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CAO – Crim Boletim Criminal Comentado n° 083 Subprocuradoria-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais Mário Antônio de Campos Tebet Coordenador do CAO Criminal Arthur Pinto Lemos Junior Assessores Fernanda Narezi Pimentel Rosa Marcelo Sorrentino Neira Paulo José de Palma Ricardo José Gasques de Almeida Silvares Rogério Sanches Cunha Analista Jurídica Ana Karenina Saura Rodrigues

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CAO – Crim Boletim Criminal Comentado n° 083

Subprocuradoria-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais

Mário Antônio de Campos Tebet

Coordenador do CAO Criminal

Arthur Pinto Lemos Junior

Assessores

Fernanda Narezi Pimentel Rosa

Marcelo Sorrentino Neira

Paulo José de Palma

Ricardo José Gasques de Almeida Silvares

Rogério Sanches Cunha

Analista Jurídica

Ana Karenina Saura Rodrigues

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Boletim Criminal Comentado n° 083 – Março 2020

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SUMÁRIO

SUMÁRIO --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 2

ESTUDOS DO CAOCRIM--------------------------------------------------------------------------------------------------- 3

1- Tema: Lei 13.964/19, o confisco alargado e a sua aplicação a fatos pretéritos ................................. 3

STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM ------------------------------ 6

DIREITO PROCESSUAL PENAL ------------------------------------------------------------------------------------------- 6

1 – Tema: Aprovado no ENEM não precisa comprovar a frequência escolar para obter remição de

pena ...................................................................................................................................................... 6

2- Tema: 1ª Turma determina realização de novo Júri diante de absolvição de réu contra provas dos

autos ..................................................................................................................................................... 8

3- Tema: Prisão preventiva, revisão periódica e o Pacote Anticrime ................................................... 12

DIREITO PENAL ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ 16

1-Temas variados de Direito penal – Pesquisa Pronta no STJ............................................................... 16

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ESTUDOS DO CAOCRIM

1- Tema: Lei 13.964/19, o confisco alargado e a sua aplicação a fatos pretéritos

Reza o art. 91-A do CP:

“Art. 91-A. Na hipótese de condenação por infrações às quais a lei comine pena máxima superior a 6

(seis) anos de reclusão, poderá ser decretada a perda, como produto ou proveito do crime, dos bens

correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele que seja compatível

com o seu rendimento lícito.

§ 1º Para efeito da perda prevista no caput deste artigo, entende-se por patrimônio do condenado

todos os bens:

I - de sua titularidade, ou em relação aos quais ele tenha o domínio e o benefício direto ou indireto,

na data da infração penal ou recebidos posteriormente; e

II - transferidos a terceiros a título gratuito ou mediante contraprestação irrisória, a partir do início

da atividade criminal.

§ 2º O condenado poderá demonstrar a inexistência da incompatibilidade ou a procedência lícita do

patrimônio.

§ 3º A perda prevista neste artigo deverá ser requerida expressamente pelo Ministério Público, por

ocasião do oferecimento da denúncia, com indicação da diferença apurada.

§ 4º Na sentença condenatória, o juiz deve declarar o valor da diferença apurada e especificar os

bens cuja perda for decretada.

§ 5º Os instrumentos utilizados para a prática de crimes por organizações criminosas e milícias

deverão ser declarados perdidos em favor da União ou do Estado, dependendo da Justiça onde

tramita a ação penal, ainda que não ponham em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem

pública, nem ofereçam sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos crimes.”

A Lei 13.964/19 (Pacote Anticrime) introduziu no Código Penal o art. 91-A, que disciplina o chamado

confisco alargado (confisco ampliado ou perda alargada), uma espécie de efeito secundário da

sentença penal condenatória que consiste na perda de bens equiparados ao produto ou proveito do

crime.

A principal motivação deste tipo de medida é a despatrimonialização do criminoso de modo a

incrementar um reproche econômico significativo aos tradicionais efeitos dissuasórios e retributivos

da sanção penal, notadamente àquelas categorias delitivas altamente rentáveis. Trata-se de

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estratégia de enfrentamento à criminalidade que parte da ideia de que determinados crimes são

permeados por um alto grau de escolha racional, em que o agente avalia e assume os riscos e

benefícios decorrentes de sua prisão e do retorno proporcionado. O elevado saldo patrimonial nessa

equação de custo-benefício serve de incentivo para o intento criminoso. A análise econômica do

crime, dentre outras lições, indica que um sistema criminal eficaz deve impor riscos superiores às

vantagens inerentes à prática do crime. Ao atingir os bens que gravitam em torno da conduta

delituosa praticada pelo agente, o confisco alargado reveste-se de nítida feição econômica, é fruto

de manejo eficacional do direito penal e está inserido em um modelo de política criminal

funcionalista porque busca enfrentar, com outra mecânica, o sentimento social de impunidade que

gradativamente leva à perda da eficácia da própria ordem jurídica.

O confisco alargado não é cabível em qualquer condenação. O dispositivo em estudo elenca alguns

pressupostos necessários que delimitam seu cabimento. Importa desde já deixar assentado que esses

pressupostos servem para demonstrar que a legislação não cria uma presunção legal, mas tão

somente uma consequência anexa e direta do édito condenatório que, por opção político-criminal,

se alastra para outras esferas jurídicas e produz outros efeitos jurídicos mandamentais previstos na

norma.

Pressupostos - Os pressupostos da medida são os seguintes:

(A) condenação por crime com pena máxima superior a seis anos

(B) Incompatibilidade do patrimônio com a renda lícita do agente

Observe-se que o art. 91-A abrange todos os bens que não sejam compatíveis com a renda lícita do

criminoso, de modo a reputá-los como produto (producta sceleris) ou proveito do crime (pretium

sceleris). Para sermos mais precisos, a norma considera como algo equivalente ao produto ou

proveito do crime todos os bens correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio do

condenado e aquele compatível com o seu rendimento lícito. E, como dispõe o § 1º, entende-se por

patrimônio do condenado para os efeitos do confisco:

(1) os bens de sua titularidade, ou em relação aos quais ele tenha o domínio e o benefício direto ou

indireto, na data da infração penal ou recebidos posteriormente;

(2) os bens transferidos a terceiros a título gratuito ou mediante contraprestação irrisória, a partir do

início da atividade criminal.

Importante observar ser necessário constar na denúncia o pedido correspondente a perda alargada,

com a indicação da diferença apurada na investigação patrimonial, nos temos do parágrafo 3°, do

artigo 91-A, do CP:

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§ 3º A perda prevista neste artigo deverá ser requerida expressamente pelo Ministério Público, por

ocasião do oferecimento da denúncia, com indicação da diferença apurada.

Na sentença em que decreta a perda, o juiz deve (a) declarar a diferença apurada entre o valor do

patrimônio do condenado e aquele compatível com o seu rendimento lícito e (b) especificar os bens

cuja perda está sendo decretada.

Já se discute sua aplicação a fatos anteriores à Lei 13.964/19. Entendemos possível, sem implicar

violação ao princípio da legalidade (anterioridade). É que a natureza do instituto, como alertada no

início, não é penal, mas extrapenal. Basta que o patrimônio a ser confiscado se refira a crimes já

tipificados no nosso ordenamento.

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STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM

DIREITO PROCESSUAL PENAL:

1 – Tema: Aprovado no ENEM não precisa comprovar a frequência escolar para obter remição de

pena

Preso que consegue aprovação no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) não precisa provar as

horas de estudo para obter a diminuição da pena. Com esse entendimento, a ministra Laurita Vaz,

do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.810.154/SP, proveu o recurso especial em decisão

monocrática para conceder ao réu a remição de 66 dias de pena.

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

O exercício do trabalho e do estudo no cumprimento da pena é uma das medidas de ressocialização

adotadas pela Lei de Execução Penal, e é incentivada pela possibilidade de remição, que, no caso do

trabalho, se dá na proporção de um dia de pena para cada três dias trabalhados e, no caso do estudo,

de um dia de pena para cada doze horas de frequência escolar.

Ocorre que a Lei 7.210/84 não estabelece em detalhes quais são as atividades que podem ser

consideradas laborativas ou escolares, razão por que os tribunais são frequentemente provocados a

decidir se a remição pode ser aplicada pelo desempenho de determinadas atividades que, à primeira

vista, podem não se enquadrar em nenhuma das situações disciplinadas na lei.

Como exemplo, temos a leitura e a resenha de livros, uma atividade autônoma, que, a rigor, não

pode ser classificada como frequência escolar, mas que o STJ admite para a remição da pena sob o

argumento de que o benefício deve ser concedido em analogia in bonam partem em relação à

possibilidade de desconto da pena por meio do estudo (HC 527.446/SP, j. 12/11/2019).

Recentemente, o STJ admitiu a remição pelo estudo sem a comprovação das horas de efetiva

frequência escolar porque o preso havia concluído o ensino médio e havia sido aprovado em exame

nacional (ENEM).

A primeira instância havia deferido a remição, mas, por recurso do Ministério Público, o Tribunal de

Justiça reformou a decisão considerando que a Lei de Execução Penal não contempla a conclusão do

ensino médio e a aprovação em exames entre as causas de remição. É preciso comprovar a

frequência escolar:

“[…] Depreende-se desse dispositivo legal [art. 126 da LEP] que a pena estabelecida na sentença pode

ser reduzida caso o condenado, durante seu cumprimento, utilize parte desse tempo para trabalhar

ou estudar. Assim, a remição é, ao mesmo tempo, um fator de combate ao ócio e um incentivo à

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preparação para a vida laborativa, ou ao estímulo de sua habilidade, tudo em busca de transformar

o cumprimento da pena num tempo de aperfeiçoamento do homem que um dia deixará o cárcere.

Em outras palavras é o tempo de pena gasto para o estudo ou o trabalho que beneficia o preso, que

poderá ser ainda mais favorecido caso demonstre que o resultado do estudo feito durante o

cumprimento da pena foi eficaz sob o prisma da educação oficial.

A lei não prevê remição de pena para quem obtém certificado de conclusão de curso (fundamental,

médio ou superior) emitido por órgão do sistema de educação, que apenas aumenta a retribuição

pelo estudo, como prêmio pela efetiva dedicação a ele. A lei só prevê a remição da pena pelo tempo

dela destinado ao estudo (ou trabalho).

Daí o cálculo da remição decorrer das horas de frequência escolar (ou dos dias de trabalho) e haver

necessidade dessa atividade ser ‘certificada’ pelas autoridades educacionais competentes dos cursos

frequentados.

III – No caso dos autos não se demonstrou que parte do tempo de pena foi dedicado ao estudo, razão

pela qual descabe remição de pena pelo estudo”.

Mas, para a ministra Laurita Vaz, o fato de o preso ter concluído o ensino médio e ter sido aprovado

no exame é bastante para comprovar o aproveitamento de seu estudo, ainda que praticado de forma

autônoma. Em outras palavras, torna-se desnecessário comprovar a frequência escolar se, por outros

meios, o preso demonstra ter se dedicado a atividades educacionais:

“Sabe-se que a Lei de Execução Penal prevê, em seu art. 126, que o condenado que cumpre a pena

em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de

execução da pena.

Assim, como resultado de uma interpretação analógica in bonam partem da norma ali inserta,

segundo reiterada jurisprudência desta Corte, é possível a hipótese de abreviação da reprimenda em

razão de atividades que não tenham previsão expressa no texto legal.

[…]

Quanto ao tema, o Conselho Nacional de Justiça publicou a Recomendação n.º 44/2013, que

apresenta a possibilidade de remição por aprovação nos exames nacionais que certificam a conclusão

do ensino médio, como na hipótese dos autos:

‘Art. 1º Recomendar aos Tribunais que:

[…] V – na hipótese de o apenado não estar, circunstancialmente, vinculado a atividades regulares

de ensino no interior do estabelecimento penal e realizar estudos por conta própria, ou com simples

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acompanhamento pedagógico, logrando, com isso, obter aprovação nos exames nacionais que

certificam a conclusão do ensino fundamental Exame Nacional para Certificação de Competências de

Jovens e Adultos (ENCCEJA) ou médio Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), a fim de se dar plena

aplicação ao disposto no § 5º do art. 126 da LEP (Lei n. 7.210/84), considerar, como base de cálculo

para fins de cômputo das horas, visando à remição da pena pelo estudo, 50% (cinquenta por cento)

da carga horária definida legalmente para cada nível de ensino [fundamental ou médio – art. 4º,

incisos II, III e seu parágrafo único, todos da Resolução n. 03/2010, do CNE], isto é, 1600 (mil e

seiscentas) horas para os anos finais do ensino fundamental e 1200 (mil e duzentas) horas para o

ensino médio ou educação profissional técnica de nível médio.’

Com as regras apresentadas, busca-se incentivar o estudo do apenado e, consequentemente, sua

ressocialização, primordial objetivo da pena, buscando a readaptação ao convívio social.

Assim, aplicando a interpretação extensiva in bonam partem, entende-se cabível a remição para

presos que estudam por conta própria, merecendo relevar, ainda, o louvável esforço individual para

tanto.

Nessa perspectiva, é certo que o benefício da remição deve ser aplicado no caso dos autos, tendo

em vista que a aprovação do Recorrente no ENEM e a conclusão do ensino médio configuram

aproveitamento dos estudos realizados durante a execução da pena, conforme dispõem o art. 126

da Lei de Execução Penal e a Recomendação n.º 44/2013 do CNJ” (REsp 1.810.154/SP, j. 6/3/2020).

2- Tema: 1ª Turma determina realização de novo Júri diante de absolvição de réu contra provas dos

autos

DECISÃO DO STF- Publicado em notícias do STF no dia 10 de março de 2020

Por maioria de votos, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Tribunal do

Júri pode realizar nova deliberação em processo-crime julgado de forma contrária às provas. A

decisão foi tomada na sessão de terça-feira (10) no exame do Recurso Ordinário em Habeas Corpus

(RHC) 170559, que trata da possibilidade de o Ministério Público recorrer de julgamento em que o

Júri absolve o réu, mesmo após admitir a existência de materialidade e de indícios de autoria ou

participação no delito.

A Turma começou a julgar o caso em dezembro de 2019. O relator, ministro Marco Aurélio, votou

pelo provimento do RHC, por entender que não se trata de contradição, pois o Júri havia respondido

"sim" à pergunta “O jurado absolve o acusado?”, contida no CPP. Ele observou que o Conselho de

Sentença não é um órgão técnico e tem liberdade de decisão.

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O ministro Alexandre de Moraes abriu divergência. Ele admite a possibilidade de recurso para que

seja realizado novo julgamento pelo Júri quando uma das partes entender que a decisão foi contrária

às provas, como ocorreu no caso. “A palavra final sobre o mérito da acusação é do Júri”, afirmou. “Se

o Júri entender novamente dessa maneira, não cabe novo recurso”. O ministro Luís Roberto Barroso

votou no mesmo sentido.

Possibilidade de recurso

Na sessão de hoje, o ministro Luiz Fux acompanhou a divergência. Para ele, apesar de a lei ter incluído

o novo quesito absolutório a ser respondido pelo Júri, isto não inibe o Ministério Público de interpor

um recurso referente à absolvição contra a prova dos autos. A ministra Rosa Weber seguiu o relator.

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

A decisão manifestamente contrária à prova dos autos aparece como a mais interessante das

hipóteses de apelação contra as decisões do Júri, que aparece com mais frequência na prática e que

enseja o maior número de controvérsias. Nela, o Tribunal de Justiça, reconhecendo que a decisão

dos jurados contrariou a prova dos autos, determina a realização de um novo julgamento (§ 3º, do

art. 593). Não pode o Tribunal, portanto, ao apreciar a apelação, condenar ou absolver, sob pena de

ferir o princípio da soberania do júri, mas somente dar provimento ao recurso para que um novo

plenário seja realizado. Insistimos: suponha-se que o réu, sempre quando ouvido, inclusive quanto

interrogado em plenário, tenha confessado a autoria do homicídio, dizendo que assim agiu por

motivo torpe, ante a negativa da vítima em pagar-lhe uma bebida. Inconformado e animado pela

ingestão exagerada de álcool, quando a vítima deixava o local, contra ela investiu pelas costas,

matando-a. A despeito da eloquência da prova, o júri, contudo, o absolve. Com o recurso do

Ministério Público, ao Tribunal de Justiça não se permite condenar o réu, em que pese o absurdo da

decisão. Se assim o fizesse violaria o princípio da soberania dos veredictos. À superior instância, nessa

hipótese, é dada a possibilidade de, acolhendo o recurso do parquet, mandar o réu a novo

julgamento.

Para tanto, repetimos, é preciso que a decisão dos jurados seja manifestamente contrária à prova

dos autos. Assim se entende a decisão totalmente divorciada da prova do processo, ou seja, que não

encontra nenhum suporte no conjunto probatório colhido nos autos, “é aquela que não tem apoio

em prova nenhuma, é aquela proferida ao arrepio de tudo quanto mostram os autos, é aquela que

não tem a suportá-la, ou justificá-la, um único dado indicativo do acerto da conclusão adotada” (RT

780/653).

Se, porém, por outro lado, a decisão dos jurados encontra algum apoio na prova dos autos, tendo

eles aderido a uma das versões verossímeis dentre as apresentadas, a decisão é mantida, em nome

da soberania dos veredictos e levando-se em conta, em acréscimo, que os jurados julgam segundo

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sua íntima convicção, o que implica dizer, sem a necessidade de fundamentar seus votos. Somente –

repita-se – aquela decisão que não encontrar qualquer arrimo na prova do processo é que autorizará

novo julgamento com base nesse dispositivo legal.

O Superior Tribunal de Justiça, no n. 75, de sua Jurisprudência de Teses, fixou o seguinte

entendimento:

“Viola o princípio da soberania dos veredictos a anulação parcial de decisão proferida pelo Conselho

de Sentença acerca da qualificadora sem a submissão do réu a novo Júri” (tese n. 6).

Ainda na Jurisprudência de Teses, o Superior Tribunal de Justiça, em abril de 2017, firmou os

seguintes entendimentos sobre o tema:

“Não viola o princípio da soberania dos vereditos a cassação da decisão do Tribunal do Júri

manifestamente contrária à prova dos autos” (tese 13) e “a soberania do veredicto do Tribunal do

Júri não impede a desconstituição da decisão por meio de revisão criminal” (tese 14).

JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA

Soberania dos veredictos não é atingida

“A soberania dos veredictos do Júri – não obstante a sua extração constitucional – ostenta valor

meramente relativo, pois as decisões emanadas do Conselho de Sentença não se revestem de

intangibilidade jurídico-processual. A competência do Tribunal do Júri, embora definida no texto da

Lei Fundamental da República, não confere, a esse órgão especial da Justiça comum, o exercício de

um poder incontrastável e ilimitado. As decisões que dele emanam expõem-se, em consequência, ao

controle recursal do próprio Poder Judiciário, a cujos Tribunais compete pronunciar-se sobre a

regularidade dos veredictos. A apelabilidade das decisões emanadas do Júri, nas hipóteses de conflito

evidente com a prova dos autos, não ofende o postulado constitucional que assegura a soberania

dos veredictos do Tribunal Popular” (STF – HC n° 81423-SP, Rel. Celso de Mello, j. 18.12.2001, DJe

19.04.2001).

Opção por uma das versões. Validade

JÚRI. ACOLHIMENTO DE TESE DA DEFESA. DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS

AUTOS. INOCORRÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA – “Decisão dos jurados que acolheu a tese do homicídio

privilegiado, com base no histórico de discussões entre vítima e réu e no depoimento de testemunha

que afirmou ter escutado vozes em tom exaltado momentos antes do crime. Inexistência de decisão

arbitrária ou inverossímil. Em verdade, o Tribunal de Justiça considerou a prova de acusação mais

sólida do que a de defesa, avaliação esta, entretanto, que é reservada ao Tribunal do Júri, juízo

natural da causa, com base no critério da íntima convicção. Assim, por não caber à Justiça togada,

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nos estreitos limites da apelação contra veredicto do Tribunal do Júri, desqualificar prova idônea

produzida sob o crivo do contraditório, a decisão é ilegal. Ordem concedida para cassar a

determinação de realização de novo julgamento pelo Júri, com base no art. 593, III, d, do Código de

Processo Penal” (STF – HC n° 85904-SP, Rel. Joaquim Barbosa, j. 13.02.2007, DJe 29.06.2007).

“A decisão proferida pelo Júri Popular somente pode ser anulada, em sede de apelação, com base no

art. 593, III, “d”, do Código de Processo Penal, quando absolutamente improcedente, sem amparo

nos elementos dos autos. Com efeito, existindo duas teses contrárias e havendo plausibilidade na

escolha de uma delas pelo Tribunal do Júri, não pode a Corte Estadual cassar a decisão do Conselho

de Sentença para dizer que esta ou aquela é a melhor solução, sob pena de ofensa ao art. 5º, XXXVIII,

da Constituição Federal” (STJ – HC n° 254730-SP, Rel. Og Fernandes, j. 24.09.2013, DJe 04.10.2013).

“Para que a decisão do Conselho de Sentença seja considerada manifestamente contrária à prova

dos autos, é necessário que a versão acolhida não encontre amparo nos elementos fático-probatórios

amealhado aos autos, o que, a toda evidência, não se verifica na espécie em análise, tendo em vista

que a Corte estadual destacou, de forma fundamentada, que existem elementos concretos que dão

arrimo à decisão dos jurados, tais como prova pericial e prova testemunhal produzidas em juízo.

Manifestamente contrária à prova dos autos é a decisão que despreza as provas produzidas, não

aquela que, claramente, opta por uma das versões apresentadas em Plenário, como verificado na

espécie sub examine” (STJ – HC n° 170447-DF, Rel. Sebastião Reis Júnior, j. 2.5.2013, DJe 13.5.2013).

Impossível analisar, nos julgamentos pelo Júri, se a condenação se deu com base na prova

produzida no inquérito policial

“Após a produção das provas pela defesa e pela acusação na sessão plenária, a Corte Popular tão

somente responde sim ou não aos quesitos formulados de acordo com a livre valoração das teses

apresentadas pelas partes. Por esta razão, não havendo uma exposição dos fundamentos utilizados

pelo Conselho de Sentença para se chegar à decisão proferida no caso, é impossível a identificação

de quais provas foram utilizadas pelos jurados para entender pela condenação ou absolvição do

acusado, o que torna inviável a constatação se a decisão baseou-se exclusivamente em elementos

colhidos durante o inquérito policial ou nas provas produzidas em juízo, conforme requerido na

impetração” (STJ – HC n° 175993-RJ, Rel. Jorge Mussi, j. 06.09.2011, DJe 21.9.2011).

Perícia que atesta inimputabilidade e condenação do réu. Decisão manifestamente contrária à

prova dos autos

HOMICÍDIO SIMPLES (ARTIGO 121, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL). INIMPUTABILIDADE. LAUDO

PERICIAL. CORPO DE JURADOS QUE AFASTA AS CONCLUSÕES DO EXAME DE SANIDADE MENTAL.

CONDENAÇÃO. VEREDICTO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIO À PROVA PRODUZIDA NOS AUTOS.

CONSTRANGIMENTO CARACTERIZADO – “No caso dos autos, o Tribunal de Estadual deixou de indicar

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quais elementos de convicção seriam aptos a afastar a conclusão da perícia técnica no sentido de

que o paciente seria inimputável à época dos fatos, circunstância que revela que o corpo de jurados

proferiu veredicto manifestamente contrário à prova dos autos” (STJ – HC n° 257629-ES, Rel. Jorge

Mussi, j. 4.6.2013, DJe 12.6.2013).

Determinado novo julgamento não é reaberta a fase de instrução

“Quando o Tribunal ad quem dá provimento ao apelo para determinar a realização de um novo

julgamento, pelo fato do primeiro veredicto ter sido considerado manifestamente contrário à prova

dos autos, não se pode admitir que haja inovação no conjunto probatório que será levado ao

conhecimento do novo Conselho de Sentença, sob pena de se desvirtuar a regra recursal prevista no

artigo 593, inciso III, alínea “d”, do Código de Processo Penal, mormente em razão da norma contida

na parte final do § 3º do referido dispositivo, que impede a segunda apelação motivada na mesma

alegação” (STJ – HC n° 243452-SP, Rel. Jorge Mussi, j. 26.02.2013, DJe 12.3.2013).

3- Tema: Prisão preventiva, revisão periódica e o Pacote Anticrime

INFORMATIVO 928 STF- SEGUNDA TURMA

A Segunda Turma, por maioria, negou provimento a agravo regimental em habeas corpus, interposto

de decisão em que concedida a ordem para revogar prisão preventiva decretada em desfavor da

paciente e, em substituição, impor medidas cautelares diversas da prisão, na forma do art. 319 do

Código de Processo Penal (CPP).

Na espécie, atribui-se à paciente a suposta prática dos delitos de lavagem ou ocultação de capitais e

de participação em organização criminosa.

Prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes (relator), segundo o qual o Ministério Público Federal

não trouxe argumentos suficientes a infirmar a ato recorrido, visando apenas a rediscussão da

matéria resolvida em conformidade com jurisprudência desta Turma.

Preliminarmente, observou que a reforma legislativa operada pelo chamado Pacote Anticrime (Lei

13.964/2019) introduziu a revisão periódica dos fundamentos da prisão preventiva, por meio da

alteração do art. 316 do CPP. A redação atual prevê que o órgão emissor da decisão deverá revisar a

necessidade de sua manutenção a cada noventa dias, mediante decisão fundamentada, de ofício,

sob pena de tornar ilegal a prisão preventiva.

Isso significa que a manutenção da prisão preventiva exige a demonstração de fatos concretos e

atuais que a justifiquem. A existência desse substrato empírico mínimo, apto a lastrear a medida

extrema, deverá ser regularmente apreciado por meio de decisão fundamentada.

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O relator destacou três pontos centrais da linha argumentativa sustentada: (i) a ausência do

elemento da contemporaneidade no decreto prisional; (ii) a ausência de elementos concretos que

justifiquem a prisão preventiva e a adequação das medidas cautelares diversas; e (iii) o estado de

saúde da ora agravada.

A seu ver, embora o Parquet sustente que o tribunal estadual teria demonstrado fundamentos aptos

a restabelecer a prisão da paciente, nenhum fato concreto e atual foi apresentado no decreto

prisional, tanto que se propôs a narrar novamente os fatos utilizados como base para a própria

capitulação dos crimes, que datam de 2012 a 2016, confundindo os fundamentos pertinentes ao

mérito com os que dizem respeito à necessidade da medida cautelar extrema, tal como fez aquele

tribunal.

Diante de linha temporal apresentada, a paciente permaneceu em liberdade por período de quase

dois anos, sem que houvesse notícias de quaisquer prejuízos para a aplicação da lei penal ou para o

devido andamento da instrução criminal. Esse é um fundamento fático decisivo para que se

mantenha o ato impugnado, pois demonstra a desnecessidade da segregação cautelar. Uma nova

decretação de prisão preventiva, por meio da não manutenção do pronunciamento agravado, neste

momento, representaria ato incongruente com o atual panorama normativo do processo penal.

O ministro sublinhou a inexistência de fatos novos ou contemporâneos concretos, idôneos a justificar

a segregação cautelar da agravada. A questão da contemporaneidade foi enfatizada por recentes

alterações do CPP, trazidas pelo Pacote Anticrime. A esse respeito, tem-se o § 2º do art. 312 do CPP.

Em passo seguinte, ponderou que a segregação cautelar está fundamentada apenas em suposições

e ilações. Foi presumido que a prisão seria necessária para acautelar a ordem pública e desmantelar

a organização criminosa, pois a agravada alegadamente integraria núcleo funcional da empreitada

ilícita.

Impende que a alegação abstrata ceda à demonstração concreta e firme que tais condições realizam-

se na espécie. Não basta a mera explicitação textual dos requisitos previstos.

Registrou que, com a redação dada ao art. 319 do CPP pela Lei 12.403/2011, o juiz passou a dispor

de medidas cautelares de natureza pessoal, diversas da prisão, a permitir a tutela do meio social e

também a servir, mesmo que cautelarmente, de resposta justa e proporcional ao mal supostamente

causado pelo acusado. Eventual perigo que a liberdade represente à ordem pública ou à aplicação

da lei penal pode ser mitigado por medidas cautelares menos gravosas do que a prisão.

Ao versar sobre o estado de saúde da paciente, o relator depreendeu dos autos que ela possui

problemas de saúde comprovados que demandam tratamento cirúrgico. Isso foi utilizado, inclusive,

pelo juiz de piso no embasamento da concessão de prisão domiciliar.

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Por derradeiro, avaliou que a falta de capacidade do sistema prisional pátrio para tratar de forma

digna as patologias da paciente corrobora a tese de que as medidas impostas no ato agravado se

mostram mais adequadas do que o cárcere para acautelar a aplicação da lei penal e a instrução

processual penal no caso concreto.

Vencido o ministro Edson Fachin, que deu provimento ao agravo. Segundo ele, não há hipótese de

concessão da ordem. De igual modo, inexiste ilegalidade flagrante ou teratologia da determinação

da prisão cautelar. O ministro reputou assistir razão ao agravante. Inclusive, ao ressaltar que a

ausência de notícias da reiteração criminosa no interior da casa prisional no período em que

segregada não elide ou encurta a gravidade das infrações penais a ela atribuídas. Argumentou que a

prisão domiciliar deferida à acusada teve por escopo observar o fragilizado estado de saúde

demonstrado anteriormente. Entretanto, não há comprovação da subsistência dessa condição

excepcional. Ao final, firmou que habeas corpus não é sede para o reexame de fatos e provas.

HC 179859 AgR/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 3.3.2020. (HC-179859).

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

Redação antes da Lei 13.964/19 Redação depois da Lei 13.964/19

Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no

correr do processo, verificar a falta de motivo para que

subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões

que a justifiquem.

Art. 316. O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes,

revogar a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do

processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem

como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a

justifiquem.

Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva se, deverá o

órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua

manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão

fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.

O juiz pode, a requerimento das partes ou de ofício, revogar a prisão preventiva por ele mesmo

decretada, desde que surja fato novo que não mais justifique sua manutenção. Não se estabelece,

assim, uma situação irrevogável, mas, antes, uma apreciação da causa no estado em que se encontra

(rebus sic stantibus). Dessa decisão cabe recurso em sentido estrito, nos termos do disposto no inc.

V, do art. 581 do código.

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De acordo com a parte final do art. 316 do CPP, nada impede, ainda, que, revogada a medida, surjam

posteriormente motivos que autorizem nova decretação, estando autorizado o juiz a decidir nesse

sentido. Discute-se se essa última decisão, diferentemente da que revoga, deve ser sempre

provocada.

O dispositivo em análise reforça a ideia de transitoriedade, que é inerente à prisão preventiva. Com

efeito, enquanto a prisão em flagrante se apoia na certeza visual do crime, a prisão preventiva se

satisfaz com meros indícios suficientes de autoria, na dicção do art. 312 do código. Daí seu caráter

de exceção, cujo cabimento é, por isso mesmo, reservado para hipóteses taxativamente elencadas

em lei, a permitir, ademais, a revisão a todo tempo, seja para sua revogação, quando já decretada,

seja para decretá-la novamente.

Considerando “a preocupação da magistratura com as situações de prisão provisória com excesso de

prazo ou a manutenção da privação da liberdade após o cumprimento da sua finalidade”, o Conselho

Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução 66/2009, onde determina que, estando o réu preso

provisoriamente há mais de três meses, com o processo ou inquéritos parados, cumpre ao juiz (ou

ao relator tratando-se de recurso), investigar as razões da demora, indicando, ainda, as providências

adotadas, a serem, posteriormente, comunicadas à Corregedoria Geral de Justiça ou à Presidência

do Tribunal (no caso do relator). A propósito, como observam Alberto Silva Franco e Maurício

Zanoide, sendo o juiz “obrigado a declinar os motivos da demora sempre que concluir a instrução

fora do prazo, com maior razão deverá fundamentar a necessidade da prisão cautelar, se o arco de

tempo processual, a que alude Chiavario, previsto para um determinado procedimento, estiver

consumido” (Código de Processo Penal e sua Interpretação Judicial, 2ª ed., vol. 1, São Paulo: Editora

Revista dos Tribunais, 2004, p. 279) (grifo original).

A Lei 13.964/19, acrescentando ao art. 316 do CPP novel parágrafo, seguiu o espírito da referida

Resolução. Diz que o órgão emissor da decisão deverá revisar a necessidade de sua manutenção a

cada 90 dias, mediante decisão fundamentada, sob pena de o constrangimento, até então legal, se

tornar ilegal.

Essa disposição (art. 316, parágrafo único, CPP) coloca em xeque algumas súmulas do Tribunal

Cidadão, como, por exemplo, as de número 21 e 52. A Súmula 21 do STJ anuncia que, pronunciado o

réu, fica superada a alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo. No mesmo sentido, a

de número 52, dizendo que, encerrada a instrução criminal, não há se falar em excesso de prazo.

Ora, a revisão da necessidade da custódia preconizada pelo novel dispositivo deve ocorrer de forma

copiosa, a cada 90 dias, não se podendo presumir legalidade do constrangimento em razão do

ventilado estágio do processo.

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DIREITO PENAL:

1-Temas variados de Direito penal – Pesquisa Pronta no STJ

STJ- PESQUISA PRONTA

Crime preterdoloso- Agravante genérica: incidência?

Para a Sexta Turma, "no crime preterdoloso, espécie de delito qualificado pelo resultado, é possível

a incidência da agravante genérica prevista no artigo 61 do Código Penal". O entendimento foi

aplicado no julgamento do AREsp 1.074.503, relatado pelo ministro Nefi Cordeiro.

Clique aqui para ter acesso as jurisprudências

Princípio da consunção ou absorção- distinção entre os bens jurídicos tutelados- incidência do

princípio?

A Quinta Turma, em julgamento sob relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca, decidiu que

"não há consunção entre dois crimes em que os bens jurídicos tutelados são distintos". O

entendimento foi fixado no julgamento do REsp 1.856.202.

Clique aqui para ter acesso as jurisprudências

Tráfico de drogas-Comprovação- Laudo toxicológico definitivo- Imprescindibilidade? Comprovação

por laudo provisório: possibilidade?

De acordo com entendimento da Sexta Turma, em julgamento sob relatoria do ministro Nefi

Cordeiro, caso tenha sido juntado laudo preliminar de constatação de cocaína, assinado por perito

criminal, e estando corroborado pelas demais provas dos autos, a materialidade do crime de tráfico

de drogas encontra-se devidamente comprovada, sendo dispensável a existência de laudo definitivo

(AREsp 1.578.818).

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Estelionato- Consumação e competência para a ação penal

Em julgamento relatado pelo ministro Reynaldo Soares da Fonseca, a Terceira Seção entendeu que,

nos termos do artigo 70 do Código de Processo Penal, a competência será, em regra, determinada

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pelo lugar em que se consumou a infração; no caso do estelionato, tipificado no artigo 171 do Código

Penal, a consumação se dá no local e no momento em que é auferida a vantagem ilícita (CC 167.025).

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Estelionato- Ressarcimento: Extinção da punibilidade?

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