texto complementar 6
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II CONGRESSO NACIONAL DE SURDEZ � S. J. CAMPOS-S.P.
SIGNWRITING: ESCRITA VISUAL PARA LINGUA DE SINAIS �
O PROCESSO DE SINALIZAÇÃO ESCRITA1 Maria Salomé Soares Dallan2
�A história nasce com a escrita. Ao fornecer um registro secundário e perene do ato lingüístico primário e transitório, a escrita permite a reflexão sobre o conteúdo da comunicação, sobre as coisas do mundo e o que delas sabemos. Enquanto registro perene, promove também a segurança e consolida o contrato social. (...) Uma língua que não tem um registro escrito é limitada, e incapaz de desenvolver-se e consolidar-se a ponto de servir de base para a constituição de um povo e uma cultura. Agrupamentos que não têm registro escrito da própria língua não têm dela o domínio necessário para articular, de modo sólido e seguro, seu desenvolvimento cultural e organização social. Permanecem sem a união da organização central efetiva e sem tradições ou memória, dependentes de feudos dispersos e de intermediários para obter informações transitórias, instáveis e vulneráveis a distorções e boatos�.3 (Capovilla b, 2001-p. 1491).
A motivação para que este trabalho fosse iniciado decorreu da preocupação
que eu tinha em oferecer aos alunos com surdez estímulos adequados ao seu
potencial cognitivo, sócio-afetivo, lingüístico e político-cultural. Preocupava-me ao
ver que a dificuldade no aprendizado da língua portuguesa acarretava prejuízos a
seu processo educacional.
Neste sentido, meus estudos, desde 2001, levaram-me a ver na escrita de
língua de sinais, sistema SignWriting, uma poderosa aliada no processo de
ampliação de conhecimento de mundo por parte desses sujeitos aprendentes, capaz
de produzir ganhos cognitivos significativos, uma vez que é adequada à escrita da
1 Artigo escrito para a palestra sobre Escrita de Língua de Sinais, proferida no II Congresso Nacional de Surdez de São José dos Campos, em 23 de maio de 2009. 2 Pedagoga em Educação Especial-PUCCamp, Pos-Grad. Educação e Surdez-Unicamp. A autora deste artigo posiciona-se em situação de rompimento com embate entre oralistas e gestualistas, conforme proposto por Damázio (2009b, mimeo), por compartilhar sua visão sobre pessoa com surdez enquanto �ser humano descentrado, em que perceptivos linguísticos e cognitivos poderão ser estimulados e desenvolvidos, tornando-os seres humanos capazes, produtivos e constituídos de várias linguagens, com potencialidade para adquirir e desenvolver não somente os processos visuais-gestuais, mas também ler e escrever as línguas em seu entorno�. Neste sentido compreende que se os alunos com surdez não receberem estímulos adequados ao seu potencial cognitivo, sócio-afetivo, linguístico e político-cultural, poderão sofrer prejuízos em seu processo educacional 3 O autor da citação gentilmente esclareceu uma indagação pessoal minha com relação ao porquê do termo �boatos�, explicando-me que fez a afirmação devido ao fato de, antes do surgimento do Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngue da Língua de Sinais Brasileira, informantes com surdez tendiam a contradizer-se uns aos outros, alegando que eram seus sinais que estavam corretos e que os sinais do outro eram errados. Os profissionais que os contratavam como informantes em cursos de treinamento freqüentemente relatavam esta queixa. Relata também que quando os surdos foram convidados a trabalhar juntos e a convencionar os sinais que consideravam canônicos, as variações regionais passaram a ser respeitadas como legítimas, sendo que os esforços passaram a se concentrar na expansão do léxico a partir de uma base aceita por consenso.
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de uma língua visual/espacial como é a Libras.
Neste texto procurarei explicar inicialmente sobre o funcionamento da Escrita
de Sinais, passando ao embasamento teórico que subsidia tal prática, finalizando
com a parte prática, fruto de meu trabalho como Pedagoga em Educação Especial,
junto a alunos com surdez da Rede Municipal de Ensino de Paulínia, interior de São
Paulo.
No trabalho de campo, ouvi de colegas que também trabalham com alunos
surdos, termos como �alfabetização em Libras� ou �alfabetizado em Signwriting�,
reportando-se ao processo inicial de aprendizado da Escrita de Sinais. Refletindo
sobre isso, consultei Alves (2007, p.28) o qual diz que: �A etimologia do termo
�alfabetização� diz respeito ao processo de aquisição do sistema de codificação de
fonemas e decodificação de grafemas, apropriação do sistema alfabético e
ortográfico da língua�. Em Houais, encontramos: �Alfabetização=ato ou efeito de
alfabetizar, de ensinar as primeiras letras�. A própria etimologia da palavra vem da
junção dos nomes das duas letras iniciais do alfabeto grego: Alpha e Beta, portanto,
decorrente do processo de apropriação da escrita de uma língua oral/auditiva,
usando o código alfabético para isso.
Como o processo da escrita em Libras através deste sistema é desvinculado
do alfabeto, sendo decorrência de um processo de sinalização � interna ou externa -
optei pela criação do termo �Sinalização Escrita� por conceber que, de fato, na
escrita de Libras é este o processo que ocorre. Entenda-se, portanto que o processo
de aprendizado da sinalização escrita refere-se ao aprendizado inicial dos códigos
usados para grafar a Libras através do Sistema Signwriting: configurações de mãos,
localização espacial do sinal, expressões fisionômicas e corporais, bem como todos
os códigos que indicam também a direcionalidade e intensidade do sinal.
Como todo processo de escrita, a sinalização escrita também se inicia com o
aprendizado das unidades mínimas que compõem o sinal (palavra em Libras) e vai
se tornando complexa quando as palavras tornam-se frases e textos, que respeitam
a gramática própria das línguas de sinais.
Espero, com este trabalho, poder colabora para desmistificar a idéia que
alguns profissionais têm de que esta escrita é muito complexa, extremamente difícil
de ser aprendida e, por conseguinte, inacessível a professores ouvintes.
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1. Como surgiu o sistema escrito para línguas de sinais �
Sistema Sutton® �Não há só uma maneira de se pensar a linguagem. Há várias. (...) há ainda os que propõem outros discursos. Estes últimos são os que percebem que o objeto da ciência também é objeto de desejo. E em torno dele tecem suas aventuras reflexivas, constituindo-se em cientistas ao mesmo tempo em que instituem as diferentes formas de conhecimento sobre a linguagem�. (Orlandi, 1999-p.66)
O SignWriting ou Sistema Sutton para grafia de línguas de sinais não foi o
único sistema capaz de grafar fonemas de uma língua visual-gestual. William C.
Stokoe foi o primeiro linguista a realizar um estudo sistemático das línguas de sinais
nos Estados Unidos, na década de 60, criando uma escrita extremamente técnica
capaz de descrever essas línguas. Naquela ocasião, este cientista conseguiu
legitimar o status linguístico desta forma de comunicação/interação, uma vez que
anteriormente se pensava que as línguas de sinais não eram línguas naturais. O
sistema é constituído por um conjunto de símbolos e regras de escrita, definidos
para representar os diversos aspectos fonético-fonológicos das línguas de sinais.
O sistema SignWriting foi desenvolvido pela norte-americana Valerie Sutton,
por volta da década de 70, quando ela estava na Universidade de Copenhague, na
Dinamarca, grafando balés tradicionais através de um sistema criado por ela para
esta finalidade, o DanceWriting. Valerie Sutton despertou a atenção de
pesquisadores da língua de sinais Dinamarquesa na Universidade de Copenhague,
que viram naquela escrita uma possibilidade para notação dos sinais utilizados na
comunicação/interação das pessoas que fazem uso desta língua visual. Surgia
então, na Dinamarca, o primeiro movimento para grafar as línguas de sinais.
PaÍses que utilizam atualmente o sistema Sutton - SignWriting
De sistema escrito à mão, passou-se a um sistema possível de ser escrito no
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computador, com o programa Signwriter, criado dentro do próprio movimento Sutton
para grafia das línguas visuais. Em 2004 surgiu um programa mais amistoso,
facilitando o uso para pessoas com pouco conhecimento de informática, uma vez
que utiliza a plataforma Windows. Desenvolvido por pesquisadores da Universidade
Católica de Pelotas e que se chama SWEdit4. Utilizo este programa hoje e o
considero muito acessível, possibilitando uso de gravuras em interface com Editores
de Texto e programas de Desenho Gráfico. Embora ainda seja uma versão
experimental, podemos produzir uma infinidade de materiais em Libras, com o
auxílio dele, como veremos adiante.
O SignWriting entrou no Brasil em 1996, quando a Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, através do Professor Doutor
Antonio Carlos da Rocha Costa, que descobriu a possibilidade de uso desta escrita
junto ao computador. Este professor formou um grupo de trabalho com as
professoras Márcia Borba e Marianne Stumpf (que na época era Doutoranda em
Informática na Educação) na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGIE).
Quadros5 afirma que o SignWriting apresenta características de evolução da
escrita alfabética, e que, em maio 1998, discutiu-se a possibilidade de padronização
da escrita do mesmo sinal, pois logo que o sistema surgiu, cada pessoa escrevia da
forma como entendia que um determinado sinal deveria ser escrito graficamente, ou
seja, alguns eram mais detalhistas no traçado, outros mais simplistas.
Esta mesma pesquisadora esclarece ainda que processo semelhante
aconteceu com a língua inglesa, quando esta começou a ser escrita. Cada pessoa
escrevia a palavra de acordo com o som que ouvia, porém com a grafia que
considerasse ser a correta, processo este que teve fim com o surgimento da
imprensa. Com o estabelecimento de normas referentes à ortografia, passou-se a
escrever de forma socialmente convencionada. Segundo Capovilla (2001a, p. 55),
�quando as convenções ortográficas de uma língua já estão consolidadas, o trabalho
de leitura e escrita é imensamente facilitado e as ambigüidades são reduzidas�.
Um movimento pioneiro e de suma importância para tornar público este
sistema no Brasil deve-se à divulgação do Dicionário enciclopédico ilustrado trilingüe
da Língua de Sinais Brasileira, de autoria dos pesquisadores Fernando Cesar 4 Projeto realizado com apoios diversos, do CNPq e da FAPERGS, durante o período 1996-2006. Projeto realizado em estreita ligação como Center for
Sutton Movement Writing (http://www.signwriting.org). Disponível em: http://sign-net.ucpel.tche.br/
5 Quadros, R. M. Um capítulo da história do SignWriting. Disponível em http://www.signwriting.org/library/history/hist010.html
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Capovilla e Walkíria Duarte Raphael. Nesta obra, além das explicações formais
sobre o sistema Signwriting, pode-se encontrar para cada termo em português a
grafia em escrita de sinais, o que possibilita a reflexão e o exercício desta escrita.
(Capovilla a, 2001, p.55).
Mostro abaixo um exemplo desta escrita, que respeita a gramática própria da
Libras, que é muito diferente daquela do português. Este trecho do Hino Nacional foi
traduzido para Escrita de Sinais pela Doutora Marianne Rossi Stumpf6.
Obs: Tradução termo a termo apenas para efeitos didáticos, visando que o leitor
identifique o processo de formação de cada palavra em Libras.
1.1 � Como funciona a escrita signwriting.
Ao contrário da ilustração analógica (receptiva), a escrita SignWriting é feita a
partir do ponto de vista do sinalizador: na perspectiva EXPRESSIVA, como se o
leitor estivesse atrás do sinalizador, facilitando assim enormemente a leitura:
Fonte: Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngüe da Língua de Sinais Brasileira � Volume 1
As expressões faciais também são escritas na perspectiva expressiva:
6 Pesquisadora surda. Material disponível em http://sign-net.ucpel.tche.br/
lugar Ipiranga água rio
grupopessoa
coragem gritar
sol nasce sombra
tentar igualdade conseguir força lutar
Hino Nacional
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Sobrancelha esquerda levantada
Sobrancelha direita levantada
Fonte: Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngüe da Língua de Sinais Brasileira � Volume 1
Os sinais são escritos na vertical, de cima para baixo:
Fonte: Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngüe da Língua de Sinais Brasileira � Volume 1
Se a linha dos ombros for necessária, ela é descrita:
Fonte: Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngüe da Língua de Sinais Brasileira � Volume 1
Formas de mão básicas:
Fonte: Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngüe da Língua de Sinais Brasileira � Volume 1
Orientações da mão e da palma:
Fonte: Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngüe da Língua de Sinais Brasileira � Volume 1
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A expressão fisionômica e a expressão do olhar podem ser descritos em
detalhes:
Fonte: Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngüe da Língua de Sinais Brasileira � Volume 1
Os pontos de contato auxiliam a determinar o tipo de aproximação:
Fonte: Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngüe da Língua de Sinais Brasileira � Volume 1
Eixos imaginários onde ocorre o movimento, gerando todas as setas de
direção:
Fonte: Dicionário enciclopédico ilustrado trilíngüe da Língua de Sinais Brasileira � Volume 1
Esta escrita possibilita a grafia da Libras preservando seus cinco parâmetros de realização do movimento (Felipe, 2005, p. 23):
a) Configuração das mãos
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b) Ponto de articulação: podendo esta estar em um espaço neutro fora do corpo do sinalizador ou ancorado ao próprio corpo
c) Movimento: se existirem ou não, inclusive apontando rapidez ou lentidão do sinal, concomitância ou não das mãos na hora da realização do sinal.
d) Orientação/direcionalidade e) Expressões faciais e corporais (indicando inclusive marcações para os
olhos, sobrancelhas, língua, etc) Um manual deste sistema de escrita pode ser acessado gratuitamente
através do site http://sign-net.ucpel.tche.br, acessando o link �Lições sobre SignWriting�. Este material é uma tradução parcial e adaptação da versão em inglês, feito pela professora Marianne Rossi Stumpf.
Existe também a possibilidade de escrita do alfabeto manual, bem como dos
números:
2. Importância do letramento para a constituição das funções
superiores do cérebro humano. Há que se considerar que a criança surda não pode construir a modalidade escrita da língua majoritária à qual está submetida pela via da oralidade, ou correlacionando aspectos da oralidade com outros da escrita. A criança surda percorre caminhos próprios, uma vez que deve aprender a escrever uma língua que ela, em geral, não fala e não domina (FERNANDES, 2006).
Para Vygotsky (1998b), a compreensão da linguagem escrita é efetuada
primeiramente através da linguagem falada (no caso do surdo, seria a viso-espacial).
Inicialmente, a escrita é um simbolismo indireto, que necessita da linguagem falada
para ser produzida e compreendida. Gradualmente, a criança deixa de usar a fala na
produção da escrita, que passa a ter um caráter de simbolismo direto, passando a
ser compreendida como a fala.
O aluno com surdez tem o processo cognitivo mediado pela língua de sinais e
pelas imagens que associa a fatos e ocasiões. Quando é solicitado a grafar
determinado texto, faz a tradução de Libras para o português escrito, convertendo os
sinais isoladamente, em palavras encontradas na língua portuguesa, similares em
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significado. As duas línguas têm um sistema gramatical incompatível em termos de
tradução literal, como aliás ocorre com todas as outras línguas.
O resultado é obvio: a coerência e coesão textual de um material escrito
produzido por uma pessoa surda, que não conhece em profundidade a língua
portuguesa, ficam extremamente prejudicadas. Estudos diversos comprovam este
problema (Capovilla, Fernandes, Goldfeld, Lacerda & Góes, Oliveira, Quadros,
Sacks, Silva, Soares, Souza, entre outros).
Segundo Kato, em estudo de caso onde ela aborda sua própria aquisição de
leitura em português, bem como a aquisição de vocabulário nesta língua, após já ser
leitora proficiente em japonês (escrita parcialmente ideográfica com componentes
fonéticos), ela afirma que: �Se o aluno já é um leitor proficiente em sua língua, as
estratégias procedimentais que nela utiliza podem compensar com vantagem, o
déficit no domínio lingüístico.� (Kato,1999,p.31).
Capovilla (2005 e 2008) demonstra, através de pesquisa, que o mecanismo
da escrita, seja ela oral/auditiva ou visual/espacial, possibilita a reflexão sobre o ato
lingüístico, permitindo a retomada e revisão sobre o conteúdo comunicativo.
Possibilita, também, a estruturação dos mais diversos tipos de textos, tais como as
piadas e os poemas, que por possuírem um conteúdo carregado de significações
próprias ao gênero textual, muitas vezes só fazem sentido quando escritas na
própria língua na qual foram criadas.
Quando a escrita é compatível com os aparelhos sensoriais que o indivíduo
possui para interagir com o mundo, a fluência na compreensão do conteúdo,
decorrente do estabelecimento das relações de coesão e de coerência que
organizam o texto, é facilitada, uma vez que a correspondência língua falada/língua
escrita é condizente (Capovila, 2001, vol.2) com o conhecimento lingüístico desta
pessoa. A aquisição da escrita em língua de sinais pode favorecer ao aluno com
surdez a aquisição de novos mecanismos para abstrair e teorizar sobre o mundo
que o cerca, uma vez que a escrita complementa os conhecimentos já construídos
no discurso do sujeito em suas interações, socialmente.
Outra vantagem da escrita de sinais é que esta pode ajudar ouvintes a
aprenderem mais facilmente a Língua de Sinais, pois possibilita a grafia do sinal, o
que vem a facilitar a organização de um material de consulta posterior. O sistema
escrito também propicia a ampliação e divulgação do léxico desta língua, pois
permite maior avanço no registro de termos científicos e tecnológicos.
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A representação gráfica de uma língua que era considerada ágrafa até pouco
tempo, auxilia o processo de desenvolvimento e expansão desta língua, uma vez
que abre oportunidades variadas em seus aspectos discursivos e/ou modalidades de
uso: um sistema escrito compatível com uma língua visual-gestual possibilita aos
usuários se constituírem como sujeitos letrados, permitindo o desenvolvimento da
consciência linguística dos usuários desta e auxiliando na produção de sentidos que
o escritor e o leitor tecem sobre os efeitos discursivos inclusos nos textos
produzidos.
Este aprendizado permite ao aluno surdo uma possibilidade maior de trocas
simbólicas, exercitando e provocando a capacidade representativa dessas pessoas,
organizando e sistematizando coordenações mentais cada vez mais elaboradas já
que a escrita é em sua própria língua. A língua de sinais, no contexto da surdez,
atua inicialmente enquanto meio organizador do pensamento e, conseqüentemente,
das interações comunicativas. Sobre este salto qualitativo que o ser humano alcança
através da linguagem (que não é apenas a oral-auditiva/visual, é também escrita),
Goldfeld diz: A comunicação não é a única função da linguagem, ao contrário, a comunicação é o início de um processo extremamente complexo que resulta na internalização de conceitos e na constituição do indivíduo enquanto membro de uma cultura específica, já que a linguagem possibilita a formação de uma visão de mundo própria (Goldfeld, 1997, p.156).
A proposta de grafia da Libras no sistema SignWriting vem a completar o
processo educacional do aluno surdo, em uma proposta que visa a ampliação de se
conhecimento do mundo, possibilitando o uso de materiais escritos, disponibilizados
como complemento ao Atendimento Educacional Especializado em Libras e para o
ensino de Libras. No entanto, um cuidado deve ser tomado: misturar o ensino de
SignWriting com palavras em língua portuguesa é uma confusão teórica que deve
ser evitada.
Segundo Fernandes (2008, p. 24), devemos evitar uma prática já comum de
�admitir-se a presença da língua de sinais apenas como meio para se chegar �à
língua da maioria, a língua portuguesa��. A proposta de escrita da Libras visa à
ampliação e reflexão sobre a própria língua; não podemos considerar o processo de
sinalização escrita como mais uma metodologia para que o aluno surdo amplie seu
vocabulário na língua portuguesa.
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3. - Complementando o Atendimento Educacional Especializado
em Libras.
Na questão específica da surdez, embora já estejam sendo delineadas
propostas educacionais específicas para que este aluno frequente o ensino regular
como a proposta bilíngue sugere, poucas medidas específicas foram tomadas no
sentido de realmente prover as necessidades específicas que este aluno apresenta
quando entra na escola comum, usuária da língua portuguesa oral e escrita. Vários
estudos apontam para o fato de a solução ideal ser o Intérprete de Libras na sala de
aula. A atual Política Nacional de Educação Especial (MEC/SEESP, 2007) vai além
e preconiza saídas viáveis para o aluno com surdez conseguir adquirir
conhecimentos curriculares na escola regular.
Numa proposta de Atendimento Educacional especializado em Libras
(MEC/SEESP, 2007) a sinalização escrita pode ser incluída, possibilitando ao aluno
que pense e expresse-se em Libras, deixando o processo de aprendizagem da
língua portuguesa como um momento diferenciado, uma vez que a estrutura das
duas línguas é complexa e este processo depende do nível de conhecimento da
língua alvo, neste caso, língua portuguesa.
Por este motivo, a proposta de Ensino da Escrita de Sinais deve ser realizado
em um momento didático-pedagógico diferenciado, no qual o aluno possa
expressar-se por escrito em Libras. Este tipo de ensino pode ser desenvolvido para
complementar tanto o Atendimento Educacional Especializado em Libras, quanto no
AEE para o ensino de Libras, uma vez que nestes dois momentos a língua alvo é
apenas a língua de sinais.
Tal política avança muito em relação às anteriores, pois na área da surdez
são propostos três tipos de atendimentos educacionais específicos, realizados no
contra-turno ao freqüentado pelo aluno na escola comum. Tais acompanhamentos
pedagógicos visam auxiliar este aluno para que supere a barreira lingüística
enfrentada na escola comum, dividindo-se em:
a) AEE em Libras: o conteúdo curricular da sala de aula comum é retomado
em Libras para que o aluno apreenda os conceitos trabalhados em sala de
aula. Deve ser realizado por um professor, preferencialmente surdo, ou
por um professor fluente em Libras.
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b) AEE para o ensino de Libras: visa que o aluno adquira habilidade nesta
língua e que avance no conhecimento da mesma, uma vez que, a grande
maioria dos alunos com surdez é filho de pais ouvintes e tem dificuldades
geradas pela ausência de uma linguagem efetiva que seja comum a
ambos.
c) AEE para o ensino de língua portuguesa: como segunda língua, com
metodologia própria e professor preferencialmente licenciado em Letras.
Embora esta política avance enquanto legislação específica, é inegável
admitir que se trata de uma proposta de normatização do trabalho junto ao aluno
surdo que enfrenta algumas dificuldades, a primeira delas o fato de o Brasil ser um
país de dimensões continentais, devendo esta proposta seguir um amplo percurso
até ser assimilada por Estados e Municípios. O ganho que percebo é que a proposta
reconhece oficialmente a condição bilíngüe do aluno com surdez, apontando uma
necessidade a ser suprida e fornecendo sugestões para que as necessidades sejam
contempladas e que o aluno não seja prejudicado em seu processo de aquisição de
conhecimentos escolares.
Na prática, iniciei o ensino de Signwriting em 2002, durante a minha pós-
graduação, para um grupo de 3 adolescentes surdos que tinham imensa dificuldade
no aprendizado da língua portuguesa, mas excelente domínio da língua de sinais.
Para surpresa minha, em dois meses de ensino, com dois encontros semanais de 2
horas, em grupo. Estes alunos aprenderam facilmente a escrita, fazendo a leitura de
textos escritos em Signwriting com facilidade. Na época, existiam poucos materiais
disponíveis e a escrita era mais complicada, pois era feita no MS-DOS.
Breve tempo após este estudo inicial, passei a trabalhar com alunos surdos
inseridos em escola regular. Iniciei o ensino para um grupo de 5 adolescentes dos
quais três tinham muitas dificuldades na língua portuguesa. Estes alunos também
não apresentaram dificuldade no processo de aquisição da escrita em Libras.
Iniciamos com a escrita do alfabeto:
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Em seguida palavras, tais como o sinal pessoal:
As frases não demoraram a aparecer:
(Escritas espontâneas, sem correção.)
Em uma proposta bilíngüe, a escrita de língua de sinais vem complementar a
aquisição de conceitos em Libras:
- Primeira língua: Língua de Sinais na modalidade viso-espacial e escrita.
- Segunda língua: Português na modalidade oral e/ou orofacial e escrita.
Mostrarei abaixo um exemplo de atividade realizada com um aluno que já
sabia grafar em signwriting. Este texto partiu de uma proposta de descrição pessoal.
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O texto inicial foi em língua portuguesa, no qual o aluno escreveu o seguinte:
�Eu sou assim� oi Vilamar saúde bom, Também mim Arnon saudade muito forte amor maê - Cor da pele moreno, Cor dos cabelos preto Cor dos olhos pretos Casa fitcar amor Computador Manias você Cortar Cabelos Curto. Não ter animal de Estimação. (Texto copiado do original, inclusive com erros ortográficos, de pontuação, etc.)
Solicitei que ele escrevesse sobre si em Signwriting, e num segundo
momento eu o ajudaria no processo de tradução.
Trecho traduzido para língua
portuguesa:
�Sou assim�
Oi, o nome de minha mãe é Vilamar,
eu sou o Arnon. Nós estamos bem de
saúde.
Eu gosto muito dela. Eu tenho
saudade da minha mãe.
Se o processo torna-se mais frequente, o aluno tem maiores oportunidades de
produzir textos mais completos, uma vez que o processo de tradução escrita flui
livremente. Ele tem oportunidade de narrar-se na própria língua, exigindo um esforço
intelectual menor, o que permite liberdade para criar.
Os alunos usaram também esta escrita nas situações de tradução de texto,
como um falante de português quando cursa uma língua estrangeira, que escreve
um �lembrete� em cima da palavra que eles consideram importante memorizar mas
que estão com dificuldade para fazê-lo:
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1- Sinal �nascer� 2 � Sinal �lugar�
São pistas que os auxiliam e que dão continuidade à leitura do texto. A escrita
de língua de sinais ainda pode ser usada em outras situações:
- Dicionários (ficarão bem menores sem os desenhos e as explicações).
Podemos trocar sinais pela Internet, ampliando o conhecimento de palavras em
Libras, que apresenta variações regionais, devido ao tamanho do nosso país.
- Jogos temáticos (geografia, matemática, português, ciências, etc).
- Jogos de fixação (bingo, frase/figura, memória, etc.)
- Palavras cruzadas (perguntas em Libras, resposta em português)
- Tradução de textos didáticos.
- Tradução dos clássicos da literatura infantil, juvenil e para adultos.
As possibilidades são enormes, e neste processo o Instrutor de Libras
também atua como tradutor do conteúdo em português para a escrita de língua de
sinais e vice-versa. Só é necessário que ele seja bilíngüe.
O uso diário desta ferramenta aponta possibilidades novas a cada dia.
Grande parte dos alunos com surdez que estão inseridos nas escolas denominadas
inclusivas, ainda encontram uma grande barreira linguística que afeta seu
desenvolvimento cognitivo. Por que não prover materialidade à sua língua? É este o
grande desafio que a escrita de sinais tenta vencer.
4. Conclusão:
São muitas as discussões sobre a inclusão escolar, tanto no âmbito legislativo
quanto no pedagógico. Essas discussões vão desde a questão da acessibilidade
arquitetônica à atitudinal, buscando apontar caminhos para que o aluno com déficit
possa incluir-se no ensino regular. As discussões sobre a inclusão do ensino de
Escrita de Sinais para alunos surdos ainda é recente e faltam profissionais com este
tipo de conhecimento específico, alguns deles ainda em processo de formação.
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Os estudos que realizei, embora desvinculados dos estudos acadêmicos,
apontam para o fato de que o aprendizado da escrita da língua de sinais possibilita
que o aluno com surdez desenvolva suas competências cognitivas, numa proposta
de modalidade escrita da língua que ele já desenvolveu competentemente. Este
processo de aprendizado da sinalização escrita pode ocorrer tanto na pré-escola
quanto nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Por se tratar de processo
simbólico, esta escrita é um instrumental eficaz para a realização dos processos
cognitivos mais sofisticados que possibilitem desenvolvimento cognitivo.
Quanto ao aprendizado do código por parte dos profissionais que irão
futuramente fazer uso desta escrita, tanto no processo de tradução
(Libras/português, português-Libras) ou mesmo no ensino da escrita para alunos
com surdez, já estão sendo formados em nível de Graduação pela UFSC (Letras-
Libras) e também Especialização. Em nível de Pós-Graduação7, posso afirmar que
leciono a disciplina de Signwriting em um curso de Pós-Graduação8 onde a grande
maioria dos alunos reporta ao final da aula que o sistema é de fácil aprendizado e
que havia da parte deles uma certa resistência ao uso do sistema devido à falta de
informação e a um pré-concebido errôneo de que o sistema era muito difícil de ser
assimilado por pessoas ouvintes.
Muitos estudos ainda necessitam ser feitos para provar cientificamente que
uma escrita deva contemplar a modalidade comunicativa do aluno em questão, ou
seja, escrita fonética para pessoas que ouvem/falam a língua portuguesa e escrita
visual/espacial para falantes de Língua de Sinais, como uma forma de que estes
sujeitos adquiram desenvolvimento cognitivo específico na área da linguagem
escrita e também aumento do léxico da Libras, para, em um segundo momento,
aprenderem a língua portuguesa como uma segunda língua. Mesmo com os poucos
estudos acadêmicos registrados9 reportando sobre a aplicabilidade do código ao
ensino de usuários de línguas de sinais, o que percebo em minha prática é que os
alunos surdos aprendem o código com uma rapidez surpreendente, sendo capazes
de fazer a leitura de textos com apenas dois meses de aprendizado sistemático
(cinco vezes por semana, uma hora aula por dia). Qual a criança ouvinte que
7 Faculdades Integradas Espíritas-UNIBEM � ATUALIZE-Promotora de cursos e eventos, Pós-graduação Lato
Sensu �LIBRAS E EDUCAÇÃO DE SURDOS�. 8 Faculdades Integradas Espíritas-UNIBEM � ATUALIZE-Promotora de cursos e eventos, Pós-graduação Lato
Sensu �LIBRAS E EDUCAÇÃO DE SURDOS�. 9 Ver estudos de GANGEL-VASQUEZ, sobre a aplicabilidade em uma escola da Nicarágua.
II CONGRESSO NACIONAL DE SURDEZ � S. J. CAMPOS-S.P.
consegue realizar leitura de textos simples com dois meses de ensino do código
alfabético?
Referências bibliograficas:
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