pela Tabela 4, os inativos e pensionistas, que járepresentavam 30 por cento do custo da folha de pessoal em 1991/93,passam a representar 40 por cento em 1996.

Por outro lado, é preciso considerar que o Brasil conta com oprovavelmente mais generoso sistema previdenciário do mundo.Enquanto nos demais países a aposentadoria ocorre aos 60 ou, maisfreqüentemente, aos 65 anos, aqui ela ocorre, em média, aos 53,subindo para 56 anos quando não se consideram as aposentadoriasproporcionais, em que o funcionário se aposenta antes de completar onúmero de anos exigido, sendo que há muitos casos de aposentadoriasde funcionários com cerca de 40 anos. Nos demais países, aporcentagem com que o funcionário se aposenta em relação a seuúltimo salário varia de 50 a 75 por cento, ao passo que aqui é de 120por cento. Os trabalhadores rurais, que são os mais pobres, aposentam-se em média aos 63 anos com umsalário mínimo. Os trabalhadoresurbanos aposentam-se um pouco maiscedo, com uma aposentadoria maior,mas muito distante das aposentadoriasdo setor público. Na verdade, oprivilégio dos servidores públicos estáse escondendo atrás das limitações derecursos que impedem maiores saláriosno setor público e maiores proventosde aposentadoria no setor privado.

A Tabela 6 dá uma idéia doprivilégio representado pelo atualsistema de aposentadorias do setorpúblico, quando comparado com o dosetor privado. O valor das aposentadorias dos funcionários doLegislativo é 21,7 vezes maior do que a aposentadoria dos beneficiáriosdo INSS. No caso do Judiciário, 20,4 vezes e do Executivo, 8,25 vezes.Como o número de funcionários dos dois primeiros Poderes é pequeno,

Em salários mínimos Vezes

INSS 1.7 1.0

Executivo (civis) 14.0 8.25

Legislativo 36.8 21.7

Judiciário 34.7 20,4

Tabela 6: Aposentadorias Médias União/INSS

Fonte: Ministério da Administração Federal e da Reforma doEstado e Ministério da Previdência Social.

Os Salários e a Folha

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a média geral deve estar ainda na casa das 8 vezes. É certo que, desde1993, os servidores vêm contribuindo para seu sistema de previdência.Em média, contribuem com 11 por cento do seu salário, sem limite deremuneração, enquanto que no caso do INSS a contribuição e obenefício estão limitados a 10 salários mínimos. Por isso, os servidorescontribuem, em média, com mais do que os trabalhadores do setorprivado. Os cálculos realizados, entretanto, mostram que suacontribuição média é apenas 3,4 vezes maior do que a contribuiçãomédia para o INSS, enquanto que o benefício é 8 vezes maior.

Os Salários e a Folha

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6Os Dois Objetivos e osSetores do Estado

A partir de 1995, com o governo Fernando Henrique, surgeuma nova oportunidade para a reforma do Estado em geral,e, em particular, do aparelho do Estado e do seu pessoal.Esta reforma terá como objetivos: a curto prazo, facilitar o

ajuste fiscal, particularmente nos Estados e Municípios, onde existe umclaro problema de excesso de quadros; a médio prazo, tornar maiseficiente e moderna a administração pública, voltando-a para oatendimento dos cidadãos.

O ajuste fiscal será realizado principalmente através daexoneração de funcionários por excesso de quadros, da definição clarade teto remuneratório para os servidores e através da modificação dosistema de aposentadorias, aumentando-se o tempo de serviço exigido,a idade mínima para aposentadoria, exigindo-se tempo mínimo deexercício no serviço público e tornando o valor da aposentadoriaproporcional à contribuição. As três medidas exigirão mudançaconstitucional. Uma alternativa às dispensas por excesso de quadros,que provavelmente será muito usada, será o desenvolvimento desistemas de desligamento voluntário. Nestes sistemas os administradoresescolhem a população de funcionários passíveis de exoneração epropõem que uma parte deles se exonere voluntariamente em trocade indenização e treinamento para o mercado privado. Diante dapossibilidade iminente de dispensa e das vantagens oferecidas para odesligamento voluntário, um número substancial de servidores seapresentará.

Já a modernização ou o aumento da eficiência da administraçãopública será o resultado, a médio prazo, de um complexo projeto de

Os Dois Objetivos e os Setores do Estado

Page 24: Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração …

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reforma, através do qual se buscará a um só tempo fortalecer aadministração pública direta ou o �núcleo estratégico do Estado� edescentralizar a administração pública, através da implantação de

�agências autônomas� e de �organizaçõessociais�, controladas por contratos de gestão.Nestes termos, a reforma proposta não podeser classificada como centralizadora, comofoi a de 1936, ou descentralizadora, comopretendeu ser a de 1967. Nem, novamente,centralizadora, como foi a contra-reformaembutida na Constituição de 1988. Em outraspalavras, a proposta não é a de continuar oprocesso cíclico que caracterizou aadministração pública brasileira, alternandoperíodos de centralização e dedescentralização, mas a de, ao mesmotempo, fortalecer a competênciaadministrativa do centro e a autonomia dasagências e das organizações sociais. O elode ligação entre os dois sistemas será ocontrato de gestão, que o núcleo estratégicodeverá aprender a definir e controlar e asagências e organizações sociais, a executar.

A proposta de reforma do aparelho do Estado considera aexistência de quatro setores dentro do Estado: (1) o núcleo estratégico

do Estado, (2) as atividades exclusivas deEstado, (3) os serviços não-exclusivos oucompetitivos e, (4) a produção de bens eserviços para o mercado.

No núcleo estratégico são definidasas leis e políticas públicas. É um setorrelativamente pequeno, formado no Brasil,em nível federal, pelo Presidente daRepública, pelos ministros de Estado e acúpula dos ministérios, responsáveis peladefinição das políticas públicas, pelo tribunaisfederais encabeçados pelo SupremoTribunal Federal e pelo Ministério Público.

A nível estadual e municipal existem correspondentes núcleosestratégicos.

As atividades exclusivas de Estado são aquelas em que o �poderde Estado�, ou seja, o poder de legislar e tributar, é exercido. Inclui apolícia, as forças armadas, os órgãos de fiscalização e de regulamentaçãoe os órgãos responsáveis pelas transferências de recursos, como oSistema Unificado de Saúde, o sistema de auxílio-desemprego, etc.

Já a modernização ou o aumento daeficiência da administração públicaserá o resultado, a médio prazo, deum complexo projeto de reforma,

através do qual se buscará, a um sótempo, fortalecer a administração

pública direta ou o �núcleoestratégico do Estado� e

descentralizar a administraçãopública através da implantação de

�agências autônomas� e de�organizações sociais�, controladas

por contratos de gestão.

A proposta de reforma do aparelhodo Estado parte da existência de

quatro setores dentro do Estado: (1) onúcleo estratégico do Estado; (2) as

atividades exclusivas de Estado; (3)os serviços não-exclusivos ou

competitivos e (4) a produção debens e serviços para o mercado.

Os Dois Objetivos e os Setores do Estado

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Os serviços não-exclusivos ou competitivos do Estado sãoaqueles que, embora não envolvendo poder de Estado, o Estado realizae/ou subsidia porque os considera de alta relevância para os direitoshumanos, ou porque envolvem economias externas, não podendo seradequadamente recompensados no mercado, através da cobrança dosserviços.

Finalmente, a produção de bens e serviços para o mercado érealizada pelo Estado, através das empresas de economia mista, queoperam em setores de serviços públicos e/ou em setores consideradosestratégicos.

Em cada um desses setores será necessário considerar: (1) qualo tipo de propriedade e (2) qual o tipo de administração pública maisadequados. A Figura 1 resume as relações entre essas variáveis.

Figura 1: Setores do Estado, Formas de Propriedade e de Administração

Fonte: Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado. Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. (1995).

Os Dois Objetivos e os Setores do Estado

Publicização

Privatização

F O R M A D E P R O P R IE D A D E F O R M A D E A D M I N I S T R A Ç Ã O

E s ta ta lP ú b lic a

N ã o - E s t a ta lP riv a d a B u r o c r á tic a G e r e n c ia l

N Ú C L E O E S T R A T É G IC O

L e g is la tiv o , Ju d ic iá r io ,

P re s id ê n c ia , C ú p u la d o s

M in is té rio s

A T IV ID A D E S

E X C L U S IV A S

P o líc ia , R e gu la m e n ta ç ã o

F is c a l iz a ç ã o , F o m e n to ,

S e g u r id a d e S o c ia l B ás ic a

S E R V I Ç O S N Ã O -

E X C L U S IV O S

U n iv e r s id a d e s ,

H o s p ita is , C e n t r o s d e

P e s q u is a , M u s e u s

P R O D U Ç Ã O P A R A O

M E R C A D O

E m p r e s as E s ta ta is

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7Propriedade Estatale Privatização

No núcleo estratégico e nas atividades exclusivas de Estado,a propriedade deverá ser, por definição, estatal. O núcleoestratégico usará, além dos instrumentos tradicionais -aprovação de leis (Congresso), definição de políticas

públicas (Presidência e cúpula dos ministérios) e emissão de sentençase acórdãos (Poder Judiciário) - de um novo instrumento, que sórecentemente vem sendo utilizado pela administração pública: ocontrato de gestão. Através do contrato de gestão, o núcleo estratégicodefinirá os objetivos das entidades executoras do Estado e os respectivosindicadores de desempenho e garantirá a essas entidades os meioshumanos, materiais e financeiros para sua consecução. As entidadesexecutoras serão, respectivamente, as �agências autônomas�, no setordas atividades exclusivas de Estado e as �organizações sociais�, nosetor dos serviços não-exclusivos de Estado.

As atividades exclusivas de Estado deverão ser, em princípio,organizadas através do sistema de �agências autônomas�. Uma agênciaautônoma deverá ter um dirigente nomeado pelo respectivo Ministro,com o qual será negociado o contrato de gestão. Uma vez estabelecidosos objetivos e os indicadores de desempenho, não apenas qualitativos,mas também quantitativos, o dirigente terá ampla liberdade para geriro orçamento global recebido. Poderá administrar seus funcionários comautonomia no que diz respeito a admissão, demissão e pagamento epoderá realizar compras, apenas obedecendo aos princípios gerais delicitação.

No outro extremo, no setor de bens e serviços para o mercado,a produção deverá ser em princípio realizada pelo setor privado. Daí oprograma de privatização em curso. Pressupõe-se que as empresas serão

Propriedade Estatal e Privatização

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mais eficientes, se controladas pelo mercado e administradasprivadamente. Daí deriva o princípio da subsidiariedade: só deve serestatal a atividade que não puder ser controlada pelo mercado. Alémdisso, a crise fiscal do Estado retirou-lhe capacidade de realizarpoupança forçada e investir nas empresas estatais, tornando-seaconselhável privatizá-las. Esta política está de acordo com a concepçãode que o Estado moderno, que prevalecerá no século XXI, deverá serum Estado regulador e transferidor de recursos e não um Estadoexecutor.

Propriedade Estatal e Privatização

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8Propriedade PúblicaNão-Estatal

Finalmente, devemos analisar o caso das atividades não-exclusivasde Estado. Nossa proposta é de que a forma de propriedadedominante nesse setor deverá ser a pública não-estatal.

No capitalismo contemporâneo, as formas de propriedaderelevantes não são apenas duas, como geralmente se pensa e como a

divisão clássica do Direito entre DireitoPúblico e Privado sugere - a propriedadeprivada e a pública - mas são três: (1) apropriedade privada, voltada para arealização do lucro (empresas) ou doconsumo privado (famílias); (2) apropriedade pública estatal e, (3) apropriedade pública não-estatal. Com isto,estou afirmando que o público não seconfunde com o estatal. O espaço público émais amplo do que o estatal, já que podeser estatal ou não-estatal.

O reconhecimento de um espaçopúblico não-estatal tornou-se particularmente importante em ummomento em que a crise do Estado aprofundou a dicotomia Estado-setor privado, levando muitos a imaginar que a única alternativa àpropriedade estatal é a privada. A privatização é uma alternativaadequada quando a instituição pode gerar todas as suas receitas davenda de seus produtos e serviços e o mercado tem condições deassumir a coordenação de suas atividades. Quando isto não acontece,está aberto o espaço para o público não-estatal. Por outro lado, nomomento em que a crise do Estado exige o reexame das relações

O reconhecimento de um espaçopúblico não-estatal tornou-se

particularmente importante em ummomento em que a crise do Estadoaprofundou a dicotomia Estado-setor privado, levando muitos a

imaginar que a única alternativa àpropriedade estatal é a privada.

Propriedade Pública Não-Estatal

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Estado-sociedade, o espaço público não-estatal pode ter um papel deintermediação ou pode facilitar o aparecimento de formas de controlesocial direto e de parceria, que abrem novas perspectivas para ademocracia.

No setor dos serviços não-exclusivos de Estado, a propriedadedeverá ser em princípio pública não-estatal. Não deve ser estatal porquenão envolve o uso do poder de Estado. E não deve ser privada, porquepressupõe transferências do Estado. Deve ser pública para justificar ossubsídios recebidos do Estado. O fato de ser públicanão-estatal, por sua vez, implicará na necessidade da atividade sercontrolada de forma mista, pelo mercado e pelo Estado. O controle doEstado, entretanto, será necessariamente antecedido e complementadopelo controle social direto, derivado do poder dos conselhos deadministração constituídos na sociedade. E o controle do mercado sematerializará na cobrança dos serviços. Desta forma, a sociedade estarápermanentemente atestando a validade dos serviços prestados, aomesmo tempo que se estabelecerá um sistema de parceria ou de co-gestão entre o Estado e a sociedade civil.

Na União, os serviços não-exclusivos de Estado mais relevantessão as universidades, as escolas técnicas, os centros de pesquisa, oshospitais e os museus. A reforma proposta é a de transformá-los emum tipo especial de entidade não-estatal, as organizações sociais. Aidéia é transformá-los, voluntariamente, em �organizações sociais�, ouseja, em entidades que celebrem um contrato de gestão com o PoderExecutivo e contem com autorização do Legislativo para participar doorçamento público. A Organização social não é, na verdade, um tipode entidade pública não-estatal, mas uma qualidade dessas entidades,declarada pelo Estado.

A transformação dos serviços não-exclusivos de Estado empropriedade pública não-estatal e sua declaração como organizaçãosocial se fará através de um �programa de publicização�, que não deveser confundido com o programa de privatização, na medida que asnovas entidades conservarão seu caráter público e seu financiamentopelo Estado. O processo de publicização deverá preservar a finalidadepública da nova entidade, que será, contudo, regida pelo direito privadoproporcionando-lhe, assim, uma autonomia administrativa e financeiramaior. Para isto, será necessário extinguir as atuais entidades e substituí-las por fundações públicas de direito privado, criadas por pessoas físicas.Desta forma, se evitará que as organizações sociais sejam consideradasentidades estatais, como aconteceu com as fundações de direito privadoinstituídas pelo Estado e assim submetidas a todas as restrições daadministração estatal. As novas entidades receberão, por cessãoprecária, os bens da entidade extinta. Os atuais servidores da entidadetransformar-se-ão em uma categoria em extinção e ficarão à disposição

Propriedade Pública Não-Estatal

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da nova entidade. O orçamento da organização social será global, acontratação de novos empregados será pelo regime da Consolidaçãodas Leis do Trabalho, as compras deverão estar subordinadas aosprincípios da licitação pública, mas poderão ter regime próprio. Ocontrole dos recursos estatais postos à disposição da organização socialserá feito através de contrato de gestão, além de estar submetido àsupervisão do órgão de controle interno e do Tribunal de Contas.

Propriedade Pública Não-Estatal

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9A ReformaConstitucional

A reforma mais importante, porque dela depende a maioria dasoutras, é naturalmente a constitucional. Além de seu significadoadministrativo, ela tem um conteúdo político evidente. Na medida quesuas principais propostas - a flexibilização da estabilidade, o fim doregime jurídico único, o fim da isonomia como preceito constitucional,o reforço dos tetos salariais, a definição de um sistema de remuneraçãomais claro, a exigência de projeto de lei para aumentos de remuneraçãonos três Poderes - sejam aprovadas, não apenas abre-se espaço para aadministração pública gerencial, mas também a sociedade e seusrepresentantes políticos sinalizam seu compromisso com umaadministração pública renovada, com um novo Estado moderno eeficiente.

O sistema atual é rígido, todos os funcionários têm estabilidade,a qual só pode ser rompida através de um processo administrativo emque se prove falta grave. A enumeração das faltas que podem serconsideradas é ampla, incluindo a desídia. Na verdade, entretanto,alguém só é demitido se furtou, se ofendeu grave e publicamente, ouse abandonou o emprego. Se isto aconteceu e puder ser provado, ofuncionário poderá ser demitido sem nenhum direito. Nos demais casos,seja porque é difícil de provar, seja porque há uma cumplicidadegeneralizada que inviabiliza a demissão, ninguém é demitido.

Na proposta de reforma, o governo abandonou esse tudo ounada, segundo o qual ou o servidor conserva o emprego ou perdetodos os seus direitos e partiu para um sistema gradualista, semelhante

A Reforma Constitucional

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ao já adotado pelo setor privado. São criadas duas novas causas paraa demissão, além da falta grave: a demissão por insuficiência dedesempenho e a exoneração por excesso de quadros. Para ficar claroque a demissão por insuficiência de desempenho não é a mesma coisaque falta grave, o funcionário terá direito a uma pequena indenização.Esta indenização será maior se o desligamento tiver como causa oexcesso de quadros, já que nesse caso não há responsabilidade pessoaldo funcionário pelo fato de ter sido exonerado.

A demissão por insuficiência de desempenho se dará caso acaso. Seu objetivo será permitir que o administrador público possacobrar trabalho do funcionário e assim viabilizar a administração públicagerencial. Já o desligamento por excesso de quadros será impessoal evoltado para a demissão de grupos de funcionários. O objetivo é reduzircustos, é garantir que os contribuintes não sejam obrigados a pagarpor funcionários para os quais o Estado não tenha necessidade. Nosegundo caso a indenização corresponderá, em princípio, a um saláriopor ano trabalhado, no primeiro, à metade desse valor.

O servidor só poderá ser demitido por insuficiência dedesempenho se for submetido a processo de avaliação formal e terásempre direito a processo administrativo com ampla defesa. Estedispositivo visa permitir a cobrança de trabalho pelos administradorespúblicos. A motivação dos servidores deve ser principalmente positiva- baseada no sentido de missão, nas oportunidades de promoção e noreconhecimento salarial - mas é essencial que haja também apossibilidade de punição.

Já a exoneração por excesso de quadros permitirá a redução dadéficit público, através da adequação do número de funcionários àsreais necessidades da administração. A decisão deverá ser rigorosamenteimpessoal, obedecendo a critérios gerais (por exemplo, os mais jovens,ou os mais recentemente admitidos sem dependentes), de forma a evitara perseguição política. Os critérios impessoais evitarão longascontestações na Justiça, porque tornarão impossível a demissão defuncionários escolhidos pelos chefes de acordo com critérios em quesempre haveria um certo grau de subjetividade.

Uma alternativa seria combinar os critérios impessoais comavaliação de desempenho. Embora essa alternativa seja atrativa, ela éna verdade incompatível com o desligamento por excesso de quadros,que acabaria reduzido à demissão por insuficiência de desempenho.Todos os funcionários atingidos imediatamente argüiriam que estavamsendo vítimas de perseguição política, iniciar-se-ia uma longa açãojudicial e os objetivos da exoneração - reduzir quadros e despesa -seriam frustrados. De acordo com a proposta do governo, uma vez

A Reforma Constitucional

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decidida a exoneração de um determinado número de servidores, osrespectivos cargos serão automaticamente extintos, não podendo serrecriados dentro de quatro anos. Dessa forma evita-se a exoneraçãopor motivos políticos.

Estas mudanças não se fazem apenas para atender o interessepúblico e o da cidadania, mas também em benefício do funcionário.Todo servidor competente e trabalhador, quevaloriza seu próprio trabalho, serábeneficiado. Saberá que está realizando umatarefa necessária. E, ao mesmo tempo,readquirirá o respeito da sociedade - umrespeito que foi perdido quando umaminoria de funcionários desinteressados,cujo trabalho não podia ser cobrado,estabeleceu padrões de ineficiência e malatendimento para todo o funcionalismo.

É importante, entretanto, observar quea estabilidade do servidor, emboraflexibilizada, é mantida, na medida que estesó poderá ser demitido nos termos da lei.Caso haja algum abuso, poderá sempre serreintegrado pela Justiça, ao contrário do queacontece no setor privado, onde não existeestabilidade e o empregado demitido temapenas direito a indenização. A manutençãoda estabilidade do servidor não apenasreconhece o caráter diferenciado daadministração pública em relação àadministração privada, mas também a maiornecessidade de segurança que caracteriza,em todo o mundo, o trabalho dos servidorespúblicos. Estes tendem a ter uma vocaçãopara o serviço público, estão dispostos a teruma vida modesta, mas em compensação esperam maior segurança.Uma segurança maior, por exemplo, do que a dos políticos ou dosempresários. Esta segurança, entretanto, não pode ser absoluta. OEstado garante estabilidade aos servidores porque assim assegura maiorautonomia ou independência à sua atividade pública, ao exercício dopoder de Estado de que estão investidos. Não a garante para atender auma necessidade extremada de segurança pessoal, muito menos parainviabilizar a cobrança de trabalho, ou para justificar a perpetuação doexcesso de quadros.

Estas mudanças não se fazemapenas para atender o interessepúblico e o da cidadania, mas

também em benefício dofuncionário. Todo servidor

competente e trabalhador, quevaloriza seu próprio trabalho, será

beneficiado. Saberá que estárealizando uma tarefa necessária.E, ao mesmo tempo, readquirirá orespeito da sociedade - um respeito

que foi perdido quando umaminoria de funcionários

desinteressados, cujo trabalho nãopode ser cobrado, estabeleceupadrões de ineficiência e mal

atendimento para todo ofuncionalismo.

A Reforma Constitucional

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10Previdência Pública

A reforma do sistema de previdência do servidor público, porsua vez, é absolutamente fundamental, na medida que é acondição para a definitiva superação da crise fiscal do Estado.A crise do sistema previdenciário brasileiro deriva, em última

análise, de uma concepção equivocada do que seja aposentadoria.Um sistema de pensões existe para garantir uma aposentadoria digna

a quem chegou à velhice e não pode maistrabalhar. Não existe para garantir umsegundo salário a indivíduos ainda comgrande capacidade de trabalho, não existepara aposentar pessoas, particularmentefuncionários públicos, aos 50 anos de idade.

Os sistemas de aposentaria garantidospelo Estado, em todo mundo, não sãosistemas de capitalização, mas, em princípio,sistemas de repartição, em que osfuncionários ativos pagam a aposentadoriados inativos. Esta preferência pelo sistemade repartição ocorre porque o Estado, quegeralmente tem condições de garantir osistema, é um mau gestor de fundos decapitalização. Um sistema de capitalização,por outro lado, só é legítimo quando o

participante do fundo depender efetivamente da rentabilidade domesmo. Ora, é difícil senão impossível, dizer aos funcionários que suaaposentadoria dependerá de quão bem o Estado administrará o possívelfundo de capitalização.

De acordo com o sistema de repartição, entretanto, é precisoque haja um equilíbrio entre o número de jovens, que pagam o sistemaem termos correntes e o número de velhos beneficiados pela

Um sistema de pensões existe paragarantir uma aposentadoria digna

a quem chegou à velhice e não podemais trabalhar; não existe paragarantir um segundo salário aindivíduos ainda com grande

capacidade de trabalho, não existepara aposentar pessoas,

particularmente funcionáriospúblicos, aos 50 anos de idade.

Previdência Pública

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aposentadoria. No Brasil, estabeleceu-se um sistema de privilégios noque diz respeito ao sistema de aposentadorias dos servidores públicos,que se expressa na existência de aposentadoria integralindependentemente da contribuição e na possibilidade de se aposentarmuito cedo. Enquanto os trabalhadores mais pobres, do setor privadorural, aposentam-se em média aos 62 anos, os funcionários públicospodem aposentar-se com proventos integrais em uma idade poucosuperior aos 50 anos e os altos funcionários, antes dos 50 anos! Poroutro lado, o beneficio médio do aposentado pela União é 8,1 vezesmaior do que o benefício do aposentado do INSS, enquanto que acontribuição média do servidor público federal é 3,4 vezes maior doque a dos segurados no INSS.

O sistema previdenciário privado vem mantendo, através dosanos, um relativo equilíbrio financeiro devido à estrutura etária emforma de pirâmide achatada que ainda prevalece no país. Com aredução da taxa de natalidade, porém, essa estrutura etária está semodificando aceleradamente. Por isso a crise financeira da previdênciajá está aí. Uma crise que tenderá a agravar-se à medida que a relaçãoentre os jovens, que têm que pagar os custos da previdência e osaposentados, for diminuindo. Nos anos 50 essa relação era de 8 para1; hoje é de 2 para 1; em breve será de 1 para 1 e o sistema estaráinviabilizado.

No caso da previdência pública, o desequilíbrio já é total: ascontribuições dos funcionários, somadas a uma virtual contribuiçãoem dobro do Estado, financiam cerca de um quinto do custo anual dafolha de inativos e pensionistas. No entanto, o sistema sobrevive porqueo Tesouro paga a diferença. Esta, entretanto, é uma situação iníqua -afinal os contribuintes estão pagando para que os funcionários seaposentem de forma privilegiada - que se tornou insustentável do pontode vista fiscal: o sistema de aposentadorias do funcionalismo públicoprovoca um rombo anual nas finanças públicas, correspondente aquase 2 por cento do PIB.

Para se sanar, a médio prazo (a curto é impossível) essedesequilíbrio originado em um sistema de privilégios, as duas regrasgerais que estão sendo previstas para a previdência privada, deverãotambém ser rigorosamente aplicadas à previdência pública:

(1) a aposentadoria deverá ser por idade, ligeiramente corrigidapor tempo de serviço, de forma que os funcionários seaposentem em torno dos 60 anos, dez anos mais tarde doque hoje acontece;

(2) o valor da aposentadoria, baseado nas últimasremunerações recebidas, deverá ser proporcional à

Previdência Pública

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3 6

contribuição e não integral, como prevê a Constituição de1988.

Só assim será possível manter um custo razoável para o sistemaprevidenciário público. Este, entretanto, deverá permanecer garantidopelo Estado. Não faz sentido exigir de funcionários do Estado - umainstituição que, ao contrário das empresas privadas, tem condições degarantir um sistema previdenciário - que recorram obrigatoriamenteaos fundos privados de previdência complementar. O Estado garantiráa aposentadoria de seus servidores, independentemente do regimejurídico em que estiverem enquadrados.

Para calcular quanto o funcionário deverá receber ao aposentar-se, deverá ser feito um cálculo atuarial. Dada a contribuição dosfuncionários e do Estado para a aposentadoria, dadas as idades médiasem que o funcionário começa a contribuir, se aposenta e falece edado um retorno razoável do fundo virtual (já que o sistema deveráser de repartição), será possível calcular e estabelecer em lei a proporçãoda média dos últimos salários do funcionário que constituirá suaaposentadoria. Cálculos iniciais sugerem que essa porcentagem deverágirar em torno de 80 por cento.

Os direitos adquiridos e as expectativas de direitos serãoplenamente respeitadas. Os funcionários que, antes da mudança daConstituição, já têm o direito de aposentar-se, aposentar-se-ão segundoas normas atuais, mesmo que decidam fazê-lo daqui a muitos anos,quando chegarem na idade compulsória. Este é um direito adquirido.Por outro lado, as expectativas de direito serão garantidas de formaproporcional. Um funcionário, por exemplo, que começou a trabalharcom 17 anos, tem hoje o direito a aposentar-se pelo atual sistema aos52 anos. Pelo novo sistema, terá direito a se aposentar com cerca de 58anos (60 anos corrigido pelo tempo de serviço, que foi longo). Comquanto aposentaria o funcionário, também admitido aos 17 anos, queno momento da emenda constitucional tivesse completado 17 anos emeio de serviço público? Como se garantirão as expectativas de direito,sua aposentadoria, calculada através de uma simples regra de 3, ocorreráem torno dos 55 anos. O mesmo tipo de cálculo deverá ser realizadopara se determinar o valor da aposentadoria: deverá ser um valorintermediário entre a aposentadoria integral mais 20 por cento quehoje prevalece e a aposentadoria em torno de 80 por cento quecaracterizará o novo sistema.

Previdência Pública

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11Três ProjetosFundamentais

Três outros projetos, além da reforma constitucional que acabeide delinear, são ainda essenciais para a reforma do aparelhodo Estado brasileiro: descentralização dos serviços sociaisatravés das �organizações sociais�, implementação das

atividades exclusivas de Estado através das �agências autônomas�, eprofissionalização do servidor.

O primeiro projeto é o da descentralização dos serviços sociaisdo Estado, de um lado para os Estados e Municípios, de outro, doaparelho do Estado propriamente dito parao setor público não-estatal. Esta últimareforma se dará através da dramáticaconcessão de autonomia financeira eadministrativa às entidades de serviço doEstado, particularmente de serviço social,como as universidades, as escolas técnicas,os hospitais, os museus, os centros depesquisa. Para isto, a idéia é criar apossibilidade dessas entidades seremtransformadas em �organizações sociais�.

Organizações sociais serãoorganizações públicas não-estatais - maisespecificamente fundações de direitoprivado - que celebram contrato de gestão com o Poder Executivo,com aprovação do Poder Legislativo, e, assim, ganham o direito de

A autonomia da organizaçãosocial corresponderá a uma maiorresponsabilidade de seus gestores.Por outro lado, a idéia implica em

um maior controle social e emuma maior parceria com a

sociedade, já que o Estado deixade diretamente dirigir a

instituição.

Três Projetos Fundamentais

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fazer parte do orçamento público federal, estadual ou municipal. Aautonomia da organização social corresponderá a uma maiorresponsabilidade de seus gestores. Por outro lado, a idéia implica em

um maior controle social e em uma maiorparceria com a sociedade, já que o Estadodeixa de diretamente dirigir a instituição.

A implantação de um programa de�publicização� - transformação de entidadesestatais de serviço em entidades públicasnão-estatais - permitirá que essas instituiçõesganhem ampla autonomia na gestão de suasreceitas e despesas. Continuarão a contarcom a garantia básica do Estado, que lhes

cederá a título precário seus bens e seus funcionários estatutários, masagora serão entidades de direito privado, que escapam às normas eregulamentos do aparelho estatal e particularmente de seu núcleoburocrático, onde continuarão relativamente rígidas, mesmo depoisda reforma constitucional.

Neste processo, o importante é evitar a privatização e afeudalização das organizações sociais, ou seja, a apropriação destaspor grupos de indivíduos que as usam como se fossem privadas. Comesse objetivo, uma série de cautelas legais e administrativas serãoadotadas, tomando-se, entretanto, o cuidado de limitar os controlespor processo, já que o essencial será, tanto da parte do próprio Estado,quanto da sociedade, o controle por resultados das organizações sociais.

O segundo projeto é o das �agências autônomas�. A necessidadede aumentar o grau de autonomia e a conseqüente responsabilizaçãopor resultados inspiraram a formulação deste projeto, que tem comoobjetivo a transformação de autarquias e de fundações que exerçamatividades exclusivas do Estado, em agências com ampla liberdade degerenciar seus recursos humanos e financeiros, a partir de um orçamentoglobal.

O projeto das agências autônomas está se desenvolvendo emduas dimensões. Em primeiro lugar, estão sendo elaborados osinstrumentos legais necessários à viabilização das transformaçõespretendidas e um levantamento visando superar os obstáculos nalegislação, normas e regulações existentes. Em paralelo, começam aser aplicadas as novas abordagens em algumas autarquias selecionadas,que se transformarão em laboratórios de experimentação.

Finalmente, o terceiro projeto prioritário é aquele que buscarácompletar o processo de profissionalização do administrador público.Já existem carreiras relativamente bem estruturados de militares,

A necessidade de aumentar ograu de autonomia e a

conseqüente responsabilizaçãopor resultados inspiraram a

formulação deste projeto.

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policiais, juizes, promotores, procuradores, fiscais e diplomatas. Nãoestá clara a existência de uma carreira de altos administradores públicos.A idéia é desenvolver essa carreira a partir das carreiras já existentes,criadas no final dos anos 80, de Gestores Governamentais, de Analistasde Finanças e Controle e de Analistas doOrçamento. Já foram dados os primeirospassos nessa direção, através da previsãode concursos públicos anuais para essascarreiras, com datas de inscrição e númerode vagas definidos até 1999. Os concursosexigirão nível de conhecimento de pós-graduação em administração pública ou emeconomia. Os altos administradores destinar-se-ão a ocupar os cargos superiores de todosos setores da administração pública, onde senecessitam administradores generalistas, administradores financeirose de controle e administradores do orçamento e da programaçãoeconômica. Seu recrutamento se dará principalmente nos cursos demestrado profissional em administração pública, economia e ciênciapolítica.

Busca-se, portanto, um modelo de recrutamento e formaçãomisto, mais próximo ao modelo norte-americano, que recruta seusaltos administradores nos cursos de pós-graduação existentes no país,do que do francês, que usa uma única escola nacional de administraçãopara essa finalidade. A Escola Nacional de Administração Pública nãose encarregará diretamente de ministrar um curso de mestrado emadministração pública, mas coordenará o processo de concurso e deformação dos administradores.

Já foram dados os primeiros passosnessa direção através da previsãode concursos públicos anuais para

essas carreiras, com datas deinscrição e número de vagas

definidos até 1999.

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1. A Reforma do Estado dos Anos 90: Lógica e Mecanismos de Controle

2. Organizações Sociais

3. Exposição no Senado sobre a Reforma da Administração Pública

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5. Plano de Reestruturação e Melhoria da Gestão do MARE

6. A Reforma do Aparelho do Estado e as Mudanças Constitucionais

7. A Reforma Administrativa na Imprensa

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11. Uma Nova Política de Recursos Humanos

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