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FORMAÇÃO DE VÍNCULOS NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA A PARTIR
DA PSICANÁLISE DE VÍNCULOS
RELATIONSHIP FORMATION OF CONTEMPORARY FAMILY FROM
PSYCHOANALYSIS OF LINKS
¹ Acadêmicas de Psicologia da
UNIPAR
² Docente do curso de Psicologia da
UNIPAR
Jussane Alexandre Risczik1
Patrícia Adriana Dresch¹
Sidinéia da Silva¹
Miriam Cristina Benedeti²
RISCZIK, A.J.; DRESCH, P. A.; SILVA, S. Formação de vínculos na
família contemporânea a partir da Psicanálise de Vínculos. 2018.
RESUMO: O presente artigo tem como objetivo discutir a formação de
vínculos na família contemporânea a partir da Psicanálise das
Configurações Vinculares (PCV). A partir dessa perspectiva percorremos
o caminho do conceito de grupo, vínculos e concomitantemente
apresentamos um breve histórico da família, mediante as transformações
as quais perpassou e sua contribuição específica através do processo
vincular como formadora da estrutura psíquica dos indivíduos. Na busca
de contemplar a compreensão da PCV ressaltamos sua característica
principal como a reciprocidade da relação do homem com o meio e sua
permanente influência modificadora nos planos intra, inter e transubjetivo.
Dos pressupostos teóricos embutidos nessa discussão sugerir-se-à uma
busca nas questões psicológicas, mais especificamente na terapia, seja
individual, de casal, familiar ou grupal, e a abertura de um espaço para as
pessoas pensarem e se comunicarem. Auxiliar os sujeitos a resgatarem
conteúdos inconscientes e introjetados e ressignificá-los, em uma tentativa
de melhor aceitação de si e do outro.
PALAVRAS-CHAVE: Grupos. Família. Vínculos. Psicanálise.
ABSTRACT: This article aims to discuss the formation of links in the
contemporary family based on the Psychoanalysis of Link Configurations
(PCV). From this perspective we have gone down the definition of group,
and concomitantly we present a brief history of the family, through the
transformations that permeated and their specific contribution through the
process of linking as a formator of the psychic structure of individuals. In
the search to contemplate the understanding of PCV, we emphasize its
main characteristic as the reciprocity of man's relation to the environment
and its permanent modifying influence on the intra, inter and transubjective
plans. From the theoretical assumptions embedded in this discussion we
will suggest a search in psychological questions, more specifically in
therapy, whether individual, couple, family or group, and open up a room
for people to think and communicate. To assist the subjects to restore
unconscious and introjected contents and reframe them, in an attempt to
accept better oneself and the other.
KEYWORDS: Groups. Family. Links. Psychoanalysis.
AKRÓPOLIS - Revista de Ciências Humanas da UNIPAR
INTRODUÇÃO
Nosso tema tem como foco apresentar a
formação de vínculos a partir da psicanálise,
repensando como se dão suas relações acerca do
grupo familiar. Percebe-se nos tempos
modernos, que o ser humano tem
progressivamente dado menos importância ao
outro. A ênfase está centrada no eu, no princípio
e no fim das coisas. É notória a superficialidade
nas relações.
Freud já havia dito que o homem se
considera o centro do universo, portanto, um
grande desafio que se coloca, é saber conviver
com o outro. Pensando assim, não podemos
viver isoladamente, necessitamos do outro e
dessa forma nos agrupamos.
O grupo precede o indivíduo. Por um lado,
vivemos essa época de exclusivismos e
individualismo, nos bunkers particulares, por
outro, é exatamente neste momento que vem
surgindo movimentos comunitários, ONGs,
associações de bairros, mutirões sociais. É a
forma do grupo imperando sobre o individual.
(ÁVILA, 2003, p. 83).
Ora, mesmo em uma sociedade
individualista, que faz com que o indivíduo se
volte para si mesmo e para seus interesses
somente, ainda assim, há em cada pessoa a
necessidade do outro.
O indivíduo não existe por si mesmo, ou em si
mesmo. O indivíduo existe por sua necessária
e obrigatória participação nos grupos. É com
os recursos e os atributos da grupalidade que
cada indivíduo vem a se constituir enquanto
indivíduo. (ÁVILA, 2007, p. 18).
Ávila (2003) mostra que o aprendizado
de conviver com os demais sujeitos, ou seja, em
grupo, é contínuo e permanente. “Precisamos
ter constituído um eu, um espaço interno para
poder, pelo menos temporariamente, abrir mão
desse eu.” (p.85).
Percebe-se que um grupo não é somente
um conjunto de pessoas que compartilham do
mesmo lugar. Num grupo há interação, estão ali
embutidos vínculos interpessoais, é no grupo
que a coletividade humana ganha espaço, onde
acontecem experiências emocionais
compartilhadas.
O grupo funciona na sua plenitude quando
encontramos um objeto exterior no qual
podemos colocar nosso ideal do ego. Esse
grupo livremente constituído permite-nos ir
além de nós mesmos, sair do narcisismo, ir
além da família de origem, da raça, do credo
ou da nacionalidade. (Idem, 2003, p. 84).
Quando nos referimos a grupo, o autor
Eiguer (1985, p. 55) traz considerações
importantes “[...] a teoria da interação,
desempenhou, é certo, um papel fundamental na
compreensão da família como grupo. ”
O ser humano nasce pertencendo a um
determinado grupo que é a sua família, estrutura
esta em que acontece sua primeira formação de
vínculos, esse “processo de estruturação do
psiquismo familiar tem início com o
investimento de sujeitos que cruzam desejos e
fantasias, estabelecendo movimentos recíprocos
de identificação” Passos (2006, p. 09), com o
passar do tempo os indivíduos interligando-se
formam novos vínculos e outros grupos sociais.
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Portanto, seja em seu aspecto relacional
ou de vínculo, o grupo vai mostrando um de
seus objetivos como o de configurar vínculos na
composição entre os sujeitos.
Vínculo é a estrutura relacional em que ocorre
uma “experiência emocional” entre duas ou mais
pessoas ou partes da mesma pessoa. Pode ser
intrasubjetivo, intersubjetivo ou transubjetivo.
(FERNANDES, 2003, p. 44)
Neste processo deve-se considerar a
comunicação entre os sujeitos envolvidos, e o
comunicar aqui tem o significado de
compartilhar, ter algo em comum e por fim,
estabelecer o vínculo, dessa forma, pode-se
dizer que estes sujeitos envolvidos estão sempre
se comunicando.
No grupo, entre as matrizes vinculares
estabelecem-se lentamente canais de
comunicação e trocas relacionais carregadas
de significado afetivo, que originam uma rede
inter e transpessoal, que no aqui e agora se faz
e se desfaz, ao longo de cada sessão, mas que
tende a se organizar e a se fixar, evidenciando
características específicas em cada grupo.
(FERNANDES, 2003, p.147).
Concomitante a busca de conceitos para
compreender melhor a teoria das configurações
vinculares na psicanálise, adentramos no campo
da família, lugar onde estabelecem vínculos
mais próximos entre os sujeitos que convivem
em grupo e possuem características vinculares
específicas e objetivos comuns.
O discurso da família, a maneira como as
relações vinculares são estruturadas e
vivenciadas pelos seus componentes, além do
momento histórico e cultural, influenciarão na
formação da personalidade do indivíduo.
Logo, a entrada do sujeito na história tem
ligações com o clima emocional interno e
externo em que ela foi gerada, com as
idealizações e angustias existentes na mente
dos pais e com o desenvolvimento do aparelho
psíquico. (LEVISKY, 2003, p.215).
Dessa forma, é importante considerar
que a instituição família precisa ser
contextualizada no momento histórico em que
esta é experienciada. É necessário pensar em
suas especificidades e os fatores em comum em
relação a outras instituições em que se
configuram os vínculos.
Diante da temática das configurações
vinculares, concebe a psicanálise das
configurações vinculares (ou psicanálise
vincular) como uma forma de organizar
conhecimentos existentes e de abrir um campo
de estudo com uma visão muito mais
abrangente em relação à psicanálise,
principalmente em se tratando de grupos, das
famílias, dos casais, das instituições.
(FERNANDES, 2003).
Sendo assim, busca-se compreender a
importância das configurações vinculares na
família contemporânea a partir da psicanálise
dos vínculos.
BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A
HISTÓRIA DA FAMÍLIA
Para buscarmos compreender a
formação de vínculos, tomando como base a
corrente do pensamento psicanalítico criada
pelos psicanalistas argentinos e franceses a
partir dos anos 1950, para abarcar os múltiplos
vínculos estabelecidos pelo indivíduo e suas
estruturas inconscientes. (FERNANDES &
SVARTMAN, 2003).
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Vamos nos deter, por um momento, nas
noções sobre os tipos de família que abarcam
desde seus primórdios até a contemporaneidade,
elucidando que não é tarefa simples descrever
sua tipologia, em vista da complexidade e
abrangência que requer o tema. Berenstein
(2011) diz que "o conjunto família se constitui
mediante um 'fazer' com isso que seus
integrantes supõem semelhante – por isso
normalmente se chama 'familiar' aquilo
conhecido, que em parte o é e em parte não – e
requer um trabalho com os outros que trazem
uma alienidade, de onde surgirá o novo"
(BERENSTEIN, 2011, p. 21).
Em relação à família existem ainda três
formas de relações vinculares apresentadas por
Levisky (2003). As mesmas são: Famílias
nucleares; Famílias reconstituídas e Famílias
adotivas. Segundo a autora, as famílias
nucleares representam-se, pelos filhos, pai, mãe,
como também os parentes que são unidos por
laços sanguíneos. Já as famílias reconstituídas,
são aquelas onde os pais adquirem uma nova
união e trazem consigo seus filhos, e estes
tentam buscar um espaço comum. E à terceira
representação de família, pertencem as adotivas,
que se formam quando, os pais adotam filhos e
seus vinculares são de natureza emocionais. (p.
216)
Esses são os modelos apresentados pela
autora, e de forma mais simples, ela descreve a
família como “[...] um grupo de pessoas com
características vinculares específicas e objetivos
comuns.” (p. 215).
Em relação aos tipos de família que se
constituíram ao longo da história até a
contemporaneidade, tomaremos o que o autor
Reis (2004, p.105) considera “[...] Poster
apresenta quatro modelos de família: a
aristocrática e a família camponesa (dos séculos
XVI e XVII), a família proletária e a família
burguesa (do século XIX).”
O autor Reis (2004) apresenta as
características essenciais das estruturas
emocionais que compõem os tipos de família
relacionado ao contexto histórico em que cada
uma destas está determinada. Diante das
peculiaridades que requer a discussão em torno
das características da família burguesa, nos
deteremos a esta tipologia, pois seu modelo
criou novos padrões familiares que foram
transmitidos ao longo do tempo até a
contemporaneidade.
Assim, podemos concluir que certas
características da família burguesa típica do
século XIX, que criou novos padrões para a
vida familiar, adequados às necessidades da
nova classe dominante, continuam presentes
nas famílias contemporâneas. Entretanto, essa
presença se dá parcialmente, porque hoje são
outras as condições históricas. (REIS, 2004,
p.122)
Portanto, remetendo a história, o grupo
familiar vem sofrendo transformações
marcantes em sua forma de organização tanto
afetivas quanto sexuais, como o autor Reis
(2004) destaca que continua vigente na estrutura
familiar advindo do modelo burguês “a rígida
hierarquia de sexo e de idade, assim como a
associação entre amor e autoridade...” (p. 122)
Mostrando assim, que esta combinação provoca
sofrimento e angústia em seus membros, ao
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mesmo tempo em que cumpre sua função de
transmissão da ideologia vigente.
VÍNCULOS X PSICANÁLISE:
CONFIGURAÇÕES VINCULARES
Sabe-se que na contemporaneidade são
apresentadas cada vez mais diferentes estruturas
familiares, e estas se configuram de diversas
formas. Considerando as relações que se
estabelecem no ambiente familiar, nos
aprofundaremos nos estudos de vínculos a partir
da psicanálise.
Dessa forma, remetendo-nos a
afetividade como algo que deve ser estimulado,
esta também faz parte da evolução do indivíduo,
no “desenvolvimento estrutural e psicológico do
ser humano” Bairros et al (2011 p.01), sem a
afetividade, não terá sua completude da
estrutura emocional. Nesse sentido os autores
apontam que:
Sem ela, este não se desenvolve plenamente, é
de extrema relevância demonstrarmos a
importância do afeto na construção da base da
personalidade nos primeiros anos de vida,
considerando que aquilo que acontece ao
indivíduo neste período irá refletir-se na
adolescência e na fase adulta. As impressões
registradas no inconsciente, pela presença ou
ausência das relações afetivas entre pais e
filhos, podem causar graves transtornos
afetivos e emocionais às crianças (BAIRROS
et al, 2011, p.01)
Quando tratamos de vínculos, para a
teoria psicanalítica, o autor Pichon-Rivière
(1998), pontua que é algo mais concreto que
relações de objeto, "é então, um tipo particular
de relação de objeto; a relação de objeto é
constituída por uma estrutura que funciona de
uma determinada maneira. (...) O vínculo é algo
diferente que inclui a conduta.” (p.17).
Nesse contexto, o autor ainda continua
ressaltando que:
O vínculo é sempre um vínculo social, mesmo
sendo com uma só pessoa; através da relação
com essa pessoa repete-se uma história de
vínculos determinados em um tempo e em
espaços determinados. Por essa razão, o
vínculo se relaciona posteriormente com a
noção de papel, de status e de comunicação.
(PICHON-RIVIÉRE, 1998 p.31)
Para Passos (2006) os laços familiares
são de extrema importância na formação e
constituição da nossa subjetividade, vão nos
moldando no processo de amadurecimento para
a convivência em grupos.
Dessa forma, esses laços, ou seja, essas
relações vinculares colocados no contexto
familiar, sem sombra de dúvida, têm grande
importância na formação do indivíduo.
As famílias têm sido recriadas não mais
segundo padrões hegemônicos do patriarcado,
mas conforme demandas dos sujeitos e das
possibilidades oferecidas pela sociedade,
atualmente mais aberta e igualitária. (PASSOS,
2006, p. 08)
Com todas as mudanças que vem
ocorrendo e com os novos modelos e
composições familiares, o autor ressalta que,
mesmo existindo certa divulgação sobre a crise
da família e seu fim, ainda assim, a mesma
conserva-se como grande auxílio da
constituição do psiquismo e da subjetividade do
indivíduo. Dessa forma, caso a família fosse
extinta, o seria também o sujeito.
Cada família constrói seus vínculos,
forma seus laços, e é a partir dessa construção
que sua história é composta. E na instituição
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familiar, conforme Durand (2003) “cada um
constitui uma forma de vínculo e contém
proposições que se materializam nos projetos,
além de uma representação compartilhada do
conjunto.” (p. 91)
Portanto,
O suceder dos acontecimentos em uma
instituição depende das pessoas, dos seus
vínculos, da história de um grupo, do que se
apostou juntos e do que negamos em nós e entre
nós para permanecermos. [...] Cada um tem a
sua cota de participação e de responsabilidade
no acontecer institucional, e isso faz a beleza
do movimento que aproxima e afasta, promove
casamentos e separações necessárias. (Idem,
2003, p. 91)
Para pensarmos na teoria das
configurações vinculares com foco na família,
se faz necessário tecer apontamentos advindos
de autores que mostram sua contribuição diante
do tema.
As pessoas relacionam-se a partir de modelos
de vínculos – as matrizes vinculares. O bebê
introjeta as estruturas vinculares a partir do
mundo externo, começando pelos pais, e passa
a conservá-las como padrão, sendo que a matriz
vincular básica é a matriz edípica. As matrizes
vinculares, configuradas como fantasias
inconscientes, vão constituir o nosso caráter.
Da mesma forma, o código dos homens de
milênios – um tipo de conhecimento advindo
do pensamento grupal – é colocado no primeiro
ano de vida dentro de cada um, como
conhecimento mítico. (FERNANDES, 2003,
p.45).
Vários autores, principalmente os
argentinos desenvolveram pressupostos teóricos
importante no que tange a psicanálise vincular.
Esses autores criaram uma escola para tecer
conhecimento e subsidiar o trabalho com a
saúde mental. Essa escola passou a se chamar
Psicanálise das Configurações Vinculares
(PVC). Segundo os autores Fernandes &
Svartman (2003, p. 67) “[...] a PVC começou a
ser utilizada pelo grupo argentino em 1988 para
abarcar a psicanálise dos diferentes grupos, além
de grupos terapêuticos, também famílias, casais
e instituições. ”
A partir das formulações teóricas dos
pensadores, as configurações vinculares vão
ganhando forma, se estruturando com sólidos
fundamentos. Para pensadores dessa época
Ao aprofundar-se o estudo dos vínculos,
interindividuais em uma perspectiva
psicanalítica essas diferentes CV (grupo,
família, instituição, etc.) são efeitos de
processos diferentes, os quais são produto do
desenvolvimento de um conjunto de estruturas
psíquicas intra e interindividuais.
(FERNANDES & SVARTMAN, 2003, p.68).
Entretanto, para alcançar a compreensão
do que vem a ser as configurações vinculares, é
necessário, elucidar suas características diante
de seu histórico de criação.
A característica principal da PCV é o destaque
da reciprocidade da relação do homem com o
meio. Mais especificamente, a perene
influência modificadora, em todas as direções,
dos planos intra, inter e transobjetivo. Nessa
concepção dialética entre processos psíquicos e
a ordem histórico-social, podemos conceber o
vínculo como o espaço no qual ocorrem as
articulações desses vários planos, sendo, ao
mesmo tempo, o vínculo aquilo que institui as
modificações que não param de ocorrer nos três
níveis (intra, inter e transobjetivo) durante toda
a vida do sujeito”. (Ibidem, 2003, p.68).
Assim juntamente com Isidoro
Berenstein e Janine Puget, psicanalistas
argentinos, deram sua contribuição na criação da
Psicanálise de Família com o fundamento de
vínculo, ou o que estes autores denominam de
vincular, considerando que vínculo é um termo
amplamente utilizado na Psicanálise com vários
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propósitos. Os autores debruçaram-se na
investigação dos vínculos familiares, as
produções sintomáticas do vínculo, bem como a
estrutura do sujeito produzido no vínculo, e
declaram o vínculo como "uma estrutura
inconsciente que une dois ou mais sujeitos, e que
os determina em base a uma relação de
presença" (BERENSTEIN, 2001, p. 246).
A partir da perspectiva da PCV que
oferece respostas para questões complexas que
nos deparamos na contemporaneidade e que
reescreveu conceitos clássicos de Freud, pois as
considerações com o que é chamado de vincular
são contemporâneas e abrangem a compreensão
dos grupos como uma configuração de vínculos,
como já foi dito, uma relação dos sujeitos.
(BERENSTEIN, 2001). A partir dos vínculos e
de suas configurações, o trabalho com sua
grupalidade diversifica-se no estudo mais
particularizado das famílias e casais, das
instituições e de todas as formas de grupos.
(FERNANDES, 2010).
Tecendo um paralelo da PCV com a
família contemporânea, pode-se dizer que houve
transformações importantes advindas das
mudanças históricas nos laços vinculares destas,
o que faz com que cada integrante busque
reinventar-se diante dessas novas configurações.
Para melhor entendermos essa organização
interna da família, usaremos os conceitos
desenvolvidos por Mark Poster. Para ele “a
família é o lugar onde se forma a estrutura
psíquica e onde a experiência se caracteriza, em
primeiro lugar, por padrões emocionais. A
função de socialização está claramente
implícita nesta definição, mas a família não
está sendo conceptualizada primordialmente
como uma instituição investida na função de
socialização. Ela é, em vez disso, a localização
social onde estrutura psíquica é proeminente de
um modo decisivo”. Ela possui também um
caráter sumamente importante: Além de ser o
lócus da estrutura psíquica, a família constitui
um espaço social distinto na medida em que
gera e consubstancia hierarquias de idade e
sexo. (REIS, 2004, p.104).
Em consonância ao lugar da formação da
estrutura psíquica, é possível ressaltar que,
Käes faz um trabalho teórico fundamental
quando aponta, no pensamento freudiano, a
importância da transmissão psíquica não só de
geração para geração, mas em uma escala
filogenética. Essa transmissão também ocorre
entre pessoas que formam um casal, uma
família, um grupo ou uma instituição.
(DURAND, 2003, p. 88)
A autora complementa que o ego é a
estrutura do nosso aparelho psíquico
encarregada de realizar a nossa adaptação no
mundo, pois ele mantém contato com a
realidade humana, material e social e também
com nossas necessidades de sobrevivência e de
amor – ele é a referência que somos.
(DURAND, 2003).
Ao acentuar o vínculo, é importante
pensar segundo Durand (2003) que hoje, estes
sofrem e nutrem-se da reminiscência do que foi
imaginado e, retrospectivamente colocado nas
origens da instituição da maneira como hoje
nos idealizamos. A reminiscência é uma das
forças que cria o futuro: se o desejo aponta para
o futuro, tem como fonte o passado. Desse
paradoxo surge o verdadeiramente novo, pois
o lastro do ideal é o desejo que ele encobre.
Concomitantemente, o autor Reis
(2004), ao tratar da estrutura familiar
predominante, este enfatiza que a promoção
incondicional do bem-estar de seus membros,
apenas será possível quando ela não mais se
definir por um fechamento e uma oposição ao
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mundo extrafamiliar, ou seja, quando voltar a
integrar seus membros na comunidade que a
circunscreve, o que não significa voltar a
modelos historicamente superados. E isso
apenas será possível quando a competição
deixar de ser o motor do relacionamento entre
os homens.
Porém, parece algo utópico pensar a
extinção de tal competição, pois a mesma está
de certa forma impregnada na
estrutura familiar. E isso é reflexo de uma
sociedade burguesa, que faz com que haja uma
disputa entre os indivíduos para que o capital
se mantenha.
Portanto, pensar a família, é pensar sim,
que a mesma tem um papel fundamental na
formação do indivíduo, mas é preciso
questionar que formação é essa, e a quem ela
serve. O autor Reis, acima citado,
destaca que é “impossível entender o grupo
familiar sem considerá-lo dentro de uma
complexa trama social e histórica que o
envolve.” (p. 102). Ou seja, a família é criação
humana, que existe propositalmente para
responder uma necessidade social.
Por mais que a sociedade e a família
sofram transformações, a necessidade social, à
qual a segunda responde, continua
historicamente sendo a da reprodução, não
somente biológica, mas principalmente
ideológica.
Como a ideologia opera na família? Ela começa
por apresentar uma noção ideologizada da
própria família. Essa noção, veiculada
principalmente pelos pais, os principais agentes
da educação, ensina a ver a família como algo
natural e universal e, por isso, imutável. Depois
passa a apresentar da mesma forma o mundo
extrafamiliar e todas as relações sociais. (REIS,
1989, p. 103).
Além de reproduzir a ideologia, a família
faz também a manutenção da mesma,
perpetuando ao longo da história os papéis e os
valores que são da classe dominante, e assim, a
família faz essa transmissão de geração em
geração, fazendo com que essa ideologia seja
naturalizada e transformada em uma visão de
mundo.
Cabe destacar também o que a autora
Levisky (2003) aborda que as famílias e grupos
vêm ocupando um lugar especial, devido a
carência que as pessoas têm sentido na
sociedade atual. Solidão, desamparo e
desencontro têm sido queixas comuns nos
consultórios. Contudo, sabe que a sociedade de
hoje tem um caráter mais individualista e com
falhas na comunicação entre os sujeitos, como
esclarece ainda a autora Levisky (2003)
considera que com o passar dos anos é possível
notar que os objetivos, seja individual, de casal,
familiar ou grupal, é a abertura de um espaço
para as pessoas pensarem e se comunicarem.
“Entendo que no processo comunicativo está
envolvido o olhar, o falar, o ouvir e o ser
ouvido.” (p. 223).
É no espaço de escuta em que a
psicologia oferece que é possível compreender
as relações que se estabelecem na família, bem
como considerar a problemática atual que surge
exigindo dos terapeutas um novo olhar. Cabe a
nós terapeutas de grupo e de famílias, auxiliar
nossos pacientes a resgatarem conteúdos
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inconscientes e introjetados e ressignificá-los,
em uma tentativa de melhor aceitação de si e do
outro, além de buscar uma melhor capacidade de
adaptação ao meio em que vivem. (LEVISKY,
2003).
Ao tratar das potencialidades do trabalho
com famílias e casais através das configurações
vinculares a autora Cunha (2003) sugere uma
modificação da demanda dos consultórios com
uma baixa procura a psicoterapias analíticas,
entretanto enfatiza a importância de explorar sua
aplicabilidade e as perspectivas de pesquisa em
seu desenvolvimento futuro a luz da prática do
terapeuta associado ao contexto histórico em
que vivemos. A autora fala de uma certa força e
vitalidade da abordagem direcionada a família,
propõe que essa vitalidade está relacionada com
o momento que estamos vivendo, as
características do seu referencial e, com o fato
de a família ser uma junção entre indivíduo e
sociedade, o que torna uma unidade de
abordagem favorável para laborar com o
desenvolvimento individual e social tanto em
nível terapêutico quanto preventivo. (CUNHA,
2003).
Podemos concluir que a PCV alinhava
um inconsciente que se configura no processo
vincular. Ao pensar nessa concepção se faz
necessário considerar que há dois ou mais
sujeitos, que afirmam entre si laços que
desenham um tipo de vinculação particular,
atravessada por elementos conscientes e
inconscientes, no que permeia uma situação que
se organiza e produz subjetividade e alteridade.
Portanto, pensar nessa perspectiva no
trabalho com famílias sobre o estudo da
comunicação destas, implica também na
aceitação do inconsciente dinâmico, pensar não
só no indivíduo, mas num sistema de relações.
Essa visão de como funciona a organização
familiar à luz da psicanálise de vínculos declara
a vida familiar como expressão do enlaçar das
várias relações objetais inter-relacionadas, ao
mesmo tempo em que constante interage com o
meio. (CUNHA, 2003). Considerar igualmente
importante, contextualizar a família que se
apresenta na contemporaneidade, assim como
suas raízes. Sob o estudo da família
contemporânea, é possível identificar os fatores
socioeconômicos e ideológicos que a formaram
e como esses elementos ainda encontram
sustentação para se manterem presentes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nos estudos em que realizamos,
constatou-se a importância das configurações
vinculares na família contemporânea a partir dos
pressupostos teóricos da psicanálise, tanto as
contribuições dos autores franceses quanto dos
argentinos. Buscou-se diante de um breve
histórico, analisar os tipos de família que se
constituíram ao longo do tempo. Mediante a
função exercida pela família nos processos
vinculares como formadora da estrutura
psíquica, bem como característica principal da
família contemporânea, a transmissão da
ideologia vigente.
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Diante dos pressupostos teóricos,
reconhecemos a importância do psicoterapeuta
que trabalha com os grupos, especialmente os
grupos familiares, buscando empenhar-se na
escuta do outro para que os sujeitos se sintam
ouvidos e amparados, compreender a
estruturação das configurações vinculares,
acreditando que os vínculos não se estruturam
somente a partir do inconsciente intrasubjetivo,
mas também a partir do intersubjetivo que
corresponde a relação com o outro, além do
plano transubjetivo que se reporta as influências
do social.
A partir dessa perspectiva, oferece a
possibilidade no processo terapêutico de auxiliar
os sujeitos a resgatarem conteúdos inconscientes
e ressignificá-los para uma melhor aceitação de
si e do outro e assim atribuir relações mais
saudáveis em seu meio.
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AKRÓPOLIS - Revista de Ciências Humanas da UNIPAR
FORMACIÓN DE VÍNCULOS EN
LA FAMILIA CONTEMPORÁNEA
A PARTIR DEL PSICOANÁLISIS
DE LOS VÍNCULOS
RESUMEN: El presente artículo tiene como objetivo
discutir la formación de vínculos en la familia
contemporánea a partir del Psicoanálisis de las
Configuraciones Vinculares (PCV). Desde esa
perspectiva recorremos el camino del concepto de grupo,
vínculos y concomitantemente presentamos un breve
histórico de la familia, mediante las transformaciones por
las que pasó y su contribución específica a través del
proceso vincular como formadora de la estructura
psíquica de los individuos. Buscando contemplar la
comprensión del PCV resaltamos su característica
principal como la reciprocidad de la relación del hombre
con el medio y su permanente influencia modificadora en
los planos intra, inter y transubjetivo. De los presupuestos
teóricos incrustados en esa discusión se sugerirá una
búsqueda en las cuestiones psicológicas, más
específicamente en la terapia, sea esta individual, de la
pareja, familiar o grupal y la apertura de un espacio donde
las personas puedan pensar y comunicarse. Auxiliar a los
sujetos a rescatar contenidos inconscientes e introyectados
y resignificarlos, en el intento de mejorar la aceptación de
sí mismo y del otro.
PALABRAS CLAVE: Grupos. Familia. Vínculos.
Psicoanálisis
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